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3 DO CAMPO PARA A CIDADE E DE VOLTA PARA O CAMPO: SURUBIM E A

3.4 O MUNICÍPIO DE SURUBIM NO POLO

Surubim é tido por Lira (2011) como o quarto município de maior produtividade do Polo. Segundo dados do SEBRAE (2013), a estimativa para o ano de 2012 era que existissem 453 unidades produtivas37, representando 2,4% do total dos 10 municípios analisados.38 Em contraste com outros municípios, Surubim aparece em sexto atrás de Santa Cruz do Capibaribe, Caruaru, Toritama, Brejo da Madre de Deus e Taquaritinga do Norte.

Entretanto, essas duas informações não se contradizem. Há que se considerar ainda outros fatores como o volume de produção de peças. Sem falar que essa estimativa é limitada pelo grande número de empreendimentos informais que existem tanto nas áreas urbanas como rurais. Contudo, pode-se sugerir uma forte participação do município de Surubim no Polo.

Como afirmei anteriormente, os três principais municípios do Polo – Santa Cruz do Capibaribe, Caruaru e Toritama – concentram a maior parte da produção de confecções das

37 Unidades produtivas é entendido por este relatório do Sebrae como empresas + empreendimentos complementares (facções).

38 São eles: Agrestina, Brejo da Madre de Deus, Caruaru, Cupira, Riacho das Almas, Santa Cruz do Capibaribe, Surubim, Taquaritinga do Norte, Toritama e Vertentes.

cidades e dos grandes espaços de comercialização como as feiras e os shoppings atacadistas de confecções39. Para os demais, resta a sua vinculação a esses centros comerciais ou a possibilidade de que cada ator poder negociar diretamente com um comprador de fora da área de abrangência do Polo. É o caso da família de Vicente e Juliana, residentes no Jucá Ferrado. Atualmente a família se especializou na atividade das confecções, não mais exercendo alguma atividade agrícola paralela. Sua produção, localiza-se no interior da casa, é voltada para a confecção de shorts e saias, sendo que no passado produziram calças e camisas. Além deles, trabalham mais uma pessoa da família e subcontratam mais três. Para a comercialização, essa família recorre ao Moda Center e ao Calçadão em Santa Cruz do Capibaribe onde vendem diretamente a mercadoria e também vendem sob encomenda para pessoas de outros estados. Até a produção cair em função da crise, como eles relatam, compradores de Goiás, Minas Gerais, Fortaleza e Bahia encomendavam sua produção. O interessante no caso dessa família é que a produção sob encomenda oferece uma garantia maior do que as vendas em Santa Cruz ou, como expressaram, o pinga na feira. As vendas nas feiras dependem do interesse de compradores em um ambiente cercado de concorrentes o que faz com que se pensem estratégias de venda regulares como a adequação às tendências da moda. Como relata Vicente, “a encomenda é o que garantirá o ganho40”.

A mobilidade intermunicipal é outra característica dessa divisão territorial do trabalho, para usar uma expressão de Lira (2011) ao se referir ao território das confecções. De fato, para além das pessoas que circulam nos centros comerciais com o objetivo de vender suas mercadorias, um grande contingente se desloca para trabalhar nas diversas atividades na confecção, na condição de migrantes sazonais como os que se fixam nesses municípios. De acordo com Fusco & Vasconcelos (2010), trabalhando com dados do Censo de 2000, em Toritama, quase 40% dos residentes que trabalham nas confecções eram migrantes. Acrescente- se a isso um número significativo de migrantes pendulares que trabalham em Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe e Toritama mas moram em cidades e zonas rurais de municípios vizinhos. Esses dados ajudam a enriquecer a caracterização do trabalho na confecção em Surubim. Se é possível apontar que nesse município, como informa os dados apresentados pelo SEBRAE

39 O Moda Center Santa Cruz é considerado o maior centro atacadista de confecções do Brasil, reunindo mais de 10 mil pontos comerciais entre lojas e boxes, de acordo com o site do mesmo <<<www.modacentersantacruz.com.br>>>

40 Importante notar nessa fala o uso da categoria ganho. Sigaud (1979), ao analisar a percepção dos salários entre os trabalhadores rurais, nota que ganho constitui uma forma de remuneração distinta do salário uma vez que este expressa uma forma diferente de relação de trabalho. O que vale destacar é a manutenção dessa categoria para explicar relações comerciais de outra ordem, agora relacionado ao trabalho faccionado.

(2013), havia 3.184 pessoas ocupadas nas unidades produtivas, tem-se que lembrar que um número significativo exerce o trabalho sazonal diário e semanal, ampliando a presença da mão de obra nessa atividade da confecção. Segundo Lira (2011), tanto Santa Cruz do Capibaribe como Toritama têm malha de influência ao leste do seu território, fazendo se inter-relacionar via subcontratação – e acrescentaria as migrações laborais – com os municípios de Taquaritinga do Norte, Vertentes, Frei Miguelino, Santa Maria do Cambucá e Surubim41.

Apesar de se diferenciar dos municípios que formam o núcleo desse aglomerado, em especial no que diz a sua localização na divisão regional do trabalho, Surubim tem procurado meios que possibilitem maior protagonismo junto ao Polo. Isso se apresenta na preocupação de entidades locais com a qualificação de mão de obra, o que tem feito com que a administração municipal invista em cursos de costura industrial – como será visto com mais detalhes nos próximos dois capítulos. Também o SENAI de Santa Cruz do Capibaribe, o SEBRAE e a ACIASSUR já organizaram um curso de aperfeiçoamento profissional. Por fim, a Escola Técnica Estadual da cidade oferece modalidades de cursos como o técnico em vestuário. Importante frisar que com o acesso às universidades e faculdades na região, muitos, em especial os mais jovens, podem ter acesso a cursos que possibilitam uma inserção qualificada no mercado de trabalho vinculado ao Polo como administração e design de moda. Outro ponto a destacar é a presença de empresas de grande porte em Surubim como é o caso da Rudá, voltada para a produção de jeans feminino e que vende para vários estados do país. Esse maior protagonismo tem feito com que o município integre a Rodada de Negociação da Moda de Pernambucana, por meio das empresas do município e tendo a ACIASUR como um dos apoiadores desse espaço. Como uma ação das associações empresariais da região, a Rodada tem permitido uma apresentação da produção local para compradores de vários lugares do país e também do exterior movimentando R$ 289 milhões em negócios durante os eventos nesses 12 anos de sua existência42.

Surubim, assim como os outros municípios que formam o núcleo desse aglomerado – e mais especificamente Santa Cruz do Capibaribe onde surgiu a Sulanca – se caracterizou historicamente pela forte presença da atividade agropecuária na sua economia. A produção da cotonicultura, por exemplo, mobilizou dos pequenos produtores aos grandes fazendeiros que se tornaram uma oligarquia algodoeira que exerceram por muito tempo influência na política local.

41 A autora não nega que a área de influência desses municípios tende a ser maior abarcando municípios da Zona da Mata Pernambucana e da paraíba.

Durante o seu auge, a indústria de beneficiamento de algodão possibilitou uma maior circulação de dinheiro no local e com o seu destaque regional, transformou-se em área de convergência e polo de várias atividades administrativas coordenadas pelo governo estadual (Medeiros, 2007). A cidade, então, destacou-se na produção dessa cultura e mais tarde a partir dos anos de 1970 quando o Agreste setentrional apresentará a maior densidade bovina de Pernambuco, Surubim, junto com Limoeiro, despontarão como os maiores criadores da área (Banco do Nordeste do Brasil, 1975). Do ponto de vista das políticas de fortalecimento das atividades agrícolas, desde o ano de 1929 o município contava com uma área destinada aos experimentos agrícolas, com maior atenção para o algodão: era a chamada Estação Experimental ou Campo de Sementeira que empregou um importante corpo técnico e mobilizou mão de obra das localidades circunvizinhas à sua sede. Como lembra Medeiros (2007), já sob o controle EMBRAPA a Estação Experimental foi perdendo espaço até encerrar por completo as suas atividades, o que ocorre no início dos anos de 1990.

Além das iniciativas do Estado para o fortalecimento das atividades agrícolas, as organizações dos trabalhadores rurais e entidades relacionadas possibilitaram um ponto de apoio a resistência e fortalecimento desses atores43. Da parte do STR, que começa a se organizar a partir da década de 1960, há um empenho em garantir a defesa dos direitos desses o que ocorre muitas vezes sob conflitos, como o que aconteceu nas fazendas Parquevira, Caiana e Caiçara e, ainda na década de 1970, em Tabu onde camponeses resistiram a expulsão das terras por parte dos grandes proprietários (Abreu e Lima, 2012). No Tabu haveria uma das primeiras desapropriações para a reforma agrária do estado.

43 Segundo me relatou Abdalaziz de Moura, fundador do SERTA (entidade voltada para formar jovens, educadores e produtores rurais com o foco no campo), em visita do LAE-Rural a unidade de Glória de Goitá (PE) da entidade em 2016, as origens desta remontam a uma série de intervenções em algumas comunidades rurais em Surubim, em especial as do Tabu e Lagoa do Capim, na década de 1980.

Imagem 3 – Estação Experimental em 1963 na época da silagem

Fonte: acervo de João Barbosa Neto disponível no site http://minharuatemmemoria.ning.com.

Imagem 4 – rua João Batista durante dia de feira (final da década de 1990)

Trata-se da parte da feira dedicada ao comércio de tecidos que no passado era conhecida como Feira do Loré. Fonte: foto tirada por Edvaldo Clemente disponível em http://minharuatemmemoria.ning.com.

A feira na cidade44, em sua diversidade interna, tem desde muito tempo uma área dedicada ao comércio de tecidos. No passado, a chamada Feira do Loré, voltava-se para a venda de retalhos de tecidos. Hoje, vende uma variedade de produtos, incluindo peças das confecções. O caso da Feira do Loré é interessante porque se assemelha à história de Santa Cruz do Capibaribe onde o comércio de retalhos de tecidos está na origem da Sulanca. Esse dado possibilita estabelecer algumas aproximações entre as práticas comerciais dos pequenos produtores nessa região do Nordeste e com isso compreender os diversos desdobramentos que podem ter.

Com esses breves dados históricos, quero apenas pontuar que em Surubim houve outras formas de alternativa para quem trabalha no campo, fora o peso que as atividades agropecuárias exerceram ali por um longo tempo. Com isso, pode-se entender porque a incorporação deste município à dinâmica do Polo se dá em um ritmo próprio, e como a expansão do trabalho das confecções nas áreas rurais vai encontrar entidades de representação dos trabalhadores do campo.

3.5 ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO TRABALHO NA CONFECÇÃO NAS ÁREAS