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2. REVISÃO CONCEITUAL

3.1 Receitas: Natureza, Reconhecimento e Mensuração

3.1.1 Receitas de Construção

3.1.1.1 Natureza

A receita de construção nos contratos de concessão pertence ao parceiro privado, pois, é a sua remuneração pela construção da infraestrutura, que neste caso, é de propriedade do Estado (assunto a ser discutido em tópico específico). Em outras palavras, como a infraestrutura necessária para a prestação de serviços é de controle do poder concedente, é como se este contratasse a SPE para prestar serviço de construção para ele. A construção de ativos para o poder concedente tem, a princípio, dois grandes impactos nas demonstrações contábeis do parceiro privado: i) as receitas (e custos) da atividade de se construir, e ii) o tratamento contábil do produto da construção.

Para entender porque a SPE (ou o outro parceiro privado qualquer) terá que reconhecer receita de construção, mesmo ela não sendo uma empresa do segmento de construção em que, às vezes até subcontrata uma empresa especializada para realizar a construção prevista no contrato, é necessário entender conceitos econômicos relacionados ao valor adicionado.

Ressalta-se que mesmo que a SPE não receba nenhum pagamento pela construção no período inicial do contrato, ela deve reconhecer a receita de construção, pois, ela está constituindo um direito de receber caixa ou de cobrar tarifa dos usuários e economicamente a

empresa está gerando e distribuindo riqueza na construção de um ativo. Em outras palavras, mesmo que não exista contratualmente um fluxo de caixa associado diretamente à construção, essa atividade vai ser remunerada, de alguma forma, pelos fluxos de caixa do contrato como um todo. Esse aspecto em particular pode gerar polêmica, pois em última instância, impele ao contratado (privado) conhecer mais profundamente suas atividades operacionais e seus riscos. Em termos financeiros, o parceiro privado é que tem a necessidade de saber quanto, quando e como os fluxos de caixa decorrentes do contrato irão remunerar a atividade de construção e/ou reforma e/ou manutenção da infraestrutura.

Um exemplo pode ajudar nessa discussão: um parceiro privado constrói uma infraestrutura no ano 01, começa a operá-la no ano 02 mas somente vai começar a receber fluxos de caixa a partir do ano 03, quando continuar a prestar serviços com a infraestrutura construída. Nesse caso fica claro a necessidade de o parceiro privado saber segregar o quanto de fluxo de caixa será para recuperar os custos da construção, o quando para remunerar a margem (lucro) da construção, o quando remunerar os custos da prestação de serviço e o quanto para remunerar a margem dos serviços prestados. Daí um dos aspectos complexos da contabilização de certos contratos de concessão, mas não o único.

No caso do reconhecimento da receita de construção pela concessionária, a contabilidade está mais próxima do modelo econômico, pois, utiliza-se o conceito de produção para obter o valor adicionado, e não o conceito de vendas, pois, à medida que a concessionária está cumprindo com a sua obrigação de construir a infraestrutura, ela vai reconhecendo esta receita.

É como se ao final ela estivesse vendendo a infraestrutura ao poder público, que estaria remunerando-a, por meio de um direito incondicional de receber ‘caixa’ e/ou um direito de cobrar tarifas diretamente do usuário.

Ademais é como se a concessionária construísse e vendesse a construção para o Estado. Em termos econômicos, a atividade de construção está utilizando recursos e insumos, ou seja, está agregando valor.

Cita-se, como exemplo, o caso de construção de ativos próprios, para uso, por qualquer empresa. Na Demonstração do Valor Adicionado – DVA aparece a receita de construção de ativos próprios, independente do ativo ser vendido. É como se a empresa construísse o ativo próprio e o vendesse para si mesma.

No caso das concessões, fica mais claro ainda a geração e agregação de valor na fase de construção. Em essência, o parceiro privado está construindo um ativo do e para o Estado, e efetivamente o está vendendo. É diferente de uma venda de real state ‘normal’, em que o fluxo de caixa dessa venda ou da receita de construção está embutido nos fluxos de caixa a serem obtidos durante o período de operação da infraestrutura, via recebimento da contrapartida do poder concedente, ou via cobrança diretamente do usuário, ou ambos.

Um outro assunto que precisa ser esclarecido é relacionado à margem de lucro da fase de construção. No caso de o parceiro privado fazer ele mesmo a construção, é óbvio que haverá uma margem de lucro, pois a receita corresponderá ao valor justo que a empresa obteria se vendesse a infraestrutura para terceiros.

Dessa forma fica óbvia a existência de uma margem de lucro na construção. Ao se entender essa margem de lucro no sentido econômico, há que interpretar esta como sendo a remuneração dos fatores de produção e do custo de oportunidade do parceiro privado, sendo que esse custo de oportunidade reflete o risco de performance (da construção) que o parceiro privado assume ao assinar o contrato de concessão.

E tendo em vista que os contratos de concessão ultrapassam diversos períodos contábeis, o momento do reconhecimento da receita é ao longo do período de execução da obra e deve ser reconhecida, conforme determina a IFRIC 12, de acordo com a IAS 11 (contratos de construção), bem como os custos e despesas associadas com a mesma.

A IAS 11, em seu parágrafo 3°, define dois tipos de contratos de construção: contrato de preço fixado e contrato de custo mais margem (cost plus):

a) Contrato de preço fixado é um contrato de construção em que o contratante concorda com um preço pré-fixado ou com uma taxa pré-fixada, por unidade concluída que, em alguns casos, está sujeito às cláusulas de custos escalonados.

b) Contrato de custo mais margem (cost plus) é um contrato de construção em que o contratado é reembolsado por custos projetados e aprovados pelas partes - ou de outra forma definidos – acrescido de um percentual sobre tais custos ou por uma remuneração pré-fixada.

Os contratos de concessão podem ser celebrados de variadas formas e com características distintas, por isso deve-se, antes de reconhecer a receita de construção, classificá-los como preço fixado ou cost plus, podendo ainda encontrar em um só contrato as duas características. A distinção é importante para estimar o resultado do contrato, porque

conforme o tipo, a contabilização terá tratamento diverso quando do reconhecimento da receita e do custo da construção.

Em regra deve-se contabilizar cada contrato de construção separadamente, embora existam exceções em que os mesmos podem ser segmentados ou combinados:

i) Contrato que possui vários ativos nesse caso, o contrato deve conter propostas separadas para cada ativo; ter sido negociado em separado e os custos e receitas serem identificáveis para cada ativo. Se forem atendidos todos os três requisitos, cada ativo deve ser tratado como um contrato específico.

ii) Grupo de contratos que deve ser tratado como um único contrato, mas somente se atender todos os três requisitos: nesse caso, a negociação é feita como se fosse um único contrato, além de possuir margem de lucro interrelacionada e execução dos contratos simultaneamente ou em sequência contínua.

No caso ainda de o contrato prever a possibilidade de construção de um ativo adicional ou mesmo futuramente vier a ser alterado para a construção deste deve ser tratado como um contrato em separado se for significativamente diferente do ativo contido no contrato original, ou o preço do ativo adicional for negociado em separado.

Em suma, deve-se, primeiramente, classificar o contrato de concessão na modalidade preço fixo ou cost plus, podendo ainda encontrar em um único contrato as duas modalidades. Logo após, definir se o contrato deve ser tratado como único, ou se prevê a construção de vários ativos que devam ser segmentados, ou seja, vários contratos.

Já a opção da combinação de contratos, no caso dos contratos de concessão observa- se, pelo menos até o momento que dificilmente deva existir pela peculiaridade a que estão expostos, pois são celebrados por meio de processo licitatório, o que impossibilita a realização de vários contratos; margem de lucro interrelacionada.

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