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Um matr´oide ´e um par M = (E, I), onde E ´e um conjunto e I ´e uma cole¸c˜ao de subconjuntos de E, que satisfaz as seguintes condi¸c˜oes:

(1.15) (i) ∅ ∈ I,

(ii) se I ∈ I e I0⊆ I, ent˜ao I0∈ I,

(iii) se I, I0∈ I e |I| < |I0|, ent˜ao existe e ∈ I0\ I tal que I ∪ {e} ∈ I.

Dizemos que M ´e um matr´oide sobre E e que E ´e o conjunto-base do matr´oide M . Chamamos os membros de I de conjuntos independentes de M . Um subconjunto de E que n˜ao est´a em I ´e um conjunto dependente de M .

Uma base de M ´e um conjunto independente maximal. Seja B uma base de M e sejam x, y ∈ E. Algumas vezes ser´a conveniente escrevermos “B−x+y” no lugar de “(B \ {x})∪{y}”. Vamos precisar da seguinte caracteriza¸c˜ao baseada em propriedades de troca:

Teorema 1.11 (Caracteriza¸c˜ao de cole¸c˜ao de bases de um matr´oide)

Seja E um conjunto finito. Seja B uma cole¸c˜ao de subconjuntos de E satisfazendo as seguintes condi¸c˜oes:

(1.16) (i) B 6= ∅ e

(ii) para quaisquer B1, B2 ∈ B e e ∈ B1 \ B2, existe f ∈ B2 \ B1 tal que

B1− e + f ∈ B.

Seja I a cole¸c˜ao dos subconjuntos de E que est˜ao contidos em algum membro de B. Ent˜ao (E, I) ´e um matr´oide que tem B como cole¸c˜ao de bases.

Demonstra¸c˜ao. Como B satisfaz (1.16)(i), ent˜ao I satisfaz (1.15)(i). Al´em disso, ´e evidente que I satisfaz (1.15)(ii). Resta provarmos que I satisfaz (1.15)(iii). Suponha que existem I, I0 ∈ I tais que |I| < |I0| e, para todo e ∈ I0\ I, temos que I ∪ {e} 6∈ I. Vamos ver que isso ´e imposs´ıvel.

Primeiro vamos mostrar que

|B| = |B0| para quaisquer B, B0∈ B. (1.17) Pois suponha o contr´ario. Dentre todos os pares (B, B0) ∈ B × B tais que |B| > |B0|, escolha um que minimiza |B \ B0|. E ´´ obvio que B \ B0 6= ∅. Seja e ∈ B \ B0. Por (1.16)(ii),

existe f ∈ B0 \ B tal que B00 := B − e + f ∈ B. ´E evidente que |B00| = |B| > |B0| e que |B00\ B0| < |B \ B0|, contradizendo a escolha de B e B0. Essa contradi¸c˜ao finaliza a prova de (1.17).

Dentre todos os pares (B, B0) ∈ B × B tais que I ⊆ B e I0⊆ B0, escolha um que minimiza

B0\ (I0∪ B) . Observe que, pela escolha de I e I0,

Se¸c˜ao 1.6. Matr´oides 21

Vamos mostrar agora que

B0\ B = I0\ B. (1.19) ´

E ´obvio que B0\ B ⊇ I0\ B. Suponha ent˜ao que B0\ B ) I0\ B, ou seja, suponha que existe e ∈ B0\ (I0∪ B). Por (1.16)(ii), existe f ∈ B \ B0 tal que B00:= B0− e + f ∈ B. Mas I0⊆ B00 e B00\ (I0∪ B)

<

B0\ (I0∪ B)

, contradizendo a escolha de B0. Essa contradi¸c˜ao conclui a prova de (1.19).

Agora vamos mostrar que

B ⊆ I ∪ B0. (1.20)

Pois suponha que existe e ∈ B \ (I ∪ B0). Pela condi¸c˜ao (1.16)(ii), existe f ∈ B0\ B = I0\ B

tal que B00:= B − e + f ∈ B. Mas ent˜ao I ∪ {f } ⊆ B00 ∈ B, de modo que I ∪ {f } ∈ I. Essa contradi¸c˜ao conclui a prova de (1.20).

Segue de (1.20) que B \ B0 = I \ B0. Como B0 ⊇ I0, ent˜ao I \ B0 ⊆ I \ I0. Conclu´ımos

que

B \ B0 ⊆ I \ I0. (1.21) Por (1.18) e (1.19), temos que

B0\ B = I0\ I. (1.22) Por outro lado, sabemos de (1.17) que |B| = |B0|, de modo que |B \ B0| = |B0\ B|. Mas

ent˜ao, por (1.21) e (1.22), temos que |I \ I0| ≥ |B \ B0| = |B0\ B| = |I0\ I|, de modo que |I| ≥ |I0|. Essa contradi¸c˜ao finaliza a prova de que I satisfaz (1.15)(iii), e portanto do teorema.

Seja M = (E, I) um matr´oide e F ⊆ E. Uma base de F ´e um subconjunto de F que ´e independente maximal. ´E evidente que todas as bases de F tˆem o mesmo tamanho. Esse tamanho ´e chamado de posto de F . Seja rM: P(E) → R a fun¸c˜ao que associa a cada F ⊆ E o posto de F . A fun¸c˜ao rM ´e a fun¸c˜ao posto de M .

Proposi¸c˜ao 1.12 (Submodularidade da fun¸c˜ao posto de matr´oides) A fun¸c˜ao posto de todo matr´oide ´e submodular.

Demonstra¸c˜ao. Seja M = (E, I) um matr´oide.

Sejam U, W ⊆ E. Seja BU ∩W uma base de U ∩ W . ´E f´acil ver que BU ∩W est´a contido

numa base de U ∪ W . Seja BU ∪W uma tal base. Note que BU ∪W ∩ U e BU ∪W ∩ W s˜ao

independentes, de modo que

rM(U ) + rM(W ) ≥ |BU ∪W ∩ U | + |BU ∪W ∩ W | = (BU ∪W ∩ U ) ∪ (BU ∪W ∩ W ) + (BU ∪W ∩ U ) ∩ (BU ∪W ∩ W ) = BU ∪W ∩ (U ∪ W ) + BU ∪W ∩ (U ∩ W ) . (1.23)

Mas como BU ∪W ∩ (U ∪ W ) = BU ∪W e BU ∪W ∩ (U ∩ W ) = BU ∩W, ent˜ao

rM(U ) + rM(W ) ≥ BU ∪W ∩ (U ∪ W ) + BU ∪W ∩ (U ∩ W ) = |BU ∪W| + |BU ∩W| = rM(U ∪ W ) + rM(U ∩ W ), (1.24) como quer´ıamos.

Corol´ario 1.12.1 (Submodularidade da fun¸c˜ao posto de matr´oides gr´aficos) Seja G = (V, E) um grafo. Defina a fun¸c˜ao r : P(E) → R como r(F ) := |V | − c(V, F ), onde c(V, F ) denota o n´umero de componentes do grafo (V, F ). Ent˜ao a fun¸c˜ao r ´e submodular. Demonstra¸c˜ao. Defina I como a cole¸c˜ao de todos os subconjuntos de arestas F ⊆ E tais que (V, F ) ´e uma floresta. Seja B a cole¸c˜ao dos membros maximais de I. ´E f´acil ver que B satisfaz as condi¸c˜oes (1.16). Pelo teorema 1.11, M := (E, I) ´e um matr´oide. ´E f´acil ver que a fun¸c˜ao r ´e igual `a fun¸c˜ao posto de M . Agora o resultado segue da proposi¸c˜ao 1.12.

Seja M = (E, I) um matr´oide. Um circuito de M ´e um conjunto dependente minimal. Se {e} ´e um circuito para algum e ∈ E, dizemos que e ´e um la¸co de M . Seja E0 o conjunto de todos os elementos de E que n˜ao s˜ao la¸cos. Se {e, f } ´e um circuito para certos e, f ∈ E0 distintos, dizemos que e e f s˜ao paralelos.

Proposi¸c˜ao 1.13

Seja M = (E, I) um matr´oide e sejam e, f, g ∈ E. Se e e f s˜ao paralelos e f e g s˜ao paralelos, ent˜ao e e g s˜ao paralelos.

Demonstra¸c˜ao. ´E claro que rM {e, f } = rM {f, g} = rM {e} = rM {f } = rM {g} = 1. Pela proposi¸c˜ao 1.12, temos que rM {f } + rM {e, f, g} ≤ rM {e, f } = rM {f, g}. Logo, rM {e, f, g} ≤ 1. Ent˜ao qualquer subconjunto de {e, f, g} com dois elementos ´e dependente minimal. Em particular, {e, g} ´e um circuito, como quer´ıamos.

Cap´ıtulo 2

Fluxos submodulares

Edmonds e Giles desenvolveram um poderoso arcabou¸co poli´edrico envolvendo o conceito de fluxo submodular, generalizando e unificando v´arios resultados importantes em otimiza¸c˜ao combinat´oria. Esse arcabou¸co ´e o mais conhecido de diversos modelos propostos com o mesmo intuito e baseados em id´eias muito semelhantes. Neste cap´ıtulo, apresentamos o teorema de Edmonds-Giles sobre fluxos submodulares e uma variante desse teorema devida a Schrijver, a partir dos quais derivamos v´arias rela¸c˜oes min-max.

O teorema de Edmonds-Giles afirma que um certo sistema de inequa¸c˜oes lineares Ax ≤ b ´e box-TDI. Nossa estrat´egia para prov´a-lo ser´a usar o teorema 1.9: ´e suficiente encontrarmos uma solu¸c˜ao ´otima y∗ para o programa linear dual de max{ cx : Ax ≤ b } tal que a submatriz de A correspondente ao suporte de y∗ ´e totalmente unimodular.

A principal id´eia da demonstra¸c˜ao ser´a escolher uma solu¸c˜ao y∗ cujo suporte seja algo que definiremos como uma fam´ılia livre de cruzamentos. Tais fam´ılias podem ser representadas atrav´es de uma ´arvore e, a partir dessa representa¸c˜ao, poderemos mostrar que a submatriz em quest˜ao ´e uma matriz de rede, um tipo not´avel de matriz totalmente unimodular. Assim, o teorema estar´a provado.

Essa estrat´egia de escolher uma solu¸c˜ao livre de cruzamentos ´e muitas vezes chamada de t´ecnica do descruzamento (uncrossing) e tem se mostrado muito poderosa na resolu¸c˜ao de diversos problemas de otimiza¸c˜ao combinat´oria. Essa t´ecnica est´a intimamente relacionada com fun¸c˜oes submodulares, que tˆem um papel fundamental em otimiza¸c˜ao combinat´oria, como ser´a visto ao longo deste texto.

O restante do cap´ıtulo est´a organizado da seguinte maneira: na se¸c˜ao 2.1, definimos matrizes de rede e provamos que estas s˜ao totalmente unimodulares; na se¸c˜ao 2.2, definimos fam´ılias livres de cruzamentos, mostramos que elas podem ser representadas atrav´es de ´arvores e, a partir dessa representa¸c˜ao, constru´ımos uma matriz de rede; na se¸c˜ao 2.3, combinamos os resultados das se¸c˜oes anteriores para provar o teorema de Edmonds-Giles, a partir do qual obtemos o teorema de Lucchesi-Younger e o teorema de intersec¸c˜ao de matr´oides de Edmonds; finalmente, na se¸c˜ao 2.4, mostramos uma variante devida a Schrijver, do qual derivamos mais rela¸c˜oes min-max.

2.1

Matrizes de rede

Seja T = (V, AT) uma ´arvore orientada e D = (V, AD) um grafo orientado. A matriz de

rede gerada por T e D ´e a matriz N sobre AT× AD definida da seguinte maneira. Para cada

par de arcos aT ∈ AT e aD = uv ∈ AD, denote por P o pseudocaminho que liga u a v em T ,

e defina N [aT, aD] :=      +1, se aT ´e um arco direto de P , −1, se aT ´e um arco reverso de P , 0, se aT n˜ao ´e um arco de P .

Vejamos alguns exemplos de matrizes de rede.

Seja D = (V, A) um grafo orientado. Tome V0 := V ∪ {z}, onde z ´e um v´ertice novo. Defina a ´arvore orientada T := (V0, AT), onde AT := { zv : v ∈ V }. ´E f´acil ver que a matriz

de rede gerada por T = (V0, AT) e D0 := (V0, A) ´e igual `a matriz de incidˆencia de D,

identificando cada arco zv ∈ AT com o v´ertice v ∈ V .

Seja G = (V, E) um grafo (U, W )-bipartido. Tome V0 := V ∪ {z}, onde z ´e um v´ertice novo. Defina a ´arvore orientada T := (V0, AT) onde AT := { uz : u ∈ U } ∪ { zw : w ∈ W }.

Oriente todas as arestas do grafo (V0, E) de U para W , obtendo o grafo orientado D. ´E f´acil ver que a matriz de rede gerada por T e D ´e igual `a matriz de incidˆencia de G, identificando cada arco uz ∈ AT com o v´ertice u ∈ U e cada arco zw ∈ AT com o v´ertice w ∈ W .

No restante desta se¸c˜ao vamos provar que matrizes de rede s˜ao totalmente unimodulares. Lema 2.1α (Hereditariedade de matrizes de rede)

Submatrizes de uma matriz de rede tamb´em s˜ao matrizes de rede.

Demonstra¸c˜ao. Seja N uma matriz de rede gerada por T = (V, AT) e D = (V, AD). ´E f´acil

ver que remover de N a coluna aD∈ AD corresponde a remover de D o arco aD. Similarmente,

remover de N a linha aT = uv ∈ AT corresponde a contrair em T o arco aT e identificar em D

os v´ertices u e v.

O principal resultado desta se¸c˜ao foi provado implicitamente por Tutte [1965]: Teorema 2.1 (Unimodularidade total de matrizes de rede)

Toda matriz de rede ´e totalmente unimodular.

Demonstra¸c˜ao. Pelo lema 2.1α da hereditariedade, basta provarmos que toda matriz de rede quadrada tem determinante 0, +1 ou −1.

Seja N uma matriz de rede quadrada gerada por T = (V, AT) e D = (V, AD). A prova ´e

por indu¸c˜ao na ordem de N , tomando como base o caso trivial em que N ´e uma matriz 1 × 1. Suponha que det(N ) 6= 0. Nosso objetivo ´e transformar uma linha conveniente de N numa linha contendo 0s e um ´unico 1. As opera¸c˜oes sobre N que aplicaremos nessa transforma¸c˜ao mantˆem N como uma matriz de rede e preservam o valor absoluto do determinante. Assim, ap´os a transforma¸c˜ao, poderemos expandir o determinante de N atrav´es dessa linha e usar o lema 2.1α da hereditariedade e a hip´otese de indu¸c˜ao para concluir que |det(N )| = 1.