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1 INTRODUÇÃO

1.3 MERCÚRIO EM ECOSSISTEMAS TERRESTRES

O comportamento de metais-traço nos solos pode ser visto em termos de reações nas fases sólida, aquosa e gasosa. Este comportamento está altamente vinculado a sua origem e forma química. Metais-traço de origem litogênica podem ser considerados fracamente móveis. Já os de origem pedogenética refletem as condições do solo. Metais-traço de origem antrópicas são em geral mais móveis que os litogênicos e pedogênicos. Porém, processos no solo controlam sua especiação e distribuição (EVANS, 1989; ZARCINAS et al., 2004a; ZARCINAS et al., 2004b).

Dois principais mecanismos estão envolvidos na retenção de metais no solo. Primeiro, o metal pode ser retido por adsorção envolvendo a formação de esferas de complexação internas ou externas com superfícies de minerais e compostos orgânicos. Segundo, o metal pode ser retido por reações de precipitação levando a formação de uma fase mineral secundária, contudo, em geral, para que isso ocorra é necessária uma elevada concentração (EVANS, 1989)

A natureza dos processos de adsorção para íons não especificamente adsorvidos é dependente apenas da carga relativa do metal em solução e da carga da superfície. Para íons especificamente adsorvidos a extensão da adsorção depende da constante de formação do complexo e do pH do solo. Metais alcalinos e alcalinos terrosos, tais como Na+, Ca2+ e Mg2+, são fixados no solo principalmente por troca catiônica envolvendo fraca associação eletrostática com as partículas do solo (EVANS, 1989).

Elementos hidrolisáveis, tais como os metais de transição e terras raras, podem formar esferas internas de complexação com óxidos, óxidos-hidróxido e hidróxidos, e assim são fortemente presos ao solo. A complexação com substâncias húmicas é muito importante para os metais que formam forte associação com oxigênio e enxofre. Estes metais incluem muitos dos cátions hidrolisáveis tais como Hg2+, Cu2+ e Al3+ (EVANS, 1989).

Yin et al. (1997a) e Yin et al. (1997b) investigaram a cinética de adsorção e dessorção do Hg2+ para discernir os mecanismos de controle e as velocidades de reação de retenção e liberação do Hg2+ no solo. Yin e seus colaboradores concluíram que provavelmente os coeficientes de velocidade de adsorção e dessorção ocorrem em duas fases, uma rápida e outra lenta, e são inversamente proporcionais ao conteúdo de matéria orgânica. Assim, solos com maior conteúdo de matéria orgânica apresentam maior capacidade de retenção de Hg2+ e são mais resistentes a dessorção do Hg2+. Segundo os autores, a difusão do Hg2+ nos microporos da matéria orgânica do solo pode ser o principal fator responsável pela irreversibilidade, mas também, depende da afinidade do Hg2+ com grupamentos contendo enxofre que são muito importantes para a persistência do Hg2+ nos solos.

Por outro lado, o pH ácido pode acelerar a lixiviação do Hg2+ ligado a matriz inorgânica, mas aumenta a afinidade com a matéria orgânica do solo. Assim, a ligação com a matéria orgânica leva à diminuição da concentração de mercúrio na água intersticial diminuindo assim a mobilidade do mercúrio em solos ácidos (SCHLUTER, 1997).

As concentrações de mercúrio nos solos variam bastante, e dependem da localização da fonte de emissão e da geologia local. Quando distante de fontes locais de poluição, os níveis de mercúrio nos solos dependem do tipo de rocha matriz, do pH do solo, da capacidade de troca catiônica, da intencidade do intemperismo e de processos biológicos. O conhecimento sobre a ocorrência de mecanismos de acumulação de mercúrio em ecossistemas terrestres é mais limitado que as informações que temos a respeito do mercúrio na cadeia alimentar aquática. Contudo, o mercúrio em ecossistemas aquáticos é fortemente influenciado pelo ecossistema terrestre (LODENIUS; MALM, 1998).

O projeto METAALICUS (experiência com mercúrio para avaliar a carga atmosférica no Canadá e nos E.U.A.) foi um experimento conduzido em um ecossistema inteiro projetado para estudar a atividade, a mobilidade, e a disponibilidade do mercúrio depositado pela atmosfera (HINTELMANN et al., 2002). Neste experimento, a dinâmica do mercúrio depositado recentemente em um ecossistema terrestre foi estudada apartir de um isótopo estável enriquecido do mercúrio (202Hg) que foi pulverizado em uma pequena bacia de floresta boreal. Esta experiência permitiu acompanhar o destino do mercúrio "novo" na deposição e distingui-lo do mercúrio nativo armazenado historicamente no ecossistema. O estudo

mostrou que o mercúrio recentemente depositado foi mais reativo do que o mercúrio nativo com respeito às vias de volatilização e metilação. Além disso, o experimento mostrou que a mobilidade através do escoamento superficial foi muito baixa e diminuiu fortemente ao longo do tempo por causa do rápido equilíbrio com o reservatório nativo de mercúrio.

O mercúrio depositado nos solos esta sujeito a vários processos químicos e biológicos de transformação como oxidação do Hg0, redução ou metilição do Hg2+ dependendo do pH do solo, temperatura e conteúdo húmico do solo. A mobilização do mercúrio em solos através da formação de compostos inorgânicos de mercúrio solúveis, tais como HgCl2 e Hg(OH)2, tem uma menor importância do que a eluição do mercúrio ligado à substâncias húmicas no solo (BIESTER et al., 2002). A formação de complexos orgânicos de Hg2+ é o processo dominante devido a grande afinidade do mercúrio aos compostos que contem enxofre em seu grupo funcional (XIA et al., 1999).

Por outro lado, os mecanismos de interação físico-química e a mobilidade do mercúrio em solos e rejeitos de garimpo de ouro foram avaliados por Melamed; Vilas Bôas (2002). Segundo esses autores a diminuição do pH afeta diretamente a capacidade de retenção do Hg em latossolos, devido à competição do H+ pelos sítios ativos. E a presença do anion cloreto complexa o Hg2+ diminuindo sua interação com a superfície oxidada, facilitando assim sua mobilização. A aplicação de fosfato aumenta a retenção do mercúrio, contudo, somente na ausência do cloreto.

A transformação do Hg2+ em metilmercúrio aumenta a mobilidade do mercúrio no ambiente (SCHLUTER, 1997; MELAMED; VILAS BÔAS, 2002).