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O papel dos municípios torna-se preponderante na aplicação de tais políticas, pois é a esfera da gestão que atua na ponta da implementação das políticas junto às comunidades. No entanto a articulação dos recursos e a destinação destes, bem como, a forma de trabalhar as políticas públicas em cada localidade requer uma sistematização feita em torno de prioridades e metas a serem alcançadas. Todo este processo envolve interesses políticos que irão delinear a efetivação ou não das ações previstas pelo Programa. O documento inicial do Programa destaca

(...) o papel de dois fatores nesse contexto que trabalham na última esfera de execução da política: o prefeito no campo da administração pública e os quilombolas como principais beneficiários. Nas localidades em que o gestor municipal for comprometido com os propósitos do Brasil Quilombola e os quilombolas demonstrarem um razoável grau de organização, certamente a obtenção dos resultados esperados se dará de forma mais consistente (Brasil, 2004, p.22).

Esta é uma constatação que vem sendo evidenciada, ao longo dos últimos dez anos, no que se refere à aplicação das políticas do PBQ. Contudo, a obviedade nesta observação não pode simplesmente se encerrar em si mesma sem que sejam destacados outros pontos

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que são igualmente relevantes para atingir os resultados almejados e, sobretudo, que resultados são esperados. Visto que os dados sobre os avanços e mudanças nas comunidades quilombolas ainda confirmam a existência de lacunas entre as propostas das políticas, a execução das mesmas e as metas alcançadas, em decorrência de vários entraves principalmente de ordem política. Existem outros interesses internos e/ou externos às políticas públicas, que rondam a execução do Programa desde a sua formulação até a implementação. Em todas as esferas envolvidas há responsabilidade sobre o processo como um todo. As peculiaridades de cada município, de suas respectivas comunidades e sua situação sócio-cultural precisam ser levadas em consideração pelos agentes implementadores em todos os níveis de gestão para que a construção e a consolidação das políticas públicas aconteçam de acordo com as realidades nas quais pretende-se intervir. As características relacionadas ao Programa em Currais Novos e os interesses em questão é o que tentaremos trazer neste trabalho para avaliarmos a atuação da gestão municipal na comunidade Negros do Riacho.

A partir do principal referencial legal sobre os direitos dos povos quilombolas, presente na Constituição de 1988, o art. 68 do ADCT, as comunidades passam a ter respaldo jurídico para a promoção de políticas públicas referentes à titulação de seus territórios. É previsto também nos artigos 215 e 216 o dever do Estado de garantir meios para a preservação da cultura destes segmentos. Outros marcos legais que incluem especificidades das comunidades quilombolas foram oficializados no decorrer destas últimas décadas.

Abaixo estão relacionados artigos da Constituição Federal e decretos presidenciais que reforçam a legitimidade e reafirmam a necessidade de construção e ampliação de políticas públicas para as comunidades quilombolas.

QUADRO 2 – BASE LEGAL PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA QUILOMBOLAS

Artigo 68/ADCT/CF

Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.

Art. 215/CF

O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1º - O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

Art. 216/CF

Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.

§ 5º - Ficam tombados todos os documentos e os sítios detentores de reminiscências históricas dos antigos quilombos.

DECRETO Nº 5.051, DE 19 DE ABRIL DE 2004.

Promulga a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre povos indígenas e tribais

DECRETO Nº 4.887 DE 20 DE NOVEMBRO DE 2003

Regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

DECRETO Nº 4.883 DE 20 DE NOVEMBRO DE 2003

Art. 1o Fica transferida do Ministério da Cultura para o Ministério do Desenvolvimento Agrário a competência relativa a delimitação das terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos, bem como a determinação de suas

demarcações, estabelecida no inciso VI, alínea "c", do art. 27 da Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003.

DECRETO Nº 4.886, DE 20 DE NOVEMBRO DE 2003.

Institui a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial - PNPIR e dá outras providências.

DECRETO Nº 6.261/2007 DE 20 DE NOVEMBRO DE 2007

Dispõe sobre a gestão integrada para o desenvolvimento da Agenda Social Quilombola no âmbito do Programa Brasil Quilombola, e dá outras providências

Art. 1o As ações que constituem a Agenda Social Quilombola, implementada por meio do Programa Brasil Quilombola, serão desenvolvidas de forma integrada pelos diversos órgãos do Governo Federal responsáveis pela execução de ações voltadas à melhoria das condições de vida e ampliação do acesso a bens e serviços públicos das pessoas que vivem em comunidades de quilombos no Brasil, sob a coordenação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.

DECRETO Nº 6.040 DE 7 DE FEVEREIRO DE 2007

Institui a Política nacional de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais.

LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010

Institui o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial - SINAPIR

Diante da base legal que dispõe sobre o papel do Estado no combate às desigualdades raciais, as políticas públicas para comunidades quilombolas passam a fazer parte da agenda política nacional e o Programa Brasil Quilombola, atualmente, compõe um conjunto de medidas que visam pôr em prática a garantia destes direitos. Então o que

dificulta a efetivação destas medidas, já que as comunidades permanecem sofrendo com a falta de acesso às políticas sociais básicas? Segundo a Fundação Cultural Palmares, até o ano de 2015, foram certificadas 2.474 comunidades quilombolas. Um alto número de comunidades vem acionando o Estado em favor do reconhecimento étnico e territorial. Neste ano, foram reconhecidas 33 comunidades até o mês de fevereiro. Apesar do aparato legal que regulamenta as ações do Estado em relação aos grupos quilombolas, muitos serviços públicos não chegam a ser acessados por estes. Como pensar em reconhecimento étnico se as necessidades básicas das comunidades ainda não foram reconhecidas e superadas? Esta é uma das problemáticas a serem investigadas na comunidade Negros do Riacho.

Capítulo 2

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