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1 INTRODUÇÃO

1.2 Drogas antifúngicas: panorama atual

1.2.4 Mecanismo de resistência em biofilmes fúngicos

Um fator crucial responsável pela virulência e aumento da resistência intrínseca às drogas antifúngicas é a capacidade dos fungos em formar biofilmes em dispositivos médicos, tais como cateteres venosos, cateteres urinários e próteses artificiais, cujo número de usuários tem aumentado drasticamente em mais de 10 milhões de beneficiários/ano nos Estados Unidos (ROBBINS et al., 2011; TAFF, et al., 2012). Em consequência da falta de uma terapia eficiente muitas vezes a remoção cirúrgica do dispositivo infectado é a única alternativa para a erradicação da doença fúngica (MUKHERJEE et al., 2003).

Os biofilmes são definidos como comunidades microbianas estruturadas e complexas, capazes de aderir a superfícies abióticas ou bióticas. As células são incorporadas em uma matriz extracelular produzida pelos próprios micro-organismos que formam o

biofilme, através da qual interagem uns com os outros e com o ambiente (MATHÉ; VAN DIJCK, 2013; SOTO, 2013). A matriz extracelular é formada por substâncias como polissacarídeos, proteínas, DNA de micro-organismos, e exibem um fenótipo alterado em relação à taxa de crescimento e aos genes de transcrição (TAFF, et al., 2012). Dessa forma, a estrutura bioquímica do biofilme proporciona proteção para as células contra os mecanismos de defesa do hospedeiro, fagocitose, biocidas, forças hidrodinâmicas e os mecanismos de ação dos antibióticos em geral (CANNIZZO et al., 2007).

As primeiras pesquisas foram destinadas apenas a biofilmes bacterianos, com o desenvolvimento do primeiro modelo de biofilme in vitro de C. albicans em 1994 (HAWSER; DOUGLAS, 1994). Desde então, estudos sobre a capacidade de formar biofilmes para várias espécies fúngicas têm sido descritos na literatura: Cryptococcus neoformans (MARTINEZ; CASADEVALL, 2007), Malassezia pachydermatis (CANNIZZO et al., 2007), Aspergillus spp. (LIU et al., 2012) e recentemente Histoplasma capsulatum (PITANGUI et al., 2012).

Muitas das pesquisas com biofilmes concentram-se em desenvolver modelos de ensaio in vitro com o intuito de investigar o perfil de sensibilidade das comunidades microbianas frente aos fármacos de uso clínico, em comparação com o perfil de sensibilidade de seus homólogos planctônicos (TOBUDIC et al., 2010; CORDEIRO et al., 2012). Além disso, tem-se buscado compreender os principais mecanismos de resistência a essas drogas (MUKHERJEE et al., 2003; PERUMAL; MEKALA; CHAFFIN, 2007). Em modelo de biofilme de C. albicans vários fatores foram elucidados para justificar a elevada resistência in vitro e in vivo, dentre eles incluem: aumento da expressão de bombas de efluxo de drogas, redução do teor de ergosterol (MUKHERJEE et al., 2003), elevados níveis de -(1,3)-D- glucana da parede celular e da matriz do biofilme (NETT et al., 2007), aumento da densidade de células (PERUMAL; MEKALA; CHAFFIN, 2007), e sinalização mediada pelas proteínas cinase C (PKC) (KUMAMOTO, 2005) e fosfatase calcineurina (UPPULURI et al., 2008). Alguns dos fatores propostos são mecanismos de resistência comuns entre as células planctônicas e os biofilmes, tal como regulação positiva de bombas de efluxo de drogas e regulação positiva de expressão do gene alvo, e outros são características específicas dos biofilmes, como presença de matriz extracelular (MATHÉ; VAN DIJCK, 2013; SOTO, 2013).

A resistência aos medicamentos de uso clínico também pode advir da incapacidade que alguns antimicrobianos têm de se difundirem através da camada polissacarídica que compõe a matriz extracelular. Ou, ainda, devido à existência de

subpopulações de micro-organismos no interior dos biofilmes, denominadas células persistentes (Persister cells) que são fenotipicamente diferentes das demais e possuem a habilidade de sobreviver em concentrações bem superiores à concentração inibitória mínima dos antifúngicos em geral (MATHÉ; VAN DIJCK, 2013; SOTO, 2013).

Os biofilmes são considerados mecanismos de sobrevivência dos micro- organismos tanto na natureza como no hospedeiro, uma vez que tais estruturas são muito mais resistentes aos antimicrobianos que as células planctônicas (TAFF, et al., 2012). Este fato foi primeiramente verificado em espécies bacterianas, quando se observou um aumento da concentração do antibiótico em até 100 vezes para a eliminação das bactérias associadas em biofilme, quando comparada às células planctônicas (DONLAN; COSTERTON, 2002). Mais tarde, habilidade semelhante foi detectada em biofilmes fúngicos, nos quais eram necessárias concentrações mais elevadas de cada droga para uma redução relevante da atividade metabólica do biofilme em comparação com as células planctônicas (EL-AZIZI, 2007). Estes resultados foram confirmados para diferentes espécies fúngicas como Candida albicans (SHUFORD et al., 2006; TOBUDIC et al., 2010), C. glabrata (EL-AZIZI, 2007; MONTEIRO et al., 2013); C. parapsilosis, C. krusei (EL-AZIZI, 2007); C. neoformans (MARTINEZ; CASADEVALL, 2006) e Aspergillus spp. (LIU et al., 2012).

A elucidação dos mecanismos de resistência em biofilmes é o primeiro passo para a otimização das terapias, ora pelo uso de terapias antifúngicas clássicas como por exemplo, o bloqueio do cateter com antimicrobianos/antissépticos e o uso de cateteres impregnados com antibióticos, ora pelo emprego de terapias com combinação de drogas (SARDI et al., 2013). Uma vez que ocorram infecções relacionadas a cateteres, o procedimento clínico atual é a remoção do dispositivo e a administração de antifúngicos com ação sistêmica. No entanto tem se verificado uma redução da quantidade de células em biofilme de C. albicans formado em cateter vascular central quando tratado com caspofungina usada como uma solução de bloqueio durante o tratamento (SHUFORD et al., 2006). Essa estratégia pode ser adotada em pacientes com candidemia clinicamente estáveis para evitar substituição intravascular do cateter (CATEAU; RODIER; IMBERT, 2008).

Para o tratamento de infecções causadas por biofilmes, as equinocandinas, a anfotericina B e suas formulações lipídicas têm demonstrado eficiência tanto in vitro (CATEAU; RODIER; IMBERT, 2008; RAMAGE et al., 2013) quanto in vivo (MUKHERJEE et al., 2009). No entanto, os derivados azólicos, os análogos da pirimidina, alilaminas e as formulações clássicas de poliênicos, como a nistatina, não vêm apresentando atividade eficaz contra biofilmes fúngicos (MONTEIRO et al., 2013). Para superar a ineficácia dessas drogas,

alguns pesquisadores têm se dedicado em avaliar o efeito sinérgico entre várias classes de medicamentos, como antifúngicos, antibacterianos, analgésicos, imunossupressores, entre outros. Exemplos dessas combinações são encontrados com frequência na literatura científica: associação entre fluconazol e doxiciclina (GAO et al., 2013), combinação entre anfotericina B e aspirina (ZHOU et al., 2012), combinação de caspofungina e o analgésico/anti-inflamatório diclofenaco (BINK et al., 2012) e a sensibilidade de biofilmes de C. albicans a diferentes antifúngicos e o medicamento imunossupressor ciclosporina (SHINDE et al., 2012).

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