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Capítulo 2 – Revisão Bibliográfica

2.2. Mercados de Energia Eléctrica

O fim do século XIX marcou o início da actividade do sector eléctrico na produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, até aos consumidores. Desde essa altura e até aos dias de hoje tem-se verificado diversas alterações no sector. Numa fase inicial o sector eléctrico era constituído por redes eléctricas de baixa potência e pequena extensão geográfica. Gradualmente com o aparecimento de novas tecnologias e sucessivos aumentos da potência de cargas, a extensão geográfica das redes e as respectivas potências começaram a sofrer fortes aumentos. Este processo aliado à crescente exploração de recursos hídricos, alguns deles distantes dos grandes centros de consumo, levou à necessidade de construção de redes de transporte de electricidade envolvendo maiores distâncias e níveis de tensão cada vez maiores. Esta evolução originou a primeira grande transformação do sector passando os pequenos sistemas para grandes sistemas eléctricos, criando a necessidade de progressivamente interligar os sistemas eléctricos.

Esta transformação permitiu do ponto de vista técnico, aumentar a estabilidade das redes e elevar os índices de segurança de exploração. No que diz respeito ao nível de estrutura de propriedade do sector eléctrico este apresentava características distintas de país para país. Por exemplo nos Estados Unidos da América, na década de 70, aproximadamente 75% dos activos do sector eram propriedade privada. Em Portugal até 1975, a organização do sector eléctrico assentava em concessões atribuídas a entidades privadas, no entanto, nesse mesmo ano ocorreu a nacionalização e integração vertical do sector com a criação da empresa Electricidade de

Portugal (EDP). No caso de países como a Alemanha ou Espanha, o sector eléctrico manteve- se estruturado com diversas empresas privadas a actuar através de concessões atribuídas para diferentes zonas do país. Esta pluralidade de empresas não fomentava qualquer tipo de concorrência visto que, para além de actuarem em diferentes áreas concessionadas, apresentavam uma estrutura verticalmente integrada que englobava todos os segmentos da cadeia de valor, desde a produção à entrega de energia com o consumidor final. Esta estrutura verticalmente integrada encontra-se representada na Figura 2.2.

Figura 2.2 - Estrutura vertical do sector eléctrico [adaptado, Saraiva J., et al., 2002]

Neste modelo de negócio, em que as empresas podiam ser públicas ou privadas, o consumidor não podia escolher o fornecedor com o qual se pretendia relacionar do ponto de vista técnico e comercial. O preço de energia era determinado por processos pouco transparentes, na medida em que não havia uma separação muito clara entre o agente regulador estatal e a entidade regulada (no caso de as empresas serem de domínio público) [Saraiva J. et

al., 2002].

2.2.2. Restruturação do sector eléctrico

O processo de restruturação do sector eléctrico trouxe vários desafios obrigando à transformação de modelos conceptuais que inicialmente dominavam o sector. Até aos anos 70, em Portugal os aumentos anuais de consumo rondavam valores entre 7 a 10 pontos percentuais, sendo usual a existência de economias de escala. Em 1973 dá-se o primeiro choque petrolífero, registaram-se importantes alterações no ambiente económico: as elevadas taxas de juro e a elevada inflação tornaram o ambiente económico mais volátil. Consequentemente, e também pela crescente preocupação com o meio ambiente, foram introduzidas políticas de eficiência energética (o que levou à queda do crescimento da carga e a uma maior dificuldade na sua previsão) e políticas de aproveitamento de recursos endógenos.

A este contexto menos favorável vivido durante anos 80 foram introduzidos mecanismos de liberalização ou desregulamentação de outras actividades económicas, como a aviação, empresas de telecomunicações, gás, correios, entre outras. A conjugação destes factores promoveu a necessidade de uma reestruturação do sector eléctrico de forma a tornar este sector competitivo no meio económico envolvente. Contudo esta reestruturação apenas se iniciou em 1990 com o governo do Reino Unido, exceptuando uma experiência precursora no Chile [Saraiva J. et al., 2002].

Segundo [Saraiva J. et al., 2002], os principais factores que impulsionaram e sustentaram a base da restruturação do sector eléctrico prendem-se com os seguintes pontos:

 Implementação de mecanismos de Mercado Livre em diversos países, através da introdução de novos diplomas legislativos, forçando a separação das companhias verticalmente integradas em diferentes segmentos de actividade;

 Forte evolução tecnológica verificada nas décadas de 80 e 90, nomeadamente ao nível de automação e telecomunicações;

 Exploração de novas áreas de gás natural economicamente viáveis em simultâneo com o desenvolvimento das tecnologias associadas às centrais eléctricas de ciclo combinado, levando a uma diminuição do período de construção e amortização das centrais, atraindo novos investidores para a actividade de produção;

 Criação de incentivos ao aumento da eficiência energética e ao aproveitamento de energias renováveis.

2.2.3. O novo modelo do sector eléctrico

O principal objectivo da reestruturação é a desverticalização do sistema até então existente, criando competitividade nas diferentes actividades da cadeia de valor do sector eléctrico. Este processo de desverticalização referido na literatura inglesa por unbundling, trouxe diversos benefícios para o sector, criando-se novas empresas que proporcionam um aumento de competitividade em alguns segmentos.

Este novo ambiente competitivo traduz-se em condições mais vantajosas para o consumidor pois todos os agentes envolvidos se esforçam para desenvolver os seus serviços e proporcionar ao consumidor condições mais atractivas do ponto de vista técnico e económico. A criação de mecanismos de coordenação e de regulação independentes constituem também um dos pontos mais importantes da reestruturação. Por isso, foi introduzida a figura dos Operadores Independentes do Sistema, denominados de Independent System Operator (ISO), e os Operadores de Mercado, Market Operators (MO). Esta nova reorganização trouxe

competitividade a algumas das áreas do sector eléctrico. Na área da produção e comercialização surgiu uma forte competição entre os agentes, derivado do aparecimento de diversas empresas a actuar num mercado de livre concorrência. Por outro lado, este incremento de competitividade seria inviável do ponto de vista económico e ambiental na área do transporte e na distribuição de energia, já que implicaria uma duplicação das redes de transporte e de distribuição. Assim sendo, estas duas actividades são exercidas em regime de monopólio natural regulado. A nova estrutura do sector eléctrico pode ser dividida em quatro áreas às quais estão associadas diferentes funções [Castro R., 2009]:

 Actividade de produção – inclui a produção de energia eléctrica em regime normal, especial, assim como o fornecimento de serviços auxiliares;

 Actividade de Rede – subdividindo-se entre:

 Actividade de Rede de Transporte – nesta actividade está inserida o planeamento da expansão, manutenção, construção e operação;

 Actividade da Rede de Distribuição – inclui as mesmas funções da rede de Transporte aplicadas à Rede de Distribuição

 Transacções – permitem o relacionamento entre entidades produtoras, consumidores elegíveis e comercializadores;

 Actividades de coordenação técnica e de regulação.

Na Figura 2.3 está representado de forma esquemática, o resultante da reestruturação, dando origem a um novo modelo desagregado em que intervêm diversos agentes.

Figura 2.3 - Nova estrutura do sector eléctrico [adaptado Castro R., 2009]

As actividades de Produção e Comercialização, situadas nos extremos da Figura 2.3, às quais se junta a Intermediação Financeira, são exercidas em ambiente de mercado concorrencial. Por outro lado, as actividades de Transporte e Distribuição são exercidas em regime de monopólio regulado, embora actualmente ainda se encontre em aberto a discussão sobre as concessões da rede de distribuição BT. A zona central do modelo representa um

conjunto de actividades que estavam anteriormente englobadas no segmento do Transporte. Nestas actividades estão incluídos [Castro R., 2009]:

 Contratos Bilaterais – podem ser do tipo físico ou financeiro e permitem um contacto directo entre o Produtor e o Comercializador ou clientes elegíveis. Estas entidades estabelecem acordos, englobando o preço e quantidade de energia a ser entregue ao consumidor durante um intervalo de tempo definido;

 Mercados Centralizados – originaram a figura de Operador de Mercado, que tem como principal função a administração dos mercados ao nível de compra, por parte dos Consumidores, e de venda, por parte dos Produtores, tipicamente para um pequeno intervalo de tempo, tipicamente 1 hora ou ½ hora. O Operador de Mercado reúne estes dois tipos de oferta (compra e venda) e como resultado desse encontro resulta um despacho económico;

 Operador de Sistema Independente – em complemento ao operador de Mercado, surge o ISO. Este Operador de Sistema recebe os despachos económicos dos contratos bilaterais e dos mercados organizados, analisando a viabilidade técnica do conjunto do sistema, tendo em especial atenção a eventual existência de congestionamentos da rede. Caso se verifique a viabilidade dos despachos, o Operador de Sistema procede à contratação dos serviços auxiliares necessários. Em caso de inviabilidade técnica o ISO deve gerir a situação através de um consenso obtido junto dos mercados/contratos bilaterais de forma a garantir a segurança de exploração do sistema. Em diversos países, a actividade de transporte e de Operador de Sistema estão agregadas na mesma entidade, designada por Transmission System Operator (TSO);

 Serviços de Sistema– permitem o bom funcionamento do sistema e asseguram os níveis de qualidade, segurança e fiabilidade do mesmo. Estão inseridos nestes serviços a produção de energia reactiva, regulação de frequência/reservas, controlo de tensão e

blackstart. Para o presente trabalho não vamos aprofundar este tipo de serviços.

2.2.4. Implementação de mecanismos de mercado no sector eléctrico

Em 1978 foi criada nos EUA a figura do produtor independente e a obrigação das empresas concessionárias monopolistas, em adquirir a energia por eles produzida. A reestruturação mais profunda do sector só teve início mais tarde, em 1992 com a publicação do

É no Chile, no final da década de 70 que se verifica a primeira implementação de mecanismos de mercado no sector eléctrico. Depois disso, em Inglaterra e Gales procedeu-se à reestruturação do sector, no final da década de 80, [Saraiva J. et al., 2002]. A Figura 2.4 apresenta uma cronologia com as reestruturações verificadas em diferentes países.

Figura 2.4 - Cronologia de reestruturação do Sector Eléctrico [adaptado, Saraiva J. et al., 2002]

2.2.4.1. Mercado Inglês e Galês da Electricidade

Na Europa o movimento de liberalização teve início na Grã-Bretanha com a obrigação legal de aquisição da energia produzida pelos produtores independentes em 1983. Em 1990 deu-se a privatização das empresas eléctricas e a criação de um mercado grossista obrigatório. Este processo de restruturação do sector eléctrico de Inglaterra e Gales, sob o governo de Margaret Thatcher, impulsionou de forma generalizada o desenvolvimento mais acelerado e generalizado do sector nos restantes países.

Antes da reestruturação, o Central Electricity Generating Board (CEGB) detinha completo monopólio da produção e transmissão, produzindo, comprando, vendendo e abastecendo os consumidores. De modo a induzir concorrência na produção, em 1990 o CEGB foi dividido em três empresas: a National Power, a Power Gen e a Nuclear Electric, que no início detinha 91% da produção total. Relativamente à rede de transmissão, foi constituída a

National Grid Company (NGC) que se tornou simultaneamente operador do sistema, operador

de mercado e proprietário de 12 companhias regionais de distribuição de electricidade. Ao longo da década seguinte, tanto as empresas de produção, como as de distribuição de electricidade foram sendo privatizadas até que em 2001 se concretizou a substituição do sistema de bolsa obrigatória (Pool) pela New Electricity Trading Arrangements (NETA). Posteriormente, em 2005, foi alargada à Escócia, dando origem à British Electricity Trading

O mercado na Inglaterra e Gales começou por ser um mercado de bolsa “power pool”, após a restruturação dos mercados passou a ser um modelo “power exchange”, com controlo e operação através da Amesterdam Power Exchange, APX [APX POWER UK], desde 2003. Com a excepção da Itália que em 2013 ainda adoptava um modelo “pool”, por toda a Europa os mercados europeus já tinham adoptado o modelo “power exchange” [Mayer K. and Truck S., 2018].

2.2.4.2. Mercado Nórdico de Electricidade (NordPool)

A Noruega foi o berço do NordPool, uma vez que, em 1991, com a publicação da Energy

Act passou a existir um livre acesso às redes de transporte e de distribuição e foi introduzida a

concorrência entre geradores, grossistas e retalhistas, assim como o direito de escolha do fornecedor por parte dos consumidores. Mais tarde, em 1996, também a Suécia implementou uma importante reestruturação do mercado – análogo ao da Noruega – que conduziu ao estabelecimento do primeiro mercado de transacção de energia, entre a Noruega e a Suécia, designado por o Nordic Power Exchange, Nordpool. Foram removidas as tarifas fronteiriças entre os dois países que se tornaram efectivamente num mercado único de energia eléctrica [Huneault M. et al., 1999]. Este foi mais tarde estendido à Finlândia (1998), à Dinamarca (2000) e mais recentemente à Estónia (2010), Lituânia (2012) e Letónia (2013). No mercado nórdico existe um operador de mercado NordPool e sete operadores de sistema, distribuídos pelos sete países integrados: Statnett SF (Noruega), Svenska Kraftnät (Suécia), Fingrid (Finlândia),

Energinet dk (Dinamarca), Elering (Estónia), Litgrid (Lituânia) e AST (Letónia) [Nordpool

Spot].

O NordPool tornou-se o primeiro mercado transaccional para o comércio de energia eléctrica, integrando estruturalmente dois mercados físicos de electricidade, um mercado diário – Elspot – e um mercado intradiário ou de ajustes – Elbas – e ainda um mercado de derivados financeiros.

O mercado diário (Elspot) é baseado num mercado pool simétrico com participação voluntária e é caracterizado por ser o maior mercado do dia seguinte do mundo, no âmbito da comercialização de energia eléctrica, oferecendo a garantia de um mercado seguro e transparente de alta liquidez. Trata-se de um mercado que funciona no dia anterior e que estabelece programas de produção e consumo para cada uma das 24 horas do dia seguinte. Para o cálculo do preço é necessário que todos os participantes do mercado submetam as suas ofertas de compra e de venda em termos de preços e quantidades. De seguida são agregadas todas estas ofertas, o preço da energia eléctrica correspondente a cada hora é dada pela intersecção entre

as curvas de oferta e procura do mercado. Este preço será o mesmo em todo o mercado, a não ser que existam congestionamentos na rede. Nesta situação o sistema nórdico pode ser dividido em onze áreas, sendo os diferentes preços utilizados pelos operadores de mercado para adquirir energia ou reduzir a produção de modo a eliminar os congestionamentos na rede.

O mercado intradiário (Elbas) promove as trocas contínuas de energia eléctrica até uma hora antes da entrega física da mesma, funcionando como um contrato bilateral. Como os preços do Elspot são fixados com 24 horas de antecedência em relação à entrega real da energia eléctrica contratada, muitas vezes existem desvios entre a produção e o consumo de energia, estipulados no contrato, podendo assim ser ajustados pelos participantes do mercado Elbas. Outra função deste mercado é administrar capacidade negocial entre diferentes áreas recorrendo ao market splitting, no caso de existir congestionamento, assim como de manter o equilíbrio entre produção e consumo.

Relativamente aos contratos financeiros, estes correspondem a contratos às diferenças, contratos futuros e contratos de opções e visam minimizar os riscos associados a situações de congestionamentos do sistema de transmissão de energia eléctrica e à volatilidade dos preços do mercado diário.

2.2.4.3. PJM – Pennsylvania-New Jersey-Maryland

A reestruturação do sector eléctrico nos Estados Unidos da América teve início em 1978 com a publicação do Public Utility Regulatory Policies Act (PURPA), terminando com os monopólios regionais estruturados em empresas verticalmente integradas até aí existentes. Esta legislação deu origem ao aparecimento de entidades produtoras independentes das empresas verticalmente integradas, assim como ao aparecimento de investidores particulares, que teve impacto na nova capacidade instalada associada a produção não directamente integrada nas empresas verticalmente integradas tradicionais, levando a um aumento de forma expressiva, atingindo mais de 60%, em 1994. Também em 1994, entrou em operação a bolsa nos Estados Unidos, a Pennsylvania-New Jersey-Maryland Interconnection (PJM), [PJM], que é constituído por treze estados dos EUA e o distrito de Columbia, abrindo o caminho para o estabelecimento de bolsas regionais de energia eléctrica tal como a de Nova Iorque.

O mercado operado pelo PJM integra dois processos de mercado que são o mercado diário e o mercado em tempo real, sendo este último para a compensação de ajustes. O mercado diário (ou mercado do dia anterior) é um mercado do tipo forward baseado em ofertas de compra e venda para cada hora do dia seguinte e no qual são determinados preços marginais

para cada uma dessas horas. As ofertas de compra e venda para o dia seguinte são submetidas até às 12 horas.

O mercado em tempo real permite calcular os preços marginais para cada barramento em intervalos de 5 minutos considerando um modelo de despacho que inclui restrições de segurança da rede, assim como os contratos bilaterais.

Os preços marginais calculados tanto no mercado diário, como no mercado em tempo real são denominados por Locational Marginal Prices (LMP). Estes preços incluem não apenas componentes referentes ao custo da energia, como também estão associados à ocorrência de congestionamentos no sistema. Assim sendo, num dado período de 1 hora de funcionamento de mercado, se não ocorrerem congestionamentos, o valor do LMP é igual ao preço ou à oferta de venda de energia mais elevado que é necessário utilizar para alimentar toda a carga. Por outro lado, se ocorrerem problemas de congestionamentos no PJM, terá de se realizar novo despacho alterando o conjunto de geradores identificados para funcionar nessa hora tendo apenas em conta a ordem de mérito dos custos de respectiva produção. Ou seja, terão de funcionar geradores com custos mais elevados de modo a evitar os problemas de congestionamentos identificados. Nestas situações, os valores dos LMP reflectem o custo do redespacho correspondente à utilização de opções mais caras em relação às que seriam utilizadas tendo em conta a ordem de mérito referida. Assim, os custos de congestionamento correspondem às diferenças entre os LMP nos pontos de injecção e de consumo.

A PJM Interconnection trabalha como um mercado grossista com um despacho centralizado, sendo que no final de 2014 tinha instalado uma capacidade de produção de 183.604 MW e mais de 900 participantes no mercado diário [PJM].

2.2.4.4. Mercado Ibérico de Electricidade – MIBEL

Na Espanha, em fevereiro de 1997, entrou em vigor a Directiva 96/92, agora revogada e substituída pela Directiva 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da electricidade [Directiva 2009/72/CE]. A entrada em vigor da Directiva 96/92 permitiu a reestruturação do sector, nomeadamente ao nível da criação de um mercado grossista, redução da intervenção estatal, diferenciação entre actividades reguladas (transporte, distribuição e operação) e não reguladas (produção e comercialização), a liberdade de escolha dos consumidores e o “livre” acesso de terceiros às redes. Foi então que, em 1998, os Governos de Portugal e Espanha iniciaram conversações e estudos para progressivamente, eliminarem obstáculos e promoverem a criação do Mercado Ibérico de Electricidade (MIBEL).

Em Portugal, a partir dos anos 80, começou a defender-se que a produção e a comercialização eram segmentos onde se poderia introduzir concorrência, dando-se os primeiros passos para a liberalização do sector eléctrico. Em 1988, com a alteração à Lei de Delimitação de Sectores, permite-se a abertura do sector à iniciativa privada, através do Decreto-Lei n.º 449/88, de 10 de dezembro, salvaguardando o interesse público e a valorização do potencial económico nacional. Paralelamente, em meados de 1991 inicia-se o processo de reestruturação e desintegração vertical da EDP, enunciado nos Decretos-Lei nos 7/91 e 131/94, de 8 de janeiro e de 19 de maio, culminando na sua privatização. No início da década de 1990, novos produtores passaram a abastecer o sistema público através de contratos de vinculação2 , definidos no Decreto-Lei n.º 182/95 de 27 de Julho, como sendo contratos de longo prazo mediante os quais, um produtor assume o compromisso de entregar ao sistema público toda a energia eléctrica por si produzida. Em 1995, é aprovado um pacote legislativo sobre a organização do sector eléctrico, que se traduz na separação jurídica das actividades de produção, transporte e distribuição, na distinção do sistema de serviço público do sistema independente e na criação de um sistema eléctrico que permite o acesso de terceiros às redes de transporte e distribuição. Com a liberalização do sector e a necessidade de garantir a universalidade do fornecimento de energia eléctrica foi criada a ERSE, em 1995, com a designação Entidade Reguladora do Sector Eléctrico, que é alterada em 1997 para Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, uma vez que ganha novas competências noutros sectores energéticos, passando, nomeadamente, a assegurar também a regulação do gás. A separação das actividades de distribuição e de comercialização dá-se em 2006, criando-se a EDP Serviço Universal, S. A. e a EDP Comercial, S. A., que actuam como comercializadores, respectivamente, no mercado regulado e no mercado liberalizado. Na base de toda esta reestruturação estão as normas comunitárias, nomeadamente, a Directiva 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de dezembro de 1996, mais tarde, revogada pela Directiva 2003/54/CE3 do Parlamento Europeu e do Concelho, de 26 de junho de 2003, que define as regras comuns com vista à criação do mercado interno da electricidade da União Europeia. A transposição dos princípios desta directiva comunitária para a legislação nacional