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com ele, ou seja, permitindo ao “paciente” também ser ativo, sendo capaz de realizar escolhas e decisões em seu processo terapêutico. O novo olhar com que as autoras problematizam a atividade enquanto recurso dentro da TO articula-se com a importância de desconstruir métodos e técnicas padronizadas, baseadas em alguns modelos teóricos e abordagens que norteiam a prática de alguns terapeutas ocupacionais.

2.3 Modelos teóricos práticos em Terapia Ocupacional

As ações terapêuticas têm como base os princípios e fundamentos históricos, filosóficos e ideológicos que delinearam as práticas em Terapia Ocupacional ao longo de sua história. Estes foram se modificando e inovando, dando origem a modelos teórico– práticos que orientam muitas práticas atuais. Para Francisco (2001), ao se questionar como ocorre o processo terapêutico ocupacional, três linhas gerais são identificadas: modelo positivista, modelo humanista e modelo dialético, que interferem na forma como se constrói a prática terapêutica.

No modelo positivista, o centro do processo é a correção da patologia, com base na compreensão da saúde como ausência de doença, vinculada a aspectos biológicos. São priorizadas estruturas mais rígidas de procedimentos, ordenadas em sequência lógica, que possibilitam conhecer de forma ampla sobre a patologia apresentada pelo sujeito, a fim de se alcançar de forma mais adequada o objetivo final. As etapas dos procedimentos consistem em ações rígidas e bem delineadas, não permitindo muita flexibilidade. Segundo a autora, são elas: encaminhamento, entrevista inicial, avaliação (inicial e/ou completa), planejamento de programa de tratamento, tratamento propriamente dito, reavaliações e alta. As atividades terapêuticas estão vinculadas principalmente a exercícios e à produção, e em alguns casos, principalmente na área de saúde mental, as atividades aparecem como forma de expressão. Os atendimentos, preferencialmente, devem ser individuais, pois se compreende que a relação terapeuta–paciente efetiva-se unicamente por meio das atividades, portanto essa relação torna-se mais estruturada e com delimitações de papéis bem definidos.

Por outro lado, no modelo humanista inexiste padrões e procedimentos a serem seguidos em sequência lógica, como entrevista, avaliação etc. A relação terapêutica ganha ênfase nessa concepção, sendo o principal instrumento de trabalho. O terapeuta proporciona um ambiente acolhedor de escuta a fim de favorecer o contato com o cliente, de modo que estimule o aparecimento de questões singulares trazidas por ele. Dessa forma, o centro do processo é o cliente, compreendendo que ele direciona os caminhos a serem seguidos, pois cada ser humano é único. Portanto, o objetivo é conhecer quem é o sujeito, os seus desejos e vontades, inclusive por meio de atividades, e, partindo disso, o terapeuta elabora o percurso terapêutico de acordo com essas características.

Na concepção dialética, a autora inicia sua definição a partir da reflexão crítica sobre o processo em TO. Muitos profissionais afirmam que priorizam o desenvolvimento do ser humano, a partir da consideração de suas características e personalidades singulares, com objetivo de promover a autonomia dos sujeitos, porém desconsideram o homem como um ser histórico e contextualizado socialmente. No modelo dialético, com base na concepção materialista da história, posiciona-se a saúde dentro de um contexto histórico e social, na busca da prática terapêutica que interfira positivamente na qualidade de vida, partindo do pressuposto que “a história da doença no indivíduo é sempre inseparável da sua história de vida, porque esta é em si mesma problematizadora” (FRANCISCO, 2001, p.65). O centro do processo terapêutico é o homem inserido dentro de um contexto, e não mais a doença ou somente o homem isoladamente. Com base nesse modelo, têm-se uma nova visão da saúde dentro do processo em TO, na qual não existem momentos nem fases distintas e específicas para realizar as avaliações e tratamentos, elas ocorrem de forma dinâmica. O foco terapêutico não se concentra sobre a doença, mas sobre a pessoa, que está permeada de relações e contextos sociais. A atividade, instrumento de intervenção do terapeuta, nessa perspectiva, relaciona-se com o trabalho, sendo ela um espaço capaz de promover a transformação tanto individual como social. Portanto, o processo terapêutico torna-se um espaço para refletir sobre o “fazer”, que incluí atos, ações e atividades, possibilitando que “o paciente possa reconhecer-se com sujeito que cria, atua, reconhece, organiza e gerencia o seu cotidiano concreto” (FRANCISCO, 2001, p.66). Além disso, é possível também que ele se perceba como um ser social, envolvido em um sistema de relações.

Para a autora, entretanto, essas modificações ocorrem a partir do momento em que ele se apropria dos meios e objetivos do tratamento, reconhecendo-se em um papel ativo

em sua história e na história do mundo. A partir da relação entre o individual e social, os atendimentos grupais ganham um destaque maior no processo, o ato terapêutico estrutura- se a partir das tensões dialéticas, baseadas em um caráter contraditório e não mais individual, conforme observado em dicotomias entre: saúde-doença; possibilidade/impossibilidade e autonomia/dependência. As ações terapêuticas ocorrem a partir de intervenções que facilitem a identificação de barreiras implicadas no fazer, que remetem a questões relativas ao modo de se relacionar e agir no cotidiano. Assim, a autora conclui que as ações da TO, dentro da visão materialista histórica, consistem em uma terapia que busca a conscientização contra a opressão, baseada na construção do fazer inserido nas práticas, relações e experiências do cotidiano.

De forma mais específica no contexto escolar, para Trevisian e Della Barba (2012), as ações da Terapia Ocupacional na educação inclusiva devem se apoiar no modelo interacionista. Esse modelo foca não somente na pessoa, mas também no contexto ambiental, físico e social em que ela se insere, e em tudo aquilo que dificulta a sua participação em seus contextos e atividades.

Esses modelos teóricos delineiam muitas práticas em TO, inclusive as ações em relação às ocupações que estão inseridas no cotidiano e o principal recurso utilizado no processo terapêutico: as atividades. Com base na proposição de um novo olhar para as práticas em Terapia Ocupacional, que possibilite ampliar a visão desses modelos, busca- se a articulação da TO com um modelo que possibilite conhecer a complexidade do sujeito que realiza essas ocupações e atividades no processo terapêutico, compreendendo a influência do social em sua constituição. A Teoria da Subjetividade de González Rey, de base histórico-cultural, permite ampliar as concepções dos três modelos, pois favorece a visão que não foca somente na patologia, mas em compreender a complexidade desse fenômeno e sua articulação com a história do sujeito. Além disso, tem como foco o homem, não analisado individualmente, mas inserido em um contexto histórico e social, a partir da complexa articulação entre o social e o individual. Esse olhar nos parece possibilitar novas articulações com a prática em Terapia Ocupacional, e de forma mais específica, a partir de suas contribuições para o contexto educacional.