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CAPÍTULO 3 – O SSI DO CAFÉ CONILON NO ESPÍRITO SANTO

3.4 Perfil tecnológico e base de conhecimento

3.4.2 Melhoria da qualidade e inovações incrementais

Segundo Ferrão (2013), a demanda por conilon no mundo atualmente é muito grande e está crescendo cada vez mais. Como o Espírito Santo é referência em tecnologia e produção no Brasil e até no mundo, há uma expectativa e uma série de ações, visando aumentar a produção e a qualidade. Por isso, um dos maiores focos de trabalho do INCAPER, que já vem ocorrendo nos últimos cinco anos, é de que o Estado aumente a produção de conilon, mas com qualidade (FERRÃO, 2013).

Para que isso ocorra, existem várias ações dentro do Estado, voltadas para a melhoria da qualidade, associadas às tecnologias de colheita, de secagem, de beneficiamento e armazenamento. Os resultados das pesquisas passam por um programa de transferência de tecnologia, que capacita não somente os técnicos do INCAPER, como também toda a cadeia do café (FERRÃO, 2013).

O Espírito Santo já está no quinto ano da campanha da melhoria da qualidade, uma ação que já vem dando bastante resultado, sendo que o café conilon capixaba já está entre os melhores cafés robustas do mundo. O Estado tem inclusive café conilon que é tão bom quanto os melhores cafés dos países que priorizam a qualidade, como a Índia, o Vietnã, e alguns países da África (FERRÃO, 2013).

Essa busca constante por qualidade, que vem ocorrendo nos últimos anos, está proporcionando uma mudança, que é lenta, porém gradual, em que muitos produtores já estão se beneficiando com agregação de valor da saca de café de melhor qualidade, com base na análise sensorial. Um fator que vem contribuindo bastante para esse diferencial é o Protocolo de Degustação de Robustas Finos, lançado pela Organização Internacional do Café e pela Coffee Quality Institute (CQI), em setembro de 2010 (THOMAZINI et al., 2012). Esse protocolo foi elaborado por diversos profissionais do setor cafeeiro mundial e permite avaliar a qualidade da bebida por meio dos atributos sensoriais25.

Outra ação na área de qualidade é o Projeto Conilon Especial, que visa preparar o produtor para a nova realidade de produção e comercialização, com melhoria da qualidade e responsabilidade ambiental e social durante todas as etapas da produção, comercialização e consumo. O projeto é baseado em um protocolo de boas práticas agrícolas, resultado de estudos e revisão das principais certificações reconhecidas mundialmente. O Conilon Especial é um projeto de fomento à certificação de café conilon, que tem o objetivo de preparar os produtores, as cooperativas e associações para a nova fase para a qual o mercado mundial aponta. O programa também contempla a criação e divulgação das

25 O protocolo contém um formulário que oferece um meio sistemático para registrar dez importantes

atributos de sabor do café Robusta: Fragrância/aroma; sabor; retrogosto; relação salinidade/acidez; relação amargor/doçura;sensação na boca; equilíbrio; uniformidade; limpeza e conjunto e defeitos.

marcas de cafés Conilon certificados em nível nacional e internacional, buscando melhores condições de comercialização de seus clientes (THOMAZINI et al., 2012).

No que diz respeito à difusão e utilização das inovações incrementais desenvolvidas para o conilon, três são importantes destacar: a poda, a adubação e a irrigação. Em relação às técnicas de poda, que eliminam os ramos velhos que ficaram pouco produtivos com o tempo, além do excesso de ramos de dentro da copa da planta (ZUCOLOTTO, 2004), Daher (2013) relata que praticamente todos os produtores já adotam essa prática no Estado. Segundo Zucolotto (2004), a poda reduz a produtividade no primeiro ano consecutivo à sua aplicação, mas nos anos seguintes, contribui significativamente tanto para o aumento quanto para a estabilidade da produtividade, como pode ser verificado na Tabela III. Ainda de acordo com o mesmo autor, a adubação (que consiste em disponibilizar para a planta nutrientes em quantidades equilibradas), além de aumentar a produtividade, também pode resultar em maior resistência das plantas a doenças e, consequentemente, redução do uso dos pesticidas.

* sacas de 60 kg de café beneficiado

Fonte: Silveira e Rocha (1995) apud Zucolotto (2004) Planta sem poda e sem adubação Planta com poda e sem adubação Planta com poda e com adubação

Tabela III - Influência da poda e adubação na produtividade de café conilon no Norte do Espírito Santos

16,49 25,32 40,2 % 100,0 153,5 243,8

Sistema de condução Produtividade média em quatro anos

Sacas/ha*

No que diz respeito à irrigação, Daher (2013) estima que 52% das áreas de conilon no Estado são irrigadas, mas considera que esta ainda é uma questão delicada dentro da cafeicultura capixaba. Segundo o entrevistado, está previsto para começar no segundo semestre de 2013 um treinamento com os cafeicultores para que saibam usar de forma correta o sistema de irrigação, porque é comum acontecer do produtor comprar um sistema de irrigação caro, mas subdimensionado para o que ele precisa. Dessa forma, pode acontecer do cafeicultor estar aparentemente irrigando sua lavoura, mas na verdade está

apenas molhando, o que tem trazido grandes óbices ao incremento da produtividade. A fertirrigação26, principalmente, é um grande problema porque o produtor fertirriga, mas se o sistema de irrigação é subdimensionado, ele acaba subfertilizando a sua planta de café e com isso os problemas se agravam (DAHER, 2013).

Segundo Ferrão et al. (2001 apud ZUCOLOTTO, 2004), apesar da irrigação na cafeicultura se mostrar importante, outras tecnologias devem ser empregadas antes dela. Também é necessário verificar o potencial genético do cafeeiro a ser irrigado e as condições de vigor da cultura, pois existem variedades que respondem bem na produtividade quando irrigadas, mas em outras essa resposta pode não ser muito significativa27. Os autores também relatam que quando compara-se lavouras irrigadas com lavouras não-irrigadas, as respostas podem variar de 20% a 260% em ganhos de produtividade. A despeito das vantagens da irrigação, ela deve ser sempre a última tecnologia a ser empregada pelo cafeicultor, devido ao seu elevado custo, e a falta de eficácia se as demais tecnologias não forem aplicadas.

O trabalho de Zucolotto (2004) mostra a importância da inserção das tecnologias no processo produtivo das pequenas propriedades. Ele constata que uma propriedade de base familiar que não utiliza nenhuma tecnologia, precisaria de 8,16 hectares para atingir o ponto de equilíbrio operacional28. Uma propriedade que utiliza apenas a tecnologia de poda consegue reduzir esse valor para 5,64 hectares. A utilização de adubação melhorou ainda mais os resultados, reduzindo este valor para 2,48 hectares (solos de baixa fertilidade), 2,46 hectares (solos de média fertilidade) e 2,41 hectares (solos de alta fertilidade. Já a tecnologia de irrigação permitiu que o ponto de equilíbrio operacional passasse para 2,72 hectares (solo de baixa fertilidade), 2,69 hectares (solo de média fertilidade) e 2,64 hectares (solo de alta fertilidade)29. Portanto, a área mínima a ser plantada está diretamente ligada às tecnologias utilizadas.

26 Método que consiste em levar nutrientes para a planta por meio da água da irrigação. 27 Normalmente materiais mais tolerantes à seca respondem menos à irrigação. 28 Em que as receitas são iguais aos custos e o lucro é zero.

29A pesquisa arbitrou alguns fatores, como preço médio de comercialização, espaçamento e tipo de cultivar utilizada.

Além disso, o INCAPER, por exemplo, tem uma série de recomendações de melhores práticas de manejo e tratamento de pragas, dentre outros avanços. Por exemplo, para facilitar e tornar mais precisos os cálculos dos nutrientes a serem utilizados em cada lavoura, foi desenvolvido pelo INCAPER, uma planilha, disponível gratuitamente no sítio do instituto, que permite ao extensionista (ou mesmo ao próprio produtor rural) ter a quantidade certa de cada nutriente (como nitrogênio, fósforo, etc.) a ser utilizada na lavoura, a partir de sua produtividade potencial30 (PREZZOTTI, 2013).

Esta ferramenta também fornece cálculos de custeio (custo por talhão, por saca beneficiada e por hectare), para verificar se a produção está sendo economicamente viável. Segundo Prezotti (2013), uma produtividade abaixo da média estadual, que atualmente está em torno de 35 sacas beneficiadas/ha, já pode ser considerado prejuízo para o produtor. Muitas vezes, o produtor não tem essa noção de viabilidade econômica. Como a venda é realizada em épocas específicas, e os custos não foram detalhados ao longo do tempo, o cafeicultor não percebe que a atividade não está dando o retorno adequado.

Outro problema, segundo o pesquisador, é que como a atividade é familiar, o custo da mão- de-obra não é considerado pelo produtor, dificultando os cálculos do retorno da produção. Se a atividade não consegue alcançar o ponto de equilíbrio, a pessoa poderia trabalhar em outra atividade e conseguir, dessa forma, contribuir para a renda da família. Além disso, esse é um cálculo de custeio simplificado, que não leva em consideração outros fatores, como a depreciação dos equipamentos. Segundo Zucolotto (2004), a exatidão desses cálculos é um fator limitante na precisão do conhecimento dos custos de produção das lavouras.

De acordo com Zucolotto (2004), a gestão de custos na agricultura capixaba, principalmente em unidades de base familiar, sempre se mostrou ineficaz. Nos momentos de crise, os pequenos cafeicultores reagem abandonando as tecnologias em que haviam investido e lhes proporcionado maior produtividade e rentabilidade. Segundo o autor, a

30 Essa ferramenta também inclui cálculos para diversos outros gêneros agrícolas (como abacaxi, mamão, hortaliças, etc.) também pesquisados pelo instituto.

grande maioria dos pequenos cafeicultores desconhece os custos de produção, o que os leva a um descontrole financeiro, o a falta de informações para tomadas de decisão. Também deve ser levado em consideração na mensuração dos custos o fato do cafeeiro ter um ciclo bienal, produzindo mais em um ano e menos em outro. De acordo com Zucolotto (2004), por meio do uso das tecnologias desenvolvidas para o conilon, as pequenas propriedades podem obter ganhos produtivos significativos, capaz de proporcionar melhoria da qualidade de vida dos cafeicultores. Entretanto, para que isso ocorra, essas propriedades necessitam de um controle mais apurado dos custos de produção, para que se conheça a viabilidade da implantação das tecnologias. Também deve-se observar que na cafeicultura o tempo entre a produção e a venda, isto é, entre custos e receitas, é relativamente longo, se comparado à diversas outras atividades.

Como foi mostrado no capítulo 1, um SSI possui uma base tecnológica e de conhecimento, relações-chave e complementaridades entre produtos, conhecimento e tecnologias. Os fatores tecnológicos específicos são determinados pela trajetória tecnológica de uma inovação, que, no caso do conilon, tem um marco importante quando da introdução comercial do produto na década de 1970. Mas é, principalmente, a partir da década de 1980, que começa-se a formar uma base de conhecimento específico e passam a ser desenvolvidas diversas inovações para esta cultura.

Além de ser o maior produtor brasileiro, o Espírito Santo também é considerado o único que se tornou referência mundial no cultivo desse tipo de café, devido aos estudos desenvolvidos pelos pesquisadores do INCAPER e da EMBRAPA/CAFÉ (EMBRAPA, 2011). Na tentativa de apresentar um pouco do que seria essa base tecnológica e de conhecimento, as principais inovações foram sintetizadas no Quadro 1 (anexo), incluindo as áreas de melhoramento genético, pragas e doenças, irrigação, poda, dentre outros avanços.