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Neoliberalismo no Contexto Mundial: uma Rápida Introdução

1 DA REFORMA SANITÁRIA AOS REFLEXOS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO

1.2 O Neoliberalismo no Brasil na Década de 1990 e suas Consequências para a

1.2.1 Neoliberalismo no Contexto Mundial: uma Rápida Introdução

O neoliberalismo surgiu na década de 1940, precisamente depois da Segunda Guerra Mundial, contra as correntes majoritárias da época: a social democracia com influência do keynesianismo e o socialismo da União Soviética. O ano preciso de seu principal texto de origem “O Caminho da Servidão”, de Friedrich Hayek18, é 1944, início do auge do antípoda Estado do Bem Estar Social, que exibia crescimento econômico, alto índice de emprego via construção de obras públicas e reerguimento da onda de expansão adquirindo respaldo no sistema capitalista mundial. (ANDERSON, 1995). A obra de Hayek, como o título demonstra, defende que as regulações do Estado vigente podem levar a uma servidão de novo tipo, uma “servidão moderna”, pois não haveria competitividade e liberdade para os mercados, prejudicando uma espécie de seleção natural onde os melhores indivíduos prevaleceriam, numa interpretação que flertava com o “darwinismo social”. Sendo assim, Hayek - e também Friedman - advoga por uma versão radical de um liberalismo regressivo. (FILGUEIRAS, 2006).

O que podia parecer uma ideia exótica restrita a um gueto de intelectuais da extrema direita se transformou em realidade com a crise fiscal do Estado (O’CONNOR, 1977)19

e seus choques do petróleo na década de 1970. A Sociedade de Mont Pèlerin (estação da Suíça onde se reuniam periodicamente para criticar o solidarismo e o estatismo) acusou como causa principal da crise do Estado de Bem Estar o excessivo poder de influência dos sindicatos e de todo o movimento operário que, nas palavras dos neoliberais, estariam colocando como refém toda a sociedade e o governo dos principais países da Europa central ao chantagear por melhores salários e gastos sociais, prejudicando as bases de acumulação capitalista. (ANDERSON, 1995).

Tal acusação do grupo liderado por Hayek e Friedman ecoou como grande solução para a crise do Estado e conseguiu preencher o vazio de legitimidade deixado pelo keynesianismo nos governos conservadores que assumiam o poder já no final da década de 1970 e início de 1980 na Europa e nos Estados Unidos. Margareth Thatcher, em 1979, na Inglaterra; Ronald Reagan, em 1980, nos Estados

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Pensador da Escola Austríaca que, juntamente com Milton Friedman, da Escola de Chigaco, se transformariam nas grandes referências do ideário neoliberal pelo mundo.

19 A crise fiscal do Estado, para O’Connor (1977), se resume a uma crise do modo de produção

Unidos, seguidos por Helmut Kohl, em 1982, na Alemanha e Poul Schlüter, em 1983, na Dinamarca. Logo após, a maioria dos países de toda a região europeia e inclusive de outros continentes, como a Oceania e a Ásia, de distintos espectros partidários (inclusive os socialistas Miterrand na França e Papandreou, na Grécia) incluiria a ideologia neoliberal como prática de governo.

Destacamos a impressionante hegemonia construída pelos defensores do neoliberalismo no sistema capitalista mundial, seja por meio de apoio do capital financeiro internacional, financiando projetos e candidaturas políticas, seja por meio da grande mídia e parte da intelectualidade, que sublinhavam diuturnamente as benesses do sistema restritivo e competitivo influenciando não somente a estrutura do processo de produção e reprodução do capital, mas também a superestrutura do sistema, determinando, dessa forma, uma “subjetividade antipública”, nos dizeres de Biondi (2000).

Os principais pontos do projeto neoliberal executados pelos governos eram a diminuição das altas taxas inflacionárias por meio de altas taxas de juros, crescimento do desemprego (aumento do exército industrial de reserva) para frear a pressão sindical e fomentar a competição entre os trabalhadores aumentando a desigualdade e privatizações de empresas estratégicas com o intuito de aumentar a receita do governo e dinamizar a atuação do mercado, diminuindo a presença do Estado no âmbito econômico. Tais propostas, se cumpridas, segundo os defensores do neoliberalismo, permitiriam que os países voltassem a altos índices de crescimento numa nova fase de expansão, tal qual os anos de ouro do capitalismo, mas desta vez, com uma nova roupagem, moderna e modernizante sem o peso carcomido do Estado. (HARVEY, 2008).

A principal aposta dos neoliberais foi um fiasco, já que não houve, na esmagadora maioria dos países onde foi implantado, crescimento econômico e recuperação de lucros. O neoliberalismo foi posto em prática, numa primeira fase, na Europa e nos Estados Unidos, substituindo governos que defendiam intervenção estatal por meio dos denominados Estado do Bem Estar Social e o “New Deal”, respectivamente. A principal implementação do neoliberalismo, porém, e a que comprova mais uma vez a força de sua hegemonia, foi nos países do Leste Europeu, que antes estavam sob influência do stalinismo soviético, que defendiam e atuavam com base na expropriação da burguesia, no monopólio do comércio exterior e planificação econômica e que tiveram que mudar drasticamente seu plano

político e econômico com a queda do muro de Berlim no final da década de 1980 e início da década de 1990 efetivando, de modo rígido, o ideário neoliberal. (ANDERSON, 1995; HARVEY, 2008).

Depois do Leste Europeu, o neoliberalismo entrou numa terceira fase de expansão também no mesmo período dos ex-países soviéticos, ao ser introduzido por governos latinoamericanos como os de Carlos Salinas, no México em 1988, Carlos Menem, na Argentina, em 1989, Carlos Andrés Perez, em 1989, na Venezuela, Alberto Fujimori, em 1990, no Peru e Fernando Collor, em 1990, no Brasil. Tal continente abraçou a causa neoliberal com entusiasmo pois na década de 1980 sofreu bastante com a hiperinflação, justamente o que o neoliberalismo sabia melhor combater prejudicando todos os outros fatores macroeconômicos, como ficou comprovado historicamente.

Lembramos também que a América Latina, especificamente o Chile, foi o primeiro laboratório do mundo de implementação do neoliberalismo. Foi no período da sangrenta ditadura do general Pinochet que o ideário do “Estado Mínimo” foi aplicado com toda a força, sob influência majoritária da Escola de Chicago, com cortes sociais, privatizações, desregulamentações, invasão de empresas estrangeiras e estrangulamento dos movimentos sociais, principalmente do combativo movimento dos trabalhadores do cobre. Milton Friedman elogiava o procedimento do Chile, pois era melhor testar o neoliberalismo num ambiente onde não havia nenhum vestígio de democracia, desta forma, tal ambiente ajudaria o desenvolvimento por completo das empresas privadas internacionais em todos os setores. O Chile foi o único país que, aplicando o receituário neoliberal, obteve um estável crescimento econômico sendo Pinochet aclamado pela Sociedade de Mont Pèlerin e, logo depois, por ninguém menos que a “dama de ferro” Margareth Thatcher. (ANDERSON, 1995).

Depois dessa introdução sobre o neoliberalismo em seu sentido geral, analisando as regiões onde foi implementado, buscamos compreender seu advento no Brasil, analisando suas peculiaridades e idiossincrasias nos âmbitos político e econômico.

1.2.2 O Surgimento do Neoliberalismo e suas Implicações Políticas,