• Nenhum resultado encontrado

Para que possamos analisar os processos de formação de professores é necessário que se discuta os modelos de formação adotadas pelas diferentes instituições formadoras desses profissionais.

Apesar de ser um dos fatores determinantes da política educativa de cada país, verificamos que a cada dia que passa, as atenções se voltam com maior intensidade para o papel do professor, enquanto profissional responsável pela qualidade do cotidiano educativo na sala de aula e na escola.

A formação de professores não pode considerar-se um domínio autónomo de conhecimento e decisão. Pelo contrário, as orientações adoptadas ao longo de sua história encontram-se profundamente determinadas pelos conceitos de escola, ensino e currículo prevalecentes em cada época. A partir da definição de cada um destes conceitos desenvolvem-se imagens e metáforas que pretendem definir a função do docente como profissional na escola e na aula. São familiares as metáforas do professor como modelo de comportamento, como transmissor de conhecimentos, como técnico, como executor de rotinas, como planificador, como sujeito que toma decisões ou resolve problemas etc. Cada uma destas imagens ou metáforas tem sujacente: uma determinada concepção de escola e do ensino; uma teoria do conhecimento e da sua transmissão e aprendizagem; uma concepção própria das relações entre a teoria e a prática, entre a investigação e a acção. (PÉREZ GÓMEZ, 1995, p. 95-96)

É a partir desse pressuposto que se estabelecem duas concepções básicas para a atividade docente: o professor como técnico-especialista e o professor como prático autônomo.

O professor como técnico-especialista está vinculado ao modelo da racionalidade técnica em que o professor é tido como um técnico, em que aplica rigorosamente as teorias e as técnicas científicas diante dos problemas que se defronta em sua prática.

De acordo com Pérez Gómez (1995, p. 108), no paradigma da racionalidade técnica a formação profissional é vista como: “(...) um processo de preparação técnica, que permita compreender o funcionamento das regras e das técnicas do mundo real da sala de aula e desenvolver as competências profissionais exigidas pela sua aplicação eficaz.”. E o mais grave, como lembra Pérez Gómez (1995, p. 97): “assiste-se a uma autêntica divisão do trabalho e a um funcionamento relativamente autónomo dos profissionais em cada um dos diferentes níveis, e, conseqüentemente, a uma “separação pessoal e institucional entre a investigação e a prática”.

Por conseguinte, na racionalidade técnica há uma separação entre a teoria e prática: normalmente a teoria se adquire nos cursos de formação através das disciplinas básicas de conteúdos que são ministradas nos primeiros anos do curso, e a prática através das disciplinas pedagógicas, que visam ensinar as habilidades e que são ministradas nos últimos anos. Embora constituam um discurso teórico eficiente, as teorias, em sua maioria, somente podem ser colocadas em prática em situações idealizadas. Entretanto, no cotidiano escolar o professor se depara com múltiplas situações incertas e imprevistas que sequer foram pensadas nos cursos de formação, nas quais o professor deve atuar de forma inteligente e flexível.

Os problemas da prática social não podem ser reduzidos a problemas meramente instrumentais, em que a tarefa profissional se resume a uma acertada escolha e aplicação de meios e procedimentos. De um modo geral, na prática não existem problemas, mas sim situações problemáticas, que se apresentam freqüentemente como casos únicos que não se enquadram nas categorias genéricas identificadas pela técnica e pela teoria existentes. Por essa razão, o profissional prático não pode tratar estas situações como se fossem meros problemas instrumentais, susceptíveis de resolução através da aplicação de regras armazenadas no seu próprio conhecimento científico-técnico ( PÉREZ GÓMEZ, 1995, p. 100)

Isso gera um processo de reflexão, no qual o professor, embasado nos seus valores morais, éticos, políticos e religiosos, tem que tomar uma atitude, resolver o problema. Dessa forma, ele constrói novas formas de agir, ultrapassando o modelo de racionalidade técnica.

Assim, o modelo de racionalidade técnica se torna inviável diante da inúmeras situações do ato educativo, porque a realidade educacional é muito mais complexa e vai além dos problemas instrumentais.

Nesse contexto, o processo de formação de professores que se contrapõe ao modelo de racionalidade técnica é o modelo de racionalidade prática, que concebe o professor como prático autônomo. Nesse paradigma, a formação docente é vista como um modelo reflexivo e artístico, pois é na prática que o professor pode analisar e interpretar a própria atuação e entender diferencialmente as exigências situacionais.

Por isso a formação básica passa a ser vista apenas como um dos momentos do processo formativo, uma vez que os conhecimentos adquiridos através da racionalidade prática transcendem os adquiridos na racionalidade técnica. A prática configura-se como eixo central da formação docente e o lugar por excelência de produção do saber pedagógico. ( PÉREZ GÓMEZ, 1995).

Outro fator preponderante no referido processo diz respeito às experiências acumuladas ao longo dos anos pelos professores, os quais estabelecem nexos entre a formação inicial, a continuada e as suas experiências, produzindo sentido para a sua prática pedagógica.

O conceito de professor como prático reflexivo pressupõe que o processo de compreensão e melhoria da ação pedagógica, e conseqüentemente do ensino, deve começar pela reflexão sobre sua própria experiência. Também significa que o processo de aprender a ensinar se prolonga durante toda a sua carreira docente, sendo o professor o responsável pelo seu próprio desenvolvimento profissional.

A docência, nesse contexto, caracteriza o ser humano como criativo, e não está mais arraigada somente ao estudo do conteúdo. É uma aprendizagem que deve ocorrer dentro de uma problemática, ou seja, de situações concretas que se dão no contexto escolar; é um ir e vir constante. Exige ainda que, além dos conhecimentos, sejam trabalhadas atitudes para o desenvolvimento de uma prática reflexiva competente. Portanto, a formação de professores é como um continuum, ou seja, ela deve ocorrer durante toda a vida.

Para delimitar o que exatamente se entende por professor reflexivo, reportamos à Pimenta (1997, p.56), que expressa seu entendimento a respeito da questão:

[...] Opondo-se à racionalidade técnica que marcou o trabalho e a formação de professores, entende-o como um intelectual em processo contínuo de formação. Enquanto tal, pensar sua formação significa pensá-la como um

continuum de formação inicial e contínua. (...) a formação é, na verdade,

autoformação, uma vez que os professores reelaboram saberes iniciais em confronto com suas experiências práticas, cotidianamente vivenciadas nos contextos escolares. É nesse confronto e num processo de troca de experiências e práticas que os professores vão constituindo seus saberes como um praticum, ou seja, aquele que constantemente reflete na e sobre a prática".

O desenvolvimento da capacidade reflexiva do professor lhe propicia condições de assimilar melhor as mudanças que causam impacto na escola, e de intermediar a relação existente entre o aluno e a realidade social, abordando temas atuais e diversificados, colaborando dessa forma para desenvolver a capacidade crítica do educando com vistas à formação para a cidadania.

Podemos afirmar ainda que o professor reflexivo tem condições de repensar e avaliar constantemente sua prática pedagógica, procurando encontrar instrumentos

mais adequados para criar vínculo com seus alunos, alicerçando uma ação que proporcione a eles mesmos uma aprendizagem significativa.