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2.1 A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO NA LÍNGUA: ENTENDENDO

3.1.1 Modalização explícita e modalização implícita

A modalização de uma enunciação pode ser determinada pelo locutor, tendo em vista as informações e o grau de engajamento com o enunciado. Com efeito, segundo Koch (2006b, p. 80), existem, no mínimo, dois critérios que determinam a escolha de uma modalidade por um locutor: “1) as informações que possui a respeito de p; 2) o grau de engajamento com relação a p (interesse, preferência, normas sociais, ações precedentes, intenções futuras etc.)”.

Deste ponto de vista, podemos afirmar que todo enunciado recebe uma dimensão modal, ou seja, recebe marcas de modalização quer de forma explícita, quer de forma implícita.

Sob a rubrica de modalização explícita incluem-se os enunciados marcados linguisticamente, de forma precisa, sem que se caibam dúvidas com relação à subjetividade do falante perante a proposição expressa. O locutor, nesse sentido, domina claramente as manobras discursivas no intento de fazer o interlocutor admitir o ponto de vista impresso no enunciado. Por outro lado, sob a rubrica de modalização implícita entende-se o processo de construção de enunciados em que se observa uma ocultação do ponto de vista do locutor, não significando, porém, que não se veicula modalidade, uma vez que esta se encontra expressa de forma atenuada. Adotando-se essas definições, entende-se, portanto, que todo texto apresenta uma modalidade que pode ser mais marcada ou, então, se apresentar de forma menos acentuada.

Assim, se o locutor diz:

(22) O professor está em sala de aula.

a modalidade apresenta-se menos acentuada do que em (23) É possível que o professor esteja em sala de aula. e menos acentuada ainda do que em

(24) É obrigatório que o professor esteja em sala de aula.

Tendo em vista as ilustrações (22), (23) e (24), constatamos que cada enunciado reveste-se de um valor modal, seja em grau maior, seja em grau menor, pois o locutor, de alguma maneira, posiciona-se perante a proposição, imprimindo marcas de sua subjetividade.

Koch (2006, p. 83) ressalta que, “segundo suas relações com o destinatário, o locutor adota uma ou outra modalidade, mas há sempre os casos em que lhe convém mascarar sua hesitação para tornar seu enunciado mais facilmente aceitável pelo interlocutor (ou vice- versa)”. À luz desse pensamento, podemos conceber que não há discurso neutro no que se refere à modalização, pois o locutor, em um ato enunciativo, pode pretender expressar sua opinião de forma que fique marcada sua tomada de posição, ou pode fazer constatações que elucidam conhecimento, apenas. Assim, esses textos podem ser lidos “sob o modo da opinião ou sob o modo do saber” (op. cit., p. 82). O enunciado (22), nesse sentido, exemplifica o texto que pode ser lido sob o modo do saber. Ao afirmar que “o professor está em sala de aula”, o locutor demonstra conhecimento, afirma uma verdade, ou seja, o locutor expressa a assertiva porque sabe; e porque sabe, a assertiva é verdadeira. “Desta maneira, o locutor não impõe

seus argumentos e deixa o interlocutor livre para aceitá-los ou refutá-los” (NASCIMENTO, 2009, p. 48).

Seria mais substancial dizer que somente os enunciados (23) e (24) carregam valores semânticos de modalização, visto expressarem possibilidade e necessidade, respectivamente. No entanto, como acontece no enunciado (22), a ausência de uma modalidade explícita não implica inexpressão da atitude do locutor perante o conteúdo proposicional. Ademais, o fato de existir um intercâmbio entre locutor e interlocutor já seria razão suficiente para entender que figura uma preocupação em interagir de forma que se oriente o sentido apontado no enunciado proposto. Em outras palavras: mesmo não expressando explicitamente sua atitude mediante o conteúdo da proposição, o locutor orienta a admissão do dito, visto estar apresentando uma verdade que não precisa ser imposta.

A apresentação de enunciados em que se empregam verbos no modo indicativo, a exemplo do que se apresenta no enunciado (22), integra a classificação de modalização implícita. Nesse caso, embora a modalização seja mínima, o discurso é assim organizado, tendo em vista a atitude do locutor em querer expressar uma informação com base no saber que naturalmente imprime a noção de que o conteúdo do enunciado pode ou deve ser aceito como uma verdade.

Ao refletir sobre a categoria modalidade, Neves (2011a, p. 152) registra as seguintes considerações:

De um lado, pode-se dizer que, se a modalidade é, essencialmente, um conjunto de relações entre o locutor, o enunciado e a realidade objetiva, é cabível propor que não existam enunciados não-modalizados. Do ponto de vista comunicativo-pragmático, na verdade, a modalidade pode ser considerada uma categoria automática, já que não se concebe que o falante deixe de marcar de algum modo o seu enunciado em termos da verdade do fato expresso, bem como que deixe de imprimir nele certo grau de certeza sobre essa marca.

Partindo dessa formulação, verifica-se que, durante uma interação verbal, o locutor reveste os enunciados de sentidos com o fim de exprimir o seu ponto de vista e, por assim realizar o ato de fala, a modalidade apresenta-se inerente ao próprio enunciado, ou seja, a modalidade é o próprio sentido do enunciado. Isso significa que não há enunciados não modalizados, pois, mesmo que certos elementos linguísticos marcadores de modalização não estejam explicitados, em qualquer enunciado haverá marcas que revelam a tomada de posição do locutor.

Devemos, então, em virtude do cenário exposto nesta seção, quando adotamos a perspectiva de que não há textos não modalizados, mas há os que apresentam uma modalidade mais acentuada (modalização explícita), bem como há os textos com modalização menos acentuada (modalização implícita), deixar claro que, neste estudo, trabalhamos com a modalização explícita em razão de sua recorrência no corpus analisado e dos nossos objetivos de investigação.

Passemos, agora, a uma nova discussão, através da qual abordamos os diferentes valores modais, tendo em vista a atitude assumida pelo locutor perante o conteúdo do enunciado apresentado.