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Marco Regulatório e Projeto de Monitoração da Anvisa

2. Apresentando nosso tema

2.2. Marco Regulatório e Projeto de Monitoração da Anvisa

Conforme também aponta o Relatório Final o Projeto de Monitoração (Anvisa, 2010), a Junta Central de Higiene Pública já demonstrava em 1851 preocupações com as “informações sobre medicamentos divulgadas pelos veículos de comunicação” (p. 25). No entanto, este mesmo documento enfatiza que somente a partir do século XX é que passaram a ser preconizadas medidas para o controle da propaganda de medicamentos no Brasil.

No ano de 1988, “a carta Magna Brasileira tornou uma obrigação constitucional a restrição às propagandas de medicamentos, com o objetivo de proteger a população dos riscos sanitários advindos dessa prática” e, neste mesmo ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) também havia criado um documento “contendo os Critérios Éticos para a Promoção de Medicamentos”. Dez anos depois, em 1998, foi criada a Anvisa “por meio da Medida Provisória nº 1.791, convertida na Lei nº 9.782 de 26 de janeiro de 1999”. Pouco depois, no ano de 2000 foi elaborada e submetida à consulta pública uma proposta de regulamentação para esse tipo de propaganda. (Anvisa, 2010, p. 26).

De acordo com o Relatório Final o Projeto de Monitoração (Anvisa, 2010), após consolidadas e encaminhadas para a sua Diretoria Colegiada, a proposta de regulamentação foi aprovada, originando a Resolução – RDC nº 102, de 30 de novembro de 2000 (RDC nº 102/2000).

No que diz respeito a essa publicação encontramos o relato de que ela “representou um marco histórico de fundamental importância para a consolidação da atuação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária como elemento articulador das políticas públicas de intervenção e proteção da sociedade brasileira globalmente considerada” (Fagundes, apud Anvisa, 2010, p. 27).

A partir da experiência conquistada com a aplicação das regras estabelecidas na RDC nº102/2000, a Anvisa verificou a necessidade de maior detalhamento da norma, além de sua atualização a fim de acompanhar as novas estratégias adotadas pelas empresas. Dessa forma, em 2005 iniciou-se uma nova discussão acerca da regulamentação da propaganda de medicamentos no Brasil, com a publicação da Consulta Pública nº 84. Após quase três anos de discussão com a sociedade, foi

publicada, em 2008, a RDC nº 96, que desde julho de 2009 é a norma que regulamenta a propaganda de medicamentos no país. (Anvisa, 2010, p. 27).

Essa nova resolução, segundo o Relatório Final o Projeto de Monitoração (Anvisa, 2010) foi considerada como uma inovação no marco regulatório, e teve como principais objetivos: “(...) estabelecer que o consumo de medicamentos não possa figurar no imaginário da população como uma situação natural, cotidiana, com atores profissionais e personalidades de grande impacto midiático ensinando como se toma a medicação” (p. 28).

Cabe aqui destacar que as ações comentadas pelo documento citado (Consultas públicas, elaboração da RDC nº 102/2000 e posteriormente da RDC nº 96/2008) foram consideradas por Anvisa (2008) como indispensáveis, principalmente após a instauração da CPI dos medicamentos, que “funcionou de novembro de 1999 a junho de 2000” (Anvisa, 2010, p. 141). De acordo com os relatos encontrados sobre essa CPI,

Logo de início, revelou-se um escândalo envolvendo 21 laboratórios, que teriam formado um cartel para impedir o pleno funcionamento da Política Nacional de Medicamentos Genéricos. (...) Ainda mais espantosa foi a denúncia surgida a partir do depoimento de Aparecido Bueno Camargo, então presidente da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma). Convocado duas vezes pela CPI, Camargo revelou a existência dos chamados B. Os. – jargão utilizado pelos donos de farmácias para designar medicamentos bonificados, popularmente conhecidos como “remédios bons para otários” – que não têm eficácia comprovada ou que geram bônus para as próprias farmácias. (Anvisa, 2010, p. 141- 142).

Em adição, a Anvisa informou que,

A CPI, presidida pelo deputado Ney Lopes e com o deputado Nelson Marchezan, como relator, chegou às seguintes conclusões: “- O Brasil está entre os cinco maiores consumidores de medicamentos do mundo. São 32 mil rótulos de medicamentos, com 12 mil substâncias, quando bastariam 300 itens; as dez maiores produtoras de medicamentos no Brasil (entre 628 empresas) respondem por 44% do faturamento total do setor e os 40 maiores produtores por 86%; a produção farmacêutica no Brasil é fundamentalmente de transformação dos princípios ativos em formas farmacêuticas acabadas, sendo a dependência de importações de princípios ativos de 80%; a rentabilidade média dos 15 maiores laboratórios farmacêuticos foi de 15%, sendo que cinco deles obtiveram 37,3%, bem maior do que as médias observadas em outros

setores industriais”. (Anvisa, 2008, p. 142).

Em relação direta com o nosso tema de pesquisa, Anvisa (2008) revelou ainda com base nessa CPI “que cerca de 30% dos recursos do setor são gastos com publicidade (algo em torno de R$ 4,5 bilhões/ano)”, e por esse motivo, “o relatório final da Comissão recomendou a fiscalização da propaganda de medicamentos” (p. 142).

Alinhado a essa recomendação, foi realizado entre os anos de 2002 e 2009 o “Projeto de Monitoração da Propaganda e Publicidade de Medicamentos”, declarado em Anvisa (2014) como o “resultado de uma iniciativa da Anvisa para expandir a todas as regiões brasileiras a monitoração e a fiscalização da propaganda de produtos sujeitos à vigilância sanitária”. Sobre essa assunto, a agência também declarou que:

Além de tentar reduzir a exposição da população à propaganda abusiva e enganosa, verificando o cumprimento da Legislação Sanitária e adotando as medidas corretivas, a Anvisa aborda no projeto questões relevantes à saúde coletiva e estimula a discussão do tema na comunidade acadêmica. Para minimizar os riscos à saúde da população, são trabalhados temas como: automedicação, intoxicações e uso inadequado de medicamentos. (Anvisa, 2014).

Em relação à justificativa e delineamento de seu Projeto de Monitoração a Anvisa expôs que:

O uso de medicamentos é um indicador indireto da qualidade dos serviços de saúde e da propaganda dirigida a médicos e populações, portanto, pode ser utilizado para identificar necessidades de intervenções como a educação da população e subsidiar a elaboração de políticas públicas para normatizar, educar e conter a divulgação, a venda e o consumo de medicamentos. (Anvisa, 2010, p. 22).

Preocupando-se em ressaltar o fato de que:

(...) a propaganda não é a única responsável pela construção integral da cultura de medicalização que se vive atualmente. No entanto, não se pode descartar a possibilidade de a propaganda de medicamentos ser um dos fatores que incentivam a prática da automedicação, vez que favorece a crença de que os medicamentos são sempre a melhor solução para determinados distúrbios ou doenças, quando muitos têm duração limitada e poderiam ser resolvidos de

outras maneiras. (Anvisa, 2010, p. 23).

Nesse sentido, no Relatório Final o Projeto de Monitoração foi ressaltado que a agência:

(...) tem trabalhado em busca do equilíbrio de informações nas peças publicitárias, que devem conter informações confiáveis, isentas, fundamentadas em dados científicos que contemplem, objetivamente, as vantagens e desvantagens dos produtos, possibilitando que o cidadão tenha acesso a informações corretas e fidedignas, e não esteja exposto aos riscos da propaganda abusiva e enganosa. (Anvisa, 2010, p. 23).

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Propaganda do medicamento “Odol”, da década de 1930. Disponível em: http://www.propagandashistoricas.com.br/2013/05/odol-mau-halito-anos-30.html

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Propaganda do medicamento “Sonrisal”, da década de 1950. Fonte: Agência Nacional de Vigilância

Sanitária - Anvisa (2008). Vendendo Saúde: a história da propaganda de medicamentos no Brasil. Brasília: Agência de Vigilância Sanitária.