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MEMÓRIAS DA PROFISSÃO DOCENTE: A ESCOLHA DE SER PROFESSORA

Professora Bárbara

3.4 MEMÓRIAS DA PROFISSÃO DOCENTE: A ESCOLHA DE SER PROFESSORA

Muitos dos relatos sobre a escolha da docência como profissão, entrelaçam diferentes aspectos. Ora fica explicito a influencia familiar, ora o caso e surgem repentinamente também fragmentos nos quais pode-se ler uma decisão planejada e engajada. Veremos que em determinados momentos atribui-se ao acaso e em outros momentos a família é responsabilizada.

Para a Professora Maria Emília ser professor não é algo inato, não pode ser dom apenas, uma vez que para ser professor, precisamos estar continuamente nos preparando para receber os alunos e suas contemporaneidades.

[...] Eu acho que entra um pouquinho disso (dom) também, tem que ter certa disposição pessoal, mas, não se sustenta somente com isso. Porque o conhecimento não para, na ciência há a cada dia algo diferente , que auxilia ou que faz você refletir sobre alguma postura ou técnica que você fazia e que agora você pode fazer de um outro jeito . Então se você for querer ensinar como ensinaram você, não funciona mais, você vai impedir que os alunos se desenvolvam. E justamente esse descompasso entre alunos e professores, muitas vezes o professor é mais velho, mais experiente tem uma jornada, uma caminhada diferente do aluno, que ainda está em formação. Esse encontro e desencontro que é o nosso desafio[...].

A Memória salientada pela Professora Maria Fernanda é a do incentivo de algund de seus professores e das suas professoras/irmãs:

[...] Quando estava no terceiro semestre, passei num concurso para professor da Rede Estadual de Ensino (1ª a 4ª série), pois já tinha magistério e um professor disse-me que aquele concurso seria o primeiro dentre tantos que eu iria fazer com sucesso. Eu me senti orgulhosa de ter sido parabenizada por ele. Isto me ajudou, sim, a me manter firme no propósito de ser professora [...] Tive professores que me fizeram acreditar que educação sempre vale à pena. Tive também professores que deixaram a desejar. Porém, devo afirmar que os bons professores na minha vida foram a maioria deles. Minhas três irmãs foram sempre bons exemplos para mim, dentre tantos outros [...](Maria Fernanda).

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Nas palavras daProfessora Maria Emília diz que o envolvimento com o conhecimento propriamente dito, acaba por nos seduzir e nos envolver com a profissão docente e com o amor pelo ofício de ensinar.

[...] E depois que a gente entra e começa a lidar com a situação de relacionamento, de envolvimento dos alunos, com os colegas , com a própria escola e a questão do conhecimento , aquilo tudo vai envolvendo a gente, vai seduzindo e tem uma questão de ser sempre algo novo . Nos vamos ficando mais velhos mas os alunos que a gente recebe é sempre uma renovação, são outras gerações , então a gente se renova com isso e isso também me agrada [...](Maria Emília). A influência familiar pelo ensino, leitura e dedicação ao conhecimento parece permear a infância das professoras pesquisadas. Professora Luiza com a rigidez e seriedade inerente da cultura japonesa; Professora Bárbara superando aos momentos difíceis da II Guerra Mundial - através dos bombardeios constantes inclusive em sua escola, para ir a escola desde muito menina; e as irmãs Maria Emília e Maria Fernanda com sua grande família de professores que contribuem ainda hoje para a educação do Mato Grosso do Sul.

[...] Minha mãe lia muito e era professora. Meu pai também lia bastante e apesar de não ser professor e ser um operário ele lia muito e gostava muito de ler. Lia sobre a história, ele sabia muito história da Família Real no Brasil, História do Dom Pedro I e ele contava. Lia também os livros do Humberto de Campos. Ele era filho de Português talvez esse gosto pela história ligada a Portugal. Mas essa influência da escrita e da leitura foi em casa mesmo. Meu avô, pai da minha mãe era maestro, minha mãe tocava piano e ela o ajudava na orquestra. Ele tocava no Rádio Clube47 e ela o acompanhava . Ele foi também o primeiro professor de musica de Campo Grande inclusive teve uma escola e musica. O nome dele é nome de uma escola aqui na cidade é a Escola Estadual Emidio Campos Vidal. Então todas as minhas tias são professoras, estudaram, gostaram de estudar. Então vivíamos naquele ambiente de professores, de ensino, de aprendizagem e além de ter essa vocação essa inclinação, tinha toda aquela circunstância [...] ( Maria Emília).

A professora Luiza revela que não teve muito tempo em pensar se iria seguir ou não a docência. Embora tinha terminado o curso de Letras não tinha planos concretos de começar a lecionar até que veio o convite de iniciar a docência. “Eu me formei em 75, quando foi em 76 comecei a dar aula lá na ‘Dona Vilma’ na Cultura Inglesa”.

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Importante clube da elite social de Campo Grande MS. Criado em 25 de dezembro de 1924, em plena era do tenentismo, tinha o objetivo de reunir as pessoas para ouvir rádio. Com o passar das décadas transformou-se em salão de festas, restaurante, bar, centro de encontro de jovens e adultos , além da parte destinada a pratica de esportes e competições. Mas da sua fundação até os dias atuais ainda é um local para as famílias “tradicionais” ou de “posses”.

Página | 95 No relato a seguir vemos que a escolha da professora Luiza não aparece coerente com o

curso que estava fazendo pois essa resposta não traz coerência. Se pensarmos que ao fazer um curso de Letras que habilita entre outras funções, mas a principal a docência. Quando questionada se ela sabia a razão ou motivo da escolha do curso ela responde:

Eu não sei exatamente por que eu fiz letras, eu ainda não sei. Ah! Eu sei sim! Quando eu fazia o colegial em Presidente Prudente eu tinha uma professora de inglês que me disse assim: “ Luiza, você deveria fazer letras porque você tem muita facilidade com o inglês”! Até então nunca me passou pela cabeça, ela se chamava Elza essa professora, uma japonesa.

Vemos dentro do discurso da professora Luiza, que existe o aspecto na ocasionaliade , motivações talvez negadas na narrativa, mas que a levou a escolha do curso de Letras mesmo que não tivesse tido consciencia do fato a principio.

A Professora Maria Fernanda ao falar sobre sua escolha da profissão aponta as influências dos seus professores e a importância da profissão docente.

[...] A todo o momento quando eu penso em fraquejar eu me coloco no lugar daquelas professoras que estão no magistério não só para ganhar dinheiro, por que se nós fossemos pensar o magistério como ganhar dinheiro? Nós ficaríamos todos muito complexados, não é? Por que ele dá para você viver, você não dá viver com aquela dignidade aquela coisa toda, mas você tem que fazer o seu orçamento para aquilo que você é capaz de segura. Mas tem uma questão muito importante tanto que eu acho que os professores nos influenciaram, que é a questão de nós sempre fazer a diferença no meio. A nossa palavra, por mais que o aluno naquele momento não concorde, chegam um momento que eles vão refletir. Eu tinha professora que falava assim: Olha pessoal - é muito fácil ser boazinha, muito fácil ser bravinha, o difícil é ser justa. Então quem fizer por merecer, vai conseguir qualificativo. Quem fizer vai ter que sofrer as consequências, então eu acho que os nossos professores nos influenciaram muito, até na nossa ética, boas influências. Eu não me lembro se teve má influência eu não guardei na memória. Não tenho modelo negativo. Eu tive muitos modelos positivos [...]

Nos apropriando das palavras de Lopes (2008, p. 29), publicadas em seu texto: O aprendiz de feiticeiro e o mestre historiador: Quem faz a história?

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[... ] Na educação há pessoas que pensam e agem, há o tangível, mas no intangível há uma camada mais profunda: a dos sentimentos, a dos ressentimentos, uma história que ainda não começou a ser escutada ou narrada, mas que já está aí. Todos os dias. Podemos colher o que está à tona – nem isto fizemos ainda. É preciso formular a hipótese do papel do inconsciente na História da Educação, hipótese audaciosa em seu princípio e em suas realizações.

Sendo assim , é necessário que não deixamos de olhar os aspetos subjetivos presentes na escolha profissional. Constatamos que nas narrativas das professoras entrevistadas estas motivações inconscientes são presentes em diferentes momentos.

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