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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1.1 Material Particulado

Aerossol é definido como uma suspensão estável de partículas sólidas ou líquidas em um gás e, portanto, corresponde a um sistema de duas fases: as partículas e o gás no qual elas estão suspensas. A estabilidade da suspensão deve durar por pelo menos alguns segundos, mas pode chegar a anos. Material particulado é o nome que se dá às partículas sólidas ou líquidas presentes no aerossol. O termo “aerossol” surgiu por volta de 1920 por analogia com o termo “hidrossol”, que designa uma suspensão estável de partículas sólidas em um líquido (HINDS, 1999).

O material particulado presente no ar provém de diversos processos, naturais ou antropogênicos, e, portanto, partículas dos mais diversos tipos e tamanhos podem ser encontradas na atmosfera, como mosta a Figura 1. Existem diversas fontes de material particulado, como por exemplo: moinhos, correias transportadoras de pó, fornos, caldeiras de combustão e tráfego veicular. Também, em suspensão no ar, podem ser encontradas partículas provenientes do solo, de sal dos oceanos, cinzas vulcânicas, gotículas de água ou partículas de gelo, bem como vírus, bactérias e esporos de fungos. Fenômenos como poeira, fumaça, névoa e neblina são exemplos de aerossóis (HINDS, 1999; ZHANG et al., 2013; SPARKS; CHASE, 2016).

No início do século XX, os aerossóis eram considerados as menores divisões observáveis da matéria, sendo, por isso, o foco das ciências físicas. O estudo dos aerossóis contribuiu para o entendimento do movimento Browniano, para a medição de carga dos elétrons e para o estudo de radiação ionizante. Nas décadas de 1970 e 1980, a crescente preocupação com o meio ambiente e com os efeitos adversos causados pela poluição do ar à saúde humana fizeram crescer a importância da ciência dos aerossóis. A utilização de aerossóis em processos produtivos de alta tecnologia e a preocupação com a contaminação por aerossóis na indústria

de semicondutores cresceram na década de 1980. A partir da década de 1990, as pesquisas voltaram-se às propriedades de partículas ultrafinas, com diâmetros menores que 0,1 µm, e com os efeitos da poluição atmosférica com material particulado nas mudanças climáticas (HINDS, 1999).

Figura 1 – Tamanhos de partículas e aerossóis comumente presentes no ar.

Fonte: Adaptado de SPARKS; CHASE (2016).

As pesquisas do século XXI têm se concentrado no desenvolvimento de métodos e tecnologias para medição de concentração e de propriedades físicas e químicas de aerossóis (BAUMGARDNER et al., 2011), na caracterização do material particulado presente na atmosfera (LI et al., 2016), nos problemas ambientais causados pela poluição com material particulado (CASAZZA et al., 2018), nas consequências de altas concentrações de partículas na atmosfera para a saúde humana (YANG; ZHANG, 2018; SCHRAUFNAGEL et al., 2019), e no desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias para controle da poluição, tanto para ambientes internos como externos (JAWOREK; KRUPA; CZECH, 2007; ZHANG et al., 2011b; JAWOREK et al., 2019).

O estudo das propriedades de aerossóis tem grande interesse prático, pois tais propriedades influenciam na produção, no transporte e no destino final de poluentes atmosféricos, ajudam a entender fenômenos metereológicos, como a formação de nuvens, e permitem o desenvolvimento de tecnologias e aplicações comerciais, como a produção de pigmentos e a aplicação de pesticidas. Como as partículas geralmente representam uma porcentagem muito pequena da massa e do volume total do aerossol, as propriedades bulk quase

não diferem das propriedades do gás. Dessa forma, o estudo do aerossol deve ser feito a nível microscópico, ou seja, devem ser entendidas as características das partículas, as forças atuando sobre elas, seu movimento, sua interação com o gás e com as demais partículas (HINDS, 1999).

O tamanho das partículas é um dos parâmetros mais importantes para caracterização do aerossol, pois dele dependem as propriedades do aerossol e a natureza das leis que governam essas propriedades. É raro que todas as partículas presentes em um aerossol tenham o mesmo tamanho. Portanto, essa caracterização se dá por meio de uma distribuição de tamanhos. Outra característica importante é o formato das partículas. Partículas líquidas quase sempre têm formato esférico. Partículas sólidas, por sua vez, têm formatos muito diversos e complexos, e, muitas vezes, precisam ser caracterizadas com base em um diâmetro equivalente.

Por fim, a densidade da partícula, ou seja, a massa por unidade de volume da partícula, é outra propriedade física de interesse. Ela difere da densidade bulk do aerossol e pode ou não ser igual à densidade do material que originou as partículas. Outras propriedades importantes para caracterização de materiais particulados são a rugosidade, a coesividade e a resistividade elétrica (HINDS, 1999; SPARKS; CHASE, 2016).

A propriedade mais comumente medida de aerossóis, e a mais importante com relação à saúde humana e meio ambiente, é a concentração, que pode ser mássica ou numérica.

A concentração mássica (g m-3, mg m-3 ou µg m-3) expressa a massa de material particulado por unidade de volume do aerossol, enquanto a concentração numérica (# m-3) é o número de partículas por unidade de volume do aerossol (HINDS, 1999). A OMS define padrões de qualidade do ar, que são níveis de poluição do ar aceitáveis em termos dos potenciais impactos à saúde pública e ao meio ambiente. Para partículas menores que 10 µm (PM10), a concentração máxima aceitável é de 15 µg m-3 em termos anuais, e 45 µg m-3 em termos diários. Para partículas menores que 2,5 µm (PM2,5), essa concentração é de 5 µg m-3 em termos anuais, e 15 µg m-3 em termos diários (WHO, 2021b).

A resolução n. 491/2018 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) estabeleceu os valores máximos de 40 µg m-3 para PM10 em termos anuais, e 120 µg m-3 em termos diários. Para PM2,5, as concentrações máximas adotadas foram de 20 µg m-3 em termos anuais, e 60 µg m-3 em termos diários. Tais valores compõem o padrão de qualidade do ar PI-1, em vigor desde a data de publicação da resolução. As concentrações definidas pela OMS, muito menores, são adotadas na resolução do CONAMA como padrão de qualidade final, uma meta a ser alcançada, mas sem nenhum prazo concreto estabelecido (CONAMA, 2018). Em 5 de maio de 2022, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, em resposta a

uma ação promovida em 2019 pelo então vice-procurador geral da República, Luciano Mariz Maia, que o CONAMA editasse uma nova resolução em até 24 meses. A ação, julgada procedente pelo STF, sustentou que a resolução atual do CONAMA prevê padrões iniciais muito permissivos e dispõe sobre os valores recomendados pela OMS de forma genérica, permitindo a continuidade de altos níveis de contaminação atmosférica (STF, 2022).

Para fontes fixas de emissão de poluentes atmosféricos, como chaminés industriais, há resoluções específicas do CONAMA a serem seguidas, como a resolução n.

382/2006, que estabelece os limites máximos de emissão (CONAMA, 2006), e a resolução n.

436/2011, que trata dos limites para fontes fixas instaladas ou com pedido de licença de instalação anteriores a 2007 (CONAMA, 2011).

Para os sistemas de despoeiramento de processos de sinterização de indústrias siderúrgicas integradas, por exemplo, o limite máximo para emissão de material particulado estabelecido por ambas as normas é de 70 mg Nm-3. Órgãos de fiscalização e controle estaduais, como a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) e o Instituto de Energia e Meio Ambiente do Estado do Espírito Santo (IEMA) podem, a seu critério, estabelecer valores ainda mais restritivos para as indústrias operantes em seus respectivos estados.

A Figura 2 apresenta uma comparação entre os tamanhos de PM2,5, PM10, um fio de cabelo humano, com espessura entre 50 e 70 µm, e grãos de areia fina, com tamanho de aproximadamente 90 µm. Partículas com diâmetros menores que 10 µm podem penetrar nas vias aéreas. Quanto menor seu tamanho, maior a chance de chegarem aos pulmões e atingirem os alvéolos, como mostra a Figura 3. A deposição nos bronquíolos e alvéolos pode afetar a troca gasosa e causar diversos problemas respiratórios (HE et al., 2016). Ao atingirem os alvéolos, há a possibilidade das partículas passarem para o sistema circulatório e serem, então, transportadas pelo sangue para todo o corpo, podendo estar relacionadas ao desenvolvimento de doenças cardíacas, derrames, cânceres (BURNETT et al., 2014; KIM; KABIR; KABIR, 2015; LELIEVELD et al., 2015; MENG et al., 2016; SCHRAUFNAGEL et al., 2019), pré-eclâmpisa (DADVAND et al., 2013; LIU et al., 2020), aterosclerose (WILKER et al., 2013;

LIU et al., 2020), alterações na microcirculação sanguínea (LOUWIES et al.; 2013) e à diminuição de funções cognitivas em crianças e adultos (POWER et al., 2011; SUNYER et al., 2015; AILSHIRE; KARRAKER; CLARKE, 2017). Além disso, microrganismos patogênicos podem estar aderidos ao PM2,5 e PM10, e, uma vez em contato com o corpo humano, provocar doenças alérgicas e a disseminação de doenças respiratórias, como a COVID-19 (CAO et al., 2014; ZHANG; HSIEH, 2020).

Figura 2 – Comparação entre os tamanhos de PM2,5, PM10, espessura de um fio de cabelo humano e grão de areia fina.

Fonte: Adaptado de KIM; KABIR; KABIR (2015).

Figura 3 – Deposição de partículas de tamanhos variados no corpo humano.

Fonte: Adaptado de KIM; KABIR; KABIR (2015).

Altas concentrações de material particulado no ar estão relacionadas também a alterações no nível de iluminação solar, mudanças climáticas, diminuição da visibilidade, nevoeiros, contaminação de rios e lagos, e diversos outros prejuízos a ecossistemas e produções agrícolas. Estudos mostram que alterações climáticas provocadas por concentrações elevadas de material particulado, como o nevoeiro, podem afetar até mesmo o humor das pessoas e aumentar a incidência de depressão (GAO et al., 2017; LIU et al., 2020).