• Nenhum resultado encontrado

Mecanismos de retenção de micro-organismos em filtros biológicos percoladores

3.3 F ATORES INTERFERENTES NO DESENVOLVIMENTO E ESTABELECIMENTO DE NITRIFICANTES EM SISTEMAS

3.3.1 Mecanismos de retenção de micro-organismos em filtros biológicos percoladores

Como dito anteriormente, os FBPs de configuração tradicional são preenchidos com material grosseiro e o principal mecanismo de retenção de micro-organismos é por meio de biofilmes. Biofilmes são organizações de células microbianas aderidas a uma superfície, envoltas por uma matriz adesiva excretada pelas células. A matriz geralmente é um mistura de polissacarídeos ou substâncias poliméricas extracelulares (EPS), podendo conter proteínas e ácidos nucleicos (Figura 3.3). Os biofilmes aprisionam os nutrientes necessários ao crescimento microbiano e ajudam a impedir o descolamento das células de superfícies presentes em sistemas de fluxo de corrente (MADIGAN et al., 2010).

Figura 3.3 – Formação e estrutura de um biofilme

(A) Adesão de um pequeno número de células a uma superfície sólida (B) Comunicação intercelular, crescimento e síntese de polissacarídeos (C) Aumento do crescimento e dos polissacarídeos Fonte: adaptado de Madigan et al. (2010)

A vida em biofilmes confere diversas vantagens às populações microbianas, dentre elas: mecanismos de autodefesa, resistência às forças físicas que poderiam remover as células não

Canais de água Polissacarídeos

Micro-organismos livres

aderidas, aumentando a possibilidade de sobrevivência das células. Além disso, os biofilmes fixam as células microbianas em um nicho favorável, por exemplo, em superfícies onde os nutrientes são mais abundantes ou constantemente repostos. Como consequência, as quantidades e atividades microbianas são normalmente bastante elevadas nas superfícies (MADIGAN et al., 2010).

Entretanto, no caso dos FBPs, o crescimento de biofilmes nos meios-suportes tradicionalmente utilizados é limitado, uma vez que o fluxo do meio líquido promove o descolamento dos micro-organismos, além da biomassa estar mais sucesptível à ação de predadores.

3.3.1.2 Retenção intersticial – espumas de poliuretano

A formação de biofilme em espumas de poliuretano é um método de imobilização de células microbianas utilizadas em um grande número de processos biotecnológicos. Este tipo de material promove maior retenção de biomassa e diversas condições ambientais, contribuindo para o aumento da nitrificação (ALMEIDA et al., 2008; TANDUKAR et al., 2006; DANIEL

et al., 2009). A vantagem do uso desse meio-suporte é a aderência, seleção e sustentação de

micro-organismos de crescimento lento, tais como AOB, além de promover a desnitrificação. Na literatura já é bem-compreendido e comprovado que a espuma de poliuretano é uma estratégia promissora no processo de nitrificação-desnitrificação no pós-tratamento de efluentes (DANIEL et al., 2009).

Chen et al. (2009) descreveram um processo biotecnológico conhecido como SNAD (Simultaneous Nitrification, Anammox and Denitrification). Segundo os autores, o processo tem altos potenciais de remoção de nitrogênio (70% de remoção de nitrogênio total; 74% de remoção de amônia) e de DQO (94% de eficiência), ocorrendo em um só reator, sendo a maioria da amônia removida por bactérias anammox. A proposta desse processo foi promover a interação de nitrificantes aeróbias, anammox e desnitrificantes sob condições limitadas de oxigênio com potencial para fazer remoção quase completa de amônia e carbono orgânico a N2 e CO2. Contudo, as condições ótimas para o enriquecimento de micro-organismos e detalhes dos mecanismos intrínsecos ao processo SNAD ainda não são bem-compreendidos (LAN et al., 2011).

Woznica et al. (2010) exploraram a organização espacial de biofilmes nitrificantes desenvolvidos espumas de poliuretano. Os biofilmes foram desenvolvidos em reatores em escala de bancada, inoculados com lodo de sistema de lodos ativados e alimentados com efluente sintético. Os autores analisaram a microbiota por meio de tomografia de raio X, microscopia de eletrônica de escaneamento e microscopia eletrônica confocal laser combinada com hibridização in situ fluorescente (FISH). Vários modos de ligação das células microbianas à espuma foram mostrados, basicamente em três padrões distintos: (1) grandes agregados irregulares e camadas de biofilme na superfície da espuma; (2) agregados esféricos localizados na superfície externa do biofilme, compreendendo AOB em maior quantidade e NOB em pequenas quantidades (identificadas por meio de hibridação in situ fluorescente); (3) porções finas de biofilme aderidas à espuma.

Varesche et al. (1997), analisaram a imobilização de lodo em matrizes cúbicas de espuma, que preenchiam um reator anaeróbio em escala de bancada, alimentado com efluente à base de glicose. Os autores também observaram três tipos distintos de organização da biomassa (Figura 3.4): (A) micro-grânulos mecanicamente retidos dentro dos poros da espuma, (B) micro-grânulos aderidos à espuma e (C) células dispersas aderidas a partículas. Tais observações estruturais foram semelhantes àquelas descritas por Woznica et al. (2010). A adsorção bacteriana depende de forças elétricas entre a célula e a superfície do substrato, forças de Van der Waals e ligação química (hidrofóbicas e iônicas), sendo predominantes aquelas que conduzem à atração entre as superfícies. Entretanto, vários estudos, citados por Varesche et al. (1997), mostraram que a retenção de biomassa em meios-suportes de espuma é predominantemente física (mecânica), nos quais micro-colônias ficam retidas dentro dos poros deste material.

A conformação espacial dos micro-organismos dentro das espumas de poliuretano não apresenta uma estrutura bem-definida (como visto, por exemplo, em grânulos anaeróbios; VARESCHE et al., 1997). A estruturação dos micro-organismos otimiza a conversão de substratos e a transferência de produtos metabólicos entre as espécies. Contudo, o alcance desta estruturação é lento, resultando em longos períodos de partida dos reatores. Em espumas de poliuretano, entretanto, esta conformação é rapidamente atingida por causa do baixo nível de organização microbiana necessária em tal meio-suporte.

Figura 3.4 – Imagens de imobilização de biomassa em meio-suporte de espuma

(A) Micro-grânulos retidos dentro dos poros da espuma

(B) Micro-grânulos aderidos à espuma

(C) Células dispersas aderidas a partículas

Fonte: Varesche et al. (1997)

Variações e mudanças nas condições ambientais dentro de espumas de poliuretano, tais como teor de matéria orgânica, concentrações oxigênio e nitrogênio podem afetar a composição da comunidade microbiana e da matriz de polímeros extracelulares do biofilme. Pouco ainda é conhecido sobre a identidade e o papel dos micro-organismos desenvolvidos em meios-suportes de espuma, que são de grande interesse para engenheiros e microbiologistas (KUBOTA et al., 2014).