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Mercado hipotecário norte-americano modernizado

4. A GRANDE RECESSÃO

4.2. MERCADO HIPOTECÁRIO NORTE-AMERICANO

4.2.3. Mercado hipotecário norte-americano modernizado

Antes de adentrar na modernização do mercado hipotecário norte-americano, é preciso apresentar algumas instituições de extrema importância para o desenho da crise, são elas a Federal House Administration (FHA); a Federal National Mortgage Association (FNMA, conhecida como Fannie Mae); a Federal Home Loan Mortgage Corporation (conhecida como Freddie Mac). A FHA foi criada em 1934, como forma de incentivar o setor imobiliário norte-americano durante a depressão; é uma espécie de seguro público que dá garantia aos financiamentos imobiliários. Já Fannie Mae, criada em 1938 com o mesmo intuito, captava recursos abaixo das taxas do mercado e emprestava aos bancos hipotecários, que se utilizavam destes recursos para ofertar crédito habitacional. Em 1970 foi criado o Freddie Mac, que além dos mesmos poderes da Fannie Mae, podia comprar e vender hipotecas no mercado secundário, e em 1980; Fannie e Freddie podiam operar com securitização de hipotecas não garantidas pela FHA (NATARIO, 2009).

Existe ainda as chamadas SIVs (Special Investment Vehicles); estas eram empresas financeiras, não bancárias, mas administradas pelos bancos, criadas com o propósito específico de realizar as operações com MBS. A compra de MBS através destas empresas especificas era uma manobra adotada pelos bancos para driblar as exigências legais de passivo e ativo, bem como fugir dos olhos dos reguladores, pois SIVs não eram fiscalizadas devido a revogação da lei Glass-Steagall.

Funciona assim: um americano vai a um banco comercial qualquer e pede um empréstimo para comprar um imóvel. Ato contínuo, o banco cria dinheiro eletrônico e acrescenta estes dígitos eletrônicos na conta do tomador de empréstimo, que agora utilizará este dinheiro para comprar um imóvel. Por uma questão de regra contábil, sempre que um banco concede um empréstimo, ele está criando um ativo e um passivo: o ativo é o valor do empréstimo, o passivo é o dinheiro que ele deu ao tomador de empréstimo (ROQUE, 2013).

Todo empréstimo gera um ativo; que são os créditos a receber, e um passivo; que são os créditos concedidos. Estes números compõe o balanço das instituições financeiras, e pela regulamentação bancária, os ativos precisam manter uma proporção limite do patrimônio líquido da instituição. No momento em que este limite é atingido, a liberdade de concessão de empréstimos de uma instituição cessa, e neste ponto é que a securitização do crédito se tornou importante para o sistema. As instituições começaram então a conceder os créditos imobiliários, e depois securitizá-los, através de uma engenharia financeira6 transformando-os em títulos negociáveis que eram vendidos no mercado secundário para as agencias Fannie Mae, Freddie Mac, e SIVs (muitas vezes da própria instituição). Este processo implica em algumas consequências fundamentais para os bancos originadores dos empréstimos: Primeiro, o banco comercial se livra do risco de inadimplência, que agora está sobre responsabilidade de quem comprou o ativo; Segundo, ao vender esta dívida, o banco diminui a proporção de seu ativo para com seu patrimônio líquido, o que habilita ele a conceder mais empréstimos sem infringir a regulamentação bancária; Terceiro, o volume de empréstimos também expande devido a rapidez da recuperação dos fundos emprestados, pois os bancos não precisariam mais esperar o longo prazo típico dos contratos de financiamento imobiliário, obtendo um fluxo de caixa livre em uma velocidade maior, para poder realizar novos empréstimos. Na prática, os bancos, juntamente com as agências hipotecárias e SIVs, se tornaram agentes de expansão artificial do crédito (MENDES, 2016).

As agências hipotecarias, que agora eram os novos credores destes ativos, precisavam monetizar a operação, e para isso, vendiam os CDOs (Collateralized Debt Obligations); que era um pacote com vários contratos de crédito hipotecário securitizado, negociados no mercado de valores com fundos de pensão, seguradoras, outras instituições,

6Funcionava da seguinte forma: Elas criavam uma espécie de fundo, chamado Mortgage Pool, e colocavam nestes fundos suas dívidas

securitizadas, onde emitiam cotas de diferentes classes de risco. Os contratos de dividas de baixo risco eram classificados como AAA, AA e A e eram vendidos diretamente aos investidores; os contratos com risco intermediário eram classificados como BBB, BB e B e eram empacotados nos chamados CDOs e vendidos para as agências hipotecárias e as SIVs; e os contratos com alto risco eram reclassificados como mais seguros através de um processo de derivativos (OLIVEIRA, 2011).

fundos hedge, entre outros; ou mesmo mantido em suas carteiras para recebimento dos pagamentos das parcelas. Os novos credores, porém, também podiam negociar estes mesmos títulos com terceiros investidores; portanto, os CDOs começaram a inundar a economia, e era difícil saber quem era o novo credor (MENDES, 2016).

Os CDOs eram estruturados em um esquema de tranches, ou seja, uma escada/cascata de investimento, onde o degrau mais alto era mais seguro, pagava juros menores, pois receberia primeiro os pagamentos destas obrigações de crédito. No degrau de baixo estava o risco/retorno intermediário, pois quando os investidores da tranche sênior fossem remunerados, os próximos pagamentos viriam para o degrau do meio. Por último, a tranche residual pagava mais retorno aos investidores, porém, era a mais arriscada, pois tinha que contar que não houvesse inadimplência suficiente para que os dois degraus acima fossem remunerados e ainda sobrasse remuneração para o último degrau (NATARIO, 2009). Este processo de empacotar títulos garantidos por dívida (CDOs) gerava obscuridade no investimento, pois não era possível conhecer a real estrutura da dívida que se estava comprando. As agências de rating tiveram um papel fundamental na disseminação deste tipo de produto na economia norte- americana e mundial; a classificação de risco destas agências gerava tranquilidade nos investidores, e os CDOs eram classificados pelas mesmas com alto grau de investimento (baixo grau de risco), sendo muitas vezes classificadas com a mesma segurança de títulos do governo americano (SILVA 2015).

O processo é ilustrado na figura 5:

Fonte: Filho, 2008.

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