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109 No recorte anterior também identificamos uma alusão a inclusão

social, porém, esses atletas, com suas deficiências, só foram inclusos e respeitados por renderem, ou seja, quando estes provam que podem render, produzir nessa sociedade, eles conquistam o direito a cidadania, o direito de serem respeitados, antes disso não. No decorrer do texto amplia-se o entendimento de inclusão e cidadania para além dos deficientes físicos, apontando a necessidade de incluir os desfavorecidos com políticas de moradia, saúde, alimentação, projetos esportivos, culturais e artísticos. Aponta-se também a importância de inclusão pela linguagem, pois essa pode expressar “respeito ou a discriminação”. Ainda, segundo o texto a inclusão social “é o processo em que a

sociedade se adapta para incluir cidadãos que não tiveram acesso a seus direitos fundamentais”.

Nesse texto identificamos uma contradição. Num primeiro momento, apresenta-se a ideia de inclusão social por meritocracia (produz/rende) e posteriormente a inclusão através de políticas públicas e de uma mudança da estrutura social.

O editorial é ilustrado pelo desenho do estudante Jonas A. A. – 11 anos 5ª série, São Bento de Sul. No desenho podemos observar a bandeira brasileira ao fundo e um cadeirante de frente para ela arremessando uma bola na tabela de basquetebol, o que evidencia, em primeiro lugar, a concepção de inclusão social/cidadania proporcionada pelo esporte e em segundo lugar uma ideia de nacionalismo, porém o pano de fundo dessa “inclusão social” é fundamentado pelo rendimento esportivo, como aconteceu com os atletas brasileiros que obtiveram sucesso nas paraolimpíadas, em Atenas 2004.

Outro texto da redação que também tematiza a lógica do rendimento e, de certa forma, tenta estender essa lógica aos estudantes. Na Página 10 do encarte de setembro de 2008, intitulada “Jogos

inesquecíveis”.

O texto introdutório da página (fig. 5) mostra o quanto os jogos vão deixar saudades, na expectativa de incentivar meninos e meninas a praticarem esportes, apesar do “Brasil” não ter ganhado tantas medalhas, porém, reconhecendo o esforço dos atletas. Achamos muito interessante apresentar o seguinte recorte do texto que diz: “tomara que a vontade de

se movimentar, de mexer o corpo, de praticar esportes também seja uma companheira desses meninos e meninas – futuros atletas do país. O número de medalhas não agradou tanto assim, mas os estudantes agradecem e reconhecem o esforço de cada atleta. Eles também fazem um apelo para os governantes por mais incentivo ao esporte – afinal

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quanto maior incentivo hoje maior a chance de os atletas voltarem com ouro no futuro”.

O que o texto deixa transparecer para o leitor, a nosso ver, é primeiramente a ideia de esporte como promotor de saúde quando aponta a necessidade do movimento, em segundo lugar a lógica do esporte rendimento quando usa o pouco número de medalhas como parâmetro para justificar a prática esportiva para menino e meninas “os

futuros atletas do país”. E por fim, o que achamos mais grave ocorre

quando citam os estudantes, dizendo que estes apelam ao governo por mais incentivo ao esporte, acabam por deixar pistas que levam a pensar na escola como um local de formação de atletas.

Nessa página ainda temos o texto do aluno de Itajaí (Leonardo A.P. – 10 anos, 4ª. série) (fig. 6). No texto podemos ver a influência da mídia e do fenômeno esportivo no processo de agendamento da vida cotidiana. Logo no primeiro parágrafo do texto o aluno escreve “Essas

olimpíadas mudaram mesmo a nossa rotina, esperamos chegar o dia das provas, esperamos, sofremos, nos emocionamos, torcemos e enfim comemoramos”.

Podemos ver que o tema agendamento também poderia ser contemplado no trabalho pedagógico, mas a olimpíada entrou na pauta principalmente para apresentar as regras dos diferentes esportes. O aluno escreve “Na minha escola as professoras sempre nos incentivaram a

praticar esportes, seja ele qual for. A minha professora de turma, Regina, juntamente com as professoras de EF Janaína e Eliane

Figura 5. Texto introdutório da página “Jogos inesquecíveis” (Fonte: AN Escola Rede Municipal, p. 10, set/2008.

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aproveitaram as olimpíadas para nos ensinar regras dos diferentes esportes”. Esse recorte contribui na identificação de outra forma de

agendamento.

Quando os professores estão ensinando as regras dos diferentes esportes e as características dos países participantes das olimpíadas eles também estão agendando o evento. Seria muito interessante se além de apresentarem esses aspectos também discutissem o próprio agendamento e suas formas de manifestação. Também identificamos elementos que evidenciam a concepção de rendimento no esporte quando escreve “Gosto muito de futebol, mas ainda não sou muito

bom”, e uma polissemia da palavra esporte, principalmente quando

relaciona a prática de atividade física como fator de promoção da saúde, classificando qualquer prática como esporte, como apresentado na frase:

“[...] já pratiquei capoeira também. Enfim gosto muito de praticar esportes e sei que é muito importante para nossa saúde”.

A ideia do rendimento e do agendamento aparece de maneira mais forte no trecho a seguir “conquistamos dez medalhas, 4 de ouro, 3

de prata e 3 de bronze, nos emocionamos em todas as provas, mas certeza o momento mais especial e emocionante para nossa vida foi a última prova dos jogos de Atenas. Foi na Maratona que [...] Vanderlei Cordeiro de Lima nos demonstrou o verdadeiro espírito de competição

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[...] um ataque inesperado de um torcedor irlandês completamente maluco.Vanderlei nos ensinou que o importante mesmo é competir, claro que ganhar medalhas é a meta de qualquer atleta”. Conclui o

texto tentando passar uma lição, escreve “Com tudo que aconteceu

aprendemos que o importante é não ficar parado, por isso mexam-se...”

Esse trecho evidencia a influência do discurso midiático gerando imposição de uma cultura esportiva, porém é bastante contraditório, pois ao mesmo tempo em que se incentiva a prática pautada no discurso da saúde (prática orientada), os meios influenciam no espetáculo transformando a estrutura do jogo, consolidando cada vez mais a cultura esportiva do telespetáculo.

Quando pensamos no telespetáculo, um dos elementos intrínsecos desse conceito é a erotização do corpo como estratégia de subjetivação do consumidor.

Ao refletir sobre o papel socializador das mídias Borges (2007, p. 97) entende que a

[...] erotização que ela promove, por meio de representações sobre sexualidade, corpo e gênero, opera no sentido da subjetivação não só de adultos, homens e mulheres, mas também trabalha, nas sociedades contemporâneas, para a formação das identidades infantis e juvenis. Numa sociedade onde as fronteiras entre o público e o privado se encontram esmaecidas, e na qual os discursos sobre a sexualidade são parte central dos conteúdos dos meios de comunicação, cria-se um conflito entre as formas tradicionais de perceber as necessidades da infância e o tipo de representações com os quais as crianças se deparam com insistente frequência no seu cotidiano. Esse tipo de preocupação que pretende separar as crianças dos conhecimentos e experiências do mundo adulto que se referem à sexualidade é um fenômeno da modernidade, consequência da construção ocidental da infância, que tem como um dos seus fundamentos a dessexualização das crianças.

Essa situação consiste num impasse, pois, exerce grande influência na construção da subjetividade já na infância. O mais instigante de tudo isso é saber que tal lógica está atrelada a questões econômicas. O corpo se torna uma mercadoria, ou melhor, a imagem do

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