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Narrativas de pessoas surdas que apreciam a música

A procura por colaboradores para as entrevistas ocorreu como consequência direta das buscas preliminares por fontes para a presente pesquisa. Nesse exercício contínuo, houve notícias sobre eventos recentes, revelando que surdos participavam efetivamente de apresentações musicais, sendo um grande destaque na mídia e nas redes sociais. Esse feito, ao despertar o interesse da mídia, apontava para o trabalho de algumas pessoas, grupos e instituições. Isso estava acontecendo em diferentes Estados do Brasil, pois esses grupos não estavam apenas no seu local de origem,

faziam apresentações públicas advindas de vários convites que recebiam. Ocorria, portanto, que, no Brasil, estava acontecendo uma discussão no

sentido de que os surdos, através da vibração dos sons e de sinais luminosos, vivenciavam a própria musicalidade. E mais, em contexto do que conhecemos como “inclusão”, os surdos estavam juntamente com outros musicistas ouvintes. Com isso, verificamos a necessidade de elaborar um inventário sobre esse fenômeno, e foram encontrados onze projetos envolvendo música com pessoas surdas. Porém, em efetiva atividade, encontramos oito projetos no Brasil, os quais apontamos a seguir:

Quadro 16 - Projetos com musicistas surdos

Instituição Órgão mantenedor Nome do Projeto Contato / coordenador Conservatório Municipal de Guarulhos - SP

Público Projeto Música do Silêncio FábioBonvenuto E-mail: fbonvenuto@gmail.com Instituto Som da Pele Recife - PE Autarquia1 Projeto Batuqueiros do Silêncio

Irton (Mestre Batman) E-mail: batuqueirosdosilencia@g mail.com Associação Amigos do Projeto Guri (AAPG) São Paulo - SP

Autarquia Projeto Guri Inclusivo Patrícia Santana E-mail: patricia.oliveira@maquin acohnwolfe.com

1 Autarquia: Pessoa Jurídica (PJ) que pode receber recursos públicos, contudo preservando autonomia

Conservatório Estadual de Música Cora Pavan Capparelli Uberlância - MG Público Banda Ab’Surdos Sarita Araújo E-mail: cemepc@conservatoriou berlandia.com.br Congregação Cristã no Brasil Sorocaba – SP

Privado Não informado Não informado

Centro Integrado de Educação Especial (CIEE)

Público Projeto Surdodum

Ana Lúcia Soares E-mail:

surdodum@hotmail.com

APADA- BA Autarquia Batuque de

Surdos

(71) 3334-1468Apada

Salvador Fundação das Artes

São Caetano do Sul – SP Público Música e Inclusão Lisbeth Soares E-mail: lisbethsoares@gmail.co m

Fonte: elaborado pela própria autora

A partir da construção do Quadro acima, constando o levantamento dos dados relativos aos projetos musicais que incluíam pessoas surdas, que iniciamos os devidos trâmites no sentido de obter permissão para conhecer in

loco o trabalho desses projetos. Alguns convites foram ignorados, outros

aceitos com muito entusiasmo. No entanto, percebemos que, sendo o período do mestrado de vinte e quatro meses, não haveria tempo hábil para visitar todos os projetos e suas respectivas instituições no local de origem. Foram escolhidas as quatro primeiras instituições e seus respectivos projetos que responderam positivamente ao nosso convite. Sendo assim, participaram da pesquisa: 4 entrevistados do Instituto Som da Pele, na cidade de Recife (PE); 3 entrevistados do Conservatório Estadual de Música Cora Pavan Capparelli, na cidade de Uberlândia(MG); um músico da orquestra, da Igreja Congregação Cristão no Brasil em Sorocaba (SP) e uma musicista do Instituto de Artes de São Caetano do Sul (SP). A receptividade calorosa desses colaboradores, que foram entrevistados, com a genuína felicidade dos surdos ao concederem a entrevista, é prova irrefutável do quanto devemos lutar pelos seus direitos de vivenciarem e apreciarem a música.

Nessas instituições, encontramos onze colaboradores que nos concederam as entrevistas. Dessa forma, o critério para encontrar os

entrevistados decorreu do próprio percurso da pesquisa, na sua fase inicial do levantamento dos dados.

O encontro deu-se quando as duas instituições visitadas convocaram o grupo para ensaios e foi nessa oportunidade que as entrevistas aconteceram. Por livre e espontânea vontade dos próprios surdos, através da intérprete de Libras, eles tomavam a iniciativa de se apresentarem para mim e, assim, iniciávamos a entrevista. Não encontrei nenhum surdo tímido, todos queriam dar entrevistas. A iniciativa de encerramento ocorreu de minha parte, porquanto havia um cronograma de atividades para cumprir. Em três das onze entrevistas concedidas não foi necessária a mediação de intérprete de Libras, por se tratarem de pessoas com perda auditiva, contudo oralizadas.

É importante ressaltar que há aspectos relacionados à surdez que impactam diferentemente os surdos. A idade em que a perda auditiva ocorreu impõe mais determinações do que o grau da perda auditiva em si. Por este motivo, Sacks (1998, p. 19) expõe que podemos dividir os surdos em duas categorias, surdos pré-linguísticos e surdos pós-linguísticos:

surdos pré-linguísticos: são aqueles que já nasceram surdos ou

que perderam a audição antes do aprendizado da língua falada. Estes, ao contrário do que se pensa, não vivenciam o "silêncio" e nem se queixam dele. Mesmo os que têm surdez mais profunda conseguem ouvir ruídos de vários tipos e ser sensíveis a vibrações de toda espécie – essa percepção de vibrações é para os surdos um sentido acessório. Surdos pós-linguísticos: são aqueles que perderam a audição após o aprendizado da língua falada. São capazes de estabelecer conexões visuais-auditivas através da experiência e da memória, traduzem o movimento em som – fenômeno conhecido como "vozes fantasmagóricas" ou "música do olhar".

Nas entrevistas sem a mediação do interprete da Libras, foram tomados os cuidados necessários para que a comunicação fosse eficaz para ambas as partes. Para esta pesquisa, realizamos nove entrevistas, sendo que duas não foram utilizadas, uma pelo não enquadramento da condição de surdez, prevista na legislação, e a outra por ter sido incipiente nas declarações prestadas nas narrativas.

A maioria das pessoas entrevistadas (sete entrevistados) são jovens entre 17 e 23 anos de idade. Dentre estas, a perda auditiva ocorreu em fase pré-linguística e todos são fluentes em Libras, sendo que apenas uma entrevistada utiliza AAS. Os outros dois entrevistados que utilizam AAS estão

na faixa etária de 49 e de 54 anos, um teve perda auditiva na fase pré- linguística e o outro na fase pós-linguística.

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