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A necessidade de separar RL da APP e de manter RL predominantemente com espécies nativas

(RL) PARA CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

1.3.5 A necessidade de separar RL da APP e de manter RL predominantemente com espécies nativas

Uma das atuais propostas de alteração do Código Florestal expande as possibilidades de incorporar a APP no cômputo da RL de todas as propriedades. O maior objetivo dessa alteração é a redução do passivo ambiental, uma vez que esse mecanismo não deverá ser autorizado caso implique na supressão de novas áreas de vegetação nativa. Com essa alteração, uma propriedade (com mais de quatro módulos fiscais) que in- cluir 10% de APP só precisará manter mais 10% adicionais como RL; aquela que tiver mais de 20% de APP não terá de manter qualquer RL. Haveria assim uma substituição de RL por APP.

Esse cálculo combinado não faz sentido em termos biológicos. Áreas de APP e RL possuem funções e características distintas, conservando diferentes espécies e serviços ecossistêmicos. Áreas de APP ripárias diferem das áreas entre rios mantidas como RL; analogamente, APPs em encostas íngremes não equivalem a áreas próximas em solos planos que ainda mantêm vegetação nativa, conservadas como RL.

As APPs protegem áreas mais frágeis ou estratégicas, como aquelas com maior risco de erosão de solo ou que servem para recarga de aquífero, seja qual for a vegetação que as recobre, além de terem papel importante de conservação da biodiversidade. Por se lo- calizarem fora das áreas frágeis que caracterizam as APPs, as RLs são um instrumento adicional que amplia o leque de ecossistemas e espécies nativas conservadas. São áreas complementares que devem coexistir nas paisagens para assegurar sua sustentabilida- de biológica e ecológica em longo prazo.

Cabe destacar ainda que, ao contrário das APPs, as RLs podem ser manejadas pelos proprietários que delas podem extrair madeiras, essências, flores, frutos e mel. Portan- to, as RLs são fonte de trabalho e renda para o proprietário, desde que as atividades exercidas não comprometam a sobrevivência das espécies nativas que abrigam. Entre outras causas, o descumprimento do Código Florestal vigente no que tange às APPs e RLs é um dos principais fatores responsáveis pelo contínuo aumento no nú- mero de espécies brasileiras vulneráveis e ameaçadas de extinção nas listas atualizadas periodicamente pelas sociedades científicas e adotadas pelos órgãos e instituições da

área ambiental1.

Na região amazônica, a redução das RLs diminuiria o patamar de cobertura florestal a níveis que comprometeriam a continuidade física da floresta, aumentando signifi- cativamente o risco de extinção de espécies, comprometendo sua efetividade como ecossistemas funcionais e seus serviços ecossistêmicos.

1 Vide Portaria IBDF nº 303, de 29 de maio de 1968; Portaria IBAMA nº 1522, de 19 de dezembro de 1989; Instrução Normativa MMA nº 03, de 27 de maio de 2003; Instrução Normativa MMA nº 05, de 21 de maio de 2004 e Instrução Normativa MMA nº 52, de 08 de novembro de 2005.

A restauração das áreas de RL, viável graças ao avanço do conhecimento científico e tecnológico, deve ser feita, preferencialmente, com espécies nativas, pois o uso de espécies exóticas compromete sua função de conservação da biodiversidade e não as- segura a restauração de suas funções ecológicas e dos serviços ecossistêmicos. É neste componente (RL) que se constata o maior passivo ambiental do setor agropecuário brasileiro. Novas técnicas de restauração e manejo sustentável de espécies nativas de- vem ser utilizadas para adequação legal e ambiental da propriedade rural.

A sobrevivência das espécies depende de suas habilidades de se deslocarem pela pai- sagem. Onde a vegetação original encontra-se reduzida e dispersa em inúmeros frag- mentos, isolando e reduzindo o tamanho das populações nativas que nela vivem, cor- redores de vegetação nativa podem ter papel capital, pois muitas espécies silvestres não conseguem usar ou cruzar áreas abertas criadas pelo homem, nem quando se trata de interferências muito estreitas como estradas (DEVELEY e STOUFFER, 2001).

1.3.6 A possibilidade de agrupar as RLs de diferentes proprie-

tários em fragmentos maiores e/ou compensar a RL em outra

propriedade ou região

Uma possibilidade a ser considerada é a estipulação de um valor percentual de vegeta- ção total a ser mantido por propriedade ou bacia hidrográfica, privilegiando aquelas com maior valor biótico e funcional. Esse percentual deve garantir ao mesmo tempo espaços para atividade econômica e para a conservação de ecossistemas e seus serviços, beneficiando inclusive as áreas de produção agrícola nas cercanias. Dentro da exten- são assegurada à vegetação nativa deveriam estar incluídas, obrigatoriamente, todas as APPs, completando-se o percentual total estipulado com RL.

A compensação de RL fora da propriedade deve ser restrita às áreas situadas nas mes- mas regiões biogeográficas e com equivalência nas formações fitofisionômicas. Dessa forma, é impossível pensar em compensação dentro de todo um bioma. Essas com- pensações só devem ser possíveis em áreas geográficas mais restritas, possivelmente como aquelas gerenciadas pelos Comitês de Bacia. Nesse caso, a disposição das RLs permitiria não apenas pensar nas melhores áreas para a conservação da biodiversidade, mas também como naquelas que mais trariam benefício para a proteção dos recursos hídricos e do solo ou a restauração com florestas nativas das áreas inadequadamente disponibilizadas para agricultura no passado, hoje marginalizadas em função de sua baixa aptidão.

É também necessário definir uma cota máxima de compensação dentro de uma região para não criar amplos contrastes com paisagens muito depauperadas de vegetação em determinadas bacias e outras com alta concentração de RL. Esses contrastes não são desejáveis, não apenas por criar paisagens pobres em termos biológicos, mas também

porque os benefícios ecossistêmicos das RLs são mais intensos se elas estiverem próxi- mas das áreas produtivas.

É ainda necessário repensar o uso de espécies exóticas dentro da RL. Elas podem ser úteis para acelerar ou facilitar a restauração dessas áreas nos primeiros estágios de res- tauração da RL, mas não deveriam ser consideradas como elementos permanentes das RLs. O uso sustentável de recursos naturais deveria ser a prioridade, podendo inclusive tornar-se uma alternativa econômica mais rentável do que o uso agrícola do solo, no caso da Amazônia.

1.4 A IMPORTÂNCIA DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO