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A negação pertence a nós quando estabelecemos um ato judicativo, ou, quando julgo algo estabelecendo comparações entre resultado esperado e resultado obtido. Ela é uma qualidade do juízo, é recusa de existência, pois, um ser é colocado e depois relegado ao nada. Todavia, a consciência não produz negação a não ser que seja consciência de negação, já que nada habita a consciência. Entretanto, “a condição necessária para que seja possível dizer não é que o não-ser seja presença perpétua, em nós e fora de nós. É que o nada infeste o ser.” (SARTRE, 2008, p. 52)

A partir de agora, teremos que tratar não só da relação entre ser humano e ser-Em-si, como também entre ser e não-ser, não-ser humano e não-ser transcendente, uma vez que o não- ser é componente do real. O nada é negação, seu fundamento está no ato porque é negação como ser, o nada não é nada, a não ser que se nadifique como nada do mundo. Tanto o ser como o nada possuem componentes necessários do real, uma vez que a realidade humana emerge do nada. “O nada acha-se na origem do juízo negativo porque ele próprio é negação. Fundamenta a negação como ato porque é negação como ser. O nada não pode ser nada, a menos que nadifique expressamente como nada do mundo.” (SARTRE, 2008, p. 60)

O nada é a negação de algum atributo de um sujeito, não é a negação do mundo. Por exemplo:

“a noção de distância, que condiciona a determinação de um lugar, a localização de um ponto. É fácil ver que possui um momento negativo: dois pontos distam entre si quando separados por certa longitude. Significa que a longitude, atributo positivo de um segmento de reta, intervém aqui a título de negação de uma proximidade absoluta e indiferenciada.” (SARTRE, 2008, p. 62)

Podemos dizer que o nada é sustentado pelo ser e condição da realidade, ele existe no coração do ser. Precisamos agora saber como surge o nada, de onde ele vem. Para pensar o nada, Sartre argumenta acerca da interrogação, uma vez que a interrogação é a possibilidade de resposta negativa. A relação sintética que chamamos de ser-no-mundo e o que devem ser o homem e o mundo para que seja possível a relação entre eles, devem ser respondidas juntas, uma vez que a conduta humana, é conduta do homem no mundo, e nos revela ao mesmo tempo o homem, o mundo e a relação que os une. Porém, se faz necessário que encaremos como realidades apreensíveis objetivamente. Para que nos aprofundemos na relação “homem-mundo”, partimos de uma conduta primeira como fio condutor de investigação, a saber: a interrogação. Ao interrogarmos ficamos frente ao ser que interrogamos, já que a interrogação requer um ser que interroga e outro que é o interrogado. Não é uma relação do ser-Em-si, porém, “fica nos limites dessa relação e a pressupõe,” (SARTRE, 2008, p. 45) ao interrogarmos, interrogamos sobre algo, esse sobre faz parte da transcendência do ser. Esperamos uma resposta, uma revelação de seu ser ou maneira de ser, ou seja, em toda interrogação ficamos ante o ser que interrogamos, que teremos como resposta sim ou não. A negação é revelada pelo ser. “A interrogação é uma ponte lançada entre dois não-seres: o não ser do saber, no homem, e a possibilidade de não-ser, no ser transcendente”. (SARTRE, 2008, p. 45) O ser revela a negação que revela o não-ser, estamos o tempo todo diante do nada. O ser então, será aquilo que não é, logo, “o ser é isto, e, fora disso, nada.” (SARTRE, 2008, p. 46)

A interrogação é uma espera de uma revelação de seu ser ou maneira de ser, espero a revelação de uma conduta que pode não vir, portanto, essa revelação pode ser afirmativa ou negativa, ou seja, a resposta pode ser nada. A interrogação é um processo humano, “Logo, o homem apresenta-se, ao menos neste caso, como um ser que faz surgir o Nada no mundo, na medida em que, com esse fim, afeta-se a si mesmo de não ser.” (SARTRE, 2008, p. 66) Ao interrogar, o interrogador nadifica em relação a si o interrogado, o interrogador também se

nadifica. A partir da interrogação é introduzido uma dose de negatividade no mundo. Portanto, o nada se manifesta através do homem, ou seja, é através do homem que o nada vem ao mundo. A relação entre homem e mundo indicada pela negatividade não significa relação de coisa para coisa, e sim uma reorganização. O homem aparece e descobre o mundo através da negação, ou seja, ele descobre por meio do não-ser, ou daquilo que ele não é.

O ser do homem condiciona a aparição do nada, esse ser aparece como liberdade que é condição para a nadificação do nada, pois, a liberdade humana é anterior a sua essência, é a possibilidade e a existência do homem, “a liberdade humana precede a essência do homem e torna-a possível: a essência do ser humano acha-se em suspenso na liberdade. Logo, aquilo que chamamos liberdade não pode se diferençar do ser da “realidade humana.” (SARTRE, 2008, p. 68) Essa realidade humana é considerada pelo filósofo como o ser, “enquanto, no seu ser e por seu ser, fundamento único do nada no coração do ser”. (SARTRE, 2008, p. 68)

O ser-para-si primeiro repousa no cerne do ser-em-si para depois irromper-se por um recuo nadificador, essa operação se dá na facticidade. Facticidade é aquilo que não poderia ser de outra forma, ou é aquilo em que não podemos mudar, é uma situação dada, como por exemplo a afirmação satreana de que somos condenados a ser livres. É a contingência do em-si que infesta o para-si sem que ele, o para-si possa captá-lo. “É esta facticidade que nos permite dizer que ele é, que ele existe, embora não possamos jamais alcançá-lo e a captarmos sempre através do Para-si.” (SARTRE, 2008, p. 132)

A condição de toda negação é o desgarramento das consciências é o nada que separa o presente de todo o seu passado, possibilitando que o ser se constitua com relação a seu passado, deixando o passado fora do circuito, tornando assim o ser humano livre, portanto, a liberdade é o ser da consciência. A liberdade é fundamento do Para-si, logo, não existe determinação do seu Ser. O Para-si é vazio, é pura existência e é a partir daí que construirá sua essência. Ele é responsável por si mesmo, já que não existem valores inscritos e nem normas a seguir, ele é pura liberdade, e essa liberdade gera uma angústia. Contrário ao Em-si que tem como característica a inércia, o passado é a petrificação, ele não motiva as ações humanas, pois é passado, e as ações humanas fazem parte do projeto, ou seja, do futuro daquilo que ainda não é, das possibilitadas do para-si.

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