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Masculinidades Excluídas

No documento Os bandidos na mesa do café (páginas 88-92)

Depois de organizar a coletânea de ensaios de estudos de gênero Masculinidades Excluídas: homens na cena

contemporânea (AZEVEDO FILHO, Flor&Cultura/

Geites, 2006), ao refletir sobre as discussões com o grupo de (pós)doutores pesquisadores que escreveram para o livro, muitas questões vieram à tona. Uma delas e, talvez, a que mais me chamou a atenção é o despreparo das pessoas em lidar com mulheres e homens homoeróticos em idade escolar e, se ainda homo negros e/ou homo deficientes, ai, temos que orar para as deusas, principalmente porque a maioria das pessoas, professores e funcionários, despreparados, não sabem como agir ante o assunto e o ignoram, o que é absolutamente desastroso em vários sentidos.

Um levantamento do IBPS (Instituto Brasileiro de Pesquisas Sociais) feito este ano mostra que 92% da população brasileira defendem o respeito ao direito de ser homossexual. Destes, 54% acreditam que a discriminação ao segmento GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros) deve ser criminalizada e 82% declaram que conviver com gays na escola não traz problemas de relacionamento. Porém, para a maioria das pessoas, falar sobre homossexualidade continua a ser um tabu. A constituição social, religiosa e conservadora faz com que as conversas informais acerca de sexo não transgridam o preconceituoso senso comum. Isso aumenta a responsabilidade que os

colégios já têm, que é trazer os debates à luz da ciência. Hoje em dia, ainda que timidamente, alguns trabalham com temas ligados à sexualidade; mesmo estes, no entanto, evitam discutir a homossexualidade.

Apesar de a Orientação Sexual constar nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), pouco se fez até hoje para garantir aos profissionais da Educação a formação necessária. É difícil para eles trabalhar com desenvoltura um tema para o qual não foram formados ou não se sentem seguros. “É importante que nos cursos de formação de professores estes profissionais tenham acesso a disciplinas que discutam a sexualidade, para que possam tratar do tema adequadamente com seus alunos”, afirma Marília Mendes, educadora e estudiosa do assunto, Doutora em Psicodidática pela Universidad Del País Vasco (Espanha). Já Rita Moreira, socióloga, especialista em Educação pela Universidade Estadual da Bahia (Uneb) e membro do Grupo de Estudos em Filosofia, Gênero e Educação da Universidade Federal da Bahia (Gefige-UFBA), diz que a sexualidade faz parte da condição humana e precisa ser abordada com naturalidade. Segundo ela, na Bahia existem poucos, mas importantes cursos para os professores interessados. “Temos hoje o Programa de Educação Sexual (PROEDSEX) na UFBA, do Instituto de Biologia”, diz. “Além disso, o Instituto está promovendo curso de extensão sobre o ensino de Ciências e Gênero, com enfoque na sexualidade”. Rita cita ainda o Núcleo de Estudos Interdisciplinares Sobre a Mulher (Neim) e os debates que o Gefige promove sobre Gênero, Sexualidade e Educação, na Faculdade de Educação (Faced). “Alguns desses são gratuitos e

de ampla divulgação na internet e nos Institutos onde acontecem”, diz. Este ano, o Governo Federal lançou o programa “Educando para a diversidade: como discutir homossexualidade na escola”, fruto de uma ação conjunta do projeto “Brasil sem Homofobia”, que visa realizar ações de combate à homofobia em todos os ministérios. Na Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo), temos o Geites – Grupo de Estudos Interdisciplinares de Transgressão – Espírito Santo, do qual sou coordenador.

Como acredito que o colégio reproduz o preconceito social, tornando-se um espelho da sociedade e não um espelho para a sociedade e não acho que isso irá mudar tão rapidamente, sinto termos que tolerar os impactos de um ensino omisso ou homofóbico, que são inúmeros e graves. “A escola interfere fundamentalmente na formação do sujeito”, afirma a pedagoga Marília Mendes, que faz palestras sobre a sexualidade humana. Segundo ela, várias pesquisas apontam nos gays, como consequências de uma má abordagem da homossexualidade, uma baixa autoestima, conflitos de identidade, isolamento social, agressividade, depressão e dificuldade na aprendizagem.

Há, ainda, aqueles (a maioria), que têm que enfrentar o bullying, termo estadunidense que é utilizado para definir a segregação a que alguns alunos são submetidos por outros. “O bullying é caracterizado por um conjunto de ações por parte de um grupo que transforma indivíduos em motivo de chacota, humilhando-os e excluindo-os do meio social”, conceitua Marília. Os alunos diminuem seus rendimentos no colégio, podem

se tornar introspectivos, agressivos e, inclusive, cometer suicídio. No caso dos gays, frequentemente os colégios fazem vistas grossas ao preconceito, ou são até agentes dele. Para quem não sabe, professores e funcionários homofóbicos podem ser acionados legalmente. “A situação é de constrangimento, vexame, um crime contra a criança e ao adolescente, porque eles têm direito a um tratamento humanitário em relação a sua sexualidade, que é um direito fundamental”, explica Marcelo Cerqueira, presidente do Grupo Gay da Bahia. “Com esse princípio e com o uso do Estatuto da Criança e do Adolescente, cadeia neles [nos homofóbicos]”. Antônio Neto, psicanalista formado pela Escola Nacional de Psicanálise, considera de enorme importância que se discuta a homossexualidade nos colégios. “É necessário mostrar ao sujeito do novo milênio que tanto faz ser hetero ou homossexual”, afirma. “Ambas as orientações têm o mesmo grau de normalidade”. E a sociedade, a passos lentos, parece estar percebendo isso, como mostram as estatísticas do IBPS. Agora, cabe às instituições de ensino fazer sua parte, educando as crianças e adolescentes para que o mundo se torne um lugar menos preconceituoso, pois, independentemente de quaisquer características que nos tornem diferentes, a condição humana deve ser sempre motivo suficiente para garantir o respeito a todos. Pelo menos, respeito, porque garantir as inclusões no Brasil ainda é hipocrisia. E por sina não pode ser diferente!

No documento Os bandidos na mesa do café (páginas 88-92)

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