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Na sequência da reforma estrutural do ensino artístico de 1983, o Curso de Canto da EMCN foi, até há relativamente pouco tempo, exclusivo do ensino secundário e de frequência em regime supletivo. A admissão ao curso, apesar de não implicar quaisquer critérios relativos à idade ou ao ano de escolaridade dos interessados, dependia de provas de seleção que tinham por base as competências físicas, vocais e musicais dos candidatos, preferencialmente adultos. Assim, durante as últimas décadas, a maioria dos alunos que frequentava este curso já tinha terminado o ensino secundário, e frequentava ou tinha completado estudos superiores noutras áreas. Por esse motivo, ao terminarem o curso secundário de Canto, já não tinham idade ou disponibilidade de tempo para prosseguir estudos de Canto a nível superior nas escolas superiores de música, entretanto criadas para o efeito.

No ano letivo de 2011/2012, a EMCN recebeu os primeiros candidatos adolescentes ao curso de Canto em regime integrado e em regime supletivo. No entanto, as condições de admissão à frequência do curso em ambos os regimes foram diferentes; enquanto que para o regime supletivo foram avaliadas as competências demonstradas na prova vocal, para o regime integrado foi também exigido o 5º grau de Formação Musical concluído ou competências musicais equivalentes.

No que diz respeito ao curso de Canto em regime integrado, e na sequência da política de expansão adotada pela EMCN relativamente a este regime, tem havido um aumento do

2012/2013 e seis no ano letivo de 2013/201424. Mesmo assim, no ano letivo de 2012/2013, o número de alunos do curso de Canto neste regime, contínua a ser muito inferior ao número de alunos do curso de Canto em regime supletivo.

Problemática

Com a implementação do curso de Canto em regime integrado, surgiu a necessidade da EMCN se adaptar a uma nova realidade pedagógica, o que implicou que os professores de Canto lecionassem a adolescentes em mudança de voz sem, no entanto, terem formação especializada nesta área.

Este problema levanta-nos uma questão de imediato: qual a principal razão pela qual a implementação do curso de Canto em regime integrado na EMCN tem sido tão demorada?

Até ao momento, ainda não foram apuradas as causas que levam a esta situação, nem tão pouco tomadas medidas para assegurar uma implementação mais rápida do curso. O que poderá ser feito? Serão os problemas relacionados com a mudança de voz a causa desta situação? Será o facto de, tradicionalmente, o ensino do Canto ser exclusivo de vozes consideradas fisiologicamente amadurecidas, a principal causa que leva a comunidade educativa a questionar-se sobre o sucesso deste ensino a adolescentes?

Questões de investigação

Tendo em conta a problemática enunciada, procurou elaborar-se um estudo que respondesse às seguintes questões de investigação:

1. Que fatores influenciam um aluno adolescente a querer frequentar o curso de Canto na EMCN em regime integrado ou em regime supletivo? Quais as diferenças na aquisição de competências por parte de alunos adolescentes que frequentam o curso em regime integrado ou em regime supletivo?

Dada a abrangência destas questões, considerou-se pertinente formular as seguintes subquestões:

1) Que papel desempenha a família do aluno nesta decisão?

2) Que papel desempenham as experiências musicais do aluno nesta decisão?

3) Que papel desempenha o contexto social em que o aluno está inserido nesta decisão? 4) Quais as consequências de uma prática regular de trabalho vocal num contexto escolar?

Objetivos da investigação

Este trabalho de investigação propõe analisar a problemática do ensino do Canto a adolescentes na EMCN, tendo em conta que a frequência do curso coincide com a fase de

mudança de voz.

São objetivos gerais deste trabalho:

• Recolher e analisar informações relativas ao desenvolvimento vocal, físico e psicológico dos adolescentes;

• Conhecer as razões que os levaram a optar por uma carreira como cantores. São objetivos específicos deste trabalho:

• Compreender se a escolha do curso de Canto e do tipo de regime de frequência se deve a influências familiares, culturais e/ou sociais;

• Analisar, de acordo com o tipo de regime de frequência escolhido: i. As diferenças de inserção no ambiente escolar;

ii. As consequências de uma prática vocal regular; iii. As perspetivas futuras.

Com os resultados obtidos, pretende-se ainda sensibilizar a comunidade educativa da EMCN para as particularidades do ensino do Canto a adolescentes, assim como para a pertinência de expansão do curso de Canto em regime integrado, demonstrando os benefícios que daí advêm no desenvolvimento musical e vocal dos adolescentes.

Fases da investigação

Este trabalho de investigação foi guiado pelas seguintes fases:

1ª Fase Elaboração de uma lista de possíveis temas de investigação; recolha de bibliografia; definição de uma possível questão de investigação; redação do índice provisório.

2ª Fase Recolha de dados sobre o universo escolar; realização de questionários “piloto”; abordagem a alguns alunos e encarregados educação, na tentativa de perceber o grau de aceitação e cooperação em possíveis entrevistas.

3ª Fase Elaboração do guião de entrevista, pedidos de autorização aos Encarregados de Educação para a realização das entrevistas; contactos telefónicos com os serviços administrativos das escolas oficiais de Música, de Portugal Continental, para contextualizar a situação do ensino do curso de Canto, em regime integrado.

4ª Fase Trabalho de Campo: marcação, gravação (em vídeo formato HD) e transcrição das entrevistas; recolha dos programas referentes a todos os recitais, audições e provas das alunas entrevistadas. 5ª Fase Análise dos dados; organização do material e redação do trabalho.

Tabela 14 - Descrição da metodologia utilizada nas diferentes fases da investigação

Natureza da investigação

Esta investigação caracteriza-se por ser uma investigação exploratória, uma vez que se procura obter um primeiro contacto e uma maior familiaridade com a situação a ser investigada, e de natureza qualitativa, baseada numa análise pormenorizada da realidade investigada.

Sendo as principais características de uma investigação exploratória a flexibilidade, a criatividade e a informalidade, considerou-se que esta seria a escolha mais adequada para ir de encontro à perspetiva do professor-investigador, aluno-investigador e músico-investigador (metodologia da investigação-ação). Desta forma, compreendemos melhor as particularidades das vivências e da aprendizagem dos alunos participantes neste estudo, podendo direcionar e analisar questões, e compreender os seus pensamentos e linguagem. Esta opção, bem como a seleção da técnica de recolha de dados, teve como finalidade a descoberta de fatores inerentes à problemática em análise, de forma a obter resultados informativos acerca de aspetos

concretos, e justifica-se por não ser pretensão fazer um trabalho de campo exaustivo e quantitativo, mas sim perceber uma realidade recente e de pequena dimensão, respeitante ao ensino do Canto a adolescentes na EMCN, não tendo, por esse motivo, qualquer propósito de generalização.

Para tentar atingir os objetivos propostos, foi feito um levantamento bibliográfico, foram realizadas entrevistas com os indivíduos diretamente relacionados com o problema, e foi recolhido material que comprovasse o nível de desenvolvimento técnico, musical e performativo dos mesmos.

Considerou-se pertinente seguir uma metodologia de natureza qualitativa, pois entendeu-se que seria a mais adequada para compreender os processos e os fenómenos inerentes à problemática desta investigação, a partir das representações e percepções dos indivíduos, já que são estes a base das questões levantadas. Como refere Yin (Yin: 2012 p.11) pretendemos uma investigação “que capte os verdadeiros significados dos acontecimentos, na perspetiva dos indivíduos a serem estudados”. Este tipo de investigação privilegia, essencialmente, a compreensão dos problemas a partir da perspetiva dos sujeitos da investigação.

Deste modo, pensamos que as técnicas de pesquisa qualitativa, a entrevista e a observação participante que se utilizaram nesta investigação, são as que melhor colocam o investigador em contacto direto e aprofundado com os indivíduos, e permitem compreender em pormenor o que esses indivíduos pensam sobre o assunto ou agem em determinadas circunstâncias. No entanto, é importante sublinhar que, sendo os dados interpretados pelo investigador, é possível que reflitam alguma subjetividade.

Participantes

Foram objeto de estudo, alunas do curso de Canto em regime integrado e em regime supletivo, inscritas neste curso nos anos letivos de 2011/2012 e de 2012/2013.

As participantes envolvidas são, presentemente, alunas de Canto da EMCN, com idades compreendidas entre os 15 e os 17 anos, e que frequentam o 10º ou o 11º ano de escolaridade.

Sendo o número de alunos adolescentes a frequentar o curso de Canto da EMCN muito reduzido (Tabelas 17 e 18), decidiu-se analisar dados referentes a oito alunas, quatro

Todos os participantes neste estudo são raparigas.

A tabela 15 apresenta características das alunas participantes, relevantes para esta investigação:

Participantes Curso de Canto em regime integrado Curso de Canto em regime supletivo A frequentar o 10º ano A frequentar o 11º ano Mariana 14-15 anos ✗ ✗ Leonor 15 anos ✗ ✗ Raquel 15-16 anos ✗ ✗ Catarina 16 anos ✗ ✗ Maria K. 15-16 anos ✗ ✗ Maria V. 16-17 anos ✗ ✗ Carolina 15 anos ✗ ✗ Beatriz 15 anos ✗ ✗

Técnicas e instrumentos de recolha de dados

Sendo esta investigação assente na perspetiva metodológica da investigação-ação, recorreu-se a técnicas de recolha de dados baseadas na conversação, isto é, entrevistas semiestruturadas, elaboradas com a finalidade de promover o diálogo, centrado na perspetiva do participante, na análise de documentação (pesquisa, leitura e análise de material escrito sob a perspetiva crítica do investigador na observação), e na análise das prestações públicas. Assim, para proceder à realização do “guião de entrevista”, foi elaborada uma estrutura em partes temáticas correspondentes a objetivos específicos, relacionados com as questões de investigação.

Na tabela seguinte, apresenta-se a estrutura a partir da qual se elaborou o guião de entrevista, partindo do tópico de investigação: Fatores que influenciam a escolha do curso de

Canto na adolescência.

Temas Subtemas Indicação das questões Objetivos das questões

Motivação para o estudo do Canto e escolha do regime de frequência do curso Antecedentes familiares e outras influências; percurso artístico e regime de frequência 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,10

• Perceber se o ambiente familiar e/ou meio social influenciou a

escolha do estudo da música; • Averiguar o motivo da escolha do

curso de Canto;

• Averiguar a existência de experiências musicais que tenham sido relevantes para a escolha do curso de Canto;

• Averiguar a razão da escolha do regime de frequência do curso de Canto e o grau de satisfação em relação ao mesmo;

Temas Subtemas Indicação das questões Objetivos das questões

Relação com o meio social musical escolar

11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21,

22,23,24,25,26,27,28,29,30

• Averiguar as diferenças entre o aproveitamento escolar dos alunos do curso de Canto em regime

integrado e em regime supletivo; • Perceber o tipo de envolvimento

que os alunos, de ambos os regimes, têm com o meio escolar musical; • Perceber se a inserção escolar dos alunos está relacionada com a motivação para o estudo; • Perceber se os seus amigos e colegas têm influência no seu gosto musical (possíveis influências na sua identificação musical e vocal); • Perceber qual é o ambiente que vivenciam mais tempo (EMCN, escola regular, coro, grupo de amigos...);

• Averiguar se os alunos se sentem ou não desiludidos com o regime de frequência do curso que escolheram na EMCN e se o mesmo vai de encontro às suas expectativas; • Averiguar se a música praticada na EMCN é a música preferida dos alunos;

Temas Subtemas Indicação das questões Objetivos das questões Consequências da prática do Canto Consciencialização do desenvolvimento técnico e musical adquirido 1, 2, 3, 4, 5, 6

• Perceber se há diferenças no grau de maturidade técnica vocal, entre os alunos do regime integrado e do regime supletivo;

• Compreender o grau de

envolvimento dos alunos de ambos

os regimes, no estudo do Canto; • Avaliar o grau de autonomia

técnica dos alunos e determinar se a mesma tem diferenças nos alunos de ambos os regimes; Definição da identidade vocal e ligação emocional com o Canto 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16

• Perceber se o público é uma fonte de motivação;

• Perceber a sua relação com o Canto dentro e fora da EMCN;

• Perceber se todos os alunos se identificam como cantores de forma igual;

• Averiguar se o tempo médio que os alunos passam no EMCN é

proporcional ao seu

desenvolvimento como cantores; • Relacionar o envolvimento entre o estudo individual e o meio social escolar;

• Conferir se relacionam com pessoas que tenham estilos musicais diferentes dos seus e se as suas escolhas musicais são iguais às dos seus amigos;

Temas Subtemas Indicação das questões Objetivos das questões

• Perceber se as aulas de Canto mudaram a percepção que tinham da sua voz e se continuam a identificar-

se com a mesma;

Perspetivas futuras 17, 18, 19, 20

• Averiguar quais são as expectativas em relação ao regime de curso escolhido;

• Averiguar se têm como objetivo, seguir Canto a nível superior; • Examinar as diferenças entre os objetivos, enquanto cantores, dos alunos dos dois regimes.

Tabela 16 - Estrutura base para a realização do guião de entrevista: relação entre os temas e subtemas, as questões e os objetivos das mesmas

O guião de entrevista elaborado teve como título: “A influência dos antecedentes familiares, culturais e sociais na escolha da frequência do curso de Canto, em regime integrado ou supletivo, de alunos do 10º e 11º anos de escolaridade, e inserção no ambiente escolar, consciencialização do desenvolvimento vocal adquirido e perspetivas futuras”. O referido guião foi dividido em duas partes, a primeira com trinta questões relacionadas com a “Motivação para o estudo do Canto: antecedentes familiares, percurso artístico e relação com o meio social musical e escolar”, e a segunda com vinte questões relacionadas com as “Atitudes em relação ao Canto: consciencialização do desenvolvimento vocal adquirido, identidade vocal, ligação emocional com o Canto e perspetivas futuras”. A este guião foi ainda adicionada, a posteriori, uma terceira parte que incluía seis questões relacionadas com a

mudança de voz. Uma vez que estas questões não estavam inicialmente previstas, foi

permitido às alunas tomar conhecimento das referidas questões no momento da entrevista, antes de decidirem responder ou não (Ver anexos I e N).

As questões referidas serviram apenas como orientação na realização das entrevistas, tendo sofrido alterações durante as mesmas. As alterações feitas foram propositadas e tiveram como objetivo conseguir um ambiente mais propício ao diálogo, numa linguagem mais adaptada à das participantes e que, por isso, refletissem mais sinceridade e espontaneidade no seu conteúdo. Cada entrevista teve uma duração média de trinta minutos (Ver anexos H, I e J). Para poder avaliar a importância da seleção de repertório das alunas dos diferentes regimes de frequência do curso de Canto, decidiu-se analisar os programas relativos às Provas de Recital trimestrais dos alunos em regime integrado, e os programas relativos às Audições dos alunos em regime supletivo, com o objetivo de o quantificar e perceber as diferenças na execução do mesmo (Ver anexos E e L). Neste caso, optou-se fazer uma análise qualitativa de observação, contabilizando o número de peças aprendidas e relacionando-as com a dificuldade técnica apresentada, assim como a variedade de estilos e idiomas apresentados. O objetivo desta abordagem seria perceber as diferenças, entre os alunos dos dois regimes, no desenvolvimento de competências interpretativas e na aquisição de conhecimentos que permitam a compreensão do conteúdo poético-musical das obras executadas, assim como o possível desenvolvimento técnico, tendo em conta a dificuldade que cada obra apresenta.

Apresentação e Análise de Resultados