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CAPÍTULO III Enquadramento Teórico da Problemática do Estágio

4. Modelos de formação

A identificação do modelo de formação é outro dos pontos da nossa investigação, porém, para uma melhor compreensão da questão é necessário realizar um enquadramento da questão, ainda que mínimo.

Antes de mais, o que é que se entende por modelo de formação? Que modelos existem? O que é que eles nos dizem? Existem vários modelos e vários autores que escreveram sobre esta temática, pelo que iremos nomear dois: Marcel Lesne e Gilles Ferry. Lesne aponta para três modos de trabalho pedagógico, ou três formas de socialização, que designa por MTP1, MTP2 e MTP3. O primeiro é um Modo de Trabalho Pedagógico de tipo transmissivo, “(…) de orientação normativa, pelo qual se transmitem saberes, valores ou normas, modos de pensamento, entendimento e acção, ou seja, bens culturais em simultâneo com a organização social correspondente” (Lesne, 1984, p. 43); o MTP2 é um Modo de Trabalho Pedagógico de tipo incitativo, “(…) de orientação pessoal, que opera principalmente ao nível das intenções, dos motivos, das disposições dos indivíduos, e procura desenvolver uma aprendizagem pessoal dos saberes” (Lesne, 1984, p. 43); por fim, o terceiro modelo, designado por Modo de Trabalho Pedagógico de tipo apropriativo, “(…) centrado na inserção social do indivíduo, considerada como uma mediação pela qual se exercerá o acto da formação, como ponto de partida e ponto de chegada da apropriação cognitiva do real” (Lesne, 1984, p. 43). Os modos de trabalho apresentados por Lesne, apresentam uma ideia central, ou seja, a noção de que a formação é parte integrante de um processo de socialização. Contudo, cada um dos modos de trabalho possui um nível de socialização diferente e com meios pedagógicos diferentes, desde métodos e técnicas de ensino/formação mais tradicionais e clássico(a)s até métodos e técnicas mais libertadoras, que permitem debate e confronto de ideias/experiências.

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Gilles Ferry (1987) propõe-nos igualmente três modelos de formação, assentes em alguns critérios, tais como: o tipo de processo formativo, a sua dinâmica formativa, o seu modo de eficiência. Os modelos designam-se por modelo centrado nas aquisições; modelo centrado no processo (démarche); e modelo centrado na análise.

O primeiro,

“(…) se caracteriza porque reduce la noción de formación se organiza en función de los resultados constatables y evaluables, cuya obtención pretende garantizar un nivel definido de competencia en términos de conocimientos, de comportamientos, de sus actuaciones o habilidades. (…) Este modelo implica una concepción de la relación teoría-práctica donde la práctica es una aplicación de la teoría. (…) La teoría designa aquí no sólo los conocimientos transmitidos, sino también los ejercicios (algunas veces llamados prácticas) distanciados de la situación real sobre la cual se anticipan.” (Ferry, 1987, pp.70-71)

Portanto, trata-se daquele modelo clássico ou tradicional de ensino/formação, aquele que caracteriza praticamente todos os estabelecimentos de ensino. Neste modelo aprender, é aprender um saber, ou uma técnica, existem objetivos predefinidos, aos quais os formandos se devem cingir. Todo o processo encontra-se predefinido, existe um “mestre” e um grupo de formandos, que recebem os conteúdos, e no final há lugar a uma avaliação sumativa. A prática é uma aplicação da teoria e nada mais do que isso.

O segundo modelo de formação apresentado por Gilles Ferry é denominado por modelo centrado no processo (démarche). Ele afirma que

“La noción de la aprendizaje debe comprenderse como una acepción más abierta que incluya, además de los aprendizajes sistemáticos de los que hemos estado hablando, todo tipo de experiencias en donde los efectos de sensibilización, de liberación o de movilización de energía sean buscados desde el inicio con más o menos claridad (…) De aquí la idea de que el trabajo de formación concierne más o proceso y sus peripecias, que a las diversas adquisiciones muchas veces inesperadas a las que da lugar.” (Ferry, 1987, p.73)

Este modelo apresenta diferenças relativamente ao primeiro modelo, fugindo ao classicismo. Formar-se é, neste caso, mais a concretização de um percurso com as suas peripécias do que a consideração das aquisições feitas e muito menos as pré- determinadas. O conhecimento poderá não ser totalmente aplicado na prática, mas sim objeto de possível transferência.

O terceiro modelo de formação apresentado pelo autor é designado por modelo centrado na análise. Ao contrário dos modelos apresentados anteriormente, o

“(…) modelo centrado en el análisis se funda en lo imprevisible y lo no dominable. Postula que aquel que se forma emprende y prosigue a todo lo largo de su carrera un trabajo sobre

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sí mismo, en función de la singularidad de las situaciones por las que atraviesa, y que consiste en un trabajo de «desestructuración-reestructuración del conocimiento de la realidad» (…) esta pedagogía del análisis puede definirse por su objetivo, que es un objetivo de adquisición: saber analizar (…) Saber analizar es estar dispuesto a determinar los aprendizajes que se deban realizar en tal o cual momento.” (Ferry, 1987, p.77)

Assim, estamos perante um modelo inovador, que procura dar iniciativa e autonomia ao formando/educando, na medida em que permite que este se forme, ou seja, dá-lhe a possibilidade de se auto-analisar, de ser ator e observador. Este constrói e reconstrói o seu conhecimento, e assim sabe quando e onde deve aplicá-lo. Existe uma regulação entre a teoria e a prática, ou seja, há uma complementaridade entre as mesmas, no sentido em que a teoria não pode ser prática sem ajuste a situações concretas, do mesmo modo que a prática não pode ser exclusivamente prática, sem uma análise teórica. Mais do que inovador, este modo de conceber a formação é aquele que permite integrar as práticas profissionais e as aprendizagens que estas nos proporcionam. Permite perceber que é no(s) contexto(s) que nos formamos em permanência, pois sendo esses contextos dinâmicos não é possível comtemplar no processo de formação inicial todas as questões que serão colocadas num futuro mais ou menos longínquo. No mundo em que vivemos em constante mutação, complexo, no qual somos chamados a viver e trabalhar em múltiplos contextos e com múltiplas situações completamente novas, é necessário não atribuir à formação inicial um papel tão importante na estruturação das práticas profissionais, mas sim fazer desta uma “ponte” para a aposta numa formação contínua forte e bem estruturada em consonância com essas práticas, permitindo ao sujeito formar-se e saber quando e onde pode colocar os ensinamentos na prática.