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Capítulo

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 1 BIOFILMES MICROBIANOS

2.1.6 Mecanismos de resistência dos biofilmes

Vários estudos demonstram que as células microbianas em biofilme podem ser de 10 a 1000 vezes mais resistentes aos antibióticos do que os micro-organismos em

sua forma planctônica (MELCHIOR; VAARKAMP; FINK-GREMMELS, 2006). Entretanto, os mecanismos responsáveis pela resistência de biofilmes a agentes antimicrobianos não estão totalmente compreendidos (DOUGLAS, 2003).

Segundo alguns estudiosos na área de biofilmes microbianos, a estrutura do biofilme e as características fisiológicas das células conferem a essa comunidade maior resistência a biocidas, dificultando a sua erradicação (DONLAN; COSTERTON, 2002; DAVIES, 2003). Certos mecanismos tais como: a penetração limitada dos agentes antimicrobianos na estrutura do biofilme; as diferentes taxas de crescimento dos organismos e alterações fisiológicas inerentes ao modo de crescimento do biofilme têm sido descritos como fatores que podem ser responsáveis pela resistência dos biofilmes aos biocidas (DAVIES, 2003; SIMÕES et al., 2003; DONLAN; COSTERTON, 2002).

2.1.6.1 Penetração restrita de agentes antimicrobianos

Nos biofilmes os micro-organismos estão situados dentro de uma matriz extracelular, formada principalmente por polissacarídeos. Essa característica dos biofilmes parece ser de grande importância para a resistência das células que residem nesse nicho devido à incapacidade dos agentes antimicrobianos de penetrarem em todas as áreas dos biofilmes (Figura 7) (DAVIES, 2003).

Campanac e colaboradores (2002) deram suporte à ideia de que a matriz extracelular formava uma barreira protetora contra a ação dos antibióticos, mostrando que a susceptibilidade de S. aureus a antibióticos é aumentada quando as bactérias estão incorporadas em uma matriz extracelular com características hidrofóbicas. No entanto, quando a matriz foi removida as células residentes tiveram a sua susceptibilidade retomada em aproximadamente 90% (CAMPANAC et al., 2002).

Nesse contexto, Hatch e Schiller (1998) demonstraram que uma suspensão de 2% de alginato, isolado a partir de biofilmes formados por P. aeruginosa, inibiu com sucesso a difusão de gentamicina e tobramicina, e a barreira de difusão formada pelo alginato foi revertida pelo uso da enzima alginato liase. Entretanto, nem todas as drogas foram afetadas da mesma forma, os glicopeptídeos vancomicina e teicoplamina tiveram sua ação significantemente afetada, entretanto rifampicina, clindamicina e alguns macrolídeos tiveram suas ações minimamente afetadas ou não foram afetadas pela presença do alginato (HATCH; SCHILLER, 1998).

Singh e colaboradores (2010) mostraram que a penetração de drogas como oxacillina, cefotaxima ( -lactâmicos) e vancomicina (um glicopeptídeo) foi

significantemente reduzida em biofilmes formados por S. aureus e S. epidermidis, enquanto que amicacina (um aminoglicosídeo) e ciprofloxacina (uma fluoroquinolona) não tiveram suas ações afetadas. Os resultados encontrados por estes autores sugerem que a formação de biofilme é um importante mecanismo na redução da penetração de agentes antimicrobianos, contudo esta resistência pode variar dependendo da droga administrada (SINGH et al., 2010).

Desta maneira fica claro que em muitos casos a ação de agentes antimicrobianos é diminuída devido a uma menor taxa de penetração e uma difusão mais lenta destas drogas no interior dos biofilmes. Assim, maiores concentrações de drogas ou ainda a utilização de outros agentes antimicrobianos são necessários para erradicar as células presentes nos biofilmes (MELCHIOR; VAARKAMP; FINK- GREMMELS, 2006;AN; DONG; ZHANG, 2009).

Figura 7 – Esquema representando a penetração restrita de drogas em biofilmes (Adaptado de DAVIES, 2003).

2.1.6.2 Diminuição do crescimento em células presentes nos biofilmes

Muitos pesquisadores acreditam que os micro-organismos em biofilmes têm sua taxa de crescimento reduzida, e que este é um dos fatores que contribuem para uma maior resistência destas células contra o tratamento com agentes antimicrobianos (DUNNE, 2002; DAVIES, 2003; DOUGLAS, 2003; AN; DONG; ZHANG, 2009). As células microbianas presentes em biofilmes crescem lentamente, principalmente na base do biofilme, isso ocorre devido à limitação da disponibilidade de nutrientes e as condições anaeróbicas nas partes mais profundas dos biofilmes (DUNNE, 2002; DOUGLAS, 2003; AN; DONG; ZHANG, 2009). A Figura 8 demonstra um esquema da atividade metabólica das células em biofilmes.

As limitações de oxigênio retarda o crescimento microbiano uma vez que restringe a atividade metabólica das células. Um crescimento mais lento é frequentemente acompanhado por modificações na composição da superfície das células, que por sua vez pode afetar a sensibilidade das células aos agentes antimicrobianos (DUNNE, 2002; DOUGLAS, 2003; AN; DONG; ZHANG, 2009). De Beer e colaboradores (1994) mediram as concentrações de oxigênio em várias profundidades dos biofilmes e demonstraram que os níveis desse gás diminuíam em 30 vezes no centro dos biofilmes quando comparado com a superfície. Este trabalho sugeriu ainda que outros nutrientes, tais como o carbono orgânico, irá igualmente ter sua concentração diminuída no centro dos biofilmes.

A redução da atividade metabólica pode contribuir para uma maior resistência dos biofilmes ao tratamento com antibióticos que são ativos contra micro- organismos na sua forma planctônica. No entanto, biofilmes tratados com antibióticos podem apresentar mortalidade nas células que residem na sua superfície, enquanto os organismos presentes no seu interior tornam-se resistentes à ação do antimicrobiano, podendo formar uma nova geração de células resistentes (HUANG et al., 1995; DAVIES, 2003).

Figura 8 – Esquema demonstrando a atividade metabólica das células em biofilmes (Adaptado de DAVIES, 2003).

2.1.6.3 Alterações fisiológicas das células em biofilmes

Diversos autores sugerem que micro-organismos associados em forma de biofilmes expressam um fenótipo diferenciado quando comparados com sua forma planctônica (DAVIES, 2003; MELCHIOR; VAARKAMP; FINK-GREMMELS, 2006; AN; DONG; ZHANG, 2009). Alguns destes identificaram genes que podem ser reprimidos ou ativados após a passagem da forma planctônica para biofilmes e entre

esses genes alguns estavam diretamente relacionados à resistência antimicrobiana (BROOUN; LIU; LEWIS, 2000; MAIRA-LITRÁN; ALLISON; GILBERT, 2000).

Segundo Marsh (2005) no momento em que micro-organismos se aderem a uma superfície inicia-se a expressão de genes “biofilme-específicos”, culminando em alterações fisiológicas nas células. Por exemplo, em P. aeruginosa os genes responsáveis pela síntese de alginato são ativados 15 minutos após o contato da célula com a superfície (DAVIES; GEESEY, 1995). Sauer e colaboradores (2002) demonstraram ainda que células de P. aeruginosa em biofilmes maduros apresentaram perfis de expressão gênica diferenciada. Os autores identificaram aproximadamente 800 proteínas, destas, 300 foram expressas em biofilmes maduros, mas não nas células planctônicas. As proteínas diferencialmente expressas estavam envolvidas no metabolismo bacteriano, na secreção e transporte e em mecanismos de adaptação e proteção (SAUER et al., 2002).

Brooun, Liu e Lewis (2000) observaram que a maioria das células de P. aeruginosa, em biofilmes, foram destruídas quando expostas a baixa concentração de ciprofloxacina. No entanto, uma subpopulação de células presentes no biofilme sobreviveu mesmo depois de um tratamento adicional com o mesmo antibiótico em concentrações mais elevadas. Estas células foram chamadas de "células persistentes" e acredita-se que as alterações fisiológicas adaptativas nestas células foram responsáveis pela capacidade de sobrevivência no biofilme (BROOUN; LIU; LEWIS, 2000). Ramage e colaboradores (2002) demonstraram ainda que genes que codificam dois tipos de bomba de efluxo em C. albicans são regulados durante a formação e desenvolvimento do seu biofilme, fazendo com que esta levedura seja mais resistente quanto à ação do fluconazol em comparação com células planctônicas.