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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.5. Melhoramento Genético da Qualidade da Soja

2.5.2. Melhoramento da Qualidade do Óleo

O óleo de soja é o líder mundial dos óleos vegetais e corresponde a 30% dos óleos vegetais consumidos no mundo (USDA, 2004). A maior utilização do óleo de soja na alimentação humana é na cocção dos alimentos, nas frituras e na produção de margarinas e gorduras vegetais (MOREIRA et al., 2001). Além do uso na alimentação, o óleo degomado é o segundo produto da soja mais utilizado na alimentação animal, sendo usado, predominantemente, no preparo de rações de frangos de corte e suínos, não havendo informações precisas do volume consumido (LIMA, 1999).

O óleo de soja tem o menor custo de produção entre os óleos vegetais, pois é um co-produto do farelo de soja (YADAV, 1996). Durante o processamento, os componentes extraídos da soja por solvente orgânico, como o hexano, são classificados como óleo bruto, cujos principais componentes são os triacilgliceróis. Componentes secundários incluem fosfolipídeos, material insaponificável, ácidos graxos livres e traços de metais. O material insaponificável consiste de tocoferóis, fitosteróis e hidrocarbonetos (LIU, 1997). O óleo bruto é, então, refinado para a obtenção do produto final livre de impurezas (KINNEY, 1996), contendo o óleo, após o processamento, acima de 99% de triacilgliceróis (LIU, 1997).

Triacilgliceróis são lipídeos neutros, consistindo de três ácidos graxos ligados a um glicerol. As propriedades funcionais e estabilidade oxidativa, bem como o valor nutricional de óleos comestíveis em geral e de soja em particular, são determinados por sua composição em ácidos graxos, configuração geométrica e distribuição posicional desses ácidos (LIU, 1997).

Cada óleo ou gordura natural tem uma composição única em ácidos graxos. Como muitos outros óleos de origem vegetal, os ácidos graxos do óleo de soja são, em sua maioria, insaturados (LIU, 1997). O óleo de soja é composto de cinco ácidos graxos principais: palmítico (16:0), esteárico (18:0), oléico (18:1), linoléico (18:2) e linolênico (18:3) (YADAV, 1996).

A composição média do óleo de soja é cerca de 15% de ácidos graxos saturados, 25% de ácido monoinsaturado e 60% de ácidos poliinsaturados. O alto teor de ácidos graxos poliinsaturados é responsável pela redução da estabilidade oxidativa e da qualidade (sabor e odor) do óleo de soja. Para tentar resolver esse problema, nos Estados Unidos o óleo de soja comercial é hidrogenado para aumentar a estabilidade oxidativa. No entanto, a necessidade de hidrogenação acaba reduzindo o atrativo econômico de se usar a fração óleo da soja. Além do mais, mesmo o óleo de soja hidrogenado possui odores desagradáveis que são atribuídos à presença do isolinoleato, produto da hidrogenação (YADAV, 1996). No processo de hidrogenação industrial ocorre também a formação de grande quantidade de ácidos graxos trans, chegando a valores ao redor de 50%. Os efeitos adversos dos ácidos graxos trans têm sido muito questionados, pois se tem tentado correlacionar a presença deles em dietas com incidência de doenças cardiovasculares (MANCINI FILHO e CHEMIN, 1996).

Como outros óleos comestíveis, além de seu papel na culinária, o óleo de soja supri-nos com calorias, ácidos graxos essenciais e vitaminas lipossolúveis. Uma vez que o óleo de soja não hidrogenado contém cerca de 53% de ácido linoléico e 8% de ácido linolênico, e o óleo parcialmente hidrogenado possui, ainda, cerca de 23% de ácido linoléico e 3% de ácido linolênico, o óleo de soja é uma excelente fonte de ácidos graxos essenciais. Os ácidos linoléico e linolênico são considerados essenciais porque mamíferos, incluindo os humanos, são incapazes de sintetizá-los. Mais especificamente, células do nosso corpo não são capazes de introduzir duplas ligações entre o

grupo metil terminal e a primeira dupla ligação situada na cadeia carbônica do respectivo ácido graxo. A única alternativa do organismo é introduzir grupos acetil para alongar a cadeia carbônica e formar novas duplas ligações entre a última dupla ligação e o grupo carboxílico do ácido graxo. Em outras palavras, a síntese dos ácidos araquidônico (20:4) e docosaexaenóico (22:6), os dois importantes precursores de prostaglandinas e outros eicosanóides, depende do suprimento pela dieta dos ácidos linoléico e linolênico (LIU, 1997).

A estabilidade natural do óleo de soja poderia, assim, resultar em baixo custo de processamento e melhoria do sabor (YADAV, 1996), sendo interessante, nesse ponto, ressaltar a tendência do consumidor atual em optar por produtos mais saudáveis.

Os principais objetivos em programas visando à alteração dos teores de ácidos graxos são o aumento do teor de ácido oléico e a redução do teor de ácido linolênico. Dessa forma, diferentes genótipos com baixo conteúdo de ácido linolênico foram desenvolvidos (WILSON et al., 1981; HAMMOND e FEHR, 1983; WILCOX et al., 1984; TAKAGI et al., 1990). Genótipos de soja com conteúdo de ácido oléico acima de 30% também foram desenvolvidos por melhoramento convencional (FEHR e CURTISS, 2004). Alternativamente, utilizando mutação induzida, novas fontes para alto teor de ácido oléico foram obtidas (RAHMAM e TAKAGI, 1996). Pelo uso de ferramentas de engenharia genética, genótipos de soja com conteúdo de ácido oléico superior a 80% foram obtidos (KINNEY, 1994; KINNEY, 1996). Segundo Araújo (2004), os ácidos graxos insaturados são oxidados a velocidades diferentes. O ácido linoléico é oxidado 64 vezes mais rápido que o oléico e o linolênico, 100 vezes mais rápido do que este.

Um exemplo do sucesso das linhagens de soja mutantes com baixo teor de ácido linolênico quanto à estabilidade oxidativa foi descrito no trabalho de Liu e White (1992). Eles compararam a estabilidade oxidativa do óleo de duas variedades comerciais de soja (com conteúdo de ácido linolênico de 7,5 e 8%) com quatro linhagens desenvolvidas no Programa de Melhoramento da Iowa State University, com baixo teor de ácido linolênico (entre 1,5 e 2%) e com o óleo de canola. Todos os óleos sofreram o mesmo processamento, foram refinados nas mesmas condições laboratoriais, sem aditivos, e estocados a 60 °C por 15 dias. Os óleos das quatro linhagens mutantes com

baixo teor de ácido linolênico foram mais estáveis que as duas variedades comerciais de soja. O óleo de canola foi muito menos estável que o óleo das duas variedades comerciais de soja em todos os testes químicos e sensoriais realizados. A qualidade do sabor e aroma foi negativamente correlacionada com o teor de ácido linolênico.

Diversas linhagens estão disponíveis no Programa de Melhoramento da Qualidade da Soja do BIOAGRO/UFV, com níveis reduzidos de ácido linolênico, obtidas por retrocruzamentos assistidos por microanálises bioquímicas não-destrutivas das sementes e marcadores moleculares, derivadas de variedades-elite adaptadas às regiões do Brasil central. Do cruzamento entre linhagens UFV TN (linhagens com ausência de LOX) e BARC 12 (acesso norte-americano), linhagem doadora de genes que determinam modificações na composição da fração óleo, foram selecionadas sementes que combinam ausência de lipoxigenases com baixo teor de ácido linolênico (MOREIRA et al., 2001).

Um primeiro trabalho realizado com grãos oriundos do programa de melhoramento, isentos de lipoxigenases e com menor teor de ácido linolênico (3,7%), teve por objetivo o desenvolvimento de um produto protéico-calórico de alto valor nutritivo, estabilidade e aceitabilidade, constituído de farinha de mandioca e farinha integral de soja. O produto consistiu de uma farofa temperada, preparada a partir de uma farinha mista, cujo processamento incluiu a mistura de farinha de soja e farinha de mandioca na proporção de 1:1, com umidificação seguida de tratamento térmico (autoclavagem a 120 °C, por 10 e 20 minutos). O alimento obtido, constituindo uma boa fonte protéico- calórica, foi submetido a teste de aceitação. Como controle, o produto foi preparado utilizando também farinha de grãos de uma variedade de soja comercial. Em termos de aceitação, observou-se uma diferença significativa entre os produtos elaborados a partir dos diferentes genótipos de soja, sendo preferido aquele à base de soja melhorada. Na farofa obtida à base de soja comercial, foram observados níveis de hexanal mais elevados que naquela da linhagem melhorada, evidenciando-se a correlação entre atividade de lipoxigenases e oxidação de produtos de soja, o que resulta em diminuição da qualidade sensorial (TIBÚRCIO, 2000).

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