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3 CAMINHOS PERCORRIDOS DURANTE O PROCESSO INVESTIGATIVO

3.1 Natureza e percurso da Pesquisa

A pesquisa nasce da curiosidade, algo que motiva a busca por respostas. Quase sempre um caminho tortuoso, porém recompensador. Analisar a educação do campo e as perspectivas que envolvem a construção e aplicação do currículo escolar na construção da identidade e da valorização da cultura de homens e mulheres do campo foi algo estimulador, uma vez que possibilitou o conhecimento de um mundo novo, rico e diferente de tudo que julgávamos conhecer. Entretanto, também uma experiência frustrante por confirmar que poucas coisas mudam por consequência de direitos adquiridos, reconhecendo o quanto somos ainda uma nação marginalizada por preconceitos e distinções.

Com a finalidade de descrever a concepção dos sujeitos da pesquisa acerca do funcionamento do currículo escolar, optamos pela abordagem de métodos qualitativos/Interpretacionistas de pesquisa, fundamentada no estudo e na análise de documentos e situações observadas, na busca por indícios para construção de

uma proposta de intervenção que vise auxiliar à adequação do currículo, para que este contribua, de forma mais efetiva, na constituição e valorização das diferentes identidades e culturas presentes na educação do campo.

Dessa forma, a pesquisa qualitativa compreende o ambiente como uma fonte direta na coleta de dados, sendo a figura do pesquisador um instrumento importante na descrição do objeto. Há, portanto, um interesse maior por discutir políticas curriculares e culturais que atendam à educação do campo em suas necessidades, tratando da construção e efetivação de propostas que venham minimizar a adequação do currículo para as diferentes identidades sociais e culturais, compreendidas nas relações de convivência e poder.

Sendo a educação do campo alimentada pelo currículo urbano, o acesso a saberes e a conhecimentos apenas da cultura urbana terminam, erroneamente, o posicionamento e a representação das identidades, perpetuando a reprodução de modelos ideológicos e capitalistas. Trabalhar com currículo escolar é verdadeiramente uma batalha, pois este ainda serve como validação de identidades definidas nas relações de poder.

Ao escolhermos trabalhar nesta pesquisa com a observação participante nos embasamos nos pressupostos de autores como Moreira (2002, p. 52), o qual define que a observação participante é conceituada como sendo “uma estratégia de campo que combina ao mesmo tempo a participação ativa com os sujeitos, a observação intensiva em ambientes naturais, entrevistas abertas informais e análise documental”. Para o desenvolvimento desta pesquisa, enfatizaremos a observação de ambientes e sujeitos e a análise de documentos, excluindo deste processo a realização de entrevistas, em virtude de consideramos que o material coletado nas observações e documentos já se qualifica como extenso para análise, considerando o tempo para conclusão desta pesquisa.

Atendendo ao nosso intuito realizamos a observação de professores e gestores no desempenho de suas funções diárias, em seu próprio local de trabalho, sendo este um lugar confortável a eles, julgamos que obtivemos de certa forma uma pequena representação de suas realidades. A referida observação se deu enquanto por um período considerável, no qual trabalhei como professora substituta, uma vez que a professora regente do conteúdo de matemática das turmas de 6º ao 9º ano havia se afastado por motivo de saúde.

Como forma de registro das observações, foi construído um diário de campo, com anotações referentes ao convívio com os alunos e colegas de ofício. Consideramos também, a análise de documentos como o PPP – Projeto Político e Pedagógico, os Regimentos Escolares construídos pelos Colegiados, as Matrizes Curriculares de Referências dos anos iniciais e de disciplinas como: Língua Portuguesa, Matemática, História e Arte dos anos finais do ensino fundamental, sendo estas também fontes primárias e secundárias de informações.

Atuar como professora em uma escola do campo me possibilitou uma proximidade social com algumas famílias, o que oportunizou também condições de observação das relações que a escola estabelece com o entorno escolar, envolvendo as famílias e os vizinhos próximos à instituição. Assegurado o convívio entre a pesquisadora e os alunos, não foi difícil analisar a adequação dos currículos escolares quanto à construção de identidades e valorização da cultura do homem do campo, pois sendo eles filhos de moradores rurais também se reconhecem como sujeitos do campo.

Costa (2007) reforça que uma pesquisa participante, aliada a uma política cultural de representação do discurso da verdade, mediante a observação, pode inscrever novas leituras de mundo a partir da realidade estudada. Dessa forma, ao conceituar a pesquisa, discutiremos os procedimentos e as técnicas empregadas neste estudo.

A pesquisa científica se diferencia segundo a natureza de seus objetivos e procedimentos de coleta e análise das informações. Porém, é importante que a pesquisa parta de um conhecimento empírico da vida prática, para tornar-se um conhecimento científico válido.

Neste contexto, optamos pela pesquisa documental e bibliográfica. A pesquisa documental é “um procedimento que utiliza métodos e técnicas para análise dos mais variados documentos”, conforme afirma Sá-silva, Almeida e Guindani (2009, p. 3), e a “pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador cobrir uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente” (GIL, 2002, p. 50).

Comparando as duas modalidades, elas apresentam distinções. A pesquisa bibliográfica é uma modalidade de estudo e análise de documentos de domínio direto e científico, já a pesquisa documental busca informações em documentos que ainda não receberam tratamento analítico.

O estado da arte foi construído sobre o aporte da análise dos documentos mencionados em princípio, uma vez que a pesquisa teórica possui o intuito de atender aos objetivos propostos. Buscamos produções existentes em acervos públicos e privados de bibliotecas das universidades brasileiras, na literatura e nos bancos de teses e dissertações da CAPES e de universidades brasileiras, trabalhos que envolvessem as temáticas referentes a partir das seguintes palavras-chave: educação do campo, currículo, identidade e cultura, que contemplassem as peculiaridades da vida no campo.

Neste contexto, o resultado obtido foi pouco expressivo. Refinamos a pesquisa ao banco de teses e dissertações da CAPES e fizemos a princípio o

download de dezesseis trabalhos sobre educação do campo. Quanto à metodologia

de análise desses trabalhos, primeiramente foi realizada uma leitura apenas dos sumários e dos resumos. Depois de selecionados nove dos trabalhos foram lidos na íntegra. Em seguida, foi adotada a entrevista realizada com gestoras e supervisoras das escolas. Além disso, aplicado o questionário semiestruturado elaborado após o estudo bibliográfico, o qual serviu de subsídio para construção e analise do perfil dos profissionais que atuam nas duas escolas pesquisadas.

A prática da etnografia educacional é uma dessas metodologias, que, para além de observar uma cultura, utiliza a descrição do outro (a partir de uma visão interna/êmica) como forma de reconhecimento. Para André (2007), o pesquisador que conhece um lugar, a partir do ponto de vista do grupo, dando volume às vozes locais, parte para uma pesquisa do tipo etnográfica ou observação participante.

O contato com a educação do campo me possibilitou estabelecer um estudo do tipo etnográfico em educação. Esta opção nos permitiu transitar pelas técnicas de análise de documentos e observação participante, com base no que pondera André (2007). Dessa forma, utilizamos a observação participante,

Porque parte do princípio de que o pesquisador tem sempre um grau de interação com a situação estudada, afetando-a e sendo por ela afetado. As entrevistas têm a finalidade de aprofundar as questões e esclarecer os problemas observados. Os documentos são usados no sentido de contextualizar os fenômenos, explicitar suas vinculações mais profundas e completar informações coletadas através de outras fontes. (ANDRÉ, 2007, p. 28).

Como pesquisadora-participante não me limitei a descrever pessoas, mas também a registrar, em minha memória e no diário de campo, inúmeras práticas escolares e suas representações. Neste momento, o registro foi sem nenhuma intencionalidade pedagógica, pois ainda não percebia como poderia contribuir para mudança educacional daquele lugar e das pessoas que integravam aquele processo educacional.

Para o tratamento das fontes, fundamentamo-nos também na perspectiva da História Cultural, a qual reconhece as ações dos sujeitos dentro da sociedade e busca entender as representações, as interpretações e os sentidos que esses dão à realidade que os cerca e também considera como parte da história, as experiências vividas pelos sujeitos comuns.

Na condição de professora - pesquisadora, fez-se necessário manter certo distanciamento, a fim de preservar o rigor científico da pesquisa, buscando compreender os problemas que se constituem em obstáculos ao fazer etnográfico. Atuar como docente do campo durante esse tempo possibilitou a abertura para coleta das informações. Foi a participação no cotidiano escolar que viabilizou a interação com o grupo de sujeitos – professores, gestores e alunos analisados. Em nosso contato direto na dinâmica escolar, fizemos a descrição, com base, principalmente, nos estudos de documentos e observações.

As teorias apoiaram o confrontamento dos dados, os quais, nesse estudo, foram articulados nos referenciais teóricos encontrados, e nos registros das observações por meio do diário de campo.