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SUBJETIVIDADES E TRAJETÓRIAS A PARTIR DA TERRITORIALIDADE

1.1. Mulheres construindo e negociando as culturas populares

A construção do popular em um movimento com trabalhadoras e trabalhadores, que são maioria da população, possui formas diferenciadas de apresentação de si e seu cotidiano, em referências e construções. A vista disso a industrialização foi um dos avanços do capital,

e como Hall (2003) e Martín-Barbero (2008) apresentam, como ideia de generalizar essa população, surgiu o termo massas com o intuito de homogeneizar as identidades através da linguagem e narrativas. No entanto, existem múltiplas identidades e formações culturais para esse grupo, que subalternizado, negociam os sentidos nas narrativas hegemônicas a partir de suas vivências. Essa negociação de sentido a partir da linguagem proporciona o compartilhamento de posicionamentos diferentes que constrói a possibilidade plural dos significados diante das leituras preferenciais, assim entendemos as culturas em pluralidade. A vivência diária e as referências, permite que o sentido atravesse o significado, construindo as subjetividades do indivíduo, uma vez que na rotina o momento televisivo que corrobora para a construção.

Martín-Barbero (2008) aponta em como as mediações foram construídas através da cultura de massa e como foi apresentada para a sociedade, considerando a burguesia sendo dominante, negociava o popular e como a arte opera na vida das pessoas. A arte sensibiliza e causa uma sensação de autorreconhecimento com o inconsciente, assim aproxima a narrativa abordada. Nas telenovelas, que é sobre o cotidiano, apresenta tramas envolventes que negociam os padrões de consumo da vida, de comportamentos, entre outros. Em um vasto alcance elas dialogavam com quem assistia, provocando uma consciência coletiva homogeneizada. Entendendo que esse consumo em sua maioria é da classe trabalhadora, a mídia com suas narrativas reforça a homogeneidade do diálogo com os setores dominantes da sociedade.

Em segundo lugar, a ambiguidade da sua ideia de “cultura popular”. Se os românticos resgatam a atividade do povo na cultura, no mesmo movimento em que esse fazer cultural é reconhecido, se produz seu sequestro: a originalidade da cultura popular residiria essencialmente em sua autonomia, na ausência de contaminação e de comércio com a cultura oficial, hegemônica. E, ao negar a circulação cultural, o realmente negado é o processo histórico de formação do

popular e o sentido social das diferenças culturais: a exclusão, a cumplicidade, a

dominação e a impugnação. (MARTÍN-BARBERO, 2008, p. 40.)

Há resistências da cultura popular a partir da transmissão oral de saberes e conhecimentos, que desconsiderada pela classe dominante, atravessa as relações sociais da população. As mulheres eram protagonistas desse processo de transmissão, por vezes, consideradas bruxas chegando a serem queimadas. Martín-Barbero (2008, p. 139) acrescenta que “[…]eram as mulheres que presidiam as vigílias, as reuniões das comunidades aldeãs ao cair da tarde, nas quais se conservavam alguns modos tradicionais de transmissão cultural[...]”, essas mulheres em contato com a população mais pobre levavam informações

de medicina, plantas e os astros, uma vez que melhorava a vivência entre as pessoas em saúde, conhecimento e qualidade de vida. Era a circulação de expressividade da consciência popular.

Hall (2008, p. 232) afirma que “[…] a cultura popular não é, um sentido “puro”, nem as tradições populares de resistência a esses processos, nem as formas que as sobrepõem. É o terreno sobre o qual as transformações são operadas […]”. As mulheres estiveram e estão nesses processos de resistência dos saberes, na qual o terreno das transformações se manifestam através do processo educativo, como aplicam e assimilam esses conhecimentos. Uma vez que é visto a associação desses conhecimentos apreendidos durante as trajetórias, há uma negociação com a linguagem que as circundam.

A cultura através das experiências e vivências em sociedade é considerar à interação do conhecimento com a regionalidade analisando-a na “[…] tentativa de descobrir a natureza da organização que forma o complexo desses relacionamentos[…]” que “[…]começa na descoberta de padrões característicos […]”. (HALL, 2003, p. 128). Esses padrões são repassados e nos leva a compreender o conhecimento e saberes a partir das inter-relações. Abordando essa construção social atravessada entre as colaboradoras as experiências, Iza apresenta a garrafada15 e explica que são remédios naturais que a ajudam na imunidade, Francinete em uma conversa com a vizinha aprende os efeitos do limão e o que acrescenta em sua rotina, utilizando o conhecimento ao seu favor.

Iza comenta que tem uma garrafada de casca de Jatobá com vinho branco que aumenta a imunidade. Diário de Campo, dia 4, 03/05/2019.

Iza me encontrou no portão, eu levei o vinho que havíamos combinado para a garrafada de Jatobá, para aumentar a imunidade, a gente fez juntas, ela me mostrou as cascas, e a quantidade que era de cada coisa, que ia colocando mesmo, sem muito segredo. Foi falando que toma todo dia, uma vez por dia, e que além do vinho, tem melhorado muito seu corpo e como ela percebe tudo. Diário de Campo, dia 6, 17/05/2019

Francinete comenta: “Eu estou me acabando de comer limão, por que quero emagrecer, tem um avô da vizinha que foi no médico, e disse que tinha que emagrecer, ai ele toma suco de limão ‘purim’, sem nada de açúcar, num (sic) é que a barriga dele já baixou bastante? Eu to me acabando no limão, quando acaba vou lá compro mais, num fico sem nem!” Diário de Campo, dia 0, 22/03/2018

As práticas sociais são experiências e vivências que perpassam em conjunto com a comunidade, que no caso supracitado é a vizinhança, tendo em vista que a referência de significados acontece diante do compartilhamento de histórias e preocupações, fortalecendo

15 Garrafada é um remédio natural típico da região, em que tem um efeito homeopático na mistura de raízes,

planas e folhas, com bebida alcoólica, em uma solução que altamente comercializada e representante da cultura brasileira. Disponível em <https://scielosp.org/article/sdeb/2018.v42n116/248-262/> Acesso em: 31/07/2019.

uma rede entre elas. Redes de conhecimento são repassadas a fim de melhorar a saúde, prevenção de doenças e de cuidado. Compõe uma vida compartilhada, um atendimento que fortalece o vínculo das relações entre elas desde o território.

Os artistas populares retratavam suas histórias e trajetórias através do cordel que eram produzidos em pequena escala e distribuídos, o que diferenciava dos folhetins entre outras características, apresentavam a relação cotidiana através da leitura em uma linguagem coloquial. Por conseguinte, a narrativa ficcional das telenovelas através das experiências e práticas cotidianas se enquadra nas vivências não ficcional, mesmo que o pensamento patriarcal perpassa e hierarquiza os processos econômicos até as relações sociais, sendo referência para a construção de sentidos. A cultura em sua abordagem popular se faz resistência tanto em linguagem como em representação, em suas bases radiofônicas, as telenovelas retratam a vivência das pessoas nos movimentos das relações sociais, de uma maneira consciente sobre as experiências daquelas que ali estão e também uma manifestação oral, possibilitando um maior alcance da obra.

Dessa forma, a entrada do audiovisual e os discurso e linguagensatravés da indústria cultural, possibilitou outros tipos de acesso. Adiante, a xilografia será uma das formas de reprodução de imagens, inclusive utilizados pelas igrejas, tanto católica como na reforma protestante. Sendo então uma leitura que faz parte do dia a dia das pessoas, sendo consumida dessa forma como já era tratado nos folhetins. Através da mídia a indústria cultural regula comportamentos sociais viabilizando consciências coletivas a partir dos gostos e vontades individuais.

Entre os gêneros narrativos, as telenovelas são produzidas através dos territórios ficcionais, que segundo Borelli (2001) estabelece um paralelo da narrativa com a matriz cultural estabelecendo uma proximidade da ficção e a não-ficção.

Recompor, portanto, a história das telenovelas no Brasil, sob a ótica dos territórios de ficcionalidade, supõe considerar este processo de elaboração e entrecruzamento de traços das matrizes culturais originárias. [...] Os territórios de ficcionalidade são fundamentais no processo de construção das mediações e ampliam o leque de conexões e alternativas de constituição do diálogo entre produção, produtos e receptores. (BORELLI, 2001, p. 34)

Logo há uma criação de pertencimento daquelas histórias contadas e mediadas através do lugar, abordando nas histórias o cotidiano. Sutilmente estratégico os folhetins representavam um gosto em comum encobrindo as diferenças e reconciliando gostos, portanto as mulheres que consomem essas leituras se constituem do que lhes é apresentado em seus comportamentos, ou no mínimo, reafirma a moral social.

Existe nos folhetins uma pintura da condição feminina (grifo do autor) que mostra um quadro bem diferente do bovarismo. Além de divórcios e adultérios, há incestos e abortos, mães solteiras e operárias seduzidas por patrões, dos quais se vigam cruel e fatalmente. Existe moralismo, mas também ligação entre a repressão sexual e as condições sociais de vida. (MARTÍN-BARBERO, 2008, p 192.)

Tendo em vista que a telenovela e os folhetins têm a mesma matriz cultural com uma narrativa sobre o cotidiano, o diálogo com o público aproxima e com o entendimento fácil e rápido, a formatação, como a divisão em capítulos é um dos elementos de convergência. Assim, é percebido que o acompanhamento da trama se dá de maneiras diferentes e não há necessidade de assistir todos os dias para entender a trama.

Nós habitamos os tempos da multiplicidade de telas, o negócio de formato, a lógica das outras emoções, o surto de narrativas audiovisuais, a multiplicação da estética, a diversidade de sensibilidades /identidades. Tempos em que todos podem fazer a televisão como quiser. O significativo é o próximo, o vital, o emocional, o não planejado. A verdade está em outro lugar, que não é Oeste, nem masculino, mas de outras culturas. […] Diversidade audiovisual feita de histeria, repetições, fragmentos, “espontaneidade”. As telas audiovisuais gritam mais e mais e tornam a vida entretenimento infinito; a celebração das temporalidades alegres e de culturas sentimentais. Uma narrativa televisiva que documenta uma atitude histérico [sempre sendo hiperativo; sempre na câmera, excitado]; uma estética de repetição [variações do mesmo para prazer relaxado]; uma narrativa fragmentada [cria ilusões de continuidade com base em situações autônomas]; um estilo cotidiano [faça como se tudo fosse vivo e espontâneo e espectador estava certo]. (RINCÓN, 2011, p. 44, tradução nossa.)16

Como um compromisso adiável, a telenovela não é o centro de atividade para nenhuma das colaboradoras. Tendo em vista que houve dias que apesar de ter marcado para assistir, elas desmarcaram, pois tiveram compromissos diferenciados como Francinete que levou as filhas na Igreja para ensaiar uma apresentação, Mariza que foi com o namorado para um jogo de futebol e Iza que viajou com as filhas. Dessa forma o acompanhamento da novela se dá por outras formas como o acompanhamento de resumos e as conversas com outras pessoas que assistem.

Trazemos o popular, em contrapartida do erudito, uma vez que a telenovela é aberta, e tem fácil acesso, ela por muito tempo não foi considerada um produto cultural, como

16Habitamos los tiempos de la multiplicidad de pantallas, el negocio de los formatos, las lógicas de otras

emociones, el estallido de las narrativas audiovisuales, la multiplicación de las estéticas, la diversidad de sensibilidades/ identidades. Tiempos donde cada uno puede hacer la televisión como se le dé la gana. Lo significativo es lo cercano, lo vital, lo emocional, lo imprevisto. La verdad está en otra parte, una que no es Occidente, ni masculina, sino de culturas otras. […] Diversidad audiovisual hecha de histerias, repeticiones, fragmentos, espontaneísmos. Las pantallas audiovisuales gritan cada vez más y hacen de la vida un entretenimiento infinito; la celebración de las temporalidades gozosas y de las culturas sentimentales. Una narración televisiva que documenta una actitud histérica [siempre andar sobreactuado; siempre en cámara, excitados]; una estética de la repetición [variaciones sobre lo mismo para el goce relajado]; una narración fragmentada [crear ilusiones de continuidad con base situaciones autónomas]; un estilo cotidiano [hacer como si todo fuera en directo y espontáneo y el televidente tuviera la razón].

considera Borelli (2001, p. 30) “No Brasil, isso ocorre a partir de meados dos anos 60, quando se observa uma cisão que segmentou o campo cultural em três fragmentos polarizados e excludentes: o culto, o de massa e o popular”. O que vai mudando na década de 70 e 80, se inicia uma forte abertura de investimento do Estado ampliando as vendas de televisão em que muda o cenário aumentado a produção e a qualidade das telenovelas. Vai mudando também a abordagem, trazendo mais o cotidiano e a contextualização com a realidade brasileira.

O território de ficcionalidade aborda os vários formatos produzidos que a indústria cultural combina com o cotidiano. Essa abertura aumenta a possibilidade de narrativa, na qual as mediações se ampliam, enxertando mais elementos para serem referenciados.

[…]da valorização da vida privada, do cotidiano, em que instâncias da intimidade e da moral parecem cada vez mais centrais como reguladora da vida social, constituindo-se no palco privilegiado para uma pedagogia moralizante necessária às novas relações sociais e políticas de uma sociedade laica e de mercado. (BALTAR, 2007, p.87)

Se atravessa a moralidade nas relações sociais, com cumplicidade aos estigmas valorativos trazendo às discussões e representações construídas ficticiamente dialogando com a narrativa do cotidiano. A representação se aproxima da vivência e experiências, negociando os valores no processo cultural, permeando o núcleo familiar que consiste na construção de sentidos dentro do espaço e quem circula nesse núcleo. Hall (2016, p. 32) delineia que a representação “[…]diz respeito à produção de sentido pela linguagem[…]”, construindo de significados diante da identidade e subjetividade. O autor discute que “[…] representar algo é descrevê-lo, trazê-lo à tona na mente por meio da descrição, modelo ou imaginação; produzir semelhança de algo na nossa mente ou em nossos sentidos[…]”, assim o sentido expressa um pensamento e o comunica. E afirma que “[…]representar também significa simbolizar alguma coisa, pôr-se no seu lugar ou dela ser uma amostra ou um substituto[…]”. Por vezes a representação midiática traz símbolos a serem interpretados e no caso das mulheres, principalmente as mulheres negras não condiz efetivamente com a construção das identidades em suas potencialidades, realidades e vivências, no espelho da falsa democracia racial, evidenciando o racismo institucionalizado. Sobre o antirracismo e racismo no Brasil, Antônio Sérgio Alfredo Guimarães (1995, p. 26) introduz “Qualquer estudo sobre o racismo no Brasil deve começar por notar que o racismo no Brasil é um tabu. De fato, os brasileiros se imaginam numa democracia racial”.

Assim o processo de formação da sociedade brasileira foi através da hierarquização, o que nos trouxe profundas fissuras raciais, classistas e de gênero, em virtude disso a arte popular foi diferenciada a partir das classes sociais categorizadas no processo artístico da vivência, sobretudo a relação com as experiências de vida delineando arte à ser consumida. A luta contra o pensamento único acha assim um lugar estratégico não só pelo politeísmo nômade e decentralizador que mobiliza a reflexão de investigação sobre as mediações históricas do comunicar, mas também nas transformações que atravessam os mediadores socioculturais, tanto em suas figuras institucionais – a escola, a família, a igreja, o bairro - , como nos novos atores e movimentos sociais emergentes que, como as organizações ecológicas ou direitos humanos, os movimentos étnicos ou de gênero, introduzem novos sentidos do social e novos

usos sociais dos meios. (MARTÍN- BARBERO, 2008, p. 20)

Ao falarmos de consumo é importante diferenciarmos o consumo do produto cultural, na qual é um consumo que não se esgota. Ao citarmos que a cultura é imaterial, na qual há uma circulação de referências e de produtos culturais a serem consumidos, quando elas são peculiares a cada vivencia e as experiências diante das trajetórias de vida. A partir de cada vivencia é possível ter sentidos e novas criações de pensamentos, partindo da premissa que essa produção – a do pensar – não se esgota em um único pensamento.

Dessa forma representar o cotidiano e as trajetórias como a arte urbana, são pontos de resistência que alimenta um aspecto político. Através de Adorno e Benjamin, revisitado por Martín-Barbero (2008, p. 84) abordam uma nova percepção da arte que consideram as experiências coletivas, a cotidianidade na perspectiva de sensibilizar e valorizar a cultura, a narrativa que aproxima às massas é mobilizada e transpassada pela classe, de entendimento da cultura popular.

Massa designa, no movimento da mudança, o modo como as classes populares

vivem as novas condições de existência; tanto no que elas têm de opressão quanto no que as novas relações contêm de demanda e aspirações de democratização social. E de massa será a chamada cultura popular. Isto porque no momento em que a cultura popular tender a converter-se em cultura de classe, será ela mesma minada por dentro, transformando-se em cultura de massa. Sabemos que essa inversão vinha sendo gerada há muito tempo, mas ela não podia tornar-se efetiva senão quando, ao se transformarem as massas em classe, a cultura mudou de profissão e se converteu em espaço estratégico da hegemonia, passando a mediar, isto é, encobrir as diferenças e reconciliar os gostos. Os dispositivos da mediação de massa acham-se assim ligados estruturalmente aos movimentos no âmbito da

legitimidade que articula a cultura: uma sociabilidade que realiza a abstração da

forma mercantil na materialidade tecnológica da fábrica e do jornal, e uma mediação que encobre o conflito entre as classes produzindo sua resolução no

imaginário, assegurando assim o consentimento ativo dos dominados. Essa

mediação e esse consentimento, no entanto, só foram historicamente possíveis na medida em que a cultura de massa foi constituída acionando e deformando ao mesmo tempo sinais de identidade da antiga cultura popular e integrando ao mercado as novas demandas das massas. (MARTÍN- BARBERO, 2008, p. 174)

Há um movimento da cultura popular que divide gostos através das classes sociais, no processo de expansão da indústria cultural o popular tornou-se erudito, nomeando como cultura de massa. A trajetória social e a vivência em articulação do crescimento político nas relações de classe são reafirmadas pela narrativa, portanto, há resistência no entendimento enquanto sujeito social em que essa classe colocada como massa, vem desconstruindo as características singulares das identidades populares em consonância com um movimento hegemônico. A linguagem mediada pelas experiências dos sujeitos negociando os sentidos hierarquizando e subalternizando essa construção.

Em uma narrativa homogeneizadora, a cultura de massa foi realocada pela indústria cultural gerando significados e mecanismos referentes para fidelizar esse consumo. Transpondo para a telenovela, foi possível um controle de qualidade a partir da década de 70 e 80, em que a produção trazia “um padrão de qualidade” (BORELLI, 2001). Isso fez com que essa linguagem padronizada fosse imbricada na rotina familiar, influenciando diretamente na construção das identidades de quem as consumia.

Hall (2006) aponta ainda que a identidade acompanha a construção da modernidade, com mudanças rápidas que causam a “crise da identidade”. Isso faz com que as referências de pertencimento das pessoas sejam cíclicas com mudanças rápidas, ou seja a partir das vivências cria-se várias identidades. As identidades revisitadas são de mulheres, negras, trabalhadoras, mães, filhas, entre outras que seria impossível narrar, pois há pluralidade nas identificações. Sobretudo para a construção dessas múltiplas identidades acontece a mudança, que referenciam essas mulheres nos comportamentos em suas vivências mesmo em deslocamento. Os deslocamentos são processos que as fazem referenciar ideias e padrões e a televisão realiza isso com perspicácia.

Pensando a partir das telenovelas e os personagens femininos, por exemplo, na década de noventa as mulheres deixaram de ser apenas donas de casa e passaram a executar trabalhos também fora de casa. Uma vez que a representação midiática desse retrato sobre as mulheres negras é da vida marcadas pelo trabalho, reafirmando-as. As identidades perpassam o padrão referenciando comportamentos, padrões de beleza, uma vez que o consumo antecede o processo de recepção. Borelli (2001, p. 34) aborda que recepção “[...]prevê que os leitores/espectadores possam se situar como sujeitos ativos, constitutivos e constituintes, dos processos de comunicação[...]”

Francinete comenta que em novela, por mais pobre que seja, os personagens e as famílias tem a mesa completa e bonita, com frutas e ainda que todo mundo come na mesa, independente se pobre ou rico. Diário de Campo, dia 4, 04/05/2018.

Sobre representação de classe Francinete interpela a diferença dos pobres da televisão, em que eles sempre sentam na mesa e que na vivência dela isso não acontece e acrescenta que muitos nem tem mesa, inclusive ela que em vários momentos afirma estar providenciando a dela. Dandara uma mulher negra que defende seu trabalho é uma personagem que Iza aprova com admiração, assim como na novela das seis, no último capítulo de Espelho da Vida17, Iza considera que a vida deve ser vivida, fazendo o bem e aceitando as coisas como são. Depois ela traz de novo essa discussão e afirma que conscientemente devemos lidar com quem somos e nossas emoções, em negociação com sua trajetória.

Então passou a morte de Margot (Irene Ravache) e ela saindo do corpo com o marido e o filho vindo buscar ela. Iza comenta Margot já era! O final é uma grande reflexão, afirma Iza que concorda que temos de seguir a vida como ela é, prestar atenção na realidade e principalmente ser feliz. Diário de Campo, dia 1,