CAMINHO METODOLÓGICO
3.1 PROJETO DIDÁTICO “GIBI NA SALA”
3.1.2 No projeto didático, filmagens, processos de escritura em ato
Ao lado da análise dos manuscritos escolares, os pesquisadores do L’ÂME começaram a investigar os processos de escritura em ato desses manuscritos47, precisamente, os dos manuscritos das duplas que haviam sido filmadas, tal como neste trabalho, tornando possível
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Nos dias 08 e 16 de outubro de 2008, como os alunos estavam muito agitados, a turma foi dividida em dois grupos, para a realização das propostas de produção. Ou seja, após a realização, por exemplo, da leitura da tira “Cebolinha e Mônica em: a tática do R”, houve divisão da turma em dois grupos. Um dos grupos permaneceu na sala de aula, o outro foi para a Sala de Leitura. Deste modo, duas duplas foram filmadas em cada um destes dias.
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Professor no CEDU da UFAL, Curso de Pedagogia, Programas de Pós-Graduação em Educação (PPGE) e em Letras e Linguística (PPGLL), além de pesquisador vinculado ao CNPq (nível I-D). Líder do ET&C, pesquisador associado ao Institut des Textes & Manuscrits Modernes (ITEM/CNRS), coordenador do LÂME e do convênio bilateral com o laboratório Ecole, Mutations, Apprentissages, (EMA), Université Cergy-Pontoise. Para maiores informações, http://lattes.cnpq.br/6822339713125905. Acesso em: 19 jan. 2012.
algum acesso à escritura se fazendo, com seus bloqueios, avanços, retomadas, reformulações, permanências. Calil (2008, p. 45-46) diz, porém, que:
Apesar de o fato de filmar dois alunos conversando sobre o que irão ou não escrever não significar que haja uma transparência naquilo que é dito, nem que o caráter empírico do dito e do escrito se sobreponha como evidência das negociações efetivadas, o processo discursivo que marca toda essa situação produz uma especificidade que seria completamente diferente se somente houvesse um aluno produzindo o texto ou se tivesse acesso apenas ao produto textual.
A manutenção de uma mesma díade, do início ao fim do projeto didático “Gibi na Sala”, era primordial para a análise da construção do DD. O caráter longitudinal do trabalho decorre de sua vinculação aos estudos em aquisição de linguagem escrita, o que também explica o fato dos estudos do L’ÂME voltarem-se para os primeiros textos dos alunos.
Como o projeto didático foi desenvolvido numa sala de aula, buscando interferir, o mínimo possível em sua dinâmica, era impossível - para o pesquisador - prever os dias em que os alunos não iriam comparecer. Logo, as duplas não foram mantidas, do início ao fim do projeto. Selecionou-se, então, a díade mais recorrente, no caso Ana e Maria, com três processos de escritura, realizados nos dias 08, 16 e 30 de outubro de 2008; destes, apenas os dois primeiros são aqui analisados. O terceiro processo será foco de trabalho posterior.
Ana (8,1 anos) é filha de um comerciante e de uma dona de casa que possuem EF incompleto. Quanto à Maria (8,2 anos), não se tem informações sobre a profissão de seu pai, mas, sabe-se que a sua mãe é dona de casa e que o casal concluiu a quarta série do EF (atual quinto ano do EF). Como a maioria dos alunos de sua turma, Ana e Maria não tinham contato anterior com HQ.
No processo da pesquisa, a construção co-enunciativa do DD é analisada numa espécie de “feedback”. A princípio é mostrado o manuscrito escolar, enfatizando-se os quadrinhos em que há DD. Ao se mostrar a transcrição linearizada do manuscrito, ou qualquer fragmento deste, a forma pela qual o aluno escreve é preservada. Quando houver necessidade, o pesquisador coloca entre colchetes a palavra escrita ortograficamente. Em seguida, passa-se ao processo de escritura do DD.
As indagações que conduzem este estudo são: por quais processos o DD passou até
chegar à configuração que consta no manuscrito? Como ele é construído? Para respondê-las
e, consequentemente, realizar o que foi proposto pelo trabalho, o processo de escritura em ato dos manuscritos escolares “O Cebolinha trapalhado” e “O meu cachorro é dorminhoco” é dividido em duas grandes partes. Na primeira, é exposta a combinação oral da história e na segunda, o momento em que as alunas começam a escrevê-la no manuscrito, o que não
significa, todavia, que não haja combinação da história, nesse último momento.
A construção co-enunciativa do DD é discutida, portanto, na relação entre o que foi materializado no manuscrito e os movimentos enunciativos (permanências, mudanças) de seu processo de escritura em ato. A referência para a análise é a delineação do DD nas HQ da TM, sob a forma de falas de personagens que dialogam em primeira ou terceira pessoa, verbos, predominantemente, no presente do indicativo, presença de dêiticos.
Todas as filmagens foram transcritas usando o ELAN, software48 desenvolvido pelo
Max Planck Institute for Psycholinguistics possuidor de ferramentas interativas que
incorporam à transcrição, de forma simultânea, precisa e temporal, distintos aspectos da situação filmada, como a consigna da atividade, interação aluno/aluno e professor/aluno.
Com a utilização do ELAN, foi possível associar, sincronizar e cronometrar a conversa das alunas, o que elas (não) escreveram, todos os elementos visuais (gestos, movimentos das mãos, olhos, corpo, expressões faciais, olhares), pausas, silêncios, hesitações, momentos em que rasuras gráficas e orais foram realizadas, dentre outros aspectos enquadrados pela filmadora que permitiram maior sincronia, entre os momentos em que se deu uma e/outra ação. Essas possibilidades podem ser organizadas em “trilhas” separadas, mas simultâneas.
Grosso modo, as etapas de transcrição apreenderam seleção da filmagem (vídeo) a ser transcrita, sua inserção no ELAN, que passa a exibir o vídeo em seu lado superior à esquerda. Em seguida, o pesquisador começou a transcrição (esta não é feita automaticamente pelo
software), no momento mesmo em que a filmagem está passando no programa, assim,
48 O ELAN pode ser obtido gratuitamente apelo site <http://www.lat-mpi.eu/> Fonte: Pesquisa Direta, 2008.
Figura 11: Transcrição na tela do ELAN
TRILHAS