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I.3. O FIG e o trato genículo-hipotalâmico

I.4.1. Modelo experimental da má nutrição pela

Os paradigmas experimentais de má nutrição permitem investigar mecanismos estruturais, fisiológicos e bioquímicos do organismo diante de diversidades ambientais envolvendo uma variada gama na disponibilidade de nutrientes essenciais ou não essenciais. Todos os nutrientes, de uma certa forma, influenciam na maturação do sistema nervoso, entretanto as proteínas parecem ser um dos componentes mais importantes para o desenvolvimento das funções neurológicas. A desnutrição protéica pode agir alterando o metabolismo periférico das proteínas por comprometer a disponibilidade de aminoácidos. Muitos aminoácidos são precursores de enzimas, proteínas estruturais, hormônios peptídeos e neurotransmissores e, em muitas instâncias, eles são os próprios neurotransmissores. A barreira materno-placentária em ratos não é efetiva na proteção do feto diante da restrição protéica (MORGANE et. al., 1993). Por essas e outras razões, os modelos de desnutrição a partir de dietas com deficiências específicas de proteínas vêm sendo largamente utilizados. No entanto, o entendimento científico da realidade da desnutrição humana necessita de reproduções fidedignas da mesma para seu estudo.

O modelo experimental de desnutrição induzido pela administração de uma dieta multideficiente, conhecida como Dieta Básica Regional (DBR) do Nordeste do Brasil foi proposto por pesquisadores do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco com base em inquéritos de consumo alimentar na Zona da Mata-sul de Pernambuco (BATISTA FILHO et. al., 1968; COUTINHO et. al., 1976). Análises de parâmetros bioquímicos, fisiológicos e comportamentais em ratos alimentados com a DBR vêm sendo realizadas em uma série de estudos (TEODÓSIO et. al., 1990, COUTINHO et. al., 1992; LAGO et. al., 1997; SANTOS-MONTEIRO et. al., 2000; BARRETO MEDEIROS et. al., 2002; PAIXÃO et. al., 2003). Os resultados obtidos em alguns desses estudos indicam que nesses animais, o tipo de má nutrição instalada assemelha-se às características observadas entre crianças pobres da região onde o inquérito alimentar foi realizado (TEODÓSIO et. al., 1990, COUTINHO et. al., 1992; LAGO et. al., 1997). Esta dieta multicarenciada apresenta uma composição de apenas 8% de proteína, porém alta quantidade de carboidratos e

fibras e pequena quantidade de gorduras, vitaminas e aminoácidos essenciais e não essenciais (TEODÓSIO et. al., 1990). Sessenta e cinco por cento (65%) das proteínas da DBR são provenientes de fonte vegetal (feijão) e são proteínas de baixo valor biológico (TEODÓSIO et. al., 1990). Uma análise comparativa entre os efeitos da DBR e de uma dieta com deficiência específica em proteína de alto valor biológico (8% de caseína), evidenciou uma redução significativa induzida pela DBR tanto no ganho de peso corporal das mães durante a gestação como no peso dos filhotes, no dia do nascimento e ao longo do seu desenvolvimento. Essas alterações persistem ou se agravam nas proles descendentes, sendo também observadas no peso do cérebro e de outros órgãos, os quais foram relativamente menos afetados. Além das alterações ponderais foi também demonstrado que a deficiência induzida por essa dieta de forma crônica diminui a longevidade e aumenta os níveis de mortalidade, principalmente nas fases iniciais da vida dos filhotes (LAGO et. al., 1997; PONTES PESSOA et. al., 2000).

Guedes et. al. (1987) analisaram o grau de excitabilidade do córtex parietal investigando o fenômeno da depressão alastrante (DA) da atividade elétrica cerebral em ratos mantidos durante a gestação e o aleitamento com DBR e também com diferentes tipos de reposição dos constituintes dessa dieta. Esses autores observaram que a DBR induziu um aumento na velocidade de propagação da DA sendo este efeito não revertido pela suplementação com lipídios, vitaminas, minerais e com um aumento na concentração de proteína derivada dos componentes da dieta. Por outro lado, quando a suplementação da dieta foi feita com a adição de 14% de caseína, os efeitos da desnutrição sobre a DA foram revertidos (ANDRADE et. al., 1990), indicando a importância da qualidade e não da quantidade de proteínas nos efeitos neurais induzidos pela DBR. Alterações metabólicas e neuroquímicas associadas com a desnutrição induzida por essa dieta e os efeitos sobre a DA foram também investigados (revisão em GUEDES et. al., 1996; ROCHA DE MELO e GUEDES, 1997; COSTA-CRUZ e GUEDES, 2001). A maioria desses estudos indica que o caráter multideficiente da DBR altera a responsividade cerebral a agentes inibitórios ou facilitatórios da DA cortical.

Vários trabalhos que investigaram os efeitos de uma administração crônica da DBR desde a fase de gestação, têm apontado alterações no desempenho neuronal de regiões centrais e periféricas. Costa et. al. (1983) descreveram um retardo no processo de maturação de reflexos envolvidos com o desenvolvimento do neocórtex,

bem como nos tempos para abertura do canal auditivo, erupção dos incisivos e abertura dos olhos. Cabral Filho et. al. (1986) evidenciaram um aumento na susceptibilidade à convulsão induzida por drogas e Silva et. al. (1987) descreveram uma redução na velocidade de condução dos impulsos nervosos do nervo ciático. No córtex visual de ratos adultos alimentados com a DBR até 43 dias de idade, a análise de terminais axonais marcados com biocitina evidenciou uma redução no número dos sítios sinápticos potenciais (botões/mm de axônio) e alterações morfométricas transitórias e permanentes foram também observadas em neurônios contendo NADPH-diaforase (PICANÇO-DINIZ et. al., 1998 e BORBA et. al., 2000). Modificações no comportamento agressivo bem como down-regulation dos receptores serotoninérgicos induzido pelo aumento da disponibilidade do neurotransmissor correspondente em ratos albinos adultos (120 dias) foram apontadas como decorrentes da má nutrição induzida pela DBR durante a fase de aleitamento associada à ação de inibidores seletivos da recaptação de serotonina (BARRETO MEDEIROS et. al., 2002).

O desenvolvimento do sistema GABAérgico e colinérgico na retina de ratos albinos, alimentados com a DBR durante o período de aleitamento, foi analisado por Almeida et. al. (2001), os quais evidenciaram um retardo na maturação desses sistemas bem como no processo de morte celular natural (apoptose). Contudo, o estabelecimento do padrão normal ocorreu em P30 de forma similar ao evidenciado em ratos normonutridos.

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