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Procurando responder às questões de pesquisa, optou-se pela realização de um estudo que pode ser considerado prioritariamente qualitativo segundo as concepções de Pires (2008, p. 90).

A pesquisa sobre as Representações Sociais, estando comprometida com situações sociais naturais e complexas ― requisito imprescindível para que sejam acessadas as condições de sua produção ―, é necessariamente uma pesquisa qualitativa, entendendo-se por pesquisa qualitativa “uma tradição específica dentro das ciências sociais que depende essencialmente da observação de pessoas em seus próprios territórios e da interação com estas pessoas através de sua própria linguagem e em seus termos”. (Kirk e Miller, 1986: 9; citado por SPINK, 2004, pp. 103-104) 17

Pires (2008) participa do debate que contrapõe o quantitativo e o qualitativo e, em sua discussão sobre este último, opta por afirmar o que ele não é devido à complexidade desta temática, já que “delimitar e caracterizar globalmente o que se denomina „pesquisa qualitativa‟ parece, em si, uma tarefa paradoxal e destinada, desde o início, ao fracasso” (PIRES, 2008, p. 87). Desse modo, o autor trata de procurar uma maneira menos errônea de caracterizá-la. Opta, pois, por um processo que faz uma desconstrução de diversos enunciados sobre a pesquisa qualitativa, os quais o autor considera incorretos ou muito fechados (PIRES, 2008, p. 87).

Para o autor, os termos qualitativo e quantitativo devem ser usados para se referir às pesquisas e não à metodologia de pesquisa. Esta deve ser caracterizada como uma só, já que as grandes questões de ordem metodológica perpassam indistintamente tanto as pesquisas de vieses qualitativos quanto as de ordem quantitativa (PIRES, 2008, p. 87).

Em seu processo de desconstrução das representações correntes acerca da pesquisa qualitativa, Pires (2008, p. 90) estabelece uma definição elementar desse tipo de pesquisa, já que ele acredita que outras definições para além desta estão muito mais associadas aos gostos e preferências do pesquisador, ou à corrente teórica a qual ele se afilia. Sendo assim, entende a pesquisa qualitativa por aquela que se realiza através de um material empírico não tratado sob a forma de números, enquanto a pesquisa quantitativa faz o inverso.

Na caminhada metodológica percorrida ao longo desta pesquisa, deparamo-nos em determinados momentos com dados que exigiam quantificação, visto que a pesquisa em Representações Sociais se faz a partir de um inventário de material simbólico que é obtido mediante um discurso proferido pelos sujeitos pesquisados, o que será mais bem esclarecido na próxima seção. Surge, no

17 KIRK, J. e JEROME, M. L. Reliabity and validity in qualitative research. Bervely Hills, Califórnia, Sage, 1986.

momento, então a dúvida sobre o caráter qualitativo da presente pesquisa, principalmente ao se considerar o fato de que pesquisas qualitativas e quantitativas não são mutuamente intercambiáveis, segundo a ressalva feita por Pires, transcrita abaixo.

Se a técnica de coleta de dados não caracteriza nem o quantitativo, nem o qualitativo, não é preciso por isso supor que estes dois tipos de pesquisa sejam intercambiáveis. Cada forma (quantitativa ou qualitativa) de medida ou de materiais empíricos possui limites teóricos (para além de seus limites práticos) relativamente aos diferentes aspectos dos diferentes objetos, e por isso mesmo que jamais se saiba determinar de antemão as fronteiras precisas de um tipo de material ou do tratamento quantitativo ou qualitativo dos dados, nem seu campo de possibilidades (PIRES, 2008, p. 89, grifos do autor).

O autor mesmo vem nos apresentar uma solução para esta dúvida, quando, para encerrar sua discussão, oferece uma conclusão sobre o que ele entende por pesquisa qualitativa. Trata-se de um momento em que ele apresenta cinco características gerais de qualquer pesquisa qualitativa. Tais elementos podem ser encontrados nessa pesquisa, o que nos permite classificá-la como qualitativa. Eles são mencionados logo abaixo, onde se aproveita também para explicitar como se fazem presentes neste estudo:

A) “… flexibilidade de adaptação durante seu desenvolvimento, inclusive no que se refere à construção progressiva do próprio objeto de investigação” (PIRES, 2008, p. 90). Esta característica esteve presente em diversos momentos da pesquisa. Observa-se uma mudança estrutural na pesquisa, desde a sua fundamentação temática, durante a construção do projeto de pesquisa a ser submetido ao PPGE/FaE/UFMG, o qual tratava de percepção sobre o professor e não representações sociais sobre o professor. Outra adaptação, a mero título de exemplificação que cabe aqui destacar, foi a consideração de que uma observação participante não se fazia necessária para a presente pesquisa em representações sociais. B) “… capacidade de se ocupar de objetos complexos, como as

instituições sociais, os grupos estáveis, ou ainda, de objetos ocultos, furtivos, difíceis de apreender ou perdidos no passado” (PIRES, 2008, p. 90). O objeto aqui pesquisado é de ordem complexa, pois que envolve consenso e negociação entre os sujeitos presentes em uma

coletividade social de grupo, no caso a sala de aula, de ordem estável, pois que se altera pouco ao longo de um ano letivo. As representações sociais lá construídas e comunicadas são objetos por vezes ocultos, nem sempre fáceis de apreender, têm origem no passado, perpetuando-se no presente dos processos de ensino-aprendizagem, fenômeno que podemos denominar de atualização, a qual se coaduna aos fenômenos de objetivação e ancoragem, discutidos brevemente no referencial teórico da pesquisa.

C) “… capacidade de englobar dados heterogêneos, ou [...] de combinar diferentes técnicas de coleta” (PIRES, 2008, p. 90). Utilizou-se neste estudo técnicas diversificadas de coleta de dados, conforme será explicitado na seção Instrumentos de Coleta. Desta forma, os dados obtidos apresentam um caráter heterogêneo, o que caracteriza a riqueza das pesquisas qualitativas.

D) “… capacidade de descrever em profundidade vários aspectos importantes da vida social [...], justamente devido à sua capacidade de permitir ao pesquisador dar conta [...] do ponto de vista interior, ou de baixo” (PIRES, 2008, p. 90). Por suas próprias características, a pesquisa em representações sociais descreve facetas importantes da vida social. Neste caso específico, trata-se do ensino e da aprendizagem da matemática escolar, conteúdo curricular importante para a nossa sociedade conforme demonstrado por diversas pesquisas.18

E) “… abertura para o mundo empírico, a qual se expressa, geralmente, por uma valorização da exploração indutiva do campo de observação, bem como por sua abertura para a descoberta de „fatos inconvenientes‟ (Weber), ou de „casos negativos‟. Ela tende a valorizar a criatividade e a solução de problemas teóricos propostos pelos fatos inconvenientes” (PIRES, 2008, p. 90). No presente estudo, houve uma construção metodológica a partir do próprio campo de investigação. Na medida em que os procedimentos de pesquisa eram realizados,

18 Pesquisas como a de Auarek (2000), dentre outras desenvolvidas pela linha de pesquisa em Educação Matemática do PPGE/FaE/UFMG, servem para ilustrar a relevância adquirida pela Matemática em nossa sociedade.

eles sofriam adaptações e eram aperfeiçoados para a utilização com os próximos sujeitos a colaborarem com a pesquisa.

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