• Nenhum resultado encontrado

3.6 A DIVULGAÇÃO NOMINAL DOS VENCIMENTOS SOB A ÓTICA DA

3.6.2 Necessidade

O exame da questão sob a ótica da necessidade revela, no entanto, a

excessiva (e, portanto, desnecessária) investida em face da privacidade dos agentes

públicos. Renove-se, no ponto, a ideia, nas palavras de Humberto Ávila

240

, de que

238 Outra obrigação acessória, decorrente da obrigação de prestar informação clara e em linguagem

de fácil compreensão, é a necessária justificativa para haver eventual diferença entre valores recebidos por pessoas que ocupem os mesmos cargos (como adicionais por tempo de contribuição, por exemplo).

239 DA SILVA, Virgílio Afonso. Direitos fundamentais [...]. Op. cit., p. 170. 240 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. Op. cit., p. 121.

“um meio é necessário quando não houver meios alternativos que possam promover

igualmente o fim sem restringir na mesma intensidade os direitos fundamentais

afetados”.

A divulgação, sobretudo pela internet, nos termos da lei,

241

de modo didático,

e em linguagem acessível, pelo órgão ou pessoa jurídica, da maior quantidade

possível de informações pertinentes às remunerações dos agentes públicos (sem a

necessidade de informação individualizada acerca de cada remuneração)

implementaria suficientemente, até mesmo com ganho de qualidade, o direito à

informação.

Tome-se, como exemplo, aa forma de divulgação adotada pelo Supremo

Tribunal Federal, que criou, em seu endereço eletrônico na internet

242

, uma “central

do cidadão” – portal didático, muito provavelmente um dos mais qualificados de que

se tem notícia, em matéria de direito à informação, no país.

A Corte, já se adiantou anteriormente, divulga as remunerações

nominalmente, em lista organizada por ordem alfabética. É possível, escolhendo o

mês e ano desejados, acessar as remunerações de todos os ministros, ativos e

inativos, juízes em colaboração, servidores, ativos e inativos, e pensionistas.

Ao clicar no nome da pessoa de quem se deseja saber a informação,

recebem-se informações sobre o cargo ocupado, o valor bruto da remuneração, o

valor líquido e os respectivos descontos legais. Não há, no entanto, informações

acerca da base legal das remunerações ou subsídios, das médias remuneratórias

por cargo ou mesmo qualquer justificativa para a disparidade de valores recebidos

por ministros.

A análise dos subsídios dos ministros, no mês de Junho de 2014, por

exemplo, indica que, no período, uns ganharam mais do que os outros. Não há, no

portal, como dito, um dos mais completos de que se tem notícia, nenhuma

explicação.

De modo diverso, se todas as informações relacionadas à remuneração ou

subsídio fossem prestadas, na dicção da lei, de forma transparente, clara e em

linguagem de fácil compreensão, a divulgação nominal, em lista, não seria

necessária.

241 Art. 8º §2º.

242 http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=centralDoCidadaoAcessoInformacao, acesso

A divulgação, na forma ora proposta, seria tão (ou mais) eficaz que a

divulgação nominal, pois permitiria ao cidadão não apenas saber quanto estaria

sendo gasto pelo órgão ou pessoa com seus agentes, mas, também, quanto se

gasta com cada um e, ainda, quais os vencimentos (e qual a base legal de cada

vantagem, gratificação ou indenização) cabem a cada função pública.

Deve-se ter sempre em vista que o direito à obtenção de informações de

interesse público não é um fim em si mesmo; objetiva, sem dúvida, fomentar maior

participação popular nas ações estatais (o chamado controle social dos gastos

públicos).

243

Não parece ser por outra razão que a Constituição Federal atrelou (art. 37,

§3º) o acesso à informação sobre os atos estatais a formas de participação do

usuário na Administração Pública.

A divulgação da informação mais completa possível (com a ressalva à

identificação nominal) implementaria, satisfatoriamente, o dever de transparência

ativa, com a vantagem de, nesse caso, promover mínimo ingresso no âmbito de

proteção

244

do direito à privacidade.

De modo diverso, quando presente interesse de conhecimento sobre a

remuneração de um determinado agente público em especial, o acesso à informação

poderia ser requerido ao órgão ou pessoa responsável, na forma do art. 10 da Lei n.º

12.527/2011.

E, para decidir a respeito, o administrador contaria com as balizas

interpretativas estabelecidas pelo art. 31 (que trata das informações pessoais).

Alguém, com a pretensão de acionar um servidor público para haver

alimentos, por exemplo, poderia, mediante requerimento fundamentado, requerer a

informação.

243 A Constituição Federal prevê, ainda, no artigo 216, que trata do patrimônio cultural brasileiro, que

“Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.” No parágrafo 1º do artigo 216, inciso IX, consta, ainda, o princípio da “IX - transparência e compartilhamento das informações”.

244 A invasão ao âmbito de proteção seria mínima se adotada a teoria ampla do suporte fático.

Poderia ser considerada até mesmo inexistente em uma concepção restritiva do suporte fático do direito à privacidade, a partir da qual se poderia argumentar que a divulgação de salários de pessoas que recebem dinheiro público, sem referência ao nome, sequer estaria protegida pelo direito à privacidade. A respeito, a título de referência, cite-se a posição de Canotilho: “Se alguma diferença hoje existe, talvez seja a de que a teoria externa e do tatbestand alargado permitem adaptar-se melhor os desafios da inclusividade e da multiculturalidade com que hoje se defronta a justiça constitucional.” Canotilho, José Joaquim Gomes. Dogmática de direitos fundamentais e

Interesses outros, de caráter geral, como, por exemplo, o de alguém que

deseje ingressar com ação popular (em decorrência de ter verificado, por exemplo,

distorções na folha de pagamento de determinado órgão) poderiam seguir o mesmo

caminho.

Em tais casos, e em tantos outros que se possa pensar, a informação

poderia ser devidamente disponibilizada, à vista do que prevê a própria Lei de

acesso à informação (art. 31, §3º).

De qualquer sorte, toda e qualquer negativa administrativa sempre estaria

submetida ao controle jurisdicional.

Por tais razões, pode-se concluir que a divulgação nominal não sobrevive ao

crivo da proporcionalidade, por ser desnecessária.