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3 QUESTÕES CONTROVERTIDAS QUANTO À APLICAÇÃO DA TUTELA EM

3.2 Aplicabilidade e controvérsias acerca da estabilização dos efeitos da tutela

3.2.2 Necessidade de recurso

Numa interpretação literal do art. 304, a única forma de obstar a estabilização será com a interposição de recurso, sendo, em regra, o agravo de instrumento113. Não basta que o réu conteste a ação, demonstre sua insatisfação por meio de contestação. Ele terá, neste caso, que obrigatoriamente interpor recurso.

112 FUX, Luiz. Comissão de Juristas Responsável pelo Anteprojeto de novo CPC. Exposição de motivos do

anteprojeto de código de processo civil de 2015. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2015.

113 Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

Deve-se ter cautela com a interpretação desse dispositivo, pois o legislador optou de forma expressa pelo recurso como meio de obstar a estabilização. Inicialmente, o projeto de lei previa a utilização de um termo mais abrangente, a “impugnação”114 como forma de obstar a estabilização. Posteriormente, houve essa modificação na Câmara dos Deputados para admitir apenas o recurso.

Conceição, Mello, Ribeiro e Wambier entendem de forma diferente da redação dada ao art. 304. Para eles “qualquer forma de oposição (v.g., contestação, reconvenção) deve ter o condão de evitar a extinção do processo”115. Heitor Vitor Mendonça Sica segue no mesmo sentido:

Entendo que esse dispositivo não deixa o juiz ‘de mãos atadas’ diante da inércia do réu em recorrer da decisão antecipatória, podendo nesse momento revogar ou modificar a decisão com base no novo cenário fático-probatório desenhado pela defesa do réu.116

Num primeiro momento pode-se pensar que se o objetivo do código é trazer maior eficácia às demandas judiciais não faria sentido exigir somente o recurso, com seus custos, burocracias, prazos, para obstar os efeitos. A estabilização veio para evitar conflitos desnecessários quando as partes, autor e mesmo o réu, se conformam com a tutela concedida. A contestação, portanto, seria o meio suficiente e adequado que o réu tem de demonstrar sua resistência, seu inconformismo. Além disso, ao admitir-se somente o recurso como forma de impugnação apta a obstar a estabilização poderá ocorrer um potencial aumento na quantidade de agravos de instrumento, travando os tribunais.

Segundo Marinoni, Arenhart e Mitidiero, o que basta é a manifestação do réu “[...] inequívoca no sentido de exaurir o debate com o prosseguimento do procedimento”117. Nesse sentido, uma eventual impugnação através de contestação, dentro do prazo de 15 dias, pode ser tida tão somente como objeção à estabilização e não como insurgência à concessão da tutela.

No entanto, com tal pensamento Antonio de Moura Cavalcanti Neto não concorda:

114 O art. 288, § 2º, na versão aprovada no Senado em junho de 2010 – Projeto de lei 166 – dispunha que

“concedida a medida em caráter liminar e não havendo impugnação, após sua efetivação integral, o juiz extinguirá o processo, conservando a sua eficácia”. Redação que foi alterada na Câmara dos Deputados, Projeto Lei 8.046, em 2014.

115 CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; MELLO, Rogerio Licastro Torres de; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva;

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. op. cit., p. 512

116 SICA, Heitor Vitor Mendonça. Doze problemas e onze soluções quanto à chamada ‘estabilização da tutela

antecipada’. In: DIDIER JÚNIOR, Fredie (coord. geral). Tutela provisória. Salvador: Editora JusPODIVM, 2015. p. 354

A apresentação de contestação pelo autor representa erro grosseiro, pois não há o que contestar. Quando o autor é citado para contestar no Procedimento Comum tem o dever de atacar os fatos e fundamentos da petição inicial. No caso da tutela antecipada antecedente, ele, se não se conformar, deve impugnar a decisão provisória. Ademais, nem há pedido final a ser contraditado, uma vez que o seu prazo para resposta apenas começará a correr na forma do art. 303, § 1º, II e III, que remetem aos arts. 334 e 335, todos do CPC.

Ainda para esse jurista, permitir a contestação seria usurpar a competência do tribunal, órgão competente para julgar agravo de instrumento. Assim, se a impugnação tem por finalidade obstar a estabilização e, portanto, combater a decisão provisória, a contestação não será a peça hábil a tanto, eis que sua finalidade é completamente outra. O mesmo processo teria, então, que ter duas contestações. A primeira como impugnação da tutela de urgência e da estabilização de seus efeitos e a segunda a fim de impugnar a integralidade da pretensão do autor.

Se o objetivo da estabilização da tutela é encerrar com o processo quando as partes contentam-se no plano fático com a tutela concedida qualquer forma de impugnação deve ser entendida como suficiente para obstar a estabilização. Isto é, se as partes abrem mão do seu direito de buscar uma tutela definitiva, exauriente e se a estabilização refere-se tão somente às intenções das partes em continuar ou não com o processo, exigir apenas o recurso, não aceitando outra forma de impugnação, seria impor a estabilização àquele que assim não deseja. Exemplifica-se: o réu citado e intimado quanto à concessão da tutela antecipada antecedente apresenta contestação, não se insurgindo quanto ao mérito da tutela concedida, mas somente quanto à estabilização. Requer a continuidade do processo com a devida instrução probatória para ao final receber a tutela definitiva. Ora, aplicar neste caso a estabilização da tutela seria esvair o objetivo do instituto.

Relativiza-se a jurisdição como monopólio do Estado para conferir autonomia às partes. Os sujeitos processuais devem decidir sobre a conveniência do prosseguimento da ação. Ninguém melhor do que eles para entender os reais objetivos do processo. Assim, tanto o recurso quanto a contestação ou qualquer outra forma de impugnação apta a manifestação inequívoca do réu no sentido de exaurir a lide com a decisão sumária.