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CAPITULO III A REPRESENTAÇÃO ATRAVÉS DOS DISCURSOS DOS

3.2 O discurso dos agentes

3.2.1 Ministério Público Federal

A coleta das respostas do representante do Ministério Público Federal foi conseguida através de emails trocados com a assessora do Procurador Federal. Contudo, cabe salientar que, apesar do próprio Procurador ter respondido ao questionário, solicitou o sigilo de seu nome.

Devido a este fato seu nome foi substituído pelo cargo que exerce, ou seja, Procurador da República.

Desta forma, as respostas para as primeiras três perguntas foram:

01 - Procurador da República em Ponta Grossa. Ingresso no Ministério Público Federal em fevereiro de 2003.

02 - Foi instaurado procedimento administrativo, afeto à 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (Índios e Minorias) para verificar as condições de permanência das famílias indígenas – da etnia kainguangue - que visitam, temporariamente, a cidade de Ponta Grossa para a comercialização do artesanato.

03 - No curso do procedimento administrativo percebeu-se que as famílias indígenas – em razão de seus hábitos culturais – trazem consigo as crianças para permanência familiar conjunta, durante o período que permanecem na cidade para a venda de artesanato.

Algumas destas crianças foram vistas em semáforos na cidade pedindo “esmolas”, bem como praticando atos de comércio dos artesanatos produzidos pelas índias.

Também houve relato de problemas de doenças relacionados às crianças que não puderam receber tratamento adequado no sistema de saúde municipal, em decorrência de proibição dos pais indígenas que preferem a cura das doenças pelo pajé da aldeia.

Analisando as três primeiras perguntas, que buscam o perfil do sujeito entrevistado e de sua relação com a questão indígena no município, pode-se perceber que este entrevistado exerce a função de Procurador da República antes da instauração do procedimento administrativo, sendo o responsável pela formalização da questão.

De igual forma, a abertura do procedimento teve como objetivo averiguar a situação das famílias indígenas que vêm para o município, uma vez que a cidade apresenta condições desfavoráveis de permanência, como a exposição de riscos e

falta de condições salubres.

Quanto às crianças indígenas apenas ratifica ocorrências já identificadas pela pesquisa a respeito de praticarem a mendicância e um aparente trabalho infantil, além de apresentarem-se doentes, sem receber tratamento médico.

Coletando as três últimas perguntas, tem-se que:

04 - Ainda de se tratar de uma situação positiva ou negativa para as crianças indígenas, a questão esbarra na cultura da etnia kainguangue que tem por costume e hábito levar consigo os filhos, desde o nascimento, em todos os momentos da vida familiar - como por exemplo, a caça, pesca, venda de artesanato, longas caminhadas -, a fim de que aprendam com os pais na prática do dia a dia. Tais questões devem ser analisadas, sobretudo, levando em consideração a diversidade e particularidade dos povos indígenas.

05 - A questão do trânsito e permanência das crianças indígenas nas cidades certamente demanda a necessidade de proteção social, em razão da especificidade da situação e dos riscos a que estão expostos. Esta é uma questão que deve ser discutida, tratada e posta em prática por toda a sociedade e não apenas no âmbito do Poder Executivo Municipal.

06 - Todas as legislações se aplicam à proteção, amparo e guarda das crianças indígenas, observadas as peculiaridades socioculturais das comunidades indígenas

Ao ser questionado a respeito de sua consideração pela situação atual das crianças indígenas, se positiva ou negativa, a resposta se ampara na cultura da etnia Kaingang e nos seus costumes em estar sempre na companhia das crianças. Assim, embora reconheça que a situação das crianças não seja favorável ela permanece, tendo em vista ser considerada como uma prática cultural étnica. Ademais, deixa de responder se para o município esta questão é de grande relevância, não havendo como analisar este quesito, sendo qualquer hipótese apenas suposição.

Na pergunta cinco, ao ser questionado como deveria ser trabalhada a questão das crianças indígenas, e se precisam de proteção social, o entrevistado veementemente afirma a necessidade de protegê-las, em especial por causa dos riscos específicos, mas que a questão precisa ser discutida por toda a sociedade, não apenas por um ou outro ente público.

Por fim, ao responder a sexta pergunta, acredita que todas as legislações referentes à proteção social devem ser aplicadas às crianças indígenas, mas sempre respeitando suas peculiaridades socioculturais.

agente, em melhorar as condições das famílias indígenas que transitam por Ponta Grossa vendendo seus artesanatos, em especial por causa da presença das crianças.

De igual forma, este agente preocupa-se também com as peculiaridades da etnia, pois busca compreender seus hábitos e costumes antes de tomar qualquer medida. Esta afirmativa se baseia também no procedimento administrativo, o qual apresenta reuniões mantidas com os demais agentes responsáveis (FUNAI e NPE), bem como com as lideranças indígenas.

Por fim, pelas respostas dadas pelo entrevistado quando questionado sobre seu perfil, não há como definir suas características socioculturais, que possa definir por que este sujeito possui este olhar sobre a causa. Por outro lado, percebe-se uma postura institucionalizada e menos pessoal deste indivíduo no sentido de proteção dos direitos indígenas. Com isto, a sua relação com as demandas indígenas é mediatizada pela instituição que representa, tomando emprestado para si a representação que o MPF, enquanto instituição, tem sobre a questão.

Neste sentido, este posicionamento aproxima-se da mentalidade burocrática apresentada por Melatti (1993), a qual se verifica junto aos agentes que trabalham nos órgãos de proteção ao índio, que se caracteriza por atender as demandas indígenas, mas também a supera, tendo em vista os esforços promovidos em resolvê-la, o que revela um engajamento maior por parte deste agente.

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