• Nenhum resultado encontrado

4. CAXIXI e CAPOEIRA

4.4 Mestres: Livros Vivos

4.4.2 Mestre Lua de Bobó

Edvaldo Borges da Cruz, Mestre Lua de Bobó, nasceu em Arembepe, Camaçari no ano de 1950. Muda-se para Salvador ainda pequeno, com a mãe - Dna. Maria Borges da Cruz. De acordo com informações contidas no blog oficial do grupo coordenado por este mestre, por volta de seus 15 anos conhece Mestre Bobó (Sr. Milton Santos) levado pelo seu amigo Bel. Primeiramente, treinou no fundo de quintal, “em terra batida”, no Dique Pequeno do Tororó, em Salvador, BA, na Academia de Capoeira Angola Cinco Estrelas. Por esta academia passaram muitos capoeiristas além de ilustres visitantes. Como canta Mestre Lua de Bobó, “Mestre Bobó me ensinou com toda dedicação, agradeço a Deus do céu, o grande homem de valor, sou discípulo que aprende sou Mestre que dou lição, Mestre Lua de Bobó tem a sua tradição (BOBÓ, 2011)

Acompanhando seu Mestre por mais de 20 anos, inicialmente sendo chamado de “Olhar para Lua”, com o tempo passa a ser chamado pela capoeiragem baiana de Mestre

Lua de Bobó, e em 1987, no Dique do Tororó, no clube Vasco da Gama, recebe oficialmente seu diploma de Mestre de seu Mestre Bobó (Sr. Milton Santos).

Mestre Lua iniciou suas atividades na Associação dos Pescadores Unidos de Arembepe, em Arembepe, Camaçari BA, na gestão do Sr. “Lió” quando realizou seu “Iº Encontro de Capoeira Angola” em 1987, com a presença de capoeiristas como, Bobó, João Pequeno, Virgílio, João Grande, Curió, Pelé da Bomba e a companheira do falecido Seu Pastinha, D. Maria Romélia. Funda o Grupo de Capoeira Angola Menino de Arembepe (GCAMA) quando começa a ensinar na cidade de Arembepe e em Salvador BA no Clube de Regatas Vasco da Gama, no Dique do Tororó. A partir de 1987 o Mestre inicia a tradição de realizar seu Encontro anual sempre em data próxima ao seu aniversário e do grupo, no mês de janeiro. Forma 2 Mestres, Eliseu Valverde em Salvador BA, hoje não mais na ativa, e José de Almeida o Mestre Zequinha da Escola Raiz de Angola de Piracicaba SP.

Em 1990 realiza sua primeira viagem ao exterior, quando vai demonstrar sua arte em Atlanta, EUA. Em 1990 o grupo inicia suas aulas em Salvador, no Clube Regatas Vasco da Gama, no Dique do Tororó dividindo o espaço com Mestre Bobó. Onde permaneceu até 2001. Ainda na década de noventa, após passar um período bastante doente, falece Mestre Bobó, aos 65 anos. O Mestre deixa o Dique em 2001 e começa o projeto de construir o espaço próprio do grupo no antigo terreno da família, em Arembepe, Camaçari, BA. Assim, intensificam-se suas viagens pelo Brasil e exterior. A partir de 2002, Mestre Lua de Bobó se muda definitivamente para Arembepe, passando a ministrar suas aulas e a realizar seu Encontro anual inicialmente na Associação Pescadores Unidos de Arembepe, até conseguir terminar a construção do seu espaço próprio. Após muitas dificuldades e com a colaboração de alguns admiradores, no seu evento anual em janeiro de 2005, o grupo inaugura seu

espaço à beira-mar num antigo terreno da família do Mestre Lua de Bobó, herdado de seus pais, localizado à beira-mar na praia de Arembepe, passando este a ser a sede do seu Grupo.

Mestre Lua transmite seus ensinamentos de capoeira angola a seus 3 filhos, Erivaldo, Ariovaldo e Taiana que desde cedo acompanham o Mestre, participando inclusive dos treinos de Mestre Bobó em vida. Estes tornam-se seus discípulos e devem dar continuidade a seus ensinamentos.

Conheci, em 2005, Mestre Lua de Bobó, quando mudei para Arembepe, distrito de Abrantes do município de Camaçari, BA, a 40km de Salvador. No CECA, alguém me falou sobre um mestre já senhor que era de Arembepe. Perguntei aos nativos aonde era sua casa e bati palma. Atendeu um senhor idoso, de barba e cabelos brancos, todo sujo de cimento. Apresentei-me como aluna de João Pequeno, e ele me disse: “venha ver a casa que estou fazendo para nós”. Quando entrei, ele estava com a mão na ferramenta, alisando um batente do que seria a sede de sua Academia em Arembepe.

No decorrer desses anos, freqüentei sua academia como aluna em 2006 e 2007, não com tanta assiduidade, participei do seu encontro anual em 2007 e 2008, e assisti algumas rodas como visitante, por exemplo o Aniversário de D. Maria, mãe do mestre. Vi passarem pelo grupo vários capoeiristas de fora do Brasil e de fora da Bahia, que não mais voltaram, ou voltam só quando podem.

Reaproximar-me do Mestre, agora com fins acadêmicos, trouxe-me uma reflexão crítica diante da realidade de fazer uma pesquisa científica com pessoas, seres humanos. A primeira palavra com o mestre foi para pedir autorização para colocar o nome dele e do grupo no meu trabalho de mestrado. Ele me disse que não dependia dele somente, mas de todo o grupo. Pegou alguns livros de capoeira para me mostrar, entre eles, o Uma Vida de Capoeira, editado por Lima (2000); o livro de Mestre Pelé, que segundo Lua, o próprio Pelé

“ralou” para pagar a edição, vendeu carro, depois comprou outro; o livro de Mestre Curió; e uma revista National Geografic, e uma revista National Geografic, em que há uma matéria sobre capoeira angola em Arembepe. Ele reclama que os jornalistas chegaram, sugaram e depois nem mandaram um exemplar da revista. Ele desconfia, percebo que ele acha que não será beneficiado com a pesquisa. O mestre aponta nos livros que pegou, alguns “erros” imperdoáveis que estão escritos como verdades e percebo que por isso ele teme ser alvo de uma pesquisa científica.

Depois desse dia, voltei algumas vezes na academia, em dias sem movimento e em dias de celebração. Visitei a família no Dia das Mães, fui levar um presente para D. Maria e para Taiana, afilhada do mestre, criada como filha, uma linda, morena, esguia, exímia capoeirista, ela deu para coisa, como eu conversava com o Mestre. Visitei a família numa data especial: o aniversário de D. Maria, a festa foi comemorada dia 12 de junho. Ela parecia uma rainha, disse uma aluna.

Depois visitei de novo, em busca de uma olhada nos livros, mas a conversa ficou boa e preferi o livro vivo. Ele me mostra alguns cartazes de eventos que ele produziu, desde 2004, ele aponta os poucos apoiadores, entre eles, uma empresa de construção civil na qual ele trabalhava, que doou uma lata de tinta de R$300,00 e o outro era o próprio grafista que produziu o cartaz. Ou seja, pouquíssimos apoiadores. Depois mostrou um cartaz que tinha o apoio do Forte da Capoeira e depois outros cartazes com a apoio somente de associações locais de Arembepe. Depois me mostra um papel e diz, “olha que absurdo”, o papel dizia: homenagem ao grandioso Mestre Lua de Bobó na Academia Mutação com a presença de Tiko Camaleão e um outro mestre. Lua diz que pegou o papel jogado por debaixo da porta. Não recebeu um telefonema, nem confirmação.

Quando eu freqüentava os treinos presenciei várias vezes discussões sobre a restrição que o grupo fazia de fotos, filmagens, entrevistas. Mestre Lua dizia que a entrevista tem que ser paga, que não permite qualquer filmagem ou fotografia do seu trabalho na academia, principalmente de alunos novos, visitantes e pessoas de fora do grupo.

O interesse acadêmico, e sobretudo o sentimento humano, levou-me várias vezes a visitá-lo em dias sem movimento em sua academia, o que gerou laços de amizade com ele e sua família.