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4.1 Frame MUDANÇA

4.1.4 Mudança segundo Michel Temer

Com o governo desgastado, devido à desaceleração da economia e à pressão do empresariado brasileiro, Dilma Rousseff sofreu processo de Impeachment. Nesse processo, a presidenta foi acusada de cometer crimes de responsabilidade fiscal durante o seu primeiro mandato.

Com o processo terminado e a cassação consolidada, assumiu a presidência da República Michel Temer, vice-presidente da Dilma. Como discurso de posse, consideramos para a realização deste trabalho o seu pronunciamento à imprensa, que se deu após a sua posse como presidente de fato (até então desempenhava esse papel interinamente) e a posse dos seus Ministros de Estado.

Pelas particularidades de sua posse, o discurso de Michel Temer tem um tom mais oral, uma vez que ele não lê nenhum discurso pronto. O discurso, em relação a tamanho, também é diferente dos demais, uma vez que é mais curto. No entanto, há

características comuns aos discursos analisados até então, sobretudo na presença do bloco temático que elucida o frame MUDANÇA. Vejamos.

E minha primeira palavra ao povo brasileiro é a palavra confiança. Confiança nos valores que formam o caráter de nossa gente, na vitalidade da nossa democracia; confiança na recuperação da economia nacional, nos potenciais do nosso país, em suas instituições sociais e políticas e na capacidade de que, unidos, poderemos enfrentar os desafios deste momento que é de grande dificuldade.

Reitero, como tenho dito ao longo do tempo, que é urgente pacificar a Nação e unificar o Brasil. É urgente fazermos um governo de salvação nacional. Partidos políticos, lideranças e entidades organizadas e o povo brasileiro hão de emprestar sua colaboração para tirar o país dessa grave crise em que nos encontramos. O diálogo é o primeiro passo para enfrentarmos os desafios para avançar e garantir a retomada do crescimento. Ninguém, absolutamente ninguém, individualmente, tem as melhores receitas para as reformas que precisamos realizar. Mas nós, governo, parlamento e sociedade, juntos, vamos encontrá-las.

Eu conservo a absoluta convicção de que é preciso resgatar a credibilidade do Brasil no concerto interno e no concerto internacional, fator necessário para que empresários dos setores industriais, de serviços, do agronegócio, e os trabalhadores, enfim, de todas as áreas produtivas se entusiasmem e retomem, em segurança, com seus investimentos. Teremos que incentivar, de maneira significativa, as parcerias público-privadas, na medida em que esse instrumento poderá gerar emprego no país (TEMER PEDE..., 2016, p. 1).

Michel Temer é do MDB, mesmo partido de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados no segundo governo Dilma e responsável pela abertura do processo de cassação da presidenta. Membro do partido que ajudou a articular o Impeachment, Temer, que já havia rompido com o governo, assume a presidência da república. Em seu discurso, portanto, espera-se um tom de mudança, de críticas à presidenta anterior.

Quanto aos frames conceptuais básicos, o de maior recorrência foi CONFIANÇA.

Com o seu governo, Temer indica, por meio do discurso, que Dilma perdeu e fez o país perder confiança. Portanto, essa ideia é o mote pelo qual o presidente começa a construir o seu significado para MUDANÇA.

Figura 21 – Temer: Mudança – Frames conceptuais básicos

Fonte: Plataforma da Wordart.com.

Além de “confiança”, “povo”, “brasileiro”, “país” e “desafios” são os elementos mais recorrentes. Juntos, ajudam a construir o sentido de Brasil no período em questão, e mostram qual será, nesse novo governo, os objetos de mudança. Apesar da ocorrência de “povo”, o discurso de Temer indica um maior acionamento de frames ligados à economia e, principalmente, aos empresários, como evidencia a representação em grafo do bloco.

Figura 22 – Temer: Mudança – Representação em grafo

Os trabalhadores aparecem por meio dos indexadores “trabalhadores” e “emprego”. Isso indica que a preocupação do presidente não é construir sentido para essa categoria, uma vez que são os empresários, principalmente, quem recebem mais atenção durante o pronunciamento.

“Parcerias público-privadas”, “empresários dos setores industriais”, “de serviços” e “do agronegócio”, além de “áreas produtivas”, ajudam a ativar um frame de maior complexidade do que o frame TRABALHADORES: o frame EMPRESÁRIOS.Por

isso,este framerecebe maior atenção, e, na “cabeça” do receptor do texto, os espaços mentais relacionados a esse modelo são preenchidos com mais informações a seu respeito.

Quanto aos frames descritores de evento, temos:

Figura 23 – Temer: Mudança – Dimensão de evento do frame

Fonte: Autoria própria (2018).

Na mesma ocorrência, empresários e trabalhadores são conclamados, após a “confiança” transmitida pelo governo, a retomarem os seus investimentos. Os empresários, de diversos setores, segundo o discurso, desacreditaram no país e pararam de investir. Isso é facilmente compreensível. No entanto, Temer traz “trabalhadores” a essa construção, mas não deixa claro que investimentos o trabalhador deixou de fazer durante a descrença no governo anterior. Talvez seja uma antecipação do seu outdoor que dizia “Não pense em crise. Trabalhe”. O papel do trabalhador na retomada da economia é, portanto, não pensar.

Claramente, o papel de “trabalhador” no discurso de Temer não é, como textualmente foi tentado colocar, igual ao papel do empresariado. No segundo discurso de Lula, por exemplo, vimos que a “agricultura familiar” foi um frame ativado ao se falar na mudança da economia. Na contramão dessa ideia, Temer, por sua vez, pede a confiança dos empresários “do agronegócio”. Há, de fato, uma disparidade no papel de empresários e trabalhadores durante a construção do sentido no discurso em questão.

Temer inicia o seu discurso se dirigindo ao povo brasileiro, no entanto, como se pode perceber, de acordo com os frames ativados neste bloco temático, não há representatividade. Evidentemente, esse é apenas o primeiro bloco temático analisado, e é possível adiantar que o povo, os trabalhadores, os não empresários aparecem em seu discurso.

A aparição de “parceria público-privada” e a valorização do segmento empresarial nesse discurso faz lembrar o papel de empresários e trabalhadores no discurso do primeiro mandato de FHC, quando aos empresários cabia “inovar” e aos trabalhadores cabia “enfrentar”. O papel dos empresários, para Temer, é o mesmo papel a eles atribuído por FHC. Tanto o pmdbista quanto o tucano, em seu primeiro discurso, legaram aos trabalhadores um papel secundário na recuperação da economia. Dilma e Lula, em ambos os discursos, deram mais importância aos trabalhadores.

Temer fala em fazer “um governo de salvação nacional”. Segundo o Houaiss (2007), salvação é:

substantivo feminino

1 ação ou efeito de salvar(-se), de libertar(-se)

2 pessoa ou coisa que salva (de perigo, situação difícil etc.) ‹a mulher foi su

a s.› ‹a moratória é a única s.›

3 passagem de uma situação difícil para outra confortável; triunfo, vitória, in

dependência

4 redenção, resgate, remissão.

Nesse sentido, Temer vai na direção oposta dos discursos de Lula e Dilma, em ambas as posses, pois considera que o rumo do Brasil não está certo. O pmdbista retrata o Brasil dentro de um CONTÊINER ao dizer que o país precisa sair “dessa crise

em que nos encontramos”. Neste bloco temático, o discurso promete “garantir a retomada do crescimento”. Essas construções indicam que, além do CONTÊINER, o

discurso recorre à dimensão imagética de ORIGEM-CAMINHO-META para embasar a

construção do sentido de Brasil.

“Resgatar a credibilidade do Brasil no concerto interno e externo” também é outro indicativo de que a mudança proposta por Temer só diz respeito às questões

econômicas. Ao menos, neste bloco, o presidente não traz ao discurso hubs que evidenciem questões sociais, mas, sim, elementos que retratam a economia33.

De acordo com as questões observadas, dentro da metáfora da contabilidade

moral, Temer, ao privilegiar a economia como bem-estar, indica um posicionamento

mais conservador, pelo incisivo aparecimento da Força moral, sobretudo pelo

Crescimento moral. A proteção, aqui, é a proteção da economia, não do povo, que

aparece pouco, e apenas como um coadjuvante no processo de mudança.