• Nenhum resultado encontrado

3 8 “Mercado negro” do voto

A falta de conhecimentos por trás do voto pode facilmente influenciar de forma negativa as ações de alguns eleitores, como por exemplo comprarem, venderem ou trocarem votos, apesar de nas democracias modernas existirem muitos cidadãos que acreditam que este comportamento não é ético ou que é imoral.

56 [Bock, P. (2018)] 57 [Chrisafis, A., (2018)] 58

42

Apesar da compra de votos ser condenada universalmente, existem razões ou argumentos que podem validar ou pelo menos tolerar essa ação. Por exemplo, no que toca à igualdade, é compreensível que as pessoas mais pobres vendam os seus votos de forma a aliviarem a pressão financeira. Da mesma forma que pode ser tolerável que os ricos comprem votos de forma a levarem a resultados políticos que favoreçam os que têm maior poder de compra assim como terem as políticas que desejam. No caso de ser possível este tipo de comportamento, a compra de votos de igual montante por parte de grupos opostos com maior capacidade financeira, pode gerar alguma eficiência económica, mantendo-se assim um equilíbrio59. O problema surge quando um dos lados tem mais poder que o outro, seja a nível económico, seja a nível militar. No entanto, existe quem descredibilize a possível eficiência económica com argumentos de inalienabilidade do voto, uma vez que afirmam que os votos pertencem à comunidade como um todo e, como tal, não devem ser alienáveis pelos eleitores individuais. Assim, os votos devem seguir sempre o interesse público e não o interesse individual dos mais ricos ou dos que compram os votos de forma a ter mais poder, seguindo assim a norma de que os votos não devem ser comprados60.

Neste sentido, é possível verificar que existem algumas preocupações que devem ser tidas em conta na compra e venda de votos. A primeira prende-se com o facto de num país em que a compra de votos seja legal, os votos serão comprados e vendidos de forma socialmente destrutiva, ou seja, os mais ricos acabarão por ficar mais ricos e os mais pobres cada vez mais pobres. Esta distinção prende-se com o facto de os que têm maior poder de compra votarem indiscutivelmente nos partidos que os beneficiam mais economicamente. Outra das preocupações prende-se com a deontologia, porque mesmo nos países em que seja permitido e não tivesse qualquer consequência a compra e venda de votos, o voto não deveria estar à venda uma vez que é um direito que assiste uma pessoa de se expressar naquilo que pretende.

A compra e venda de votos são consideradas, numa perspetiva deontológica e ética, atitudes e uma ação errada porque leva a que seja eleito um partido com base numa

59 (Hasen, R. L. (2000: 1332)] 60

43

corrupção. No entanto, se for permitida a compra e venda de votos, talvez possa haver um acerto ou até mesmo um equilíbrio dependendo de como o eleitor irá votar61. Por exemplo, se uma pessoa pagar para se votar pela igualdade de direitos, então, neste caso, será uma compra e um voto útil.

Para os defensores da não permissibilidade da compra e venda de votos, o argumento mais comum é que pagar a uma pessoa para votar impõe de certa forma uma externalidade a terceiros, ou seja, irá ter efeitos colaterais de uma decisão sobre aqueles que não participaram na votação. Contudo, essa externalidade também existe quando se tenta persuadir os outros a votar de certas maneiras ou mesmo a ir votar inconscientemente. Assim, é tão grave e errado pagar a alguém para votar num partido uma vez que impõe um custo de terceiro, como persuadir uma pessoa a votar nesse mesmo partido com base num bom argumento.

Os filósofos Debra Satz62 e Michael J. Sandel63 (2012), por exemplo, opõem-se aos mercados eleitorais e apoiam-se no argumento de que os votos devem ser para o bem comum e não para o interesse individual. Nesse sentido, é possível afirmar que o mercado de votos deveria ser ilegal porque se houvesse efetivamente liberdade para comprar e vender votos, então esses votos seriam contra o bem da sociedade e da população. Apesar deste comentário não ser totalmente esclarecedor, não justifica o porquê de não ser legal o mercado de votos, não podendo assim proibir as pessoas mais irracionais ou egoístas de votarem, uma vez que os seus votos também têm tendência a destruir o bem comum. Além disso, e em paralelo com o mercado, é possível acreditar que a “mão invisível” de Adam Smith64 leva ao equilíbrio mesmo que cada um faça escolhas egoístas. 61 [Brennan, J., (2011)] 62 [Satz, D. (2010)] 63 [Sandel, M. J. (2012)] 64

A mão invisível de Adam Smith foi um termo introduzido no livro “A Riqueza das Nações” a 1776, para descrever como numa economia de mercado, apesar da inexistência de uma entidade coordenadora do interesse comunal, a interação dos indivíduos parece resultar numa determinada ordem como se houvesse uma “mão invisível” que orientasse a economia, o que, nos dias de hoje, intitula-se de “oferta e da procura”

44

Esta compra e venda de votos, apesar de não ser ética, não pode ser visto como totalmente errada visto poder haver uma decisão racional por parte do possível vendedor. Se o possível vendedor do voto ponderasse efetivamente sobre este ato e, após análise da situação, verificasse que ia ter mais benefícios do que custos, ou que teria mais benefícios líquidos que outras alternativas do que não ir ou ir votar, então nesse caso seria vantajoso para ele. Obviamente que depois podia suscitar dúvidas quanto à legitimidade de o fazer corretamente ao contrário de fazer um voto destrutivo ou egoísta. No entanto, se efetivamente houver dúvidas sobre a legitimidade, isso irá estender-se a todos, questionando assim se de um modo geral deveríamos ser todos autorizados a votar ou não.