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NEPE Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade UFPE Renato Monteiro Athias Bartolomeu F de Medeiros

AS COMUNIDADES NEGRAS RURAIS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS NO BRASIL

14 NEPE Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade UFPE Renato Monteiro Athias Bartolomeu F de Medeiros

Esses 14 Grupos de Pesquisa, os quais realizam pesquisas que estão em andamento, congregam ao todo 163 pesquisadores e 131 estudantes envolvidos na produção científica de elementos que estão relacionados, direta ou indiretamente, com as comunidades negras rurais quilombolas. Nesse sentido, podemos perceber que os estudos sobre essas comunidades, se juntarmos a produção acadêmica de dissertações e teses; os laudos e os relatórios antropológicos; e os Grupos de Pesquisa, vem passando por um significativo processo de vizibilização tanto no meio acadêmico como fora dele. Fato que interfere significativamente nas ações políticas governamentais para essa população.

165 Projeto desenvolvido no CNPq desde 1992, constitui-se em bases de dados que contêm informações sobre os

grupos de pesquisa em atividade no País (Fonte: http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/).

166 Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. 167

109 - A atuação dos antropólogos fora da academia

Com relação ao trabalho do antropólogo, ocorre certa similitude entre a produção acadêmica e a constituição de direitos para os grupos minoritários da sociedade nacional, no caso em tela, as comunidades negras rurais. É fato que, nos três períodos acima, a organização política do movimento negro urbano e, posteriormente, do movimento quilombola trouxe visibilidade jurídica e política às reivindicações territoriais dos remanescentes de quilombo. Porém, os antropólogos há muito tem se dedicado dentro e fora da academia na política desses direitos, como já observado por Ramos (1990) no caso indígena e O’Dwyer (2002) no caso das comunidades negras rurais quilombolas. Os temas de pesquisa, de grande parte dos trabalhos aqui apresentados, contemplam, além do interesse do antropólogo, a necessidade de produzir conhecimento estratégico que possa contribuir para a defesa dos direitos das comunidades negras rurais quilombolas. Considero que a Constituição Federal de 1988 - ao abordar as comunidades de remanescente de quilombo, e o decreto nº 4.887/03 - que utiliza o termo quilombo, ressemantizado principalmente pela antropologia168 (ARRUTI, 2002), influenciaram o aumento dos estudos das comunidades negras rurais.

A participação dos antropólogos tem sido observada na discussão de políticas públicas nos órgãos governamentais, como também na realização de laudos e/ou relatórios antropológicos, realizados via, geralmente, convênio entre instituições federais, estaduais e municipais; ONGs e associações profissionais. Essa produção em larga medida também influencia o aumento da produção acadêmica de dissertações e teses das comunidades negras rurais. Entre essas instituições estão o Ministério Público Federal, a Justiça Federal, o INCRA, a FCP, as universidades (que geralmente delegam os estudos aos antropólogos dos seus Departamentos de Antropologia/Sociologia) e a ABA. O objetivo desses convênios é a feitura de laudos e/ou relatórios antropológicos.

A Fundação Cultural Palmares, que era responsável, até o ano de 2003, pela regularização fundiária das terras de quilombo, realizou 26 relatórios antropológicos. Desse total, 22 foram feitos por meio de convênios com universidades. Posteriormente, o INCRA, que assumiu, após 2003, a responsabilidade pelas regularizações fundiárias dessas terras,

168 (...) o GT sobre Comunidades Negras Rurais da Associação Brasileira de Antropologia divulgava uma

interpretação ”cientifica” que se tornaria dominante, para essa aplicação da noção de “remanescente de quilombos”. Reunido no Rio de Janeiro, o GT propôs a “ressemantização” do termo quilombo a partir dos novos significados que lhe eram atribuídos pala literatura especializada (...) e pelas entidades da sociedade civil que trabalhavam junto aos “segmentos negros em diferentes contexto e regiões do Brasil.” (ARRUTI, 2002: 33).

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concluiu, até janeiro de 2010, 89 relatórios antropológicos, sendo que 53 foram realizados por universidades conveniadas169.

Segundo dados da Coordenação Geral de Regularização de Territórios Quilombolas/INCRA, estão na fase de elaboração 47 relatórios antropológicos. São 16 relatórios elaborados pelo INCRA, 08 por instituições conveniadas com o INCRA, 22 por universidades conveniadas com o INCRA e um relatório que está sendo preparado por antropólogo sem ligação com nenhuma instituição, esse relatório, após a sua finalização, será doado ao INCRA.

Tabela nº 06 - Relatórios Antropológicos Produzidos

Relatórios Antropológicos

Órgãos que realizaram Nº de Relatórios Produzidos

Fundação Cultural Palmares/FCP 04

Convênios universidades/FCP 22 INCRA 31 Convênios Universidades/INCRA 53 Contrato/Licitação/INCRA 05 Doação 05 ITESP 21

Sem Informação de quem produziu 08

Total 149

Podemos perceber, de acordo com os dados acima, que os convênios com as universidades foram responsáveis pela produção de 75 relatórios antropológicos, ou seja, os antropólogos vinculados às universidades produziram cerca de metade dos relatórios antropológicos feitos até hoje. As universidades conveniadas utilizam, para a realização dos trabalhos nas comunidades remanescentes de quilombo, os Departamentos de Antropologia, Sociologia ou de Ciências Sociais, bem como os Núcleos de Pesquisa e Laboratórios que tem familiaridade com a temática quilombo. O corpo de pesquisadores nesses estudos, geralmente, é formado por professores de Antropologia, alunos/bolsistas de graduação em Ciências Sociais e/ou alunos/bolsistas vinculados aos PPGAS. Por isso, influenciados por esses trabalhos, muitos alunos optam em realizar pesquisas acadêmicas (monografias, dissertações e teses) voltadas para as comunidades negras rurais e/ou urbanas quilombolas, as quais antes estiveram vinculados.

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Tabela nº 07 - Produção dos Relatórios Antropológicos por Ano

Relatórios Antropológicos Instituições que

realizaram

Ano que foi entregue ao INCRA

s/ ano 1997 1998 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Total INCRA 5 - - - 2 6 13 5 31 FCP 2 2 4 4 - 4 2 5 2 1 - 26 Convênios/Contrato/ Licitação/INCRA 7 - - 1 4 - 9 4 10 14 9 58 Doação 2 - - - 1 - - 1 - 1 - 5 ITESP 15 - - - 4 - - 2 - 21 Sem Informação 8 - - - 8 Total 39 2 4 5 5 4 15 12 18 31 14 149

Nos anos de 2004 e 2005, como o INCRA não havia antropólogos170 em seu quadro funcional e estava ainda se adequando aos ditames do Decreto nº 4.887/03 – o qual passava a responsabilidade da regularização fundiária das terras quilombolas da Fundação Cultural Palmares para o INCRA, não foram produzidos pelo órgão relatórios antropológicos. Somente a partir do ano de 2006 foi que cientistas sociais, antropólogos e técnicos do INCRA, começaram formalmente a trabalharem com as comunidades negras rurais quilombolas e a produzirem relatórios antropológicos.

Como podemos notar o trabalho do antropólogo, dentro e fora da academia, tornou-se imprescindível na elaboração de políticas públicas voltadas às comunidades negras rurais quilombolas, assim como na produção direta de relatórios antropológicos para essas comunidades. Por outro lado, as dissertações e teses têm corroborado com esse “fazer antropológico”, na medida em que discutem criticamente as políticas públicas para essas comunidades, bem como as suas realidades. Nesse sentido, no intuito de contribuir com uma nova abordagem, procuro nos próximos capítulos trazer a história das comunidades negras rurais quilombolas do Mato Grosso do Sul sob a perspectiva do campesinato, ou seja, trabalhá-los como grupos camponeses. Acredito que os quilombos “históricos”171, no período colonial, até as comunidades remanescentes de quilombos172 atuais, podem ser analisados no contexto de microssociedades camponesas (CUNHA; GOMES, 2006). Do século XVII até o

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Em 13 de outubro de 2005, foi publicado o Edital INCRA/SA/nº 07 que versava sobre o concurso público para o cargo de Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário (os profissionais, para esse cargo, deveriam ser das seguintes áreas: Engenharia Civil, Engenharia Florestal, Engenharia Agrimensura, Arquitetura e Antropologia). Foi a primeira vez que o órgão abriu vagas para Antropólogos, porém foram criadas apenas 35 vagas distribuídas em 31 cidades.

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Refiro-me ao conceito de quilombo elaborado pelo Conselho Ultramarino, em 1740. Descreve como quilombo toda habitação de negros fugidos, que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem achem pilões nele. No Brasil, os termos mais comuns para nomear as comunidades de negros fugidos foram quilombo ou mocambo (VAINFAS, 2000).

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final do século XIX, grupos de ex-escravos no Mato Grosso do Sul avançaram para o período pós-emancipação constituindo comunidades negras rurais, articuladas em redes políticas, socioeconômicas e culturais. Redes que hoje são utilizadas na afirmação da identidade quilombola.

113 CAPÍTULO II