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MODA INCLUSIVA: IDENTIFICAÇÃO DE AVIAMENTOS DE VESTUÁRIO

2 | MODA INCLUSIVA

Hogstel e Gaul (1991) apud Diogo (1997) explicam que a autonomia deve ser entendida como um princípio ético, onde o homem é entendido como auto gerenciador de sua vida e, principalmente, um ser racional. Para as pessoas com deficiências, é urgente pensar a autonomia.

Entende-se que a autonomia fala sobre as decisões próprias do indivíduo e que ela

é importante na escolha e no processo de vestir, que faz parte do princípio ético de reger sua própria vida (HOSTEL; GAUL, 1991 apud DIOGO, 1997). Munari (1981) evidencia que os sentidos do usuário devem ser um ponto importante no momento de projetar um produto. Nessa perspectiva, o vestuário deve ser projetado com foco no utilizador e nas suas necessidades. O corpo é o ponto de partida do projeto de vestuário, e também é seu ponto final, seu ápice (SALTZMAN, 2004). Saltzman (2004, p. 13) enfatiza isso quando diz “[…] pero lo cierto es que el diseño empieza y termina en el cuerpo. [...] es su punto culminante”.

Os rígidos padrões de moda privilegiam um tipo específico de corpo: pessoas altas, magras e sem nenhum empecilho de movimento (MODA INCLUSIVA…, 2012). Em contrapartida, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), o Brasil tem 45,6 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência.

O viés da moda que se ocupa do vestuário como processo de inclusão — entendido como Moda Inclusiva — se estabelece como uma alternativa para a democratização da moda, onde os variados biótipos devem ser contemplados pelo mercado (MODA INCLUSIVA…, 2012).

Segundo o Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (BRASIL, 1999, n.p), as deficiências são classificadas em:

I — deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, [...] apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

II — deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais [...];

III — deficiência visual – cegueira, [...] baixa visão, [...] casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;

IV — deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas [...];

V — deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências. (BRASIL, 1999, n.p).

Segundo Portal Brasil (2012, n.p) a origem das deficiências físicas pode ser:

[...] genética, surgir no período de gestação, em decorrência do parto ou nos primeiros dias de vida do bebê. Ainda, podem ser resultantes de doenças transmissíveis ou crônicas, perturbações psiquiátricas, desnutrição, abuso de drogas, traumas e lesões (PORTAL BRASIL, 2012, n.p).

Na questão dos aviamentos, as pessoas com deficiência física são as mais

propensas à invisibilidade, principalmente aquelas que não têm a motricidade fina desenvolvida. Além disso, algumas pessoas têm mais dificuldade de encontrar produtos com aviamentos adequados e não prejudiciais: pessoas que utilizam-se de cadeiras de rodas — pois qualquer coisa que fique nas costas, nádegas ou na parte de trás das coxas pode machucar, além da possibilidade de enrolar nas rodas, como no caso de cordas ou franjas; pessoas que utilizam órteses e próteses — pois aviamentos como fitas, cordas e franjas podem dificultar o movimento, por exemplo; e pessoas com deficiências que atingem o tecido cutâneo — como a epidermólise bolhosa, por exemplo, onde a pele do indivíduo desenvolve bolhas, de leves à graves, e transforma o tecido cutâneo em frágil.

A seguir, os aviamentos disponíveis no mercado brasileiro são especificados, além de suas possibilidades de uso e dificuldades encontradas.

2.1 Aviamentos disponíveis no mercado brasileiro

Os aviamentos podem ser especificados quanto à duas categorias: função decorativa — diz respeito aos aviamentos utilizados apenas para fins estéticos; e função componente — compõem a peça e, sem eles, a mesma não existiria. Ainda, podem ser visíveis — que podem ser vistos com a peça finalizada, como franjas, zíperes visíveis e etiquetas — ou invisíveis — elásticos e entretelas, por exemplo. Treptow (2013) explica que esses aviamentos precisam estar definidos e catalogados para a produção do vestuário, ou seja, é necessário que a ficha técnica tenha todas as informações necessárias para a compra do material, além do local que o mesmo ocupará na peça.

Embora o mercado brasileiro disponha de inúmeros incrementos nas peças de aviamentos disponíveis, ele não atende uma parcela da população. Conforme constatado no tópico anterior, há diferentes tipos de deficiências e, ao tratar, em específico, de deficiências físicas, há diversos fatores que devem ser observados. Um aviamento que auxilie um público específico, como pessoas com paraplegias, por exemplo, pode não auxiliar outro público, como pessoas que não têm a motricidade fina. Além disso, uma mesma pessoa pode ter uma deficiência múltipla, ou seja, pode ter mais de uma deficiência, por isso a necessidade de pensar os aviamentos com olhar para o usuário. O Quadro 1 apresenta os principais aviamentos encontrados no mercado brasileiro, exemplifica seu provável uso e os possíveis obstáculos encontrados nos aviamentos disponíveis no mercado brasileiro, quando pensados para a Moda Inclusiva.

Aviamento Uso Possíveis obstáculos Rebites Peças metálicas para reforçar cantos

ou decorativas Colchetes Metal para fechamento, podendo ser

de gancho ou de pressão

rodas ou a pele de pessoas com epidermólise bolhosa ou com demais

deficiências que fragilizam o tecido cutâneo

Botões Pode ser costurado ou de pressão, e também é encontrado em diferentes

tamanhos, cores e materiais

Necessitam motricidade fina e podem machucar pessoas que utilizam

cadeiras de rodas

Elástico Normalmente utilizado para ajustar as peças ao corpo

Podem necessitar motricidade fina e machucar pessoas com ostomias, pessoas em cadeiras de

rodas, pessoas com deficiências que fragilizem o tecido cutâneo ou

pessoas acamadas

Barbatanas Sustentação e estruturação de peças, podendo ser encontrada em diferentes que utilizam órteses ou próteses ou

pessoas acamadas Ponteiras Utilizado nas pontas dos cordões Podem machucar pessoas que

utilizam cadeiras de rodas Passante Utilizado normalmente em zíper Podem necessitar motricidade fina

e podem machucar pessoas que utilizam cadeiras de rodas

Franjas Decorativa

Fitas Decorativa ou funcional Pode atrapalhar a locomoção de pessoas que utilizam próteses,

órteses ou cadeiras de rodas

Passamanarias Decorativa

Tira bordada Decorativa Pode machucar pessoas em cadeiras de rodas

Pedrarias Decorativa Pode machucar pessoas em cadeiras

de rodas Fivelas Utilizadas para fechamento de

acessórios Pode machucar pessoas em cadeiras de rodas

Quadro 1. Principais aviamentos encontrados no mercado brasileiro, seus prováveis usos e possíveis obstáculos encontrados nos aviamentos do mercado brasileiro quanto à Moda Inclusiva. Fonte:

elaborado pelos autores (2020) com base em em Brogin (2015) e Amaden-Crawford (2014).

A partir da observação entre as informações do Quadro 1, em especial no que se refere ao uso proposto do aviamento e os possíveis obstáculos às pessoas com deficiências, pode-se verificar que, embora os usos indicados pelos aviamentos pode-sejam facilmente inpode-seridos no processo de desenvolvimento de vestuário, os mesmos não atendem algumas questões da Moda Inclusiva, por exemplo: segurança ao vestir e despir as peças, conforto físico e autonomia do usuário. Com base no que foi abordado anteriormente, as considerações finais traçam algumas informações interessantes para pensar em aviamentos para pessoas com deficiências.