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2. DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIAS NORMATIVAS AOS ÓRGÃOS E

2.1. Competências normativas primárias exercidas por órgãos distintos do

2.1.4. Normas expedidas pelo CNJ e pelo CNMP

Os Conselhos Nacionais da Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP) foram inseridos na Constituição pela Emenda Constitucional nº 45/04, no âmbito da denominada Reforma do Judiciário, com vistas ao fortalecimento do controle externo do Poder Judiciário e do Ministério Público, respectivamente.

As atribuições de um e de outro foram estabelecidas no art. 103-B17 e no art. 130-A 18 da Constituição da República. A questão que suscitou maior

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Art . 103-B. O Conselho Nacional de Just iça com põe-se de 15 (qui nze) mem bros com mandat o de 2 (dois) anos, admit ida 1 (uma) recondução, sendo:

[...]

§ 1º O Conselho será presidido pelo President e do Supremo Tribunal Federal e, nas suas ausências e impedim ent os, pelo Vice-President e do Supr emo Tribunal Federal.

§ 2º Os demais mem br os do Conselho serão nomeados pelo President e da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absolut a do Senado Federal.

§ 3º Não efet uadas, no prazo legal, as indicações previst as nest e art igo, caberá a escolha ao Supr emo Tribunal Federal.

§ 4º Com pet e ao Conselho o cont role da at uação adm inist rat iva e financeira do Poder Judiciário e do cum priment o dos dever es funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de out ras at r ibuições que lhe forem conf eridas pelo Est at ut o da M agist rat ura:

I - zelar pela aut onomia do Poder Judiciár io e pelo cumprim ent o do Est at ut o da M agist rat ura, podendo expedir at os regulam ent ares, no âmbit o de sua com pet ência, ou recomendar providências;

II - zelar pela observância do art . 37 e apreciar, de ofício ou mediant e provocação, a legalidade dos at os admi nist rat ivos prat icados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconst it uí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adot em as providências necessárias ao exat o cum priment o da lei, sem prejuízo da com pet ência do Tribunal de Cont as da União;

III - receber e conhecer das reclamações cont ra membros ou órgãos do Poder Judi ciário, inclusive cont ra seus serviços auxiliar es, servent ias e órgãos prest ador es de serviços not ariais e de regist ro que at uem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da compet ência disci plinar e correicional dos t ribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e det erminar a remoção, a disponibilidade ou a aposent adoria com subsídios ou pr ovent os proporcionais ao t empo de serviço e aplicar out ras sanções admi nist rat ivas, assegurada am pla def esa;

IV - repr esent ar ao M inist ér io Público, no caso de cr ime cont ra a administ ração pública ou de abuso de aut oridade;

V - r ever, de ofício ou mediant e provocação, os processos disciplinar es de juízes e m em bros de t ribunais julgados há m enos de um ano;

VI - elaborar semest ralment e relat ório est at íst ico sobre processos e sent enças prolat adas, por unidade da Federação, nos diferent es órgãos do Poder Judi ciário;

VII - elaborar relat ório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a sit uação do Poder Judiciário no País e as at ividades do Consel ho, o qual deve int egrar mensagem do President e do Supremo Tribunal Federal a ser remet ida ao Congr esso Nacional, por ocasião da abert ura da sessão legislat iva.

controvérsia deste a criação dos órgãos, diz respeito ao poder normativo que lhes foi conferido pelo Texto Constitucional.

Em relação ao poder normativo do CNJ, prevê o art. 103-B, §4º, I, da Constituição da República, verbis:

§ 5º O M inist ro do Superior Tribunal de Just iça exercerá a função de M inist ro-Corregedor e ficará excluído da dist ribuição de processos no Tribunal, compet i ndo-lhe, além das at ribuições que lhe forem conferidas pelo Est at ut o da M agist rat ura, as seguint es:

I receber as reclamações e denúncias, de qualquer int er essado, relat ivas aos magist r ados e aos serviços judiciários;

II exer cer funções execut ivas do Conselho, de inspeção e de corr eição geral;

III requisit ar e designar magist rados, delegando-l hes at ribui ções, e requisit ar servidores de juízos ou t ribunais, inclusive nos Est ados, Distrit o Federal e Territ órios.

§ 6º Junt o ao Conselho of iciarão o Procurador-Geral da República e o President e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

§ 7º A União, inclusive no Dist rit o Federal e nos Territ ór ios, criar á ouvidor ias de just iça, compet ent es para receber reclamações e denúncias de qualquer int eressado cont r a membros ou ór gãos do Poder Judiciário, ou cont ra seus serviços auxiliares, represent ando diret am ent e ao Conselho Nacional de Just iça.

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Art . 130-A. O Consel ho Nacional do M inist ério Público compõe-se de quat orze mem bros nom eados pelo Presi dent e da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absolut a do Senado Federal, para um mandat o de dois anos, admit ida uma recondução, sendo: [...]

§ 1º Os mem br os do Conselho oriundos do M inist ério Público serão indicados pelos respect ivos M inist érios Públicos, na forma da lei.

§ 2º Com pet e ao Conselho Nacional do M inist ér io Público o cont role da at uação admi nist rat iva e financeira do M inist ério Público e do cum priment o dos deveres funcionais de seus mem bros, cabendo lhe:

I zelar pela aut onomia f uncional e administ rat iva do M inist ério Público, podendo expedir at os regulam ent ar es, no âmbit o de sua com pet ência, ou recomendar providências;

II zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediant e provocação, a legalidade dos at os admi nist rat ivos prat icados por mem bros ou órgãos do M inist ério Público da União e dos Est ados, podendo desconst it uí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adot em as providências necessárias ao exat o cum priment o da lei, sem prejuízo da com pet ência dos Tr ibunais de Cont as;

III receber e conhecer das reclamações cont ra membros ou órgãos do M inist ério Público da União ou dos Est ados, inclusive cont ra seus ser viços auxiliares, sem prejuízo da com pet ência disciplinar e cor reicional da inst it uição, podendo avocar processos disci plinares em curso, det erminar a remoção, a disponibilidade ou a aposent adoria com subsídios ou pr ovent os proporcionais ao t empo de serviço e aplicar out ras sanções admi nist rat ivas, assegurada am pla def esa;

IV rever , de of ício ou mediant e provocação, os processos disci plinares de mem bros do M inist ério Público da União ou dos Est ados julgados há menos de um ano;

V elaborar relat ório anual, propondo as providências que julgar necessár ias sobre a sit uação do M inist ério Público no País e as at ividades do Conselho, o qual deve int egrar a mensagem pr evist a no art . 84, XI.

§ 3º O Conselho escol herá, em vot ação secret a, um Corregedor nacional, dent re os m em br os do M inist ério Público que o int egram, vedada a recondução, compet indo-lhe, além das at ribuições que lhe forem conf er idas pela lei, as seguint es:

I receber reclamações e denúncias, de qualquer int eressado, relativas aos membros do M inist ério Público e dos seus serviços auxiliar es;

II exer cer funções execut ivas do Conselho, de inspeção e cor reição geral;

III requisit ar e designar mem bros do M inist ério Público, delegando-lhes at ribuições, e requisit ar servidores de ór gãos do M inist ério Público.

§ 4º O President e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil oficiará junt o ao Conselho.

§ 5º Leis da União e dos Est ados cr iarão ouvidorias do M inist ério Público, compet ent es para receber reclamações e denúncias de qualquer int eressado cont ra mem bros ou órgãos do M inist ério Público, inclusive cont ra seus serviços auxiliares, represent ando diret am ent e ao Conselho Nacional do M inist ério Público.

Art. 103-B [...]

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

Já o poder normativo do CNMP consta do art. 130-A do Texto Constitucional, que estabelece:

Art. 130-A [...]

§ 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe:

I zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

Ambos os dispositivos prevêem a competência dos órgãos para expedição de atos regulamentares, no âmbito da competência que lhes foi constitucionalmente atribuída.

Com fundamento neste dispositivo, o CNJ expediu a Resolução nº 07/2005, que visou a disciplinar “o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário”.

O artigo 1º da Resolução19 tratou da vedação à prática de nepotismo no âmbito de todos os órgãos do Poder Judiciário, caracterizando como nulos os atos com ela identificados. No art. 2º20 vieram enumeradas as práticas que se enquadram no conceito de nepotismo, em rol não taxativo.

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Art . 1° É vedada a prát ica de nepot ismo no âm bit o de t odos os órgãos do Poder Judiciário, sendo nulos os at os assim caract erizados.

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A constitucionalidade do ato normativo foi apreciada pelo Supremo Tribunal Federal por intermédio da ADC nº 12/08, sob a relatoria do Ministro Carlos Britto. Na ocasião, na esteira do posicionamento já adotado pela Corte quando da apreciação da medida cautelar, ressaltaram os ministros que as vedações constantes da Resolução nº 07/05 do CNJ não padeciam de qualquer mácula, tendo em vista ser ela dotada de caráter normativo primário, por retirar fundamento de validade diretamente do art. 103-B, §4º, I da Constituição da República.

Consideraram os julgadores, ademais, que a norma veio a densificar o conteúdo dos princípios constitucionais da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade e, não havendo antinomia entre estes a e norma expedida pelo CNJ, não havia de se cogitar da sua inconstitucionalidade.

Eis o excerto do voto do ministro relator, que reproduz a ementa do acórdão da medida cautelar:

A Resolução nº 07/05 do CNJ reveste-se dos atributos da generalidade (os dispositivos dela constantes veiculam normas proibitivas de ações administrativas de logo padronizadas), impessoalidade (ausência de indicação nominal ou patronímica de quem quer que seja) e abstratividade (trata-se de um modelo normativo com âmbito temporal de vigência em aberto, pois claramente vocacionado para renovar de forma contínua o liame que prende suas hipóteses de incidência aos respectivos mandamentos).

I - o exer cício de cargo de proviment o em comissão ou de função grat ificada, no âmbit o da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, com panheiro ou par ent e em linha ret a, colat eral ou por afinidade, at é o t erceiro grau, inclusive, dos respect ivos mem bros ou juízes vinculados;

II - o exercício, em Tr ibunais ou Juízos diversos, de car gos de pr oviment o em comissão, ou de f unções grat ificadas, por cônjuges, companheiros ou parent es em linha ret a, colat eral ou por afinidade, at é o t erceiro grau, inclusive, de dois ou m ais magist rados, ou de servidores invest idos em cargos de direção ou de assessorament o, em circunst âncias que car act erizem ajust e para bur lar a regra do inciso ant erior mediant e reciprocidade nas nomeações ou desi gnações;

III - o exercício de cargo de pr oviment o em comissão ou de função grat if icada, no âmbit o da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, com panheiro ou par ent e em linha ret a, colat eral ou por afinidade, at é o t erceiro grau, inclusive, de qual quer servidor invest i do em cargo de direção ou de assessorament o;

IV - a cont rat ação por t empo det erminado para at ender a necessidade t em porár ia de excepcional int eresse público, de cônjuge, com panheiro ou par ent e em linha ret a, colat eral ou por afinidade, at é o t er ceiro gr au, inclusive, dos respect ivos membr os ou juízes vinculados, bem como de qualquer servidor invest ido em cargo de direção ou de assessoram ent o;

V - a cont rat ação, em casos excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licit ação, de pessoa jurídica da qual sejam sócios cônj uge, companheiro ou parent e em linha ret a ou colat eral at é o t erceiro grau, inclusive, dos respect ivos mem bros ou juízes vinculados, ou servidor invest ido em cargo de direção e de assessoram ent o.

A Resolução nº 07/05 se dota, ainda, de caráter normativo primário, dado que arranca diretamente do § 4º do art. 103-B da Carta-cidadã e tem como finalidade debulhar os próprios conteúdos lógicos dos princípios constitucionais de centrada regência de toda a atividade administrativa do Estado, especialmente o da impessoalidade, o da eficiência, o da igualdade e o da moralidade.

O ato normativo que se faz de objeto desta ação declaratória densifica apropriadamente os quatro citados princípios do art. 37 da Constituição Federal, razão por que não há antinomia de conteúdos na comparação dos comandos que se veiculam pelos dois modelos normativos: o constitucional e o infraconstitucional. Logo, o Conselho Nacional de Justiça fez adequado uso da competência que lhe conferiu a Carta de Outubro, após a Emenda 45/04.

Noutro giro, os condicionamentos impostos pela Resolução em foco não atentam contra a liberdade de nomeação e exoneração dos cargos em comissão e funções de confiança (incisos II e V do art. 37). Isto porque a interpretação dos mencionados incisos não pode se desapegar dos princípios que se veiculam pelo caput do mesmo art. 37. Donde o juízo de que as restrições constantes do ato normativo do CNJ são, no rigor dos termos, as mesmas restrições já impostas pela Constituição de 1988, dedutíveis dos republicanos princípios da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade. É dizer: o que já era constitucionalmente proibido permanece com essa tipificação, porém, agora, mais expletivamente positivado.

Nota-se, portanto, que embora o STF tenha entendido que o conteúdo das vedações impostas norma expedida pelo CNJ já era de observância obrigatória no âmbito do serviço público, uma vez que dedutíveis de diversos princípios do Texto Constitucional, restou expressamente consignado no acórdão da ADC nº 12/05 o enquadramento das normas expedidas pelo CNJ como normas de caráter normativo primário, já que extraem sua força diretamente da Constituição da República.

O mesmo raciocínio se aplica ao CNMP, que tem a mesma natureza jurídica e a mesma função normativa do CNJ, ambas conferidas pela Constituição da República, conforme explicitado anteriormente.

Deste modo, os atos normativos expedidos por ambos (CNJ e CNMP) estão inseridos no âmbito de delegação de competências normativas que Alexandre Santos de Aragão denomina deslegalização constitucional, e não na esfera da deslegalização legal, que abordamos neste trabalho.