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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 Morfoestruturas e Morfoesculturas dos Maciços Antigos

A análise da evolução das formas de relevo possui diversos métodos de investigação. Estes métodos foram elaborados obedecendo a distintos critérios a depender da escola epistemológica em que se desenvolveram, e do ajuste, ao longo do último século às fases de introdução, modificação e adaptação às novas técnicas que surgiam.

Como ponto central da análise geomorfológica encontra-se a compartimentação, gênese e evolução dos maciços antigos. Dentre as variadas metodologias dessas macro-unidades geomorfológicas cabe destaque para a proposta elaborada no leste europeu, mas que teve seus pressupostos ancorados nos postulados alemães no início do século passado.

Para melhor compreender a hierarquização das formas dos maciços antigos, pode-se lançar mão da proposta de Gerasimov (1946) que elaborou os conceitos de geotextura, morfotectura e morfoestrutura para designar as relações entre os componentes morfológicos da superfície terrestre e seus processos geradores. Estes conceitos se mostraram semelhantes e até equivalentes aos propostos por Mescerjakov (1968) que empregou os termos morfotectura, morfoestrutura e morfoescultura. Esta terminologia analítica desenvolvida pela escola soviética de geomorfologia tem suas bases na premissa de Penck (1924) que considera o modelado terrestre como resultado do balanço de forças entre os processos internos (tectônicos) e os processos externos (erosivos). O resultado deste "embate" responderia pela gênese do relevo terrestre.

Focando nos conceitos que possuem grandeza escalar compatível com a análise dos maciços, ou escudos, temos que, em síntese, a morfoestrutura seria a relação existente entre a estrutura de base e o modelado superficial. Como estrutura entende- se o contexto geotectônico, com seus complexos litológicos e conjuntos de dobras e falhas, além da atuação ou não de esforços tectônicos atuais ou recentes, bem como os aspectos paleotectônicos.

Como morfoescultura se entende a relação dos agentes externos, climáticos, e o modelado. Os processos esculturadores modelam a paisagem em diversas escalas a depender da amplitude espacial dos elementos climáticos, entretanto, em geral, atuam em escalas maiores que os elementos estruturadores (BIGARELLA, 2003).

Quanto à evolução dos maciços, devemos entender que estes corpos cristalinos são formados em geral sob a forma de cinturões de montanhas em margens convergentes. A partir da formação da cadeia montanhosa segue-se o desgaste da mesma e o ajuste isostático assim como postulado por Hack (1975), e que por fim, obedecendo às imposições gravitacionais, resultaria em uma superfície ampla e plana com altitudes próximas às do nível do mar, com processos formativos variando de acordo com as diversas teorias que tratam sobre o tema (BIGARELLA, 2003; MONTEIRO 2010).

Estes maciços são formados por rochas antigas, em geral complexos metamórficos compostos por gnaisses, migmatitos, xistos, entre outros. Estes complexos metamórficos não raras vezes são cortados por intrusões graníticas na forma de batólitos, diques e sills. Sua ocorrência é associada às plataformas estáveis e possuem importância fundamental no entendimento da evolução dos continentes, pois entender como estes maciços de desenvolveram é peça vital no entendimento dos processos evolutivos e geodinâmicos pelos quais passam os continentes.

O esquema elaborado por Hamblin & Christiansen (2003) ilustra de maneira compreensiva como os maciços cristalinos se originam (Fig. 2.3) e as rochas ígneas plutônicas chegam a ser expostas em superfície.

De maneira geral estes autores observam dois principais fatores controladores no processo de exposição de um escudo: 1 - erosão da cadeia por processos fluviais e 2 - ajuste isostático da cadeia montanhosa como resultado da remoção do material. Os mesmos aceitam a idéia de que tanto a erosão quanto o ajuste isostático continuam atuando até que um novo equilíbrio seja alcançado.

Figura 2.3 - Desenvolvimento de um escudo a partir de uma cadeia de montanha. Adaptado de Hamblin & Christiansen (2003).

A) Nos estágios iniciais de desenvolvimento o relevo é máximo. Alguns vulcões andesíticos podem permanecer na superfície. Falhas de empurrão e dobras são as estruturas dominantes na superfície. As cabeceiras fluviais começam a organizar o padrão de drenagem adaptando-se aos principais

trends estruturais. Os Andes estão nesta

fase.

B) À medida que a erosão remove o material da montanha o ajuste isostático acresce material à base da montanha. Falhas geradas na base da cadeia montanhosa são expostas em superfície e as cabeceiras de drenagem se ajustam aos padrões de falhas. Muitos tributários drenam paralelamente às estruturas, e as capturas fluviais começam a se formar entre os lineamentos de cristas em níveis topográficos diferentes. Os Apalaches se encontram em fase semelhante a esta. C) A continuação da erosão e do ajuste isostático reduz a topografia do relevo e as maiores profundidades da base do cinturão orogenético começa a aflorar. Complexos de dobras e intrusões ígneas formadas originalmente em regiões profundas do cinturão são expostas na superfície. As drenagens se ajustam às novas estruturas expostas. O relevo e as taxas de erosão são drasticamente reduzidos. Os cinturões da Escócia e Noruega possuem estruturação semelhante a esta.

D) O equilíbrio isostático é restabelecido. As rochas formadas em profundidade são expostas na superfície e o relevo local é de poucos metros. A drenagem se ajusta aos terrenos metamórficos. Neste estágio o cinturão compõe um novo segmento do escudo, um maciço. O escudo canadense apresenta estágio de desenvolvimento compatível com esta fase de evolução.

O entendimento dos processos enunciados acima é essencial na hierarquização das morforestruturas regionais das áreas plataformais. A análise evolutiva dos maciços está ligada ao entendimento de que estes sofrem amplos soerguimentos e subsidências, mas também existem as variações constantes no nível do mar. Estas variações são importantes devido ao fato de que o nível eustático é, em última instância, o último nível de base, o nível de base geral, onde os processos fluviais cessam e se inicia a deposição.

As variações no nível do mar definem portanto o estabelecimento ou as variações dos níveis de base, geral, regionais e locais. E como os níveis de base determinam os processos fluviais modeladores da paisagem, temos que o entendimento destes sistemas nos levam à hierarquização dos processos morfoescultores.

As morfoesculturas por sua vez são estabelecidas e limitadas pela resistência da rocha, originando o termo "erosão diferencial". A erosão diferencial ocorre quando os mesmos processos atuam sobre rochas de dureza diferente assim resultando em formas finais distintas entre si. Estas diferenças ocorrem em todas as escalas, desde montanhas até degraus de uma encosta formados por diferença entre camadas de rochas mais rígidas e mais frágeis. Esta diferenciação erosiva é mais observada em regiões secas onde as diferenças dos tipos de rocha produzem maiores detalhes na paisagem (BIGARELLA, 2003) na ausência de um manto de intemperismo mais profundo.

Deve-se pontuar entretanto que as diferenças litológicas são criadas majoritariamente pela gênese estrutural. Portanto, não é rara a aceitação de que as morfoesculturas atuam a partir da definição e estabelecimento das morfoestruturas.

Em tempos mais recentes tem sido cada vez mais notável a compreensão de que os modelos de evolução morfológica de longo prazo necessitam de informações confiáveis acerca do período e das taxas de soerguimento das formas de relevo de um lado e das taxas de desnudação de outro. Mas para isto é necessário que os modelos substituam os esquemas antigos por esquemas mais aprimorados, condizentes com as

técnicas contemporâneas (THOMAS, 1995). Neste contexto, uma hierarquização morfoestrutural e morfoescultural do modelado se torna cada vez mais essencial.