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Catford (1965, p. 23) foi um dos pioneiros a abordar a equivalência, que, segundo ele, é um dos aspectos essenciais dos estudos da tradução, uma vez que “uma tarefa central em teoria de tradução consiste em definir a natureza e as condições da equivalência de tradução”. O conceito de equivalência textual apresentado por Catford distingue-se de outro conceito, o de correspondência formal. Para Catford, “um correspondente formal é qualquer categoria da língua alvo (unidade, classe, estrutura, elemento de estrutura etc.) que pode ocupar, tanto quanto possível, na economia da língua alvo o mesmo lugar que determinada categoria da língua fonte ocupa na língua alvo”. Um equivalente textual, portanto, “é qualquer texto ou porção de texto da língua alvo que [...] se observe ser numa ocasião específica o equivalente de um determinado texto ou porção de texto da língua fonte” (CATFORD, 1980, p. 29). Dessa forma, enquanto estabelecer a correspondência formal entre textos originais e suas traduções é considerada uma operação aproximada e geralmente difícil de realizar, dadas as diferenças entre os sistemas linguísticos, estabelecer equivalências entre eles seria sempre possível, uma vez que, mesmo que não haja equivalência em uma ordem, ela pode ser estabelecida em uma ordem acima (CATFORD, 1980). Ainda segundo Catford, a relação entre equivalência textual e correspondência formal é essencial por duas razões. A primeira delas é que “o grau de divergência entre a equivalência textual e a correspondência formal pode ser usado talvez como medida de diferença tipológica entre línguas” (CATFORD, 1980, p. 36). A segunda causa diz respeito às mudanças (shifts) observadas quando se comparam textos fonte e alvo. Para o autor, as mudanças acontecem quando não é possível estabelecer uma correspondência formal entre os elementos do texto fonte e os do texto alvo durante a tradução, ou seja, as mudanças acontecem quando é possível estabelecer equivalentes textuais, mas não correspondentes formais entre textos fonte e alvo (CATFORD,1980, p. 22).

O autor propõe, então, a existência de dois tipos principais de mudanças, a saber, mudança de nível e mudança de categoria. As mudanças de níveis são aquelas que ocorrem na esfera do contínuo léxico-gramatical. Já as mudanças de categoria se subdividem em (i) mudanças de estrutura, (ii) mudanças de classe, (iii) mudanças de unidade e (iv) mudanças intrassistema. As mudanças de estrutura são tidas como um dos tipos mais frequentes de mudança, podem acontecer em todas as ordens (frase, oração, grupo, palavra e morfema) e correspondem às mudanças na disposição dos elementos nos textos fonte e alvo (CATFORD, 1980). Já as mudanças

de classe acontecem “quando o equivalente de tradução de um item da língua fonte é membro de uma classe diferente do item original” (CATFORD, 1980, p. 88). As mudanças de unidade são as “alterações de ordem, isto é, perdas de correspondência formal, nas quais o equivalente de tradução de uma unidade de uma ordem da LF é uma unidade de uma ordem diferente na LM” (CATFORD, 1980, p. 89). E, finalmente, as mudanças intrassistema são aquelas que acontecem no interior de um sistema, “isto é, [...] os casos em que LF e LM possuam sistemas que de maneira aproximada correspondam formalmente quanto à sua constituição envolvendo, porém, na tradução a escolha de um termo não correspondente no sistema da LM” (CATFORD, 1980, p. 90).

Ainda que tenha sido pioneiro em vários aspectos, o trabalho de Catford foi alvo de diversas críticas, principalmente nas décadas de 1980 e 1990. Apesar disso, seu trabalho tem oferecido subsídios fundamentais e tem sido retomado na área dos

Estudos da Tradução. Segundo Pagano e Jesus (2009, p. 183), o “fato de as

categorias propostas terem se sustentado como referência (mesmo negativa) na área” não pode ser ignorado, pois, embora o modelo sofra de limitações, seu detalhamento é justificado por representar o pioneirismo nessa interface. Além do mais, como dissemos anteriormente, é necessário lembrar que a proposta de Catford (1965) surgiu em um momento em que a Teoria Sistêmico-Funcional ainda se encontrava em uma fase de desenvolvimento. Por isso, podemos defender que vários dos pressupostos sugeridos pelo autor podem ser utilizados em pesquisas dos estudos da tradução se compreendidos e aplicados a partir da releitura de Matthiessen (2001), em que o autor afirma que o trabalho de Catford (1965) “pode servir de base para os estudos semelhantes atualmente, posto que a tarefa teórica fundamental é ampliar a proposta de Catford sob a luz das novas práticas teóricas e descobertas descritivas” (MATTHIESSEN, 2001, p. 43). O autor retoma e atualiza o conceito de mudança de Catford e abrange a possibilidade de mudanças metafuncionais (metafunctional

shifts).

Segundo Matthiessen (2001), as metafunções são responsáveis por organizar os recursos linguísticos na forma de significados textuais, interpessoais e ideacionais (lógicos e experienciais), configurando-se como um aparato fundamental para o estudo da tradução. O teórico parte da hipótese de que as metafunções comumente são mantidas na tradução, pois, se um significado é realizado ideacionalmente na língua fonte, ele tende a ser realizado ideacionalmente na tradução para a língua alvo.

O autor, no entanto, afirma que tanto mudanças de metafunção quanto mudanças dentro das metafunções são possíveis, sendo que as mudanças dentro das metafunções são os tipos mais frequentes.

As mudanças que acontecem dentro das metafunções podem ser mudanças na ordem, no sistema ou na estrutura. As mudanças na ordem (oração, grupo, palavra, morfema) são aquelas cujo significado metafunctional é mantido; porém, ele é realizado pela língua alvo em uma ordem diferente daquela da língua fonte. As mudanças no sistema acontecem quando tanto a metafunção quanto a ordem são mantidas e as mudanças ocorrem em um determinado sistema da língua alvo. As mudanças na estrutura são aquelas em que a metafunção, a ordem e o sistema são mantidos na tradução; porém, a realização na estrutura da língua alvo é diferente.

Tendo em vista a atualização feita por Matthiessen, com base nos desenvolvimentos da teoria sistêmico-funcional subsequentes a Catford, é possível perceber que a proposta de Rodrigues-Júnior e Oliveira (2015) de considerar as mudanças sob a dimensão do conceito, cunhado por eles, de “mudança ideacional” favorece as pesquisas relacionadas à tradução de textos literários, porque permite analisar e comparar as línguas fonte e alvo em termos dos seus sistemas linguísticos, ampliando os tipos de mudanças, contextualizando os ambientes em que elas podem ser analisadas, pois não mais se limitam apenas à ordem e à estrutura como em Catford (1965, 1980). Nesse contexto, esta pesquisa lança mão do conceito “mudança ideacional” para a análise e descriçao dos dados cujo foco se encontra nas mudanças no nível da metafunção ideacional, ou seja, mudança dos processos, participantes e circunstâncias.