• Nenhum resultado encontrado

Núcleo de Umbanda Pai Joaquim D’Angola e mentores de Luz (Praia Grande) O núcleo “Pai Joaquim D’Angola e Mentores de Luz” existe desde 1996 e só em

2006 é que este terreiro foi se filiar a AUESSP, quando seu pai de santo conheceu a Magia Divina. Alexandre, o pai de santo, disse que no começo tinha muita resistência,

46 Vestir Branco refere-se a fazer parte da corrente mediúnica, ou seja, trabalhar no terreiro de

umbanda. Apareceram outras referências no campo de pesquisa que indicam o uso da magia divina como alternativa aqueles que não querem participar das obrigações religiosas (mesmo que indicadas pelos guias espirituais).

114 principalmente com relação à utilização de objetos, como ocorre na Magia Divina, mas que, com a aproximação à diretora da AUEESP, foi se adaptando à doutrina de Saraceni e aos moldes da Magia Divina e da AUEESP.

(Aula de Magia Divina no Núcleo de Umbanda Pai Joaquim D’Angola e mentores de Luz, foto retirada dia 19/01/2015)

Além da amizade com a Sandra (diretora da AUEESP), este terreiro recebe todas as semanas a Regiane, uma maga mencionada anteriormente, que também faz parte da comissão diretora da AUESSP, que já está na sua sexta turma de Magia Divina neste terreiro. Alexandre, ao me contar como esta aproximação com a AUESSP e com a Magia Divina se deu, explicou que foi de extrema importância para o terreiro, pois foi neste momento que começaram a se organizar para arrecadar fundos e se informar a respeito dos direitos de cada terreiro.

Hoje, no terceiro endereço, passam por uma reforma de ampliação, graças à verba que conseguiram levantar na festa junina que ocorre na cidade. A partir de rifas, de festas e organizações de eventos, além, é claro, das mensalidades dos alunos de magia e das contribuições dos médiuns da casa, todos arrecadam fundos para manter as despesas do espaço e do funcionamento das atividades. Guita, mãe de santo do terreiro, me disse que a participação da AUEESP para o terreiro foi extremamente importante, uma vez que instruiu os pais de santo na organização de toda a documentação necessária para pleitear a participação do terreiro na festa da cidade. Sobre conhecer a AUEESP, a mãe de santo disse:

Eu costumo até brincar com a Rê, com a Regiane, dizendo que minha vida umbandista ela se resume, são divisores de água, o primeiro deles foi ter me

115 considerado uma umbandista e assumir, que já não é muito fácil, porque eu era de uma família toda católica, tradicional, aquelas coisas. Depois, quando você assume um papel, a vida muda bastante, ai eu conheci essa pessoa que está aqui desse lado, dona Sandra. Que é pra mim um divisor de águas, que toda vez que você mudou, como você abriu as portas, eu uso sempre uma frase que eu ouvi delas há muitos anos atrás que acho que nem ela não lembra que esta questão de você sair do seu próprio mundo, de você sair do seu casulo. Porque, hoje mesmo, a gente participou uma reunião lá e eu fico muito honrada de sentar ao lado dela, de ouvir ela falar, então, aquelas pessoas que a gente vê do alto, agora a gente tá vendo do lado, tá acompanhando, é muito gratificante, saber que você pode acionar este poder a qualquer momento, no seu trabalho, num hospital em alguém que estiver doente né? Eu sou apaixonada. (Fragmentos de entrevista com os pais de santo Guita e Alexandre realizada no dia 10/09/2014)

Ainda, o pai de santo explicou que os cursos de Magia Divina propiciaram uma fonte de renda legítima para o terreiro, uma vez que os recursos eram pequenos e como a Umbanda tem o princípio de caridade47, o que impede dos atendimentos serem cobrados, não tinham muitas formas de arrecadar o dinheiro necessário para pagar todas as contas. Alexandre, a respeito de Saraceni disse:

Desde quando ele começou a escrever a gente acompanha. Mas sempre a gente teve uma certa resistência. Primeiro porque era em São Paulo, tudo, e como a gente foi doutrinado numa umbanda mais antiga, então o pessoal tinha uma certa resistência, mas depois que a gente conheceu, e não só conheceu, mas começou a praticar, a gente começou a gostar né? [...]Aí eu fui fazer o curso de Sacerdócio em São Paulo, que eu era sacerdote mas não tinha o curso do Rubens né. Aí eu também fiz a magia de Exú. Daí a gente começou a se interessar. Daí ela trouxe a Regiane, aí foi que começou. É interessante assim também que o curso também ajuda também na construção. Ele agrega não só conhecimento, mas agrega também uma fonte de recurso também, né? Que é importante também para umbanda. Porque o grande problema da umbanda é onde você vai conseguir recursos né. (Fragmentos de entrevista com os pais de santo Guita e Alexandre realizada no dia 10/09/2014)

Além dos cursos de Magia Divina e dos atendimentos de umbanda, o terreiro segue a linha de Bezerra de Menezes, uma linha de incorporação de médicos curadores. Desta forma, mantém no andar de baixo do terreiro algumas salas com macas, onde os pacientes passam por consultas e cirurgias espirituais. Há também a evangelização kardecista, com aulas com evangelho e uma biblioteca, mantida no próprio espaço. Este terreiro, por ter as aulas de Magia Divina e os atendimentos de baralho cigano, também

47 Herança do espiritismo, a caridade aparece como valor central na umbanda, que, ao contrário do

candomblé, por exemplo, não permite que sejam cobrados os serviços religiosos prestados. Segundo Negrão (2008), a teoria kardecista da reencarnação e da evolução espiritual é o pano de fundo motivador da caridade umbandista. Sua prática seria entendida, portanto, como missão, à qual os pais-de-santo gostariam de poder fugir, pois são muito restritivas da liberdade individual, mas à qual se submetem.

116 agrega pessoas que frequentam outros terreiros, inclusive outros pais e mãe de santo, que frequentam as aulas mas que não se alinham aos mesmos trabalhos espirituais.

Como o estudo da Magia Divina na cidade é recente, é comum que outras pessoas frequentem terreiros que oferecem cursos de magia, mesmo que seja comum alguns pais e mãe de santo irem para São Paulo todos os finais de semana para assistirem os cursos de Saraceni. Porém, à medida em que vão se instrumentalizando, vão disseminando os estudos de Magia Divina, viajam menos e deixam de depender totalmente de professores da capital. Assim, a mãe de santo me explicou que agora ela própria começou a oferecer seu primeiro curso de Magia Divina e pretende com o tempo não necessitar mais que Regiane venha de São Paulo para oferecer as aulas.

Além da inclusão dos cursos, da participação de eventos da cidade e da expansão física e de trocas de pessoas no terreiro, o pai de santo me explicou que o próprio culto aos orixás foi sutilmente modificado, uma vez que Saraceni cultua 14 orixás, ao invés dos 12 que antes se cultuava. Além desta modificação, é visível a incorporação e homogeneização dos ritos e das explicações umbandistas, que pouco a pouco tomam os terreiros, que mesmo assim continuam a marcar sua própria identidade e formação histórica.

Assim, podemos observar em outros terreiros, há várias pessoas que se interessam pelas aulas de Magia Divina que não frequentam os dias de atendimento umbandista. Uma aluna, ao me explicar sua relação com a Magia Divina e com a umbanda, me disse:

Agora, a parte da magia sagrada48, vem muito a parte religiosa, e o

desenvolvimento que tem, você sente alguma coisa diferente ao fazer o portal, você tem a intuição um pouquinho mais aguçada, do que uma pessoa que não é da religião em si, mas eu sou suspeita de falar, porque é minha religião de berço, apesar de ter estudado em um colégio católico treze anos, pequena assim, mas sempre fui umbandista e sempre vesti branco, e com relação a parte religiosa da trajetória, eu comecei a trabalhar, e tive um desenvolvimento em questão de sete meses, eu estava recebendo todos os guias. E todo mundo questiona o lado da religião, você abandonar a religião, mas nunca mudou minha religião. Foi mais a parte do não tempo a me dedicar isso. (Fragmentos de entrevista com uma aluna de magia do Núcleo de Umbanda Pai Joaquim D’Angola e mentores de Luz realizada no dia 10/09/2014)

48 Interessante que a Magia Divina é tratada por este terreiro como Magia Sagrada por alguns alunos. Fato

117 Como esta aluna, colhi outros relatos de pessoas que se declaram umbandistas, mas que por falta de tempo ou porque não podem por algum motivo ir ao terreiro estão praticando a Magia Divina. Em muitos casos dizem que esta prática não substitui a religião, mas que de certa forma ajuda, já que resolve muitos problemas cotidianos.

De toda forma, podemos compreender que a Magia Divina entra neste terreiro como instrumento de captação de recursos e como agregação de conhecimento, uma vez que instrumentaliza não só os pais de santo, como também aqueles que frequentam o terreiro em busca dos conhecimentos mágicos. Além disso, é clara uma ligação política que beneficia e que visibiliza este terreiro frente a associações e organizações de umbanda maiores. Além disso, podemos compreender que este terreiro, por ser um terreiro tradicional, ou seja, por já existir antes da doutrina de Saraceni, sofreu algumas modificações em suas práticas rituais para ser afiliado à associação e à rede de Saraceni, mesmo que ainda respeite sua linha de trabalho de Bezerra de Benezes e sua linha de orientação kardecista. Ainda, podemos compreender a Magia Divina como um potencial de congregação de adeptos da umbanda localmente, uma vez que reúne pessoas de outros terreiros e até umbandistas que não são praticantes ou que não estão trabalhando sua mediunidade.

3.8 Templo de Umbanda Sagrada Pai Benedito de Aruanda (São Carlos) e Núcleo