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A NÁLISE DOS M ECANISMOS DE T RANSPORTE

2.3. E STRUTURA I NTERNA DO B ETÃO

2.4.4. A NÁLISE DOS M ECANISMOS DE T RANSPORTE

O sistema em equilíbrio quando sofre uma alteração, resultante das condições exteriores ou até internas, leva a que o sistema reaja na tentativa de restabelecer novamente o equilíbrio. Os três mecanismos apresentados permitem interpretar a generalidade dos processos de movimentação através da estrutura do betão; contudo, a modelização da acção é bastante mais complexa do que a simples distinção entre eles.

De acordo com Neville (1995), a actuação de cada mecanismo não ocorre de forma independente e dissociada dos restantes, levando a que se estabeleça uma interacção destes processos de movimentação, conduzindo a sistemas de movimentação peculiares. Esta acção conjunta será influenciada pelas características do betão, pelas condições definidas pela ambiência, assim como pelo “peso” na acção de interacção dos mecanismos (elementares) (Hearn et al., 2006).

A estipulação dos processos de avaliação é bastante complexa e relativa, pois aos factores antes referidos, acrescenta-se que dentro da estrutura do betão também é possível uma contínua mudança estrutural e de concentração, podendo resultar numa interacção distinta entre estes mecanismos ao longo do tempo. As alterações das condições exteriores (temperatura, pressão e gradiente químico) podem conduzir à alteração dos fluxos adquiridos, assim como mudar o tipo de processo estabelecido (Rose, 1965 e Hearn et al., 2006).

Outras acções exteriores, tais como o vento, a chuva e a gravidade, por muito insignificantes que se apresentem, podem ser também um factor de alteração durante a movimentação de partículas.

A complexa coordenação dos mecanismos levou a que se começasse também a estudar a sua acção de modo combinado, ou seja, com os vários mecanismos em simultâneo. Esta abordagem, apesar de não contrariar os modelos simplistas de caracterização expostos inicialmente, consegue ligar-se mais directamente às condições reais e fornecer, teoricamente, uma avaliação mais aproximada e consequentemente mais fidedigna. Hearn et al. (2001), através da interligação destas acções elementares, apresentaram cinco mecanismos de transporte no betão, sendo eles:

 1. Adsorção;

 2. Difusão de vapor;

 3. Transferência por filme;

 4. Fluxo de líquido sob condições de saturação;

 5. Difusão iónica sob condições de saturação.

Para além da diferença de actuação de mecanismo, a sua caracterização global tem como elemento base as humidades relativas existentes (do ar exterior). É assim possível balizar estes fluxos de partículas em 3 estádios que serão descritos de seguida.

1º Estádio:

Para uma humidade relativa (HR) próxima de zero, nenhuma fonte externa de água será adsorvida inicialmente sobre as superfícies altamente hidrofílicas dos produtos de hidratação do cimento. De acordo com a teoria BET (denominação resultante das iniciais dos nomes Brunauer, Emmet e Teller), com 11% de HR, em todas as superfícies de hidratos, verifica-se já a existência de uma monocamada de moléculas de água (Feldman, 1989).

Com o aumento da humidade relativa do ar, a energia de adsorção superficial vai diminuindo, pois as moléculas de água de camadas posteriores encontram-se mais longe da superfície dos produtos de hidratação (Peer, 1990).

A adsorção é de extrema importância mesmo a baixas humidades, pois age como a força motriz ao longo dos poros, transmitindo o fluxo à frente do menisco de maior humidade relativa, iniciando assim o fluxo num poro seco. Este processo encontra-se esquematizado na Fig. 2.4.

Para Humidades abaixo dos 40% a 45%, é adsorvida uma fina película de moléculas de água sobre as superfícies dos poros (Fig. 2.4), no entanto o menisco capilar não poderá ser sustentado dentro dos poros (Mills, 1985).

De acordo com o esquema anterior compreende-se que a movimentação das partículas é controlada através dos mecanismos de adsorção e difusão de vapor (Hearn et al., 2006).

2º Estádio:

Estabelece-se um comportamento diferente quando a humidade relativa supera os 40 a 45%. Este incremento leva a um aumento do tamanho dos poros e à formação de meniscos capilares dentro da rede porosa. Estes meniscos formam-se no gargalo dos poros, ajustando-se em função das diferentes larguras de cada gargalo, como se ilustra na figura 2.5 (Mills, 1985).

Esta ilustração representa o mecanismo denominado por transferência por filme, e que leva à criação de um sistema tipo “curto-circuito” onde é impelido por condensação capilar (teoria de Kelvin) no lado de alta pressão (entre os meniscos formados) e por evaporação na parte inferior do lado de baixa pressão (poro capilar) (Mills, 1985 e Freitas, 1992).

Fig. 2.5 – Tranferência por filme (2º Estádio): Modelo de curto-circuito (Hearn et al., 1994)

Este tipo de transferência estabelece-se quando estamos perante pressões de vapor de 0.45 a próximas de 1, sendo processado através de difusão de vapor e tensão capilar. A passagem de humidade efectuar-se-á de uma forma rápida sem que o sistema se encontre saturado (Hearn et al., 2006).

Como aspeto elucidativo da interferência da humidade nestes mecanismos, de acordo com Aldred (2008), uma alteração da humidade relativa que implique a passagem do estádio 1 (pressão de vapor inferior a 0.45) para o estádio 2, poderá levar a que o valor do coeficiente de difusão sofra um incremento de algumas ordens de grandeza.

3º Estádio:

Quando o sistema se encontra saturado ou muito próximo da saturação (parcialmente saturado), a transferência de humidade deve-se a um escoamento, praticamente laminar (Fig. 2.6) (Hearn et al., 2006).

Deste modo, o fluxo é controlado pela viscosidade do fluido e pelo gradiente de pressão, sendo a lei de Darcy a relação directa entre este gradiente de pressão e o escoamento resultante.

Fig. 2.6 – Modelo de transporte de água no 3º Estádio (adaptado de Rose, 1965)

Na presença de um gradiente de concentração, a existência de água (no estado líquido) no interior da estrutura porosa, irá possibilitar a dissolução dos iões (Fig. 2.6). Esta movimentação de espécies dissolvidas pode ser caracterizada de acordo com as características de difusão abordadas anteriormente.

Fig. 2.7 – Modelo de transporte de iões no 3º Estádio (adaptado de Rose, 1965)

As estruturas de betão, na maior parte das situações, quando sujeitas a ambientes de exposição agressivos, apresentam água no seu estado líquido em vez de vapor. Constata-se assim que a difusão de iões é um mecanismo de transporte muito importante para a avaliação durabilidade, sendo a sua caracterização normalmente considerada como referência à determinação do grau de deterioração física e química da estrutura.

Todas as movimentações de partículas conseguem ser representadas pelos mecanismos apresentados sendo, naturalmente, uns mais eficientes e influentes que outros. A importância para adopção desta caracterização prende-se com o facto de mostrar como uma mudança de certas condições externas pode modificar drasticamente o processo de interacção e respectiva forma de movimentação (Hearn et

al., 2006).

A contínua hidratação da estrutura do betão tenderá a que o sistema poroso tenda a interromper, ou pelos menos em parte, o percurso através dos poros capilares conduzindo, aparentemente, a um aumento da capacidade do betão em contrariar a invasão dos seus espaços internos. Contudo, as acções cíclicas resultantes da exposição ou, por vezes da utilidade funcional de cada obra, provocam sucessivas entradas e saídas de partículas que podem conduzir a alterações para além do processo de

hidratação. Estas implicações possibilitam que a capacidade resistente do betão a cada mecanismo elementar seja modificada, desencadeando uma alteração ao comportamemto global a nível de durabilidade.

Por fim, convém referir que a velocidade de absorção/adsorção da água pelo betão é muito superior à velocidade de perda de água por evaporação, facto que conduz a que a HR do betão seja normalmente superior à HR do ambiente envolvente.

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