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Atualmente são conhecidas inúmeras alterações moleculares que foram descritas em melanomas malignos, quando comparados aos melanócitos. Diversas outras, a maioria talvez desconhecida, estão sendo descobertas a partir de análises comparativas de perfis de expressão gênica de melanomas de várias fases (Curtin et al., 2005; Haqq et al., 2005; Kabbarah & Chin, 2006; Gray-Schopfer et al., 2007; Jönsson et al., 2007). Com esse acesso infindável de informações, certamente, o mais importante será distinguir as causas primárias da transformação maligna de melanócitos.

O principal evento durante um processo de transformação pode ser acarretado por uma mudança celular que é clonalmente herdada. Este evento poderá contribuir para uma eventual malignidade, o que ocorreria independentemente e não como um resultado secundário de algumas outras mudanças oncogênicas. Todas as outras alterações, ocorrendo como conseqüência da mudança primária, poderiam ser chamadas de mudanças secundárias (Bennett, 2008). Inúmeras técnicas podem ser utilizadas para detectar centenas destas mudanças (Winnepenninckx et al., 2006; Hoek, 2007; Johansson et al., 2007; Stark & Hayward, 2007), mas infelizmente nem todas contribuirão para a malignidade. Portanto, identificar eventos primários é de extrema importância, pois, por definição, são a causa do desenvolvimento tumoral. Conseqüentemente, durante sua evolução clonal, tal evento primário resultaria em um clone que apresentaria uma vantagem de crescimento comparado aos seus vizinhos, ou uma vantagem alternativa e seletiva como capacidade de migração (Hoek et al., 2006).

A maioria dos estudos sobre a etiologia do câncer considera as alterações genéticas (mutação, deleção, amplificação e translocação) como os únicos mecanismos responsáveis pela gênese do tumor (Davies et al., 2002; Houghton & Polsky, 2002; Carr et al., 2003; Chin, 2003; Medic et al., 2006; Miller & Mihm, 2006; Gagglioli & Sahai, 2007). Recentemente, entretanto, eventos epigenéticos tem atraído a atenção dos investigadores, e um número crescente de trabalhos têm demonstrado a participação de alterações epigenéticas tanto na iniciação como na promoção de tumores e, ao que tudo indica, esses eventos são tão importantes quanto as mutações

Introdução

(Baylin & Herman, 2000). Eventos epigenéticos podem alterar o estado fenotípico sem que haja mudanças no genótipo e, mesmo sendo potencialmente reversíveis, são geralmente herdados durante a divisão celular (Laird, 2005). Neste processo, múltiplos mecanismos interagem para estabelecer coletivamente um estado da cromatina, envolvendo modificações em histonas, associação de proteínas, atividade transcricional e, em mamíferos, metilação do DNA (Robertson & Jones, 1998).

A única modificação epigenética que ocorre no DNA de mamíferos é a metilação no carbono C5 da citosina que precede a guanina nos dinucleotídeos CpG (Bird, 2002) (Figura 5), e tem sido reconhecida como um importante mecanismo de regulação da expressão gênica destas células (Jones & Takai, 2001; Jones & Baylin, 2002). A maquinaria da metilação de DNA em mamíferos é composta pelas DNA metiltransferases (DNMTs), que estabelecem e mantém o padrão de metilação do DNA, e pelas methyl binding proteins (MBDs), que estão envolvidas no reconhecimento da metilação (Robertson, 2005).

Em células normais, a metilação ocorre predominantemente em regiões repetitivas do genoma, incluindo DNA satélites, elementos transponíveis e retrovírus endógenos (Robertson, 2002). Além disso, participa da inativação do cromossomo X e do imprinting genômico, que é definido como uma modificação epigenética de um cromossomo parental específico, no gameta ou no zigoto, que leva à expressão diferencial de dois alelos de um gene na célula somática do descendente (Feinberg et al., 2002). Ilhas CpG (regiões ricas em dinucleotídeos CpG), localizadas em promotores de cerca de 50% de todos os genes, apresentam-se geralmente desmetiladas (Jones & Baylin, 2002), embora um aumento no número de exceções tenha sido identificado (Liu et al., 2005; Song et al., 2005) (Figura 6). A metilação do DNA pode reprimir a transcrição gênica diretamente, através da inibição da ligação de fatores de transcrição específicos e, indiretamente, pelo recrutamento de MBDs e suas associações a proteínas repressoras e remodeladoras da cromatina (Robertson, 2005).

Introdução

Figura 5. Mecanismo de metilação de DNA. As fitas de DNA estão enroladas em volta de um octâmero

de histonas, formando os nucleossomos. Estes nucleossomos são organizados em cromatina, que é o bloco de construção dos cromossomos. A metilação de DNA ocorre no carbono 5 da citosina que precede uma guanina, e esta reação é catalizada pelas DNA metiltransferases (DNMTs). Essa metilação garante uma assinatura epigenética única que regula a expressão gênica. Figura modificada de Rodenhiser & Mann, 2006.

Introdução

Figura 6. Metilação de DNA e câncer. O diagrama mostra uma região representativa do DNA genômico

de uma célula normal. Essa região contém heterocromatina pericentromérica hipermetilada rica em repetições e um gene suppressor de tumor (GST) ativamente transcrito associado a uma ilha CpG hipometilada (indicada em vermelho). Em células tumorais, a heterocromatina rica em repetições torna- se hipometilada e isso contribui para a instabilidade genômica, uma característica de células tumorais,

por meio do aumento de eventos mitóticos recombinantes. Metilação de novo de ilhas CpG também

ocorre em tumor, e pode resultar no silenciamento transcricional de genes que regulam a proliferação. Mudanças no padrão de metilação do DNA parecem ocorrer no início da tumorigênese. Figura modificada de Robertson, 2005.

Introdução

O estabelecimento adequado e a manutenção dos padrões de metilação são essenciais para o desenvolvimento normal dos mamíferos e para o funcionamento do organismo adulto. Além de ser responsável pelo silenciamento da expressão gênica, a metilação do DNA mantém a estabilidade genômica, tendo em vista a vasta quantidade de regiões repetitivas, que, quando desmetiladas, podem favorecer recombinações e causar a desregulação transcricional de genes próximos a estas regiões (Eden et al., 2003). Por isso, sua importância tem sido cada vez mais ressaltada por meio de um número crescente de estudos com doenças humanas que ocorrem quando padrões epigenéticos não são apropriadamente estabelecidos e/ou mantidos (Egger et al., 2004). Além de ser comumente relacionada ao desenvolvimento do câncer humano (Brueckner & Lyko, 2004; Das & Singal, 2004; Jiang et al., 2004; Levenson, 2004), anormalidades epigenéticas são encontradas em várias outras doenças, entre elas desordens neurológicas, psiquiátricas e imunes, e malformações congênitas (Robertson, 2005).

Inúmeros trabalhos mostram a hipermetilaçao de DNA reprimindo a transcrição de genes que codificam supressores de tumor (Zheng et al., 2000; Jackson-Grusby et al., 2001), reguladores do ciclo celular (Gonzalez-Gomez, 2003), enzimas responsáveis pelo reparo do DNA (Dobrovic & Simpfendorfer, 1997; Chan et al., 2002), receptores de hormônios (Nass et al., 2000) e promotores de apoptose (Soengas et al., 2001). De fato, dados obtidos de estudos de screening de alterações epigenéticas no genoma de células tumorais demonstraram que os produtos de genes modificados epigeneticamente estão envolvidos na regulação de todas as funções celulares e que o silenciamento epigenético destes genes contribui com a tumorigênese (Herman & Baylin, 2003). Nos últimos cinco anos, estudos com melanomas malignos revelaram por exemplo a hipermetilação aberrante de regiões promotoras de pelo menos 50 genes (Paz et al., 2003; van der Velden et al., 2003; Gallagher et al., 2005). Embora o padrão epigenético anormal de genes possa ocorrer em qualquer fase da progressão tumoral, estudos têm indicado que ele ocorre com maior freqüência durante os estágios iniciais do processo neoplásico (Yamada et al, 2005).

A perda da metilação global é um evento freqüente e precoce no câncer, e está relaciona com a gravidade da doença e com o potencial metastático de muitos tipos de tumores (Widschwendter et al., 2004). A perda da metilação em promotores gênicos

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também pode ocorrer durante a carcinogênese. A desmetilação acompanhada pelo aumento da expressão tem sido relatada em alguns genes como o gene SERPINB5, inibidor de serina protease (também conhecido como maspina) em câncer gástrico (Akiyama et al., 2003), bem como o oncogene γ-synuclein (SNCG) em melanoma (Wada et al., 2004) e nos cânceres de mama e de ovário (Gupta et al., 2003), e a família de genes MAGE, que codifica antígenos tumorais de função desconhecida (De Smet et al., 1999). No início da tumorigênese, a hipometilação global pode predispor instabilidade genômica e, conseqüentemente, mais alterações genéticas, enquanto que a hipometilação do promotor poderia ser um evento tardio, que permitiria a adaptação das células tumorais em seu ambiente local e promoveria a metástase. Entretanto, a perda do controle epigenético que reativa a transcrição de genes no desenvolvimento de cânceres ainda é muito pouco compreendida.

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