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3.2 Evolução dos Modelos de Negócios em Jogos Móveis

3.2.1 Modelos de Distribuição

No final dos anos 90, apareceram os primeiros telefones celulares para os quais um terceiro (não fabricante) poderia construir aplicativos. Nesse cenário de alta fragmentação, tanto em termos de sistema operacional quanto em configuração de hardware, a produção de jogos para dispositivos móveis era uma atividade extremamente complexa. Os desenvolvedores de jogos, para atingir uma parcela significativa dos aparelhos disponíveis, precisavam desenvolver e manter centenas, e até milhares, de versões diferentes dos seus jogos com código-fonte específicos para cada uma das plataformas. Além disso, era necessário testar cada uma dessas versões para garantir o correto funcionamento de todas as versões nos respectivos aparelhos- alvo.

Além do desafio em termos de produção de jogos, os desenvolvedores ainda enfrentavam um cenário extremamente competitivo para distribuição dos jogos em dispositivos móveis. Os principais modelos de distribuição adotados apresentavam várias barreiras para disponibilizar os jogos e alcançar o público consumidor final.

■ Distribuição pelas fabricantes

Inicialmente a distribuição dos jogos foi realizada direto pelas fabricantes através da pré-instalação dos jogos nos aparelhos. Os jogos eram instalados nos celulares junto com o sistema operacional ainda durante o processo de fabricação. Do ponto de vista do consumidor, esse processo permitia acessar jogos logo após a aquisição dos aparelhos. Porém, os consumidores não podiam remover os jogos já previamente instalados e tampouco instalar novos jogos (ver Figura 3-2).

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Figura 3-2: Menu de jogos no Nokia 1100 com espaço para somente 2 títulos (Snake e Space Impact).

Do ponto de vista do desenvolvedor, a pré-instalação através dos fabricantes representava o único caminho viável para conseguir alcançar os consumidores. Entretanto, os aparelhos apresentavam restrições em termos de memória para permitir a pré-instalação de uma grande quantidade de jogos. E dada a quantidade também limitada de fabricantes, a distribuição de jogos através desse modelo era algo acessível para um número extremamente restrito de desenvolvedores de jogos. Esse foi o formato de distribuição mais comum até por volta do ano 2000.

■ Distribuição pelas operadoras de telefonia

Após o advento da tecnologia WAP para internet móvel, as operadoras de telefonia também iniciaram a distribuição de jogos digitais. A tecnologia originalmente criada para prover serviços como e-mail, notícias e download de música passou a também ser utilizado para o download e instalação de jogos e aplicativos.

Para o consumidor, a distribuição pela operadora não era de usabilidade fácil e não ganhou escala. Esses jogos eram comprados direto pelas operadoras e o custo incluído na conta de telefone. A baixa adoção da tecnologia pelos consumidores levou as operadoras a não realizar grandes investimentos para a criação de um vasto portfólio de jogos para os usuários. Aliado a isso, as operadoras não desejavam gerir a relação com uma grande quantidade de desenvolvedores para disponibilizar novos conteúdos para seus usuários. O resultado é que esse tipo de distribuição não vingou.

Para o desenvolvedor, a distribuição através das operadoras de telefonia representava uma alternativa ao monopólio das fabricantes. Esse canal de distribuição de conteúdo, em teoria sem restrição quanto ao limite de espaço físico, permitiria incluir uma quantidade maior de jogos e abrir o mercado para um número maior de desenvolvedores. Na prática, entretanto, essa previsão não se concretizou.

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■ Sites de Conteúdo

Praticamente em paralelo com a distribuição de conteúdo pelas operadoras surgiram os sites de conteúdo distribuídos através do protocolo de comunicação WAP, como o site GetJar.com. Esse serviço de distribuição enfrentou os mesmos problemas das operadoras. A baixa qualidade desse serviço, aliado ao alto custo cobrado pelas operadoras na conexão WAP, também inviabilizou esse modelo de distribuição.

■ Publicadores de Jogos

Os publicadores de jogos surgiram para suprir a lacuna existente entre os desenvolvedores de jogos e os principais distribuidores de conteúdo: fabricantes e operadoras. As operadoras não estavam interessadas em lidar com potencialmente centenas de desenvolvedores para buscar conteúdo para popular as lojas de aplicativos WAP. Os publicadores de jogos emergiram, portanto, para intermediar esse relacionamento comercial ao custo de uma porcentagem da receita gerada pelo jogo.

Essa nova peça na curva de valor da indústria de jogos para dispositivos móveis foi responsável por reduzir ainda mais a receita dos desenvolvedores. A negociação com as operadoras e fabricantes em geral consistia em um modelo de compartilhamento de receita com somente 30% da receita sendo destinada para o desenvolvedor. Essa fração passou a ser dividida também com os publicadores.

■ Loja de Aplicativos

O cenário mudou com o lançamento da loja de aplicativos do iPhone, chamada de iPhone App Store, inaugurada em julho de 2008 através de uma atualização do aplicativo iTunes. Essa loja permite à Apple controlar a qualidade do conteúdo distribuído e cobrar uma porcentagem da receita proveniente da comercialização dos aplicativos, incluindo jogos. Os usuários do iPhone podem baixar somente aplicativos distribuídos através dessa loja.

Ainda em 2008, em conjunto com o lançamento do sistema Android, o Google lançou também a sua loja de aplicativo chamada Android Market, e posteriormente renomeada para Google Play. A loja de aplicativos do Google possui funcionamento similar à loja da Apple com a disponibilização de jogos e aplicativos compatíveis com o sistema operacional Android. O modelo de negócios também é similar, os desenvolvedores distribuem seus jogos diretamente na loja sem a necessidade de intermediários e em contrapartida pagam uma porcentagem (30%) da receita proveniente dos jogos e aplicativos disponibilizados à respectiva loja virtual.

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Para o desenvolvedor, a iPhone App Store inovou também com o modelo de negócios para distribuição de aplicativos e jogos para o iPhone ao permitir que os desenvolvedores distribuíssem diretamente na loja sem intermediários. Essa mudança de paradigma permitiu aos desenvolvedores evitar as longas negociações com publicadores, fabricantes de aparelhos e operadores de telefone e ainda aumentar a sua participação na receita.

E do outro lado, para o consumidor, a forte integração da iPhone App Store, posteriormente renomeada para Apple App Store, com o dispositivo em si levou muitos consumidores a experimentar jogos e aplicativos. A facilidade para encontrar, baixar e instalar os conteúdos foi responsável por promover um crescimento substancial no consumo de jogos para dispositivos móveis.

A iPhone App Store foi lançada com incríveis 500 jogos e aplicativos para o iPhone. Esse é uma quantidade de conteúdo imensa para os padrões da época. Na semana do lançamento da loja foram contabilizados o download de mais de 10 milhões de aplicativos (Bowcock 2008). De lá para cá, a quantidade de conteúdo só cresceu. As lojas possuem, juntas, praticamente 4 milhões de jogos e aplicativos disponíveis para download (ver Figura 3-3).

Figura 3-3: Número de aplicativos disponíveis nas principais lojas de aplicativos ao final de 2016 (Costello 2016; AppBrain 2017)

O surgimento das lojas de aplicativos acarretou no encerramento do modelo de negócios de distribuição por meio das operadoras de telefonia e fabricantes de aparelhos. A distribuição se tornou mais simples, rápida e barata. Além disso, também favoreceu a redução da pirataria. A exigência de um identificador único para um usuário impediu as pessoas de jogarem sem pagar ou de repassar o jogo para terceiros evitando os balcões de revendas de jogos.

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