• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II – ARGUMENTAÇÃO

2.2 Noções de Argumento/Argumentação

Pensar a argumentação na atualidade é sentir sua presença atrelada a diferentes campos do saber e a diferentes grupos de estudo e focos de atenção, o que resulta numa variedade de olhares, conceitos e até controvérsias quanto aos seus elementos conceituais e suas especificidades.

Tendo em vista que essa prática é uma área de estudo interdisciplinar, quer seja no campo teórico ou no senso comum, a palavra argumento/argumentação tem recebido

diferentes significados. Nesse contexto, perfilharemos algumas definições contempladas pela literatura vigente no campo da Psicologia.

Embora a definição de argumentação não seja ainda algo concluído, há um certo consenso, entre os teóricos dessa linha de estudo, sobre sua conceituação. Em tese, o argumento tem sido tradicionalmente tratado como um “meio pelo qual as afirmações do conhecimento são justificadas” (Rowland, 1987, p.140 In: Macedo, 1998). Seguindo esse pensamento, S. L. Santos (1996) e C. M. Santos (1996), fazem, em seus trabalhos, uma distinção entre o termo argumento e argumentação definindo o primeiro como uma proposição acompanhada de sua respectiva justificativa e a segunda como o processo de elaboração de um argumento. Tomando como base o pensamento de O’ Keefe (1977) - apresentado em S. L. Santos (1996) - essas autoras afirmam que a argumentação pode ser dividida em dois elementos básicos: argumento como produto e argumentação como processo.

Argumento como produto enfatizado na relação premissa-conclusão (forma proposicional) pressupõe um conjunto de proposições lingüisticamente expressas, dentre as quais uma premissa serve de justificativa para outra. Esse tipo de argumento sugere uma aproximação com a definição para esse termo no âmbito da lógica formal ou dedutiva.

Nesse tipo de lógica, um argumento lógico – ou válido - é aquele em que a conclusão é encontrada a partir da análise das relações entre as premissas dadas, sem considerar-lhes o conteúdo real (Dias, 1996).

Em contrapartida, a argumentação, como processo, é vista como uma atividade social, um processo interativo em que se contrapõem pontos de vistas diferentes em relação a um tema, sua justificativa e as considerações de objeções a este. Nessa perspectiva, o diálogo é a figura central da argumentação (S. L. Santos, 1996).

Essa forma de tratar a argumentação está engendrada em um contexto interacional, abrindo espaço para a idéia de uma negociação de significados (Rodrigues, 2001) na qual é fundamental a divergência de opiniões, a consideração do ponto de vista do outro e a tentativa de convencimento.

Tendo em vista essa definição, é possível caracterizar o ato argumentativo como uma atividade de natureza dialógica - envolve multiplicidade de perspectivas - e dialética - pressupõe antagonismos (Leitão, 2000). É válido esclarecer que, no processo de argumentação, ao trazer para seu contexto um elemento de oposição, ou seja, pontos de vistas alternativos, gera-se confronto entre esses e não, necessariamente, entre indivíduos. Um indivíduo pode, por exemplo, refletir sobre um tema controverso, considerando um “oponente imaginário” e não necessariamente a presença de outra pessoa com ele.

A perspectiva de considerar a implementação da dialogicidade e dialeticidade da argumentação viabiliza a construção de um espaço de negociação e discurso. Para Rodrigues (2001), “a argumentação é um processo no qual o sujeito procura distanciar- se de si mesmo, mas, sem perder de vista a própria posição, procurando assim, colocar- se no discurso de forma subjetiva, reconhecendo a variedade de orientações possíveis e alcançando o universo do outro” (p.26). Então, nesse movimento de ir e vir da dimensão dialética entre o eu e o outro, a negociação é tecida.

Essa perspectiva é bastante importante para o conteúdo deste trabalho por isso adotaremos, para o presente estudo, os principais conceitos relativos à argumentação e seus elementos constitutivos trabalhados por S. L. Santos (1996).

Para Macêdo (1998) – pesquisadora do grupo de S. L. Santos (1996) – o argumento pode ser considerado tanto como um meio de justificativa de conhecimento

quanto um meio independente de descoberta. Enquanto meio independente de descoberta do conhecimento, a autora explica:

Esse processo de descoberta ocorre no argumento dialético quando o argumentador testa suas afirmações em face a afirmações contrárias, isto é, ao tentar responder a um argumento contrário à sua posição, ele descobre que está errado e é forçado a modificar suas crenças, ou, ele pode tentar convencer o opositor de que o errado é ele. (Macedo, 1998, p.2)

Eemeren, Grootendorst & Henkemans (1996), apresentam um significado específico para o termo argumentação defendido hoje por vários teóricos da argumentação, qual seja:

A argumentação é uma atividade verbal, social e intelectual cujo objetivo é aumentar ou decrescer a aceitabilidade de um ponto de vista controverso por um ouvinte ou leitor, tendo em vista a apresentação antecipada de uma lista de proposições escolhida para justificar (ou refutar) um ponto de vista por meio de um julgamento racional (p.5).

Dessa forma, a argumentação é vista, por esses autores, como uma atividade que tem o propósito de convencer ou obter aprovação de alguém diante de um assunto controverso, isto é, modificar a representação que o interlocutor tem sobre a temática em questão. Para isso, exige-se que o argumentador construa um conjunto de premissas ou justificativas que validem as afirmações feitas. No entanto, para que o processo argumentativo se estabeleça de fato, é necessário que exista “o desejo de se estabelecer uma argumentação, uma vez que existem outras formas de se resolver uma controvérsia, como uma ameaça ou suborno, por exemplo” Rodrigues (2001, p.26).

A despeito da concretização da argumentação Almeida (1999) explica:

A argumentação é um tipo de discurso que só se produz em presença de divergências a respeito de temas polêmicos, sobre os quais não havendo consenso, ao menos duas posições competem entre si. Se por um lado, a divergência não é de modo algum negociável ou, por outro, há um consenso entre opiniões, não há porque argumentar. Somente em presença de competição de posições, e mais, em presença de divergências que possam vir a ser negociadas, faz sentido o estabelecimento de um discurso dessa natureza. (p.6)

No que se refere ao conceito de argumentação, destacamos os autores acima mencionados por considerarmos que a visão destes sobre essa atividade se mostra compatível com a visão de homem, sociedade, educação e conhecimento defendidos nesse estudo, ou seja: dialética, dialógica, processual e crítco/reflexiva.

No processo de negociação e construção de argumentos, o qual se dá num contexto interativo em que coadunam dialeticamente os interlocutores, seu pensamento e linguagem, destacaremos, nessa sessão, o pensamento como um dos elementos dessa engrenagem e para o qual o presente trabalho se volta através do estudo do raciocínio no campo da argumentação e moralidade.

Nessa perspectiva, o pensamento constitui-se um elemento central na tessitura do discurso, uma vez que argumentos fundamentam-se e são uma dimensão do pensamento, além de que originam-se na mente do argumentador ou como afirma Jackson & Jacobs (1980), Sproule (1980) citados em S. L. Santos (1996), que a sua construção é uma atividade intelectual.