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3 NOVOS DANOS

3.3 DANO DA PERDA DE UMA CHANCE: CONCEITO E NATUREZA

3.3.2 Natureza do dano

O dano da perda de chance tem conceito e natureza distintos, a depender da escola doutrinária ou experiência jurídica a que se filia. A escola francesa tem uma acepção e a italiana, outra.

122 BOCCHIOLA, Maurício. Perdita di uma chance e certezza del dano. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, anno XXX, p. 55-101, 1976. Cf. SAVI, Sérgio. Op. cit., p. 23.

123 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade Civil pela perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2013. p. 106.

124 Ibidem.

125 Ibidem.

126 CARNÁUBA, Daniel Amaral. A responsabilidade civil pela perda de uma chance: a técnica na jurisprudência francesa. In: STOCO, Rui. Doutrinas essenciais: dano moral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1285-1315.

Com base na escola francesa, na visão de Carnaúba127, “[...] a perda de uma chance é técnica decisória, criada pela jurisprudência francesa, para superar as insuficiências da responsabilidade civil diante das lesões a interesses aleatórios. Essa técnica trabalha com o deslocamento da reparação: a responsabilidade retira sua mira da vantagem aleatória e, naturalmente, intangível, e elege a chance como objeto a ser reparado”.

Em complemento, Sanseverino citando o francês Viney, explica que a perda de uma chance corresponde à reparação devida ao lesado pela frustração de uma probabilidade em decorrência de um fato imputável ao agente responsável e, em outras palavras, ao evento danoso que acarreta a perda de uma chance de obter um proveito determinado ou de evitar uma perda128.

Para ambas escolas, o que se indeniza não é o resultado final, mas o dano decorrente da chance perdida, divergindo quanto aos critérios de reparabilidade do dano. A escola francesa dita que para o dano ser indenizado ele precisa ser certo e específico, determinando o arbitramento da indenização em conformidade com a maior ou menor probabilidade de vitória no tribunal129.

Já para a escola italiana, o dano é de natureza material, considerado certo quando a chance tiver uma probabilidade superior a 50%, valorada segundo um cálculo de probabilidade e será indenizada como dano emergente e não como lucro cessante130.

Tratando-se da natureza extrapatrimonial do dano da perda de uma chance, a doutrina brasileira se divide em duas correntes: a) a perda de chance apenas como um agregador do dano moral; e b) a perda de uma chance com natureza híbrida, apresentando tanto caráter material como extrapatrimonial.

127 CARNAÚBA, Daniel Amaral. A responsabilidade Civil pela perda de uma chance: a técnica na jurisprudência francesa. In: STOCO, Rui. Doutrinas essenciais: dano moral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1285-1315.

128 VINEY, Geneviève. Les obligations: la responsabilité, effets. Paris: LGDJ, 1988. (‘Traité de droit civil, v. 5, p. 341). Cf. SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 166.

129 Ibidem.

130 BOCCHIOLA, Maurício. Perdita di uma chance e certezza del dano. Rivista Trimestrale di

A primeira corrente, defendida por Sérgio Savi131 e Nelson Rosenvald, entende que o dano da perda de chance é um dano de natureza material, não o admitindo como um dano exclusivamente moral, podendo-se admitir que, em determinados casos, a perda da chance, além de causar um dano material, poderá, também, ser considerada um agregador do dano moral, ou seja, que o dano extrapatrimonial coexiste com o dano moral, dependendo da sua existência.

Nelson Rosenvald afirma que a perda de uma chance é um dano patrimonial, não se negando que, excepcionalmente, tal como poderia ocorrer com danos emergentes e lucros cessantes, o dano poderia ter repercussão em situações jurídicas existenciais do ofendido ou de seus familiares, como consequência do dano econômico, a ele se agregando132.

Para Rosenvald133, se em uma demanda judicial, o promovente pede indenização por dano pela perda de uma chance e concomitantemente por dano moral, se lhe for concedida apenas indenização por dano moral, não foi caracterizado o dano da perda de uma chance, mas sim, o dano moral em algum aspecto, porque dano da perda de uma chance não se indeniza exclusivamente, a título de dano moral, porque, por sua natureza e essência, é dano material.

A segunda corrente, defendida por Rafael Peteffi, demonstrada no Enunciado n° 443 do Conselho de Justiça Federal134, que é de sua autoria, confere um caráter híbrido ao dano da perda de uma chance, classificando-o,

131Segundo explica Sergio Savi: “[...] haverá casos em que a perda da chance, além de causar um dano material poderá, também, ser considerada um “agregador” do dano moral. Por outro lado, haverá casos em que apesar de não ser possível indenizar o dano material, decorrente da perda da chance, em razão da falta dos requisitos necessários, será possível conceder uma indenização por danos morais em razão da frustrada expectativa. Frise-se mais uma vez: o que não se pode admitir é considerar o dano da perda de chance como sendo um dano

exclusivamente moral, já que, presentes os requisitos descritos neste livro, a perda de uma chance pode dar origem a um dano material, nesta hipótese como dano emergente” (SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 60.

132 FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de Direito Civil: responsabilidade civil. 5. ed. rev. e atual. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 273-274.

133 Ibidem.

134“Aresponsabilidade civil pela perda de chance não se limita à categoria de danos

extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance perdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. A chance deve ser séria e real, não ficando adstrita a percentuais apriorísticos” (TARTUCE, Flávio. V jornada de direito civil: perda de chance. Jusbrasil. [S. l.], [2012]. Disponível em:

https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/121820180/v-jornada-de-direito-civil-perda-de-chance. Acesso em: 20 dez. 2018.).

precipuamente, como extrapatrimonial e a depender do caso concreto, poderá ter natureza patrimonial.

Anderson Schreiber135, seguindo a segunda corrente, afirma que “a perda da chance é, a rigor, uma hipótese lesiva, que se configura na perda da oportunidade de obter uma vantagem ou evitar um prejuízo, seja no campo econômico, seja no campo moral”.

Peteffi estuda a doutrina da perda de uma chance, baseada na doutrina francesa, diferente de Savi, que pautou seus estudos, na doutrina italiana. A doutrina francesa atribui natureza patrimonial e extrapatrimonial ao dano da perda de chance, de forma autônoma, classificando o dano a depender de sua repercussão, se na esfera moral ou material. Enquanto a doutrina italiana estabelece que o dano da perda de chance é eminentemente material, podendo-se admitir, também, dano moral, condicionado a configuração do dano material. A teoria da perda de uma chance, na doutrina francesa, trabalha com dois conceitos de dano por perda de uma chance: o clássico - dano autônomo e específico para algumas hipóteses, que indeniza as chances perdidas, e o da causalidade parcial que indeniza o dano final, especialmente aqueles casos ocorridos na seara médica, na qual o dano extrapatrimonial encontra seu maior amparo.

135 SCHREIBER, Anderson. Manual de direito civil contemporâneo. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 626.

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