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Por mais de 322 anos (1500-1822), período em que o Brasil foi colônia de Portugal, a educação feminina ficou praticamente restrita aos cuidados com a casa, o marido e os filhos. Naquele período, a instrução era reservada aos filhos/homens dos indígenas e dos colonos. Esses últimos cuidavam dos negócios do pai, seguiam para a universidade de Coimbra ou tornavam-se padres jesuítas.

Quanto às mulheres, fossem brancas, ricas ou pobres, bem como as negras escravas e as indígenas, não tinham acesso à instrução. Sequer aprendiam a ler e a escrever durante o Brasil Colônia, já que resquícios da cultura árabe, oriundos da

metrópole, tratavam a mulher com menosprezo. É o que se vê na seguinte expressão: “O sexo feminino fazia parte do inbecitus sexus, ou sexo imbecil. Uma categoria à qual pertenciam mulheres, crianças e doentes mentais” (RIBEIRO, 2000, p. 79).

A mulher era tratada com muito menosprezo. Os homens não admitiam que ela se instruísse e chegaram até mesmo a contar com o apoio de intelectuais da época. Por exemplo, o festejado poeta português, Gonçalo Trancoso, muito lido pelos homens lusos entre 1560 e 1600, “[...] afirmava que a mulher não tinha necessidade de ler e escrever e, se possível, não deveria falar” (RIBEIRO, 2000, p. 79). Prossegue a autora citando o seguinte refrão atribuído ao aludido poeta: “[...] as moças não falem, nem alcem os olhos do chão quando forem pela rua e se ensinem a não tomar brio de virem a serem vistas, que a mim me parece muito bem” (p. 80).

Naquela época, era comum, nas casas de Portugal e do Brasil, ouvir-se o versinho: “Mulher que sabe muito é mulher atrapalhada, para ser mãe de família, saiba pouco ou saiba nada”.

As mulheres indígenas também não conseguiam ter acesso ao ensino, embora seus companheiros assim o quisessem. Tanto que a primeira reivindicação feminina no Brasil partiu dos indígenas brasileiros que foram ao Padre Manoel da Nóbrega pedir que ensinasse suas mulheres a ler e a escrever.

Em que pesem os esforços daquele religioso no sentido de atender às reivindicações dos silvícolas, a autorização foi negada pela Rainha de Portugal, dona Catarina, com o fundamento de que a iniciativa era ousada, devido às conseqüências nefastas, “[...] que o acesso das mulheres indígenas à cultura dos livros da época pudesse representar” (RIBEIRO, 2000, p. 81).

Curiosamente, o indígena brasileiro, ao contrário do branco, considerava a mulher uma companheira, não encontrando razão para as diferenças de oportunidades. “Não viam como os brancos os preveniam, o perigo que pudesse representar o fato de suas mulheres serem alfabetizadas” (RIBEIRO, 2000, p. 80).

Convém ressaltar que, no século XVI, na própria metrópole, não havia escolas para meninas. Educavam-se em casa as portuguesas, na sua maioria, eram analfabetas. Mesmo as mulheres que viviam na Corte possuíam pouca leitura, destinada apenas aos livros de reza.

Portanto poucas mulheres eram letradas. E, apesar da negação da metrópole, algumas indígenas conseguiram burlar as regras, por exemplo, Catarina Paraguassu (também conhecida como Madalena Caramuru), que teria sido a primeira brasileira que aprendeu a ler e escrever. Isso ocorreu exatamente numa época em que a educação letrada estava reservada ao sexo masculino e ficava sob a responsabilidade exclusiva dos padres da Companhia de Jesus.15

Contudo a primeira legislação relativa à educação feminina surgiu em 1827 e permitia apenas a criação de escolas elementares, somente de meninas. Porém, tais escolas deixavam a desejar, tanto pelo número insuficiente de estabelecimentos, como pela qualidade do ensino ministrado: os mestres só poderiam ser do sexo feminino e sabia-se que, em geral, as mulheres não tinham uma boa educação. Conclui-se que as professoras não tinham a instrução necessária e seus salários eram muito baixos.

Havia uma gritante diferença entre o ensino ministrado aos meninos e o destinado às meninas, o que era justificado pelas diferenças biológicas: dizia-se que o cérebro feminino era atrofiado e por isso as meninas eram menos inteligentes. Enquanto elas aprendiam a bordar, os meninos aprendiam geometria.

Na concepção da época, as mulheres deveriam ser mais educadas do que instruídas, por isso elas aprendiam a ser uma boa senhora: eram preparadas para o domínio do lar, para satisfazer seu esposo, ser-lhe agradável e ser também capaz

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A Companhia de Jesus (em latim, Societas Iesu, abreviadamente S. J.), cujos membros são

conhecidos como jesuítas, foi fundada em 1534 por um grupo de estudantes da Universidade de Paris, liderados pelo basco Íñigo López de Loyola (Santo Inácio de Loyola), é hoje conhecida, principalmente, por seu trabalho missionário e educacional. Os jesuítas foram fundados no seguimento da reforma Católica (também chamada Contra-Reforma), um movimento reacionário à Reforma Protestante, cujas doutrinas se tornavam cada vez mais conhecidas através da Europa, em parte graças à recente invenção da imprensa. Os jesuítas pregavam a obediência total às escrituras e à doutrina da Igreja. Também pregaram que as decorações e a ostentação, em geral, as cerimônias do Catolicismo (desprezadas pelos Luteranos) deviam ser acentuadas e abundantemente financiadas (SILVA, 2005).

de representá-lo socialmente. O enfoque da educação feminina sempre foi a formação moral-religiosa, pois era isso que sua função de núcleo da família lhe exigia.

A educação das mulheres deveria caracterizar-se como “[...] conformista, alienada dos problemas do mundo à sua volta, levando-as a não serem pensantes e criativas, segregadas; menosprezadas” (BELOTTI, 1987, p. 160), com vistas a reproduzir essa educação para seus filhos e alunos.

Com o passar do tempo, a educação feminina tomou novos rumos, para que se tornassem companheiras inteligentes e bem formadas do marido e, para tanto, deveriam falar e escrever bem, ter conhecimentos básicos de História, Geografia, Ciências Naturais, saber canto e tocar algum instrumento musical, elevando-se, de acordo com o consenso, à categoria de musa familiar.

Por seus dotes naturais de doçura, paciência, indulgência, compreensão e calma, a mulher passou, então, a ser vista como ideal para o exercício do Magistério. “O homem por ser mais autoritário causaria medo às crianças, portanto, não seria adequado para tal função” (FRANCO, 2001, p. 85). É interessante ressaltar que, no início do século XX, muitas mulheres ingressaram na carreira do Magistério.

Mesmo com o ingresso das mulheres no ensino superior, com amparo legal, a maioria dos homens cultos ainda defendiam que a energia das mulheres deveria ser totalmente devotada ao serviço de suas famílias. Os educadores brasileiros, em sua grande parte, consideravam a educação feminina uma preparação para a maternidade, expressando a crença de que, bem qualificadas, as mulheres poderiam educar melhor as crianças. Essa missão recaía, principalmente, no campo da moralidade, pois lhes cabia transmitir aos seus filhos princípios verdadeiros, as virtudes morais.

As defensoras da emancipação feminina acreditavam que, com uma educação melhor, as mulheres brasileiras poderiam garantir não apenas mais oportunidades de emprego, mais ainda boa remuneração pelo trabalho que executassem.

A posse de um título superior era uma condição fundamental para o ingresso no grupo de elite que dominava a vida política, durante o século XIX. Contudo, no Brasil, tradicionalmente, a educação superior destinava-se a preparar os rapazes para profissões de prestígio, especialmente Direito e Medicina. Poucas conexões existiam entre tal formação e o sistema da escola primária dirigido à massa da população, pois a maioria dos brasileiros permanecia analfabeta.

As mulheres da classe superior que desejavam se tornar médicas encontravam a oposição dos de sua classe. Obstáculos enfrentados por elas para o ingresso nessa profissão foram maiores do que em campos de menor especialização e prestígio, como a Enfermagem e a Educação.

As pioneiras em Medicina no Brasil encontraram agressividade e menosprezo. Tem- se conhecimento de que, em algumas matérias, por exemplo, Anatomia, elas eram dispensadas, pois, naquela época, só existiam professores do sexo masculino nas escolas de Medicina, tornando-se inviável a presença de mulheres nessa disciplina.

Se, por um lado, as profissões de professoras, enfermeiras e, principalmente, médicas já eram criticadas, a maioria absoluta dos homens considerava muito mais absurda a perturbadora a existência de advogadas e políticas. As primeiras mulheres graduadas em Direito formaram-se no final do século XIX e encontraram grandes dificuldades para exercer a profissão.

4.6 A VINDA DA FAMÍLIA REAL PARA O BRASIL E AS TRANSFORMAÇÕES NA

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