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Capítulo 2. Fundamentos teóricos e programas de cálculo

2.3 Modelos de comportamento do solo utilizados

2.3.2 Mohr-Coulomb

O modelo de comportamento do solo tipicamente mais utilizado nos programas numéricos é um modelo linear elástico-perfeitamente plástico designado usualmente por modelo Mohr-Coulomb. A ideia básica de um modelo elástico-perfeitamente plástico está apresentada na Figura 2.13. Este modelo, ao contrário de modelos elásticos mais básicos, fornece uma maneira simples de limitar a tensão de corte permitida.

O princípio básico da elastoplasticidade é que as deformações são decompostas numa parte elástica e numa parte plástica. Para pequenas deformações, tem-se:

𝜀 = 𝜀𝑒+ 𝜀𝑝 (2.44)

Figura 2.13: Modelo elástico-perfeitamente plástico de comportamento do solo (adaptado de Brinkgreve et al., 2010 e de Woods e Rahim, 2007).

Numa fase puramente elástica, como se mostra no primeiro troço da Figura 2.13, todas as deformações são reversíveis. Esta fase acontece para muito pequenas deformações. Por outro lado, numa fase em que o comportamento é perfeitamente plástico, as deformações são irreversíveis. Nos programas numéricos, para avaliar se num cálculo o material entra em plasticidade, pode introduzir-se a chamada função de cedência, 𝑓, função da tensão e da deformação. A condição de 𝑓 = 0 define a ce- dência plástica e é normalmente representada por uma superfície no espaço das tensões principais. Um modelo elástico-perfeitamente plástico é um modelo constitutivo com uma superfície de cedência fixa (forma e tamanho constantes), ou seja, uma superfície de cedência que é definida pelos parâmetros do modelo e não é afetada por deformação plástica. Para estados de tensão dentro dessa superfície o comportamento é puramente elástico (Brinkgreve et al., 2010). Para o modelo Mohr-Coulomb (modelo MC), a superfície de cedência é representada por um cone hexagonal no espaço das tensões principais, como se mostra na Figura 2.14.

Figura 2.14: Superfície de cedência do modelo MC no espaço das tensões principais (𝒄 = 𝟎) (Brinkgreve et al., 2010)

O modelo MC incorporado nos programas computacionais utilizados contempla o critério de rotura com o mesmo nome. Pelo critério de rotura de Mohr-Coulomb, um solo entra em rotura num ponto quando num par de facetas que passam neste ponto é atingida a seguinte relação entre a componente tangencial, 𝜏, e a componente normal, 𝜎′, da tensão:

𝜏 = 𝑐′+ 𝜎 tg 𝜙′ (2.45)

em que 𝑐′ é a coesão efetiva e 𝜙′ é o ângulo de atrito ou ângulo de resistência ao corte (ambos efetivos, porque o critério de rotura de MC aplica-se em tensões efetivas).

Na Figura 2.15 apresentam-se circunferências de Mohr representativas das tensões de um ponto num maciço de solo com coesão e ângulo de atrito (e nas condições de equilíbrio de Rankine), no qual é aplicado deslocamento horizontal “para fora” do solo. O deslocamento é tal que leva o solo à rotura, que pelo critério de MC acontece quando a circunferência interseta a envolvente de rotura, como se observa na figura. Este critério foi utilizado por Rankine na formulação da sua teoria, como foi apresentado na Figura 2.5, para solos sem coesão, e Figura 2.9, para solos com coesão.

Uma das vantagens da utilização deste modelo em cálculos é que os parâmetros necessários para o definir são bastante familiares aos engenheiros geotécnicos e podem ser obtidos a partir dos ensaios de caracterização geotécnica mais comuns. Os parâmetros básicos definidores deste modelo são os apresentados na Tabela 2.1, sendo que os elásticos (de rigidez) vêm da lei de Hooke e os parâme- tros de resistência 𝑐′ e 𝜙′ vêm, como referido, da forma generalizada do critério de rotura de Mohr-Coulomb. A utilização do ângulo de dilatância, 𝜓, permite o uso de lei de fluxo associada ou lei de fluxo não associada (com esta última modelam-se mais realisticamente variações de volume irreversíveis devido ao corte (Brinkgreve R. B., 2005)). Nos programas computacionais utilizados, o modelo MC tem al-

−𝜎1

−𝜎2

2.3.MODELOS DE COMPORTAMENTO DO SOLO UTILIZADOS

gumas características mais avançadas, como o aumento do módulo de deformabilidade com a profun- didade (característica que será usada) e o aumento da coesão com a profundidade (respetivamente 𝐸𝑖𝑛𝑐 e 𝑐𝑖𝑛𝑐 no programa de cálculo numérico PLAXIS, e 𝑚𝑒 e 𝑚𝑐 no programa de cálculo numérico CRISP).

Figura 2.15: Circunferências de Mohr para vários estados de tensão: desde o repouso até ser atingida a rotura do solo de acordo com o critério de MC, depois de aplicadas 3 fases de deslocamento horizon-

tal numa estrutura de suporte de um maciço de terras (adaptado de Matos Fernandes, 2006).

Tabela 2.1: Parâmetros do modelo Mohr-Coulomb.

TIPO PARÂMETRO DESIGNAÇÃO UNIDADE

Rigidez 𝐸 Módulo de deformabilidade kPa 𝜈 Coeficiente de Poisson -

Resistência

𝑐′ Coesão efetiva kPa 𝜙′ Ângulo de resistência ao corte Graus (°)

𝜓 Ângulo de dilatância Graus (°)

Deve ser notado que este é apenas um modelo de primeira ordem; o comportamento na rotura é geralmente bem conseguido (pelo menos em condições drenadas), mas o comportamento de rigidez antes de ser atingida a tensão de corte limite é modelado de maneira deficiente. Assim, como refere Brinkgreve (2005), o modelo revela capacidades limitadas em modelar com precisão o compor- tamento de deformação antes da rotura. Por esta razão, a utilização deste modelo em problemas de escavações e muros de contenção pode resultar em deformações irrealistas. Por outro lado, como em termos de comportamento de resistência o modelo tem um melhor desempenho, este modelo é ade- quado para analisar a estabilidade de barragens, taludes e aterros. Porém, o modelo não inclui amole- cimento após ser atingido um estado de pico. Sendo assim, faz-se uma advertência importante para

este trabalho: para se estar do lado da segurança, ao usar este modelo devem selecionar-se parâmetros de resistência que representem a resistência de estado crítico e não a de pico. Neste trabalho, para comparação com o modelo CCM na fase de pico serão usados, no modelo MC, parâmetros que repre- sentam a resistência no estado de pico (como feito na secção 3.5.4), mas apenas para fazer a compara- ção das pressões ativas obtidas pelos dois modelos e não como parâmetros que se devem usar numa análise numérica de um problema geotécnico, utilizando o modelo MC.

Por fim, faça-se referência a um aspeto que, como se verá mais à frente neste trabalho, é crucial na relação entre os parâmetros de resistência do modelo MC e do modelo CCM. Tal como disse Wood (1990), o critério de rotura de MC, por lidar com condições no plano, não é influênciado pelo valor da tensão principal efetiva intermédia, 𝜎′2. Ou seja, esta tensão intermédia pode ser igual à tensão principal mínima, igual à tensão principal máxima ou ter um qualquer valor intermédio sem que afete o círculo de Mohr que define a rotura, pois este círculo é apenas definido pelas maior e menor tensões principais.

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